Desentendimentos
A ante-sala do ministro da Defesa era bem decorada e as paredes eram pintadas em tons pastéis. Malfoy deixou Antoine ali e seguiu para resolver outros negócios pelas redondezas, seria uma segunda-feira cheia para ele, mas voltaria para buscá-la mais tarde. Antoine esperou por alguns minutos, até a macérrima e prepotente secretária conduzi-la ao gabinete do ministro.
– Sente-se mais perto senhorita Dimanchè! - disse Trevor que estava sentado, numa cadeira presidencial, atrás de uma majestosa mesa de madeira totalmente adornada.
– Pois não, senhorr, o que deseja?
Trevor levantou e se aproximou lentamente.
– O seu sotaque chamou muito a minha atenção.
– E o que há de interressante nele?! - respondeu ela cortando-o.
– Estou muito interessado... em você!
– Outrro interressado em meu nome? Se fosse grrande coisa minha família não terria parrado de prraticarr magia há tanto tempo!
– Eles nunca entenderam muito bem disso, mas não fique tão desapontada, existem outros Dimanchè que adorariam recebê-la!
– E-existem? - perguntou Antoine mudando a expressão no rosto.
– Sim. Falei de você para eles ontem mesmo, depois do jantar. Gostariam que fosse passar um dia na casa deles!
Antoine tinha um sorriso brilhante nos lábios. Era sincero e cativante.
– Eu poderia levá-la até eles, se me permitir.
– Como é que nunca ouvi falarr deles? - questionou ela mudando de expressão repentinamente, encarava-o com o canto dos olhos, a sobrancelha erguida.
– São muito reservados, não usam o nome Dimanchè, usam D’Mark.
– Mas... porr que está querrendo me ajudarr? - perguntou desconfiada.
– Bem, não posso negar que tenho certas intenções... pensei que gostaria de sair comigo, para nos conhecermos melhor!
Antoine olhou para a mesa e viu muitos papéis, uma caneta dourada, provavelmente de ouro, mas nenhum porta-retratos, nenhuma foto.
– Isso é uma afirmação? - perguntou ao vê-la silenciar - Eu lhe darei tratamento especial, tratamento que o jovem Malfoy não pode lhe dar.
– Está falando de dinheirro? - perguntou ela.
– Estou falando de tudo que possa lhe ser útil, estou lhe oferecendo uma união ao nome Ivengreyt! - exclamou de braços abertos.
Antoine baixou a cabeça. “Serrá que tudo acontece comigo?”, pensou ela. Teve vontade de estuporá-lo. Não queria casamento por dinheiro, não queria ser tratada com tanto arcaísmo! Gostava de receber elogios, galanteios, mas era absurda a forma como mulheres bruxas ricas eram tratadas por seus maridos! Não queria ser como a mãe de Draco: submissa às palavras do marido, acorrentada a casa como um escravo ao pelourinho, como um elfo à cozinha.
– Ouça. - disse ele adiantando-se e impedindo a passagem dela, que já havia se posto de pé há muito - Acha que vai ter um futuro mais promissor com Draco? Posso lhe encher de jóias e dinheiro...
– É isso que pensa! Acha que me casarria com Drraco pelo dinheirro?
– Pelo que sei, você não tem onde cair morta! - sibilou irônico e foi uma alfinetada e tanto.
– Senhor Ivengeryt... - suspirou ela - posso serr um zerro à esquerrda, mas tenho amigos!
Ele riu alto. Parecia muito engraçado para Trevor a situação da moça.
– Escute, senhorr Ivengreyt III, se quiserr me levarr parra conhecerr minha família, sem qualquerr ganho em trroca, lhe serrei grrata. Se não quiserr, paciência! Eles poderriam terr me procurrado, mas não o fizerram, então, que se virrem se quiserrem me conhecerr!
Os olhos de Trevor estavam vidrados nela.
– Eu estudei muito, fui a melhorr aluna de todos os tempos e não subjugarrei meu conhecimento parra levarr uma vidinha mediocrre de “madame”! Posso serr melhorr do que qualquerr um de vocês homens! - e dizendo isso, cerrou os punhos, mas mudando de idéia quanto ao que iria fazer, voltou a olhar para Trevor, agora, porém, com profundidade e ironia - Esperro que este “encontrro” não tenha nenhuma influência sobre a resporta que o senhorr irria darr a Drraco sobrre o emprrego, não gostarria de terr que voltarr aqui e lhe fazerr mudarr de idéia!
Antoine saiu do gabinete enraivecida. Trevor jogou-se sobre o sofá, sentia-se pasmo, estranho, os olhos dela falavam mais do que as palavras. Ao sair do prédio, Antoine voltou ao mundo real. A um mundo ao qual não estava acostuma. Nunca esteve num lugar assim antes! A confusão de gente, todos amontoados indo e vindo de lugar algum. Não sabia quando Lúcio viria pegá-la e não sabia voltar à mansão. Arrependeu-se de ter tratado Trevor daquela forma, mas algo se apoderara de seu corpo, era um lado que não conhecia de si mesma, tinha um lado autoritário e ameaçador... será que era isso que seus pais haviam pressentido e por causa disso a trancavam naquele porão? Bem, agora era tarde, já havia feito o que achara certo e não iria voltar atrás. Perambular por entre toda aquela gente era um martírio, mas Antoine resolveu que era isso que iria fazer. Lembrou-se que Lúcio falara em visitar um amigo num local chamado Towerfield. Parou ao lado de um homem vendendo pãezinhos com um molho estranho por cima e o observou.
– A senhora quer um cachorro-quente? - perguntou o vendedor rapidamente.
– Ah, não, obrrigada, apenas gostarria de saberr onde é que fica um local chamado Towerrfield.
Está com sorte, é aquele prédio ali na frente! - disse o homem apontando para o mais alto e brilhante prédio dos arredores. Ela sorriu, agradeceu e caminhou até lá. O prédio era majestoso, muito mais bonito que o do ministério. Ao entrar, foi atendida por um rapaz vestido com um uniforme de azul, cheio de botões, mas o rapaz não conhecia nenhum Lúcio Malfoy, e levou-a até o balcão da recepção, onde uma mulher loura e muito bonita a atendeu. Conhecia Lúcio e o vira ali de manhã cedo, mas não sabia informar se ainda estava no prédio. A moça conseguiu o nome do amigo que Lúcio visitara ali, Oscar Beneth. Então, Antoine tinha uma única opção: ir até o escritório do tal Oscar e pedir se alguém poderia conseguir localizar Lúcio. Entrou no elevador e apertou o botão de número 40, conforme a recepcionista lhe indicara. Gostava tanto de viver no mundo dos bruxos que ela não fazia idéia de que havia umas regrinhas do mundo trouxa: ter sempre em mãos o número de telefones de emergência, um celular ou um cartão telefônico... ou pelo menos algum dinheiro! Antoine entrou por um portal adornado com anjos, que levava a um saguão onde havia muitos sofás e mesinhas e muita gente carregada de papéis, indo de um lado para outro. Procurava por alguém para lhe dar informações, mas parecia que ninguém a estava vendo.
– Querida? - chamou uma mulher de formas sinuosas e avantajadas - Você não vai conseguir nada com esses aí! São estressados e só se importam com eles mesmos!
– Ah, obrrigada!
A mulher andou até outro portal e passou para trás de um balcão de madeira clara, Antoine a seguiu. A sala era muito elegante, ao centro havia uma enorme porta da mesma madeira também talhada com motivos angelicais, nela estava escrito com letras garrafais: Oscar Beneth. Antoine sorriu e voltou-se para a moça. Ela se apresentara, seu nome era Grace. Era uma moça muito bonita, como todas as que tinha visto na cidade, tinha a pele clara, os cabelos negros que pareciam ser lisos, mas estavam amarados em um coque e seus verdes olhos eram os maiores que Antoine já vira em sua vida.
– Quem você está procurando? - perguntou Grace.
– Bem, na verrdade, não é ninguém que trrabalha aqui! Procurro porr Lúcio Malfoy.
– Lúcio? - Grace parecia surpresa - Bem, ele esteve aqui esta manhã, mas já saiu faz uma hora! - explicou interessada em Antoine, que bufou e voltou o olhar para a porta do elevador abrindo e fechando.
– Algum problema? - Grace tornou a perguntar.
– Sim. O senhorr Malfoy me deixou num prrédio aqui em frrente e disse que virria me buscarr, mas não aparreceu e eu... bem... fui estúpida o bastante para sairr sem dinheirro. Não tenho como encontrrá-lo e não faço a mínima idéia de como voltarr parra a casa dele.
– Isso não é uma coisa que se vê todos os dias! - brincou Grace. Antoine riu forçado - Talvez eu possa encontrá-lo. Espere um instante! - Grace mexeu num macinho de papéis, tirou um deles onde estava escrito o nome e o telefone de Lúcio e discou o número - Senhor Malfoy? Desculpe incomodá-lo, é Grace, secretária do senhor Beneth. - ela parou um momento, ele deveria estar falando algo - Oh, não, não se preocupe. O caso é que há uma moça aqui, chama-se Antoine... - e foi interrompida - Sim, ela está aqui na minha frente! - parou de falar mais uma vez - Claro, pode deixar! - e desligou. A cara dela não era muito boa, ergueu rapidamente as sobrancelhas e sorriu brevemente, depois pediu que Antoine se sentasse para esperar, Lúcio estava vindo buscá-la - Você é parente dos Malfoy, querida?
– Não, não sou!
– Por que é que ele ficou tão nervoso?
– Não faço a mínima idéia! - respondeu Antoine sentando-se. Grace sentou-se ao lado dela.
– São uma família e tanto, não?
– Sim.
– Quando vêm aqui esse lugar pára. Parece que todos querem agradá-los. Conhece o filho dele?
– Drraco? - disse Antoine sorrindo - Ele deve adorrar esse assédio.
– Humfr! Ele é um esnobe, mal olha para os lados quando vem aqui! - disse Grace rindo.
– Este é o Drraco!
– Vocês se conhecem? - perguntou Grace servindo uma xícara de chá a Antoine.
– Estudamos juntos durrante sete anos, acabei de me forrmar e vim passarr uns dias na casa dele. Há dois dias em Londrres e já me perrco... bem, não estou acostumada com toda essa agitação!
– De que parte da França você vem?
– Borrgonha.
Naquele momento Lúcio irrompeu carrancudo a saleta. Tinha o olhar congelante. Antoine levantou e se aproximou dele.
– Suponho que o senhorr já esteja sabendo. - murmurou ela.
– Sim, Ivengreyt me ligou! O que está fazendo? - disse em baixo tom, mas repressivo - Não pode chegar e arruinar tudo, Draco precisava daquele cargo!
– Então ele não vai trrabalharr no ministérrio?
– Acho que não! - respondeu Lúcio se aproximando sem dar bola à Grace que havia ido para trás do balcão - Como se pode desejar que um filho seja alguém quando pessoas próximas estragam os planos de uma vida?
– Eu não fiz nada que manchasse a honrra de sua família, senhorr Malfoy. Eu somente recusei sairr com ele! Acho que quem está estrragando os planos de uma vida é o senhorr! Sabia que Trrevorr irria me fazerr tal prroposta e nem se imporrtou. O que seu filho falarria se soubesse?
– Você poderia sair com Ivengreyt e ganhar muito, Draco não pode lhe dar o que ele lhe daria! E Draco não precisaria ficar sabendo!
Antoine fechou os punhos e perguntou com fúria:
– Sua mulherr também fez isso com o senhorr?
– O quê?
– Isso mesmo que o senhorr ouviu! - disse Antoine olhando dentro dos olhos azuis dele, que estavam flamejando - Desculpe-me, mas não fui eu quem pediu parra me pegarrem na estação, o senhorr aparreceu porrque sabia que eu estarria lá e sozinha!
Lúcio olhou para os lados, viu Grace, mas ela estava sentada mexendo em papéis numa gaveta.
– Resolveremos este assunto em minha casa!
– Porr que é que meu nome é tão evidenciado?
Naquele instante apareceu Oscar Beneth.
– Lúcio? Esqueceu algo?
– Não, não... - riu ele - Estou de saída! Bom-dia! Vamos, Antoine.
Ela se despediu de Grace e seguiu Lúcio até o elevador. Foram calados até o vigésimo andar porque o elevador estava cheio, mas quando os dois ficaram sozinhos, Lúcio advertiu:
– Não quero mais nenhuma gracinha! Eu a respeito porque seu nome é muito influente na sociedade bruxa, mas não abuse de minha paciência.
Quando chegaram a casa, Antoine foi direto ao quarto, nem desceu para jantar. Draco sentiu falta dela, mas nada perguntou sobre o que acontecera, notara que o pai não estava num de seus melhores dias. Quando todos estavam dormindo, bateu à porta do quarto de Antoine. Ela o deixou entrar, tinha os olhos muito vermelhos havia chorado.
– O que foi que aconteceu? Meu pai está intragável - Draco queria explicações.
– Estrraguei suas chances de entrrarr no ministérrio. - respondeu cabisbaixa - Só isso!
– Como é?
– Você me conhece, Drraco, sabe que não gosto que me forrcem a fazerr o que não querro!
– Meu pai...
– Nem sei se deverria contarr a você... - mas os olhos de Draco pediam - Trevor querria que eu saísse com ele e eu disse não, além de falarr umas poucas e boas! - ela engoliu em seco - Desculpe!
– Desculpe nada, velho safado!
Antoine acariciou o rosto de Draco. Ele estava muito diferente, mais maduro, o rosto quadrado, a barba que antes era rala agora estava bem mais grossa. Só seus olhos estavam mais cansados, as feições do menino de treze anos, que Antoine conhecera em Hogwarts, continuavam aparentes.
– Era um importante cargo, mas não por esse preço, alguma coisa me dizia que o velho ia tentar isso, ele não pode ver um rabo de saia!
– Seu pai não teve um ataque porrque estávamos na frrente de uma secrretárria...
– E ainda consegue ser ponderado, se fosse comigo... teria amassado a cara de Trevor!
– Vou emborra amanhã, Drraco, acho que não é cerrto ficarr aqui! Dumbledorre me deu um enderreço, se puderr fazerr a gentileza de me levarr até lá!
– Não, não, você vai ficar aqui, a não ser que não tenha aceitado meu repentino pedido!
– Noivado... - murmurou ela.
– Sim. Não quero perdeu um minuto mais!
– E onde irremos morrarr?
– Vai depender do emprego que eu conseguir!
– Você terria corragem de morrarr em um lugarr como a casa de Hagrrid?
Draco arregalou os olhos.
– E por que moraríamos num lugar como aquele?
– Bem, porrque nem eu nem você temos condições de pagarr porr um lugar como sua casa! Com toda essa morrdomia!
Draco teve muito em que pensar naquela noite, mal conseguiu dormir. Todos notaram as olheiras dele no café da manhã.
Continua...
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