Amigos, piranhas e impressões

Amigos, piranhas e impressões



Capítulo 9 – parte I - Amigos, piranhas e impressões erradas


Tarde, dormitório feminino do sétimo ano


Lily Observadora: Sexto dia


Observações Totais: 44


Eu decidi que uma mudança de cenário seria a única coisa que colocaria o meu motor de Transfiguração pra funcionar. Afinal de contas, eu fiquei exilada no meu quarto o fim de semana inteiro. Esse enorme bloqueio no meu cérebro que eu parecia estar tendo só podia ser resultado de olhar para a mesma parede por quarenta e oito horas consecutivas. Eu realmente acredito que uma coisa dessas deixaria qualquer pessoa um pouquinho maluca.


Então, deixando de lado todo o risco, todo o perigo e o Plano: Esconder, eu concluí que uma boa e rápida viagem até o Salão Comunal seria a saída para minha inteligência funcionar de novo. Eu rapidamente peguei minha tarefa incompleta e o meu livro e comecei a descer as escadas pela primeira vez no que pareciam ser séculos.


Para ser franca, enquanto eu descia as escadas e o Salão Comunal lentamente ia entrando no meu campo de visão, eu esperei que alguma coisa estivesse diferente. Eu não sei o quê, mas era só esse sentimento que, de alguma forma, durante meus dois dias de ausência, alguém ou alguma coisa teria mudado. Mas nada tinha. Mudado, quero dizer. As poltronas vermelhas ainda estavam no mesmo lugar, as mesas de madeira também, os curiosos primeiranistas se escondendo no canto, os confiantes sextanistas espreguiçando-se na frente da lareira...Parecia exatamente a mesma coisa. Todos estavam exatamente iguais. Parecia até estranho.


Eu peguei um lugar em uma poltrona desocupada perto da lareira, mas não tão perto dela para que eu não tivesse que entrar em alguma conversa sem sentido com os sextanistas reunidos lá. O lugar também permitia uma vista perfeita da sala para uma investigação mais completa. Alguma coisa tinha que estar diferente. Eu podia sentir.


Eu comecei primeiro com as poltronas, olhando em volta para ver quem estava sentado nelas. Os sextanistas sentaram na maioria delas, claro, espreguiçando-se e conversando amigavelmente. Eu achei Marley entre eles, e sorri e acenei quando ela olhou pra mim. Alguns terceiranistas estavam sentados no outro sofá, jogando baralho, mas não Snap Explosivo, que é o único jogo bruxo de cartas que eu conheço. Depois, eu olhei para o chão, onde algumas garotas que eu acho que são ou do primeiro ou do segundo ano estavam estudando com um livro bem grande. Elas pareciam totalmente absorvidas pelo trabalho, e eu apenas esperava que eu também estivesse assim em breve. Meus olhos se moveram para as mesas. Na primeira, Chris Lynch e uma garota loira mais nova estavam sentadas, jogando um silencioso jogo de xadrez. Na segunda, estavam Sirius, Remus e Peter. Suas cabeças estavam bem juntas e eles estavam observando algo que estava em cima da mesa. Eu os observei, curiosamente, por alguns minutos, imaginando que loucura eles iriam aprontar agora, até que eu, repentinamente, percebi que um deles não estava lá. A Peste não estava com eles. Eu mordi meus lábios curiosamente, imaginando o porquê dele estar desaparecido. Onde ele poderia estar?


E foi aí que eu o vi.


Ele estava sentado na mesa ao lado. Estudando.


É. Estudando.


Eu controlei o desejo de rir bem alto por causa desse absurdo. Os alarmes dentro da minha cabeça estavam disparando em um volume muito alto – alguma coisa estava acontecendo. Tinha que estar. Eu nunca, nunca, nesses sete anos que eu o conheço, vi James Potter estudar. Nunca. Ele simplesmente não faz isso. Eu não sei porque, mas ele simplesmente não estuda. E mesmo assim, lá estava ele, silenciosamente virando as páginas de um livro, constantemente lendo e ocasionalmente anotando alguma coisa num pedaço de pergaminho perto de seu cotovelo. E ele estava fazendo tudo isso, apesar de seus amigos estarem, precariamente, planejando alguma travessura apenas alguns passos longe dele. Parecia tão não-natural, que eu fiquei um pouquinho surpresa. Eu pensei que, talvez, ele não estivesse estudando. Talvez, ele estivesse, na verdade, olhando revistas indecentes e anotando fatos interessantes a respeito de suas modelos favoritas ou algo assim. Eu levantei o meu pescoço um pouco mais, tentando ver melhor o que ele estava fazendo sem ser completamente indiscreta. Eu não consegui ver nada.


Lentamente, eu percebi que algo tinha mudado. Só que não era o que eu tinha esperado.


Depois de observar Potter cuidadosamente por mais algum tempo, eu voltei para os meus próprios estudos, determinada a ignorar aqueles alarmes retumbantes na minha cabeça que estavam gritando para mim para que eu descobrisse o que estava acontecendo com o enigma que é o James Peste Potter. Eu sabia que eu não podia lidar com tudo isso agora. Eu tinha uma tarefa de Transfiguração pra terminar.


Eu abri o meu livro e olhei para a primeira pergunta da minha tarefa.


Explique os resultados do movimento de uma leve pancada com a mão esquerda ao transformar animais. Explique o movimento circular.


Ugh.


O movimento de uma leve pancada com a mão esquerda? Isso...bem, isso...er...faz alguma coisa?


Assim como o movimento circular?


Que resposta, gênio. Enquanto você está nela, encontre também a cura do câncer, tudo bem?


Lendo as próximas perguntas pelo que parecia ser a bilionésima vez naquela noite, eu consegui achar as mesmas respostas patéticas para cada uma. Eu dei uma olhada no livro, mas não conseguia parecer achar informação suficiente para me ajudar, ou talvez eu simplesmente não conseguia juntar tudo que eu estava lendo. Eu olhei para as minhas anotações apressadas das últimas aulas.


Nada. Niente.


Eu tentei não gemer alto, enquanto eu lia as outras perguntas e continuava sem conseguir respondê-las. Não era a minha localização, era eu. Esse pensamento me deprimiu imensamente. Eu suspirei, parando de olhar para o meu livro com uma expressão de tristeza. Imediatamente, quase como se tivesse sido atraída por uma força magnética, meus olhos voltaram a observar o monitor-chefe. Só pra conferir, percebe. Sabe, para ver se ele ainda estava estudando e tudo mais.


Ele estava.


Ou lendo revistas indecentes. Eu ainda não tinha total certeza se ele não estava fazendo isso. No entanto, se ele estava fazendo isso, eu imagino que ele não teria uma expressão inquiridora em seu rosto. A não ser que ele estivesse estudando a anatomia feminina, mas, sabe, eca.


Ele parecia tão envolvido, tão consumido pelo trabalho, assim como as garotas que eu tinha visto estudando no chão antes. Eu fiquei imaginando se ele era tão naturalmente aplicado em todas as coisas, ou simplesmente no que ele estava fazendo agora. E depois, eu comecei a pensar se ele, talvez, poderia estar assim tão concentrado porque ele não tinha mais nada para terminar. E se ele não tinha mais nada para terminar, isso teria que significar que ele tinha terminado sua tarefa de Transfiguração, não teria? E se ele tinha, como eu acreditava, de fato terminado sua tarefa, eu comecei a pensar o que o Sr. Peste iria fazer se eu, inocentemente, o abordasse e pedisse ajuda com a minha tarefa. Meu primeiro pensamento foi que ele iria rir de mim e me dizer o quanto eu era patética. Meu segundo – e surpreendentemente mais predominante – pensamento, no entanto, era que ele iria puxar a cadeira ao seu lado, me pedir para sentar, e iria, então, me ajudar com afinco, assim como ele estava fazendo agora mesmo. E quanto mais eu pensava sobre isso, mais a minha segunda idéia começava a fazer sentido. Quero dizer, ele era, afinal de contas, o meu professor particular. Era sua obrigação me ajudar com coisas como essa. Então, não seria idiota ou bobo se eu, simplesmente, fosse até ele e pedisse ajuda agora, seria? Não, eu não acho que seria.


E antes que eu percebesse – ou desse ao meu cérebro mais uma chance para refletir de novo sobre o meu plano maluco – eu me encontrei silenciosamente me levantando da minha cadeira, com os livros na mão, lentamente indo à mesa do James.


Eu parei silenciosamente ao seu lado, observando-o enquanto ele movia sua pena rapidamente em um dos pergaminhos espalhados pela mesa. Ele não me notou.


“Olá”, eu disse repentinamente, com um tom um pouco mais alto do que eu tinha pretendido. Potter pulou ao ouvir minha voz, e virou sua cabeça rapidamente para me encarar. Sua surpresa era aparente, e eu mordi os meus lábios nervosamente.


“Lily!”, ele disse, suas sobrancelhas enrugadas. “Eu...er...é, oi”.


Ele me observou cuidadosamente, obviamente se perguntando o que eu estava fazendo em pé ao lado de sua mesa, tentando iniciar uma conversa com ele. Eu estava começando a me perguntar a mesma coisa.


“Eu tenho uma pergunta pra você”, eu disse a ele calmamente, meu estômago se revirando incomodamente. Em pé ao seu lado, minha idéia não parecia mais tão magnífica.


“Sim?”, ele me incentivou a continuar.


Eu continuei a mordiscar os meus lábios nervosamente. Eu não queria continuar. O que ele iria dizer se eu simplesmente me virasse e fosse embora? Ah, Merlin, eu não podia fazer isso. Eu me lembrei da minha tarefa incompleta, do fato de que James era meu professor particular, e de sua concentração. Eu me forcei a continuar.


“Eu...bem, eu estava só pensando – porque você é meu professor particular e tudo mais, e é seu dever e – que...bem, que como essas perguntas idiotas de Transfiguração não fazem o menor sentido pra mim, é meio que minha obrigação ir até você, não é? Porque você é meu professor particular, e esse é o seu trabalho. E se eu não viesse até você, você não seria realmente o meu professor particular, porque você não estaria me ajudando – não que você precise totalmente, ou algo assim! Eu só pensei que você provavelmente deveria e tudo mais porque...bem, porque você é o meu professor particular e...ai, droga...”. Eu dei alguns passos para trás, corando furiosamente por causa da minha ridícula fala. Eu estava bastante certa de que se o teto tivesse aberto e, de uma nuvem lá alto no céu, um raio tivesse escolhido naquele exato momento para cair em cima de mim, eu não ficaria assim tão chateada.


Os olhos de Potter brilharam com óbvia diversão, e um pequeno sorriso apareceu em seus lábios. Eu esperei que ele zombasse de mim; que ele risse abertamente na minha cara da minha estupidez e imbecilidade. Mas ele não riu. Não mesmo. Ao invés disso, ele continuou a sorrir e gentilmente perguntou, “Esse é o seu jeito de me pedir ajuda, Lily?”.


Eu não sabia o que dizer. Isso era uma armadilha? Eu me arrependeria em responder sim em alguns minutos? Não tinha jeito de eu saber.


“Se fosse, o que você diria?”, eu reagi, respondendo evasivamente.


James continuou a me olhar cuidadosamente, seus olhos examinando o meu rosto de um jeito, que me deu vontade de sair correndo da sala o mais rápido possível. Eu pude me sentir corar de novo em sinal de desconforto. Por que ele estava me olhando desse jeito?


“Eu diria”, ele começou com sua voz calma, “para você se sentar”. Ele balançou sua cabeça em direção a cadeira ao seu lado. Meu coração parou de bater tão forte dentro do meu peito. Eu, silenciosamente, soltei a respiração, sem nem mesmo saber que eu a estava segurando. Ele tinha dito sim. A maldita tarefa seria feita. Eu estava tão aliviada, que eu poderia até ter cantado. Sem me importar com o fato de que eu estava me humilhando totalmente na sua frente, eu me sentei no lugar indicado, colocando meus livros calmamente na minha frente. Potter marcou a página em que ele estava em seu livro bem grande (não uma revista indecente), e moveu os seus pergaminhos.


“Se você estiver no meio de alguma atividade, você não tem que me ajudar, é claro”, eu gaguejei, olhando para as suas muitas anotações, que davam a impressão de serem muito importantes. “Eu posso esperar Grace voltar, ou eu posso-“.


“Não se preocupe com isso”, ele insistiu, rejeitando os meus protestos.


“O que você estava fazendo – quer dizer, se você não se importar que eu pergunte?”.


“É um trabalho de Aritimancia”, James respondeu casualmente, dando de ombros. Ele pegou suas anotações para me mostrar. “Professora Vector precisa disso pronto pra algum professor Francês, e ela me pediu para ajudá-la”.


Eu olhei para os números e fórmulas complicadas, e depois para o livro enorme que ele estivera usando. As duas coisas pareciam totalmente estranhas e totalmente intimidadoras. “Parece bastante difícil”, eu comentei, seguindo seus rabiscos com o meu dedo.


“É um pouco”, James confirmou, sua voz ainda indiferente. “Professora Vector disse que até ela teve dificuldades em algumas partes, então eu não estou preocupado se parte da tarefa vai me dar trabalho. Eu gosto do desafio”.


Sua menção ao fato de que Professora Vector teve dificuldades me intrigou. “Espera aí”, eu disse o olhando ceticamente. “Você quer dizer que você está fazendo uma coisa com nível de professor?”.


James deu de ombros de novo. “Eu acho que eu simplesmente tenho jeito pra coisa. Não é nada especial”.


Eu acho que eu simplesmente tenho jeito pra coisa. Não é nada especial.


Minha cabeça rodou ao ouvir suas palavras. O James Potter que eu conhecia nunca teria dado de ombros ao ouvir um elogio. O James Potter que eu conhecia era um idiota vaidoso que se achava um Deus. O James Potter que eu conhecia teria alardeado e se gabado de seus excelentes talentos e habilidades. Quem era esse impostor? Onde estava o idiota vaidoso que eu conhecia? Trancado num armário? Escondido nas masmorras? No fundo do Lago?


Era loucura. Loucura ridiculamente e brilhantemente louca. Ele não só estava sendo gentil de novo, como ele não estava mais agindo como um exibido intimidador. Loucura. Loucura pura e inalterada.


“Não”, eu disse, balançando minha cabeça furiosamente, enquanto eu olhava para as fórmulas complicadas de novo. “Isso é...isso é incrível, Potter. Sério. Aritimancia é difícil, e se você está fazendo algo no nível da Professora Vector...você deve ter mais do que simplesmente um jeito pra coisa”.


Potter deu de ombros de novo.


“Bem, chega dessa coisa chata”, ele disse, limpando sua garganta. “Agora, no que você estava precisando de ajuda?”.


Eu empurrei o questionário em branco para ele. Ele o olhou de forma meio zombeteira.


“Todas as perguntas?”, ele perguntou.


“Todas as perguntas”, eu respondi me encolhendo.


Ele balançou sua cabeça, me lançando um pequeno sorriso. “Só você mesmo, Evans”.


Evans. Ele não tinha me chamado de Lily. Isso tinha sempre me incomodado antes, mas agora, de alguma forma, o sobrenome parecia errado. Talvez fosse por causa do erro de chamá-lo dez vezes de ‘James’. Talvez fosse porque eu me acostumei a ouvi-lo me chamar de Lily. Eu não sabia. E eu, particularmente, não queria saber.


“Me desculpe”, eu murmurei, corando de novo. Eu xinguei todos os meus genes ridículos.


“Por quê?”.


“Por ser idiota”, eu respondi sem rodeios, fazendo um gesto em direção ao questionário em branco. James riu.


“Você não é idiota”, ele me disse. “Algumas pessoas simplesmente não pegam as coisas”.


“Mas eu sempre entendo as coisas”, eu insisti, “Transfiguração é a única coisa idiota que me dá trabalho, e eu não tenho idéia do porquê”.


“Todo mundo tem suas fraquezas”, ele me disse gentilmente. Eu revirei os meus olhos.


“Você não”, eu murmurei sem pensar. “Você é bom em tudo”.


Droga! Minha boca traidora atacou de novo. Eu me senti a maior idiota do mundo inteiro. Acha que eu elogiei o garoto o suficiente?


“Confie em mim”, ele respondeu calmamente, com uma voz muito estranha. “Eu também tenho minhas fraquezas”.


O seu tom de voz estranho me fez olhar pra ele, mesmo me sentindo incomodada. Quando eu o olhei, eu me assustei ao encontrar suas bochechas um pouco vermelhas. Seria verdade? Eu e meus ridículos elogios tinham deixado o James Potter corado? Isso era mesmo possível?


“Er, certo”, Potter disse, limpando sua garganta de novo, suas bochechas ainda vermelhas. “Vamos começar logo isso, não?”.


E mais ou menos por uma hora, foi o que nós fizemos.


Ele era aplicado, tudo bem, com certeza. Era, na verdade, bastante engraçado, sabe, porque ao invés de simplesmente me dar as respostas como todo mundo faz, Potter, na verdade, tentava explicar as coisas pra mim sendo um verdadeiro professor particular – não que eu tenha entendido alguma coisa, claro, e eu disse isso pra ele, mas ele não se importou. Ele simplesmente continuou explicando até que eu finalmente mentisse e dissesse que eu tinha entendido. Foi legal da parte dele, eu acho, mesmo sendo uma causa totalmente perdida.


Nós terminamos mais ou menos as nove, e o Salão Comunal tinha começado a se esvaziar, já que os estudantes mais novos tinham ido dormir. No entanto, nada disso tinha sido notado por mim, já que eu estava me divertindo muito conversando com James para notar. Ele estava sendo tão legal, mais ou menos como antes de todo o incidente da ‘gosma verde’, e ele tinha um jeito de dizer as coisas que fazia com que você o escutasse. Foi bastante estranho, sentar lá e conversar com ele como se nós fôssemos...amigos ou algo assim.


Mas nós ainda não somos. Amigos, quero dizer. Mesmo eu gostando de conversar com ele. Eu também gosto de conversar com o secretário do correio de corujas em Hogmeade, mas nós não somos amigos. De qualquer jeito, quem sabe por quanto tempo essa coisa toda vai durar? Eu acredito com toda certeza que James Potter não pode ser tão legal assim comigo por tanto tempo.


“Ai, droga!”, Potter disse, olhando para o relógio que marcava dez horas. Eu fiquei surpresa ao ver que já era tão tarde. “É melhor eu subir. Eu ainda tenho uma redação de Estudos dos Trouxas para terminar”.


Eu concordei com a cabeça, surpresa em descobrir que eu estava me sentindo muito cansada.


“Obrigada por me ajudar”, eu disse, me levantando e começando a recolher as minhas coisas.


“É o meu trabalho”, James insistiu com um sorriso, imitando o que eu tinha gaguejado antes. “Já que eu sou seu professor particular e tudo mais”.


“É, é”, eu ri, revirando os meus olhos.


Nós chegamos ao lugar em que o dormitório masculino se separa do feminino e paramos. Eu, de repente, me senti extremamente estranha parada lá. James passou sua mão pelo cabelo de maneira nervosa e eu mordi os meus lábios. Hábitos asquerosos, todos os dois.


“É, bem, obrigada de novo”, eu murmurei, me virando para encarar a escada. “Boa noite, James”.


James.


Eu o tinha chamado de James.


Em voz alta.


Meu olhar se cravou no dele no segundo em que o nome saiu da minha boca. Eu juro que eu nunca tinha visto James Potter tão chocado em toda a minha vida. Eu tinha certeza que a morte seria misericordiosa demais naquele momento. Qual era o meu problema? O que eu estava fazendo?


“Boa noite, Lily”, ele respondeu calmamente algum tempo depois.


E antes que um de nós dois pudesse dizer mais alguma coisa completamente idiota, eu subi correndo as escadas e entrei no meu dormitório.


Eu sou tão, tão idiota.




Extremamente tarde, dormitório feminino do sétimo ano


Lily Observadora: Sexto dia (ou será o sétimo?)


Observações Totais: 44


Depois de ficar nessa cama abandonada por horas e horas, partir em pedacinhos todas as conversas e ações da noite, analisá-las a fundo e completamente, eu cheguei a uma conclusão bastante confortadora:


Estava tudo bem eu tê-lo chamado de James.


Sério, estava mesmo. Porque, quer saber de uma coisa? Por agora, hoje, ele é legal. Ele é legal e é divertido conversar com ele. Pessoas que são legais e divertidas de se conversar merecem serem chamadas pelo primeiro nome, mesmo que eu nunca tenha feito isso antes, mesmo que isso pareça loucura.


Além disso, se essa gentileza toda for outra brincadeira de mau gosto da parte dele, eu decidi que isso não tem problema nenhum, porque aí, pelo menos eu vou saber pela última e definitiva vez que ele nunca vai crescer. Eu vou saber que outras tentativas de ser ‘legal’ no futuro serão em vão. Eu vou ter certeza.


E, enquanto isso, agora que ele está sendo legal e eu o estou chamando de James, ele pode fazer as minhas tarefas de Transfiguração pra mim.


Nós não seremos amigos, mas também não seremos inimigos.


Eu, não mais, vejo um lado negativo nessa situação. Eu realmente acho que não tem um.


Hurrah!




Segunda-feira, 22 de setembro, dormitório feminino do sétimo ano


Lily Observadora: Sétimo dia


Observações Totais: 45


Como, exatamente, alguém passa a ser legal com antigos inimigos?


Quero dizer, eu acho que antes de eu sair correndo para o café-da-manhã – onde ele certamente estará – eu devo, pelo menos, descobrir como eu devo agir na sua frente, agora que eu decidi não odiá-lo mais, certo? Ele sendo James, quero dizer. James antigamente conhecido como Potter. James, com quem agora é permitido ser legal. E também chamá-lo de James.


Então, o que eu faço?




Mais tarde, dormitório feminino do sétimo ano


Lily Observadora: Sétimo dia


Observações Totais: 46


Eu acho que eu simplesmente vou dizer “oi” ou algo assim. Sabe, simpática, mas não simpática demais. Não amigavelmente-simpática. Porque James Potter não é meu amigo. Nós somos apenas...colegas. Sim. É isso.


Então, eu serei simpática.




Mais tarde, Defesa Contra as Artes das Trevas


Lily Observadora: Sétimo dia


Observações Totais: 47


Quando eu cheguei no Salão Principal, Marley estava sentada sozinha na mesa da Grifinória, comendo seu café-da-manhã e lendo O Profeta Diário.


“Ah, oi, Lily!”, ela me cumprimentou com um sorriso, tirando os olhos do jornal. “Eu pensei que você não viria. Nós sentimos sua falta ontem”.


Eu sorri de volta pra ela, me sentindo um pouquinho culpada por fazê-la acreditar – sabe, já que eu disse a ela que havia uma chance de eu vir para o café-da-manhã, quando obviamente não havia. Foi muito rude da minha parte.


“Eu não estava me sentindo muito bem”, eu menti, me sentando na sua frente. Marley balançou a cabeça compreensivamente e voltou a ler a seu jornal.


Depois dessas gentilezas trocadas, eu silenciosamente me ajeitei no banco e comecei a me servir. Ao colocar os meus usuais waffles no meu prato, a ausência de uma certa pessoa não passou despercebida por mim. Ao encher o meu copo de suco de abóbora, eu secretamente comecei a examinar o Salão Principal, procurando por qualquer sinal de um familiar monitor-chefe com cabelo bagunçado. James parecia ainda não estar lá, o que eu achei um pouquinho estranho. Enquanto eu comia meus waffles, eu silenciosamente continuei a procurá-lo, esperando que ele aparecesse para que eu pudesse, oficialmente, experimentar a minha nova rotina sendo ‘simpática’. Seria um desperdício de tempo todo esse plano de parecer simpática se ele não aparecesse. Eu teria me preocupado à toa por razão nenhuma. Que injusto seria!


Ao dar mais uma rápida olhada para Marley, algo que eu vi pelo canto do olho me chamou a atenção. Pela primeira vez, eu repentinamente notei um prato cheio ao seu lado.


Um prato que continha ovos.


Ovos, com ketchup.


Ah-há.


“Onde está James?”, eu perguntei, movendo minha cabeça em direção ao prato, tentando parecer o mais indiferente possível. Marley olhou para mim, e depois para o prato ao seu lado.


“Ah, ele saiu correndo há alguns minutos”. Ela mordeu sua torrada ainda olhando para mim e virou, ruidosamente, a página do jornal. “Disse que tinha uma redação de Estudos dos Trouxas para fazer e que tinha esquecido seu livro”. Ela sorriu levemente e revirou os seus olhos. “Garotos”, ela murmurou.


Eu sorri em resposta e concordei com a cabeça. Sim, garotos. Mas Marley não sabia que esse certo garoto provavelmente não teria feito essa coisa própria de garotos – deixar a tarefa para última hora, quero dizer – se eu não tivesse mantido esse certo garoto acordado até dez e meia da noite, me ajudando com a tarefa de Transfiguração porque eu sou idiota (e, eu reconheço agora, um pouquinho egoísta). Ela não sabia que não era realmente culpa dele, ele estar fazendo essa coisa toda própria de garotos, mas sim minha.


“Ah”, eu respondi fracamente, empurrando meus waffles pelo prato. Eu mordi os meus lábios com incerteza. “Então, ele vai voltar?”.


Marley deu de ombros, seu rosto, mais uma vez, desapareceu atrás do Profeta. “Eu acho que sim”.


“Ah”, eu murmurei de novo. “Bom. Muito bom”.


Eu sabia que eu devia ter parecido uma completa idiota.


“Por quê? Você sentiria minha falta, Lily?”.


Minha cabeça se virou ao ouvir a voz divertida que surgiu atrás de mim. Com um sorriso infantil em seu rosto e um livro enorme seguro em suas mãos, James me observou com uma óbvia risada presente em seus olhos.


“Eu- er...o quê?”, eu bradei, corando furiosamente por ter sido pega olhando pra tipo de coisa não combina com o Plano de ser simpática. Na verdade, esse tipo de coisa, definitivamente, combina com uma categoria ACIMA da simpatia, ou talvez até mesmo chega na categoria de perseguição. E eu não sou nenhum dos dois. Não sou excessivamente simpática e nem uma perseguidora, quero dizer.


James me lançou um sorriso conhecido, enquanto ele se sentava ao meu lado. Ele pegou o seu prato e o colocou no seu novo lugar e jogou seu livro na mesa com um barulho enorme.


“Admita, Evans”, ele me provocou, ainda sorrindo como um garoto travesso com sete anos de idade. “Seu café-da-manhã não estaria completo sem ê morreria de saudades de mim, se eu não estivesse aqui”.


Sua arrogância soberba com a qual eu estava acostumada e que sempre me causava repulsa não pareceu tão ruim assim, enquanto ele estava sentado lá, com seu inocente sorriso, me observando com atenção, sua diversão aparente. Eu lutei para não sorrir, mas depois me lembrei da decisão que eu tinha tomado ontem à noite e, suavemente, o deixei escapar. É permitido que pessoas simpáticas sorriam quando os outros estão os provocando. Era permitido eu me divertir quando ele fazia coisas como essa agora. O conceito parecia quase estranho, mas ao mesmo tempo, levemente confortante.


“Ah, claro”, eu reagi com sarcasmo, revirando os meus olhos e espetando o meu garfo nos waffles. “Eu tenho certeza de que eu ficaria desolada sem você aqui”.


James sorriu de forma atrevida, antes de acrescentar com um tom convencido, “Eu sabia”. Depois ele, de forma não cerimoniosa, enfiou um monte de ovos vermelhos na sua boca. Eu fingi vomitar em cima do meu prato e ele riu de novo.


Percebe? Essa coisa toda de ser simpática é tão fácil.


Nós continuamos a conversar e a comer por mais algum tempo (eu sendo totalmente simpática, claro, e não má e antipática como eu tinha sido alguns dias atrás, ou extremamente simpática e perseguidora como eu tinha sido alguns minutos atrás), quando James repentinamente se lembrou da sua esquecida redação de Estudos dos Trouxas, e tirou um pergaminho em branco da sua mochila.


“É sobre o quê?”, eu perguntei, pegando seu livro, enquanto ele procurava por uma pena em sua mochila. No topo da página pude ler: O Automóvel.


“Er, carros, eu acho”, sua voz estava levemente abafada, já que ele continuava a procurar na mochila a sua pena. “Aonde, diabos, está – “.


“Aqui”, eu disse, pegando uma pena da minha própria mochila e entregando pra ele. Ele se endireitou, olhou para a pena oferecida e depois levantou sua mão e a pegou.


“Obrigado”, ele disse com um sorriso. Eu sorri em resposta e balancei a cabeça, verdadeiramente orgulhosa de mim mesma por ser tão simpática. Enquanto James começava a ler suas anotações, eu folheei curiosamente as páginas do livro. Como eu nasci trouxa, é sempre esquisito ler sobre esses objetos, como um microondas e uma lâmpada por exemplo, de uma perspectiva que os faz soar meio que como tecnologias novas e confusas. Mas é exatamente isso que elas são, eu acho. Para os bruxos, quero dizer. Mas ainda assim é esquisito.


“Ei, Lily?”.


“Hum?”, eu respondi, ainda folheando as páginas.


“Posso pegar o meu livro de volta agora?”.


“Ah!”, eu corei de novo pela segunda vez naquela manhã, enquanto eu devolvia o livro pra ele. “Me desculpe”.


Ele deu de ombros, e depois continuou a escrever sua redação.


Operação Simpatia: Completa.




Ainda mais tarde, Aula dupla de Feitiços


Lily Observadora: Sétimo Dia


Observações Totais: 47


Por alguma estranha razão, June Mackey – monitora quintanista da Grifinória, e uma completa e total piranha – repentinamente, decidiu que ela precisa falar comigo. Eu não sei sobre o quê, e eu não sei porque, mas eu sei que ela quer. E o problema é que ela sabe que eu sei que ela quer falar comigo. Quero dizer, quem não iria saber? Eu acho que toda a maldita escola sabe nesse momento, porque ela agora fica me seguindo por todo canto, e ela não é, exatamente, dos seguidores mais quietos. Como por exemplo, de repente, ela está correndo pelo corredor da sala de feitiços, tentando chamar minha atenção.


“Ei, Evans!”.


Eu me encolhi...e fingi não tê-la escutado.


“Evans!”.


Eu entrei na porta mais próxima, que acabou sendo a porta da sala do Professor Flitwick. Eu, então, comecei a perguntar pra ele sobre a nossa tarefa do fim de semana, porque assim iria parecer que eu estava, momentaneamente, inacessível para certa piranha do quinto ano que, por acaso, poderia estar querendo falar comigo. Por cima dos ombros do Flitwick, eu vi June meter sua cabeça na sala. Então, graças a Deus, ela partiu. Meu plano genial tinha funcionado.


No entanto, eu tive que ouvir o Flitwick falar sobre a tarefa do fim de semana, a qual eu poderia ter feito com os meus olhos fechados e com as minhas mãos amarradas.


Mas, no final, eu acho que valeu a pena.




Ainda mais tarde, almoço no Salão Principal


Lily Observadora: Sétimo dia


Observações Totais: 48


Apesar das minhas elaboradas tentativas de evitar o ocorrido, June habilmente armou uma emboscada para mim quando eu estava saindo da sala de Feitiços, praticamente me agredindo assim que eu saí da sala. Não tinha a mínima possibilidade de eu escapar dela dessa vez.


“Evans!”, ela exclamou, pulando na minha frente assim que eu abri a porta, Grace logo atrás de mim. Em seu rosto havia um grande e ansioso sorriso. “Eu preciso falar com você”.


Uh, é. Eu meio que já percebi isso, piranha.


“Fica fria, Mackey”, Grace riu, lhe lançando um olhar divertido e casualmente se colocando na minha frente, bloqueando June com seu corpo.


June revirou os seus olhos e lançou um olhar impaciente para Grace. “È importante, Reynolds. Saia da frente”.


Grace bufou e riu. “Eu acho que vou deixar essa pra você, Monitora”, ela me disse com um sorriso. Eu olhei furiosa para ela ao perceber que ela estava me abandonando. “Vejo você no almoço!”, ela disse com um aceno. E com um último pigarreio, caminhou pelo corredor, me deixando sozinha.


Sozinha.


Com a piranha.


“O que você quer June?”, eu perguntei impacientemente, um pouco nervosa por que Grace tinha me abandonado daquele jeito. Que amiga leal ela é! Hunf!


“Eu preciso de sua ajuda, Evans”, June me disse seriamente, ainda irritada. Eu levantei uma sobrancelha.


“Ajuda?”, eu perguntei imediatamente com suspeita. “Que tipo de ajuda?”.


June deixou escapar um longo e sofrido suspiro, como se a minha simples pergunta tivesse, de alguma forma, dificultado desnecessariamente a situação, mesmo sem ter dificultado.


“É realmente muito simples”, ela me disse, jogando seus cabelos para trás de seu ombro. Eu esperei ela continuar. Ela não continuou.


“E?”, eu a instiguei.


Ela suspirou de novo, como se eu fosse a culpada por estar prolongando essa conversa horrível. “E”, ela repetiu, revirando seus olhos. “Eu preciso de sua ajuda”.


Eu tive que me segurar para não estrangular a idiota estúpida.


“Fale logo o que você quer, ou eu vou embora”, eu respondi com raiva, deixando a minha irritação com ela ser percebida. Quando ela simplesmente revirou seus olhos de novo, eu comecei a ir embora.


“Espera! Pare!”, ela gritou, agarrando o meu pulso e me levando de volta para onde a gente estava. Irritada com ela, eu lhe lancei um olhar que, claramente, mostrava que eu não estava de bom humor.


“Ou diga o que você quer, ou me deixe ir”, eu disse pra ela sem rodeios, finalmente de saco cheio com a coisa toda.


Além disso, eu estava morrendo de fome.


“Tudo bem”, ela respondeu, me olhando furiosamente. “Eu...eu...”.


“June – “.


“Eu preciso que você troque comigo o dia das rondas”.


Eu parei.


Er, o quê?


“O que você disse?”, eu perguntei, estreitando meus olhos ceticamente.


“Eu disse”, ela repetiu, sem perder seu tom sarcástico, “que eu preciso que você troque o dia das rondas comigo. O meu é quinta-feira. O seu é semana que vem. Troque comigo”.


Era isso. Não era ‘Eu preciso que você faça a minha tarefa’, ou ‘Eu preciso que você faça uma Poção Contraceptiva pra mim”, ou até mesmo ‘Eu preciso que você me ajude a matar esse ou aquele’. Apenas ‘Eu preciso que você troque comigo’. Agora, eu não sou idiota – quero dizer, me dava muito trabalho conseguir pegar as rondas do fim do mês e tudo mais, já que todo mundo sabe que esses são os melhores dias para fazer a ronda (eu não sei porque, mas nesses dias você consegue se livrar da ronda mais cedo. Sabe, ao invés de fazer a ronda até meia-noite, você consegue sair às onze. É desse jeito) – mas eu duvido que June Mackey iria se humilhar na minha frente, simplesmente pra se livrar de uma hora de ronda pelo castelo. Não fazia sentido nenhum.


“Por quê?”, eu perguntei cautelosamente.


June me olhou com ainda mais raiva. “E isso importa?”, ela respondeu.


Eu balancei minha cabeça. “Sem explicação eu não troco”, eu disse a ela firmemente, cruzando os meus braços. Seus olhos se estreitaram perigosamente, e eu pensei que, talvez, ela iria se virar e me atacar ali mesmo. Ao invés disso, ela virou sua cabeça e murmurou alguma coisa.


“Pode falar”, eu mandei, tentando fazer com que ela me olhasse de novo. Ela virou sua cabeça para me encarar e me olhou com raiva um pouco mais. Eu lhe lancei um olhar irritado e ela suspirou com pesar.


“Tudo bem!”, ela respondeu com raiva, cruzando seus braços também. “Eu – eu...você sabe com quem você vai fazer a ronda?”.


Eu refleti por um momento, e depois sacudi a minha cabeça. Eu tinha corrido para a programação e assinando meu nome nos dias perto do fim do mês, e depois tinha saído. Sinceramente, eu nem mesmo tinha olhando com quem eu ia fazer as rondas. Não importava muito.


“Bem, você vai fazer com...alguém”, June afirmou, arrumando seus braços cruzados com desconforto. “Eu preciso – falar com essa pessoa”.


Eu olhei para a loira sem acreditar. “Alguém?”, eu perguntei com desconfiança. “Falar? Não me diga que você vai, na verdade, tentar seduzir algum pobre garoto inocente, enquanto você estiver fazendo a ronda!”.


A expressão no rosto de June me disse que isso era exatamente o que ela pretendia fazer.


Merlin, Mackey!”, eu gemi, sem nem mesmo me importar com a expressão de nojo em meu rosto. “Isso é um nível muito baixo! Mesmo pra você!”.


“Ah, cala a boca, Evans!”, June espumou de raiva. “Não é como se eu fosse estuprar alguém! Ele quer tanto quanto eu!”.


Eu não podia realmente contradizer June. Quero dizer, existem poucos caras que iriam, de bom grado, resistir aos avanços indecentes de June. Mas mesmo assim...


“Quem é?”, eu perguntei.


June sacudiu sua cabeça furiosamente. “Não é da sua conta, Evans”.


“Eu vou descobrir de qualquer jeito”, eu insisti dando de ombros.


“Bem, então que você espere até descobrir”, ela disse determinada, sua cara emburrada com óbvio desgosto pelo que ela tinha acabado de me revelar. Eu pensei em continuá-la pressionando, mas depois decidi deixar pra lá. Eu queria que essa conversa terminasse o mais rápido possível.


“Então, nós temos um acordo?”.


Ela estendeu sua mão bronzeada e com as unhas pintadas para mim, e eu a olhei cautelosamente. Eu deveria mesmo fazer isso? Quero dizer, o pobre garoto inocente...mesmo que ele quisesse isso...não é justo..e eu vou ter que fazer ronda por mais uma hora...e o pobre garoto...e as rondas...


June bateu seu pé impacientemente. “Vamos lá, Evans. Eu não tenho o dia todo”.


Eu mordi meus lábios em dúvida. “June...eu realmente não – “.


“Você faria sua ronda com o Diggory”.


Eu congelei, meu coração parou de bater, enquanto eu observava a garota com assombro.


O quê?”, eu resmunguei, impossibilitada de acreditar que ela tinha acabado de me contar pelo motivo que eu achava que ela tinha contado.


June sorriu arrogantemente, me olhando de forma presunçosa. “Eu vou fazer ronda com o Amos Diggory na quinta-feira”, ela esclareceu, mantendo em sua voz um inocente tom monótono, apesar de eu saber exatamente o que ela estava fazendo. Ela estava tentando atingir o meu ponto fraco.


E ela conseguiu.


E, por Merlin, a maldita piranha sabia de tudo.


Eu não perguntei como ela sabia do Amos. Eu nem mesmo me importei naquele momento. Eu esqueci do pobre garoto inocente! Esqueci de June e seu jeito piranha de ser!


Quase sem pensar, eu peguei a mão dela e apertei.


“Não”, eu disse, minha voz severa e determinada. “Eu vou fazer a ronda com o Amos Diggory na quinta-feira”.




Mais tarde, dormitório feminino do sétimo ano


Lily Observadora: Sétimo dia


Observações Totais: 50


Observação #50) Professora Abbot ou está sendo completamente negligente ou ela, sem saber, perdeu um papel muito importante.


Eu acabei de passar pela Professora Abbott no corredor agora mesmo, e surpreendentemente, ela não olhou furiosamente para mim. Na verdade, ela nem tomou conhecimento da minha presença. Ela simplesmente olhou pra mim, me encarou um pouquinho com a sua frieza de sempre, e depois continuou pelo corredor. Ela me viu – eu sei que viu – mas ela não me olhou com mais raiva do que geralmente ela me olha. Isso me leva a acreditar em uma dessas duas coisas:


por causa de algum milagre, explosão improvável de sorte, Abbot ainda não leu A Tarefa, ou


ela leu, ficou completamente apavorada, e agora está esperando a próxima aula para que ela possa fazer alguma coisa drástica (i.e.: me humilhar na frente da turma inteira)


Mas ela pode fazer isso? Me humilhar publicamente, quero dizer? Não é algum tipo de abuso contra o estudante ou algo assim? Porque eu duvido, seriamente, que ela não tenha lido A Tarefa ainda. Ela é uma daquelas professoras que sempre entregam as tarefas no dia seguinte. Ela teve todo o fim de semana, sem falar hoje, para corrigir os trabalhos. Então, ela com certeza leu. Não é possível que ela não tenha lido.


Espera um minuto. A menos que...


E se ela perdeu?


E se, no meio de todo aquele caos, quando todo mundo estava entregando os seus trabalhos, o meu tenha, de alguma forma, acidentalmente caído no chão, para nunca mais ser visto ou comentado? É possível. Eu acho que já aconteceu antes – não comigo, claro, mas já aconteceu – então, pode ter sido isso.


E, quer saber de uma coisa? Talvez eu esteja melhor com o trabalho perdido. Quero dizer, eu ainda vou receber uma nota péssima de qualquer jeito, então, o que isso importa? E aí Abbott nunca teria que saber que eu praticamente a insultei com as minhas desculpas-para-não-fazer-a-redação. E eu nem mesmo teria que pagar James os dez galeões, porque eu entreguei a redação, mas ela simplesmente se perdeu.


Hum. Bem. Isso funciona direitinho, eu acho.




Muito tarde, dormitório feminino do sétimo ano


Lily Observadora: Sétimo dia


Observações Totais: 51


Apesar de ser incrivelmente tarde, e eu estar, incrivelmente, cansada, e apesar de Elisabeth e Emily terem escolhido esse momento em particular para, aos berros, escolherem suas roupas para a próxima visita a Hogsmeade (que é, a propósito, só no mês que vem), eu estou de bom humor. Quero dizer, tirando toda a coisa da ‘Emma estar sendo uma idiota’, minha vida está, relativamente, em boa ordem, comparada com a porcaria que ela estava recentemente.


Então, pelo menos por essa noite, eu acho que eu posso descansar tranqüilamente.


Eu gosto disso.




Terça-feira, 23 de setembro, café-da-manhã no Salão Principal


Lily Observadora: oitavo dia


Observações Totais: 51


Nem James, nem Marley estão aqui essa manhã, e eu tenho que dizer que isso é muito estranho.


Quero dizer, sim, eu estive tomando café-da-manhã com eles só por três dias, mas parece que é há mais tempo, e é por isso, provavelmente, que está tão estranho agora. E eu estou um pouquinho sozinha também. Porque ninguém mais acorda tão cedo assim. As outras pessoas são sãs e estão, portanto, dormindo. O que, sabe, é bom pra eles, mas nem tanto pra mim. Eu só queria -


“Oi, Lily. Posso sentar com você hoje?”.


Ah, eu. O que nós temos aqui?


“Er, claro, se você quiser, Thomas”, eu respondi com um sorriso. Talvez, eu não fique tão sozinha, afinal de contas. Thomas sorriu de volta pra mim e se sentou na minha frente.


Mas porque ele está aqui comigo, quando ele poderia sentar com os seus amigos da Lufa-Lufa? Eu perguntei isso a ele.


“Eles estão agindo como um bando de idiotas”, Thomas me informou. Eu concordei com a cabeça e disse a ele que meus amigos também têm uma tendência a agirem como idiotas às vezes. Ele sorriu.


“Como o James Potter e seu kecthup?”, ele me perguntou. Eu sorri em resposta e concordei com a cabeça, sem me importar em negar a sua suposição de que eu e James somos amigos. Eu acho que seria um pouquinho complicado explicar para o pequeno e adorável Thomas Dunn que James Potter não é, exatamente, meu amigo, mas só uma pessoa com quem eu sou simpática. É bem menos complicado apenas concordar com a cabeça e continuar a olhar para o seu lindo cabelo. Afinal de contas, não é ruim passar a manhã desse jeito, eu acho.


Observação #51) Posso dizer que hoje o dia vai ser bom.




Um pouco mais tarde, café-da-manhã no Salão Principal


Lily Observadora: Oitavo dia


Observações Totais: 52


Observação #52) Eu sou total e completamente idiota.


Ai, droga, eu me esqueci completamente que dia era hoje.


Dia de aula de Poções.


O que significa: dia de entrega da Tarefa.


O que significa que, apesar do dia de hoje ter começado bem, ele vai, no fim das contas, terminar muito mal – porque A Tarefa tendo sido perdida ou não, Professora Abbot ainda assim vai me matar. Quero dizer, se a redação se perdeu, Abbott não vai saber disso. Ela só vai pensar que eu não me importei em entregá-la. O que é, sabe, melhor do que ela pensar (ou realmente saber) que eu, de bom grado (se bem que foi por causa da pressão de uma aposta de 10 galeões, o que, para uma pessoa avarenta como eu, é algo que impossível de se resistir), escrevi uma carta bastante ofensiva para ela.


Eu simplesmente não consigo ter um descanso, consigo?


Ai, droga. Nem mesmo o lindo cabelo de Thomas Dunn pode me animar agora.


A vida realmente é muito triste.




Mais tarde, Defesa Contra as Artes das Trevas


Lily Observadora: oitavo dia


Observações Totais: 52


Por que eu estou preocupada? Por que eu estou enlouquecendo agora? Quando eu entreguei a redação para a Professora Abbott, eu sabia que ela ia me dar um zero – NAQUELE MOMENTO é que eu tinha o direito de enlouquecer, mas não agora. Eu deveria estar feliz agora, certo? Eu deveria ter algum tipo de sentimento de realização, não deveria? Eu lutei contra o sistema! Eu deveria me sentir livre e liberal!


Ugh. Então, por que eu estou me sentindo tão mal?


Livre e liberal, ô caramba. Obviamente, não é PERMITIDO para mulheres loucas se sentirem livres. Deve ser contra o Código das Mulheres Loucas ou algo assim.


Eu acho que eu vou vomitar.


Merlin, eu espero que a redação tenha se perdido.

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