Somente Harry.
Capítulo 2 – Somente Harry.
Eram sete horas da manhã e o barulho no andar de baixo era incessante. Harry, que não dormira direito durante toda a noite, decidiu se levantar.
Desde que chegara à casa dos Weasley, que se mostravam cada vez mais maravilhados com a idéia de Harry passar tanto tempo com eles quanto Hermione, sentia-se realmente como um membro da família. A não ser, é claro, quando algum dos ruivinhos sardentos começava a contar alguma história antiga sobre membros da família já falecidos, apesar de Harry se divertir com a maioria delas.
Procurando a origem de todas aquelas vozes, ainda de pijama, Harry desceu o lance único de escada até o térreo. Percebeu que havia algo importante de que esquecera: O casamento de Gui e Fleur.
Todos estavam vestidos com roupas diárias, embora carregassem ternos e vestidos por todos os lados, e Harry percebeu que era o único que ainda usava roupas de dormir. Tentando fugir para o quarto, na esperança de se vestir antes que alguém o visse, fracassou: Hermione passou por ele, bem-humorada, parecendo divertida com a situação:
- Bela roupa para uma manhã de sábado, Sr. Potter!
- Obrigada, Srta. Granger. Agora será que eu posso passar para tentar me vestir, antes que mais alguém apareça?
- Ora, vamos. Você tem dezessete anos, pode se vestir com magia!
Quando Harry mirou seu corpo, estava usando, sem perceber, uma das roupas que deveriam estar em seu malão, lá em cima.
- Obrigada. Às vezes esqueço que já posso usar magia em casa.
- Eu percebi! Agora vamos, o Sr. E a Sra. Weasley estão conjurando a decoração, e os outros escolhendo as roupas adequadas para a festa. Você vem?
- OK.
Hermione levou Harry até o jardim, segurando seu braço com impaciência, onde Harry notou Rony, Jorge, Fred e... Gina. Seus olhos cruzaram com os dela por um breve instante, e ambos tornaram a olhar para os pés depois disso.
Em cima de uma pedra enorme que, Harry logo percebeu, não estivera sempre ali, havia roupas em diversas caixas coloridas. Rony chamou sua atenção para um terno preto, com uma gravata vermelha e dourada que o fez lembrar de Hogwarts e da Grifinória. Sentiu certa tristeza ao se lembrar de que, provavelmente, a escola não abriria este ano. A morte de Dumbledore (e aí Harry sentiu um nó na garganta) ainda era algo muito recente, e a escola estava um tanto desprotegida depois de todo o ocorrido.
- Ei Harry, mamãe comprou vestes pra você também. O que acha?
Quem respondeu foi Hermione:
- Achei maravilhosa! Gina quer fazer o favor de se decidir na cor desse vestido? Já estou até tonta!
- Que droga, não faço idéia de qual é a melhor cor. Fred, qual você disse que ficaria bem, antes?
- Cor de abóbora, maninha, cor de abóbora.
Para a surpresa de Harry, Gina chegou a agitar a varinha e seu vestido ficou ligeiramente alaranjado, resultando em um olhar frio que Fred e Jorge receberam como resposta.
Observando, distraído, o imenso jardim que se estendia em frente à casa, Harry sentiu uma ligeira sensação de bem-estar. Era incrível ser acolhido dessa forma por uma família de que gostava tanto, embora a falta de Sirius e Dumbledore ainda fosse algo muito difícil de suportar. Durante anos, contara com a presença de dois seres que o protegiam, fazendo parecer que nada de muito ruim poderia lhe acontecer. Agora, porém, estava sem eles. Estava sozinho.
Sem notar que tinha andado tanto, já que estava quase na outra extremidade do jardim, percebeu a presença de Hermione, que ralhava com alguns gnomos em quanto se aproximava. Por fim, a garota falou:
- Sei bem como é a saudade, apesar de ser diferente pra mim. Mas não, Harry, você não está sozinho... Tem a nós.
- Sei disso.
- Sorria Harry. Todo mundo aqui te ama, e você não pode ser egoísta ao ponto de não receber isso como algo suficiente.
- Eu sei, eu sei... Desculpe. Obrigada, Mione. Tem se saído uma ótima amiga nesses seis anos.
Hermione corou ligeiramente, mas logo voltou ao normal, dizendo:
- Você também, Harry. Aliás, tanto você quando Rony. Imagino que hoje somos todos um tripé, entende? Se faltar um pé, os outros dois não se seguram sozinhos.
Harry, se divertindo com a definição dada pela amiga, resolveu se reunir ao grupo, pondo carinhosamente a mão sobre o ombro de Hermione, que ainda sorria.
Mais tarde, no quarto onde dormira, Harry conversava alegremente com Rony, que lhe oferecera algumas cervejas amanteigadas, enquanto tiravam as sujeirinhas de seus ternos com alguns acenos de varinha. Harry adorava a idéia de poder fazer magia fora da escola, já que fora, certa vez, quase expulso de Hogwarts por não poder fazê-lo. O assunto, porém, era outro. Rony reclamara de Hermione o dia todo, e Harry estava começando a ter algumas idéias estranhas a respeito dos dois amigos.
- Eu juro pra você, Harry. Ela me deixa louco! Pensei que acostumaria com tudo isso, depois de seis anos de amizade, mas ela realmente não sabe se conter. Dá uma de espertinha mandona o tempo todo!
- Não sei, não, se é realmente esse o motivo que tanto incomoda.
- Mas o que... Como assim? É claro que é isso! Ah, sim... Tem também o fato de ela se sentir no direito de escolher a minha própria roupa e julgar minha inteligência todos os dias, era disso que você estava falando?
- Não é bem isso... Mas deixa pra lá.
Rony ficou escarlate, parecendo ter entendido. Quando Hermione apareceu, porém, com mais cervejas amanteigadas na mão, ele foi apto no disfarce:
- Até que enfim!
- Harry, preciso falar com você. Agora.
- Certo, Mione, mas...
- AGORA!
Rony, que já estava acostumado com segredos entre os dois amigos, mesmo não aceitando nunca que isso acontecesse com freqüência, se levantou, impaciente, levemente corado. Hermione pareceu perceber:
- Não é nada pessoal, Rony. Você até pode ficar, se prometer não dar chilique no meio do assunto.
- Daria pra você parar de dar instruções como se eu fosse um bebezinho burro e sem noção de nada?
- Você não é um bebezinho burro, Rony. Mas às vezes age como se fosse um.
- Certo então, senhorita sabichona. Se eu ajo como um bebezinho ridículo, me dêem licença que eu vou lá fora pedir a mamadeira pra minha mamãe.
Harry pensou em interferir, mas sabia que o melhor mesmo era deixar quieto. No fim do dia, provavelmente, as coisas estariam melhores entre os dois. Era sempre assim.
Por fim, vendo que Hermione não começaria a falar de repente, resolveu questionar:
- O que houve, afinal?
- Quero que você me responda: Qual é o problema de manter ao menos uma amizade com a Gina?
- Que quer dizer com isso? Eu... Nós somos amigos.
- Você sabe do que estou falando. Ela me contou do encontro inesperado certa madrugada, e me falou também da forma brusca com que você a deixou lá em baixo.
- Eu não queria que ela se chateasse com aquilo.
- Não queria, Harry, mas ela ficou... Chateada nem seria a palavra. Eu diria triste.
- Será que é mesmo tão difícil de me entender?
- Eu te entendo, Harry. E Gina também. Você gosta dela e ela de você, mas não podem ficar juntos. E, é claro, ela tem uma melhor prática do que você, quando se fala em disfarçar sentimentos.
- Sei bem disso tudo. Pra mim, é impossível ficar perto dela, Hermione... Se você visse a maneira como ela sorriu pra mim; Me faz lembrar de coisas que não pertencem a vida de Harry Potter.
- É aí que você se engana gritantemente. Você cresceu pensando que não tinha o direito de amar, que as pessoas não poderiam gostar de você e que nenhuma garota olharia pra você de uma forma diferente. Cho olhou um dia. E Gina sempre amou você. O que vocês passaram pertence a sua vida Harry, a vida de Harry Potter. A questão é que você não se dispõe a admitir isso nunca.
Harry baixou os olhos, pensativo. Durante todos esses anos em Hogwarts, nunca tinha olhado Gina com os olhos que havia olhado no ano que se passou. Nunca tinha se imaginado beijando Gina antes, e agora esse pensamento invadia sua mente mais do que esperava que fosse. Ele a amava, tinha certeza disso. Mas precisava protegê-la, e quanto mais longe, melhor.
- Olha Harry, desculpa. Não deveria ter falado tudo isso agora, ter lembrado da forma como você via as coisas antes. Mas nós estamos em tempos difíceis... E se tem uma coisa que é capaz de ultrapassar essa barreira de maldade que se espalha agora por nosso mundo, é o amor. O amor entre amigos, entre famílias – sim, Harry, você tem uma família – e, principalmente, o amor entre duas pessoas que sentem algo sincero.
- Não nesse caso, Mione. Você sabe que é diferente.
- É diferente porque, Harry? Você já teve provas suficientes de que, na vida, são as nossas escolhas que fazem as coisas serem como são, e não um destino! Você escolheu a Grifinória quando na verdade era destinado à Sonserina; Voldemort escolheu você como inimigo mortal, e não aquela profecia. São as escolhas, Harry. As escolhas que a gente faz é que nos guiam pro resto de nossas vidas.
- Que diferença isso faz agora?
- Você escolheu se separar de Gina. Gina aceitou, acatando a sua escolha. É uma proteção, eu sei... Mas será que ela não precisa de você? Será que você não sente falta dela? Tem mesmo certeza de que não é mais fácil passar por Voldemort do que por seu próprio coração? Você pode enfrentá-lo de novo, se Gina correr perigo. Já enfrentou outras vezes, não vai ser a primeira. Mas enfrentar o próprio coração, Harry? Quem no mundo já foi capaz disso? Pode parecer incrível, eu sei. Mas é muito mais fácil enfrentar os maiores perigos de um mundo como o nosso, do que ir contra o que os nossos sentimentos nos dizem. Vocês se amam. E o amor é mais importante do que a proteção.
Harry não queria ouvir aquilo. Acabaria pensando que era tudo verdade e, sem perceber, logo estaria correndo até a sala de jantar, beijando Gina e acabando com tudo de uma vez. Ao invés disso, suspirou e disse:
- Preciso pensar.
Hermione suspirou também, mostrando certo ânimo na voz.
- Pensa Harry. Mas pensa com o coração da pessoa que você é hoje, e não com aqueles sentimentos que você tinha há seis anos atrás.
- Pensarei.
E Harry não mentira; Durante o restante dos preparativos do casamento, parecia um zumbi. Andava de um lado pro outro, ajudando a carregar as coisas que lhe pediam para levar até o jardim, onde seria a festa, mas sequer tirava o pensamento da conversa que tivera com Hermione.
Como previra, Harry viu que Rony e Hermione já estavam perfeitamente bem, novamente. Aliás, percebeu que o amigo sabia de toda a conversa, pelo comentário que ouviu quando Rony passou por ele, com caixas de doces que sua varinha carregava, flutuando no ar:
- Odeio dizer isso, cara, mas concordo com ela.
Hermione, que andava ao lado de Rony, sorriu e deu uma piscadela amigável, fazendo Harry se sentir momentaneamente feliz por tê-los consigo naquele momento.
Tomou, por fim, sua decisão. Não sabia se era a coisa certa a fazer, mas quando se deu conta já havia passado por Gina e lhe dado um recado de voz fraca e baixinha:
- Preciso falar com você. Depois da cerimônia, vá até aquela pedra onde escolhemos as roupas hoje cedo.
- Certo, então.
E Harry, uma hora depois, estava vestido com sua roupa social, impaciente, ao pé da escada. O combinado era que ele entrasse de braços dados com Hermione, já que Rony entraria com Gina.
Já havia se passado mais alguns minutos quando de repente, no alto do lance de escadas em que se encontrava, Harry viu alguém. Pensou, por um instante, que fosse Hermione lá em cima, indo em sua direção, mas se deu conta de que se enganara. Era Gina, que não usava o vestido cor de abóbora que chegara a experimentar.
Com seus longos cabelos ruivos presos num coque, no alto de sua cabeça, com fios cintilantes soltos à frente pousando suavemente sobre seu rosto sorridente, Gina descia as escadas, em um vestido sem alças de um azul turquesa muito suave, que fez os olhos de Harry brilharem.
- Hermione já está descendo.
Harry não conseguiu dizer nada. Abriu a boca uma vez, puxou ar, mas logo tornou a fechá-la. Por sorte, Hermione descia as escadas logo atrás, poupando o garoto de alguma situação constrangedora, em que sua voz certamente falharia. Também estava linda em seu vestido verde-claro, mas não chegava nem aos pés de Gina, aos olhos de Harry.
- Vamos, Harry? Depois eu deixo você babar.
Gina sorriu constrangida – o que certamente não fazia seu feitio -, e logo já havia se distanciado, puxada por Rony - e este parecia discordar de Harry quanto à superioridade na beleza da irmã. Harry, que não queria ter perdoado Hermione tão rápido, teve de esquecer o ocorrido mesmo assim, pois a música doce já soava lá fora anunciando a entrada dos noivos.
A decoração era de muito bom gosto. Como tudo estava ao ar livre, Sra. Weasley e Fleur, que haviam cuidado de todos os preparativos, escolheram flores brancas e cor de rosa para todo o caminho até o altar - onde não havia um padre, como Harry logo percebeu – onde estavam as alianças prateadas escolhidas por Gui.
Ninguém costumava comentar a aparência nova que o garoto adquiriu depois do ataque dos lobisomens, no ano passado, e alguns feitiços reparatórios ajudaram a disfarçar as marcas. Por enquanto, Gui não parecia ter adquirido nenhum tipo de semelhança com esses animais, apesar de dar alguns rosnados enquanto dormia que ecoavam pela casa durante a noite.
Depois de dançarem uma linda valsa, sozinhos por entre as velas flutuantes e o tapete de flores que se estendia pelo jardim, Gui e Fleur desapareceram sorridentes, em meio a uma grande tempestade de fogos de artifício que espalhavam seus nomes e votos de felicidades por todo o céu.
Harry se distraiu por alguns instantes, percebendo que todos não achavam nada estranho em fogos de artifício que gritavam “viva os noivos” ao invés de emitirem estrondos, mas logo voltou a si: Gina estaria esperando que ele chegasse.
Andou decidido até o lugar em que marcaram, e percebeu que a garota ainda comemorava com seus pais. Resolveu esperar, subindo na pedra e se sentando de costas para a festa que crescia no jardim. Olhando a lua e os fogos de artifício que estouravam à todo vapor, sentiu vontade de chorar. Queria Sirius perto de si. Queria Dumbledore o protegendo novamente. E, por mais que não admitisse por completo, precisava de Gina por perto para suportar toda a dor que tomava seu peito.
Com seus pensamentos flutuando, sentiu o doce perfume floral exalando atrás de si, mas não se virou de imediato. Seria mesmo Gina, ou ele estaria recordando de um cheiro agradável que o lembrava a garota? A dúvida sumiu quando Harry ouviu aquela voz:
- Pois bem, estou aqui.
Virou-se feliz, sem saber por que, e pediu que Gina se sentasse. Em seguida começou a falar, com uma voz embargada:
- Gina, olha... Eu quero que você escute o que eu tenho pra te dizer, porque já devia ter falado isso há um tempo.
Tomou fôlego, suspirou, abriu a boca e, lentamente, voltou a falar:
- Faz certo tempo que acabamos com tudo aquilo, e eu sinceramente pensei que seria capaz de passar por isso sem muita demora. Me enganei.
- Harry, não quero que você se culpe pelas coisas que Hermione te disse. Ela me contou que conversaram, e eu sinceramente preferia que você fizesse o que é melhor pra você.
- É exatamente esse o problema. Eu realmente não sabia o que era melhor pra mim, mas achava que o melhor pra você era que eu ficasse longe. Nunca tive coragem de te dizer isso claramente, mas... Gina, eu simplesmente te amo demais pra deixar Voldemort te tirar de mim. Já perdi pessoas que eu amava e não suportaria que você também se fosse. A questão é que desse jeito, nós dois separados... Eu realmente sinto como se ele tivesse conseguido. Não nos separou por meio da sua morte ou da minha, mas é por causa dele que eu não posso mais ficar com você.
Harry se surpreendeu ao ver que Gina tinha uma lágrima cintilante escorrendo sobre a face, e achou impossível que ela estivesse conseguindo falar:
- Se for pra tudo continuar assim, prefiro não ouvir nada disso. É difícil pra mim também, Harry. Eu te amo há tanto tempo, e agora... Agora que eu poderia receber o mesmo em troca, Voldemort estragou tudo.
- É por isso que eu pedi que viesse até aqui. Me dê a sua mão.
Harry não esperaria esse tipo de coisa de si mesmo, há alguns anos atrás. Mas se lembrou do que Hermione dissera quanto a ser o que se tornou hoje, e não viver mais da sombra de um passado que já não dizia muito sobre si.
Gina lhe deu sua mão direita, que estava trêmula, sem tirar os olhos dos de Harry, que voltou a falar:
- Não vou deixar que ele estrague tudo. Uma amiga me ensinou que o amor é a única coisa que pode vencer o mal, e eu acredito em meus amigos.
- O amor é mais do que a força que combate o mal. É o que move qualquer um que o sinta, Harry... E fico feliz que você tenha finalmente compreendido isso como eu.
Harry sorriu, sentindo seu coração pulsar em um ritmo rápido como nunca. Era irônico pensar que, sendo aquele um momento tranqüilo de sua vida, seu coração pulsava mais do que quando estivera em perigo. Voldemort odiaria saber disso, mas Gina tinha um poder muito maior do que o dele de controlar os batimentos cardíacos de seu pior inimigo.
Sem pensar duas vezes, encarando novamente aquela expressão dura e intensa que tomou conta do rosto de Gina naquela noite, Harry a beijou. E, sentindo o gosto daquele beijo que tanto fez falta, compreendeu finalmente que Harry Tiago Potter, a partir dessa noite, não era mais o menino-que-sobreviveu. Era somente o Harry; O Harry que amava Gina Weasley.
Espero que estejam gostando!
Beijos,
Isa.
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