Um Amargo Despertar
Acordou, como sempre, com o maldito Sol batendo em seu rosto. Virou-se para o outro lado, quase que automaticamente, mas ao fazer, sentiu algo estranho e diferente. Sentou-se na cama e olhou para a janela, sentindo um repentino arrepio percorrendo sua espinha.
Não podia acreditar que tinha voltado... levantou-se correndo, indo até a porta e girando com força a maçaneta. Logo em seguida tentou de um modo mais calma, mas a porta continuou fechada. Devia ser algum mal entendido... ela foi até a janela e tentou abri-la também, mas logo percebeu que estava trancada.
Sentou-se no chão, tentando absorver aquilo tudo. Tinha se esforçado TANTO para conseguir fugir, e tudo que conseguira fora apenas algumas horas de liberdade. Passara o dia todo em paranóia, e quando relaxara, voltara para a mansão.
E pela terceira vez não havia comemorado seu aniversário completamente. Mais um aniversário estragado pelo Lorde. Ele com certeza queria arruinar sua vida! Conviver eternamente com as pessoas que mais detestava e repudiava, trancada em uma Mansão que a reprimia, sufocava... tudo incentivava o aumento da sua revolta, sua raiva e seu ódio.
Depois de algum tempo irritada, começou a pensar com mais lógica, transformando sua raiva em indiferença. Precisava pesar as balanças de tudo que acontecera. Levantou-se do chão e se jogou na cama, virando-se para a parede, de modo que poderia pensar sem que o Sol incomodasse-a.
Entre ficar lá dentro, aturando o Lorde, Draco, as ordens, a opressão e tudo o que atrapalhava uma vida sadia, e fugir da Mansão, mas ter que ficar vigilante e tensa o tempo todo, sem poder pensar corretamente, preferia ficar lá dentro. Pelo menos era mais lógico. Afinal, se você não pode contra seu inimigo, junte-se a ele. Ellen tinha um ponto de vista diferente, quanto á esse ditado. Para ela, “unir-se” significava “aturá-lo”, já que não tinha opções. Além disso, em cada fuga executada, ela desperdiçava energias desnecessárias, já que a probabilidade do plano dar certo era de 10%. E quando funcionava, como no dia anterior, ela passou o dia todo paranóica, e aquilo tornaria sua vida mais insana do que era lá dentro.
Mas uma coisa incomodava Ellen mais do que tudo: O castigo. Ela sabia que as conseqüências pra essa sua fuga seriam terríveis, já que o Lorde deveria estar furioso com ela, por ter escapado debaixo do nariz de Draco. Ela sabia que sua vida estava destruída, e decidiu que aturar aquela Mansão era a coisa mais correta á fazer. Só poderia esperar a hora que o Lorde entraria ali, para aplicar-lhe o pior castigo que ela receberia em toda sua vida.
Ela esfregou os olhos e tentou relembrar os acontecimentos da noite anterior. Ela lembrava de estar dançando e...! Ellen sentiu como se uma luz tivesse sido acesa em sua mente. Fora Malfoy quem trouxera ela de volta! Draco foi o responsável por ter deixado ela fugir, e isso causou a ira do Lorde contra ele. Provavelmente os dois fizeram um trato: Se ele trouxesse Ellen, não seria castigado. E Malfoy, como o covarde que era, não piscou nem os olhos para aceitar. Provavelmente ele ficou sabendo que da festa á fantasia, e roubou a primeira fantasia com máscara que vira pela frente. Como ela fora idiota em dançar com aquele Fantasma! Os olhos cinzentos, como ela não notara? Então, depois de dançarem, ele enfeitiçou-a, e fugiu com ela. Aquele mal-caráter... Como pudera fazer aquilo?
Suspirou pesadamente e fechou os olhos para retornar a dormir. Mas, exatamente assim que ela os fechou, o Lorde abriu a porta com um estrondo, fazendo o barulho característico de madeira colidindo com a parede. Ellen via perfeitamente a imagem dele, entrando com a varinha e com os olhos vermelho-sangue brilhando de ódio, pronto para castigá-la, porém, ela continuou deitada de olhos fechados, virada para a parede.
— Levante-se, Ellen. – a voz imperativa, por alguma razão, não a irritara, mas a desanimara.
Sem a mínima pressa, ela retirou o lençol que havia jogado por cima de si e começou a sair lentamente da cama. Ela nem ao menos percebera, mas haviam trocado sua roupa enquanto ela dormia. Mentalmente agradeceu aos elfos, já que se tivesse passado a noite toda com aquele vestido, não conseguiria nem se levantar. Sua demora irritou mais ainda Voldemort, que a agarrou pelo colarinho da capa e jogou-a para fora do aposento. Ellen cambaleou por alguns metros, mas conseguiu se equilibrar. O Lorde voltou a segurá-la pelas vestes e foi arrastando-a pelos corredores, provavelmente á procura de um lugar onde pudesse castigá-la com mais liberdade. Finalmente chegaram a um aposento amplo, que era utilizado para os treinos de feitiços dos dois. Ele jogou Ellen lá dentro, trancando a porta depois de passar e virando-se á tempo de ver a menina caindo no chão.
Não demoraria muito para começar, já que ele odiava prólogos antes dos castigos, até porque ele sabia que receberia uma resposta venenosa se o fizesse. Afinal, Ellen nunca implorava. Não era como aqueles comensais idiotas e covardes, que imploravam por sua vida, á cada castigo que recebiam. Ela era orgulhosa demais para se humilhar, de qualquer modo que fosse. Voldemort sabia disso desde o princípio, e talvez fosse por isso que ele nunca mais tentara fazê-la implorar, depois de perceber que não adiantaria nada. Mas o fato dela ser orgulhosa só piorava, já que á cada castigo que recebia, a sensação de que iria morrer piorava.
Ela levou horas para gemer, e mais algumas horas para não ter mais forças para se levantar. Ela agüentara tudo completamente lúcida e consciente dos machucados que estavam espalhados por seu corpo. Não desmaiara em nenhum momento, e não gritara apenas por ser orgulhosa demais. Não daria aquele gostinho de vitória para o Lorde.
Seu corpo estava repleto de machucados. Havia tantos hematomas que eram impossíveis de contar. Seu rosto estava cheio de cortes e ela estava completamente ensangüentada. O cabelo negro estava grudado em seu rosto e nas suas feridas, piorando a dor. Ele estava úmido não de suor, mas de sangue, já que a cada vez que ela era arremessada na parede, os cabelos eram projetados pra frente, tocando em várias feridas diferentes.
O Lorde caminhou em direção ao corpo estirado no chão. Ellen ainda estava de olhos abertos, apesar de miúdos. O cabelo estava todo espalhado por seu rosto e corpo. Ela encarava a aproximação do Lorde, com aquele mesmo ar insolente de sempre. Parecia ser sua máscara, para esconder a profunda dor que sentia por dentro.
Com os longos dedos brancos, ele retirou as mechas ensangüentadas do rosto dela, abaixando-se para encará-la melhor com os olhos vermelhos. Sorriu aquele sorriso animal e assustador dele, que não demonstrava compaixão ou carinho, mas aquela felicidade cruel de predador que domina a presa. Ele percebeu uma leve movimentação nos braços dela, que não passaram de um esforço inútil de se afastar dele, já que ela não tinha força o suficiente para se mexer.
— Não preciso da sua compaixão. Tire as mãos de mim. – Já que ela não podia se afastar com as mãos tentaria com a voz, que apesar de baixa, continuava com aquele tom de desafio.
— Insolente... – havia um ar estranho, na pronuncia daquela simples palavra. Era como se ele estivesse avaliando-a e aquele aspecto fosse positivo. – De certa forma, sua insolência me satisfaz.
— É uma pena não poder dizer o mesmo das suas ordens. – Ela respondeu imediatamente, com o olhar feroz estreitando-se, numa completa demonstração de ódio. Daquele jeito, eles pareciam pai e filha, era como se depois de todo aquele tempo junto do Lorde, ela aprendera a usar as expressões corporais dele, na tentativa de intimidar alguém. Geralmente funcionava com os outros, mas nem sempre o feitiço volta contra o feiticeiro.
Como era previsto, não adiantou nada. O Lorde começou a rir enquanto se levantava, encarando-a ali deitada. Mesmo depois de ter recebido um castigo horrendo daqueles, deixando-a em um estado completamente moribundo, ela continuava as provocações, com o mesmo olhar raivoso de sempre. Ele abanou positivamente a cabeça e virou-se para a porta, falando antes de sair:
— Você não nasceu pra obedecer, Ellen.
Ele saiu e encostou a porta, cruzando com Draco, que vinha na direção contrária. O garoto olhou do Lorde para a porta que ele acabara de fechar e prosseguiu andando. Ao chegar no fim do corredor, esperou o Lorde virar a esquina e voltou correndo, para ver o que tinha lá dentro. Draco passara o dia inteiro perambulando pelos corredores, para poder espreitar a hora que o Lorde iria sair com Ellen.
Ele colocou a mão na maçaneta e abriu a porta silenciosamente. Ao ver o estado em que Ellen estava, horrorizou-se, achando que ela provavelmente estava morta. Correu até ela e se ajoelhou ao seu lado, com o coração martelando em seu peito. Ao sentir o movimento ao seu lado, Ellen abriu os olhos e ficou olhando fixamente para o teto. Uma parte de Draco sentia-se aliviada, por saber que ela estava viva. A outra parte estava admirada pela resistência dela em agüentar aquele castigo brutal e permanecer consciente. Realmente Ellen era uma garota admirável.
— Você está bem? – Ele perguntou imediatamente, tentando saber se ela não estava ferida letalmente. Sabia que era impossível estar bem naquelas condições, mas se ela conseguisse responder, pelo menos indicava que poderia se recuperar. Draco tinha um ar extremamente preocupado, e até mesmo um pouco culpado, enquanto olhava para ela, esperando a resposta.
Ellen virou os olhos para poder encará-lo pelo canto do olho e respondeu em voz baixa:
— Porque está tão preocupado comigo, se horas atrás me trouxe de volta? Se realmente se importasse com a minha vida, não teria me recapturado. Teria deixado eu viver minha vida em paz. – Havia um ar raivoso em sua voz, mas ao mesmo tempo, era como se, no fundo, ela estivesse completamente magoada com o que ele fizera.
— Mas... – Draco não sabia exatamente o que falar, e Ellen também não colaborou, cortando-o antes que ele completasse.
— Ah... é claro. Será que isso é remorso por pensar que você poderia ter sido o responsável pela minha morte? – Ela falou com a voz ainda mais venenosa do que antes – Engraçado é que, até antes de me capturar, você só estava pensando em salvar sua própria pele! – seus olhos até mesmo brilhavam, como se ela estivesse liberando todo o ódio que sentia através deles. Draco até mesmo se levantou, dando alguns passos para trás, completamente trêmulo de medo.
Ele abriu a boca, para tentar gaguejar alguma resposta, mas não fora preciso. O Lorde abriu com força a porta, olhando para Draco. Este caiu sentado por causa do susto, e ficou naquela posição, com medo de se mover e acabar morto pelo olhar fuzilante do Lorde.
— O que está fazendo aqui, Malfoy? – perguntou Voldemort, tentando controlar ao máximo a raiva em sua voz, que estava trêmula.
— Eu... eu só... pensei que ela pudesse... precisar de algo... – falou ele, levantando-se rapidamente, sentindo que suas pernas poderiam desmontar á qualquer momento.
— Se ela precisasse de algo, Malfoy, eu mandaria chamá-lo. Ou melhor, eu mandaria chamar um elfo, já que eles estão aqui para servir-me, e não fazer as coisas sem que eu peça. Você não deveria estar aqui, Malfoy. Já não acha que foi idiota o suficiente ao deixar Ellen fugir? Não acha que deveria estar trancado em seu quarto, longe das minhas vistas, no caso de eu resolver castigá-lo ainda mais? – O Lorde respondeu de uma vez só, afastando-se da porta – Fora daqui antes que eu mude de idéia e faça picadinho de você. FORA!
Draco deu uma última olhada em Ellen, que voltara a encarar fixamente o teto, antes de sair dali o mais rápido possível. Se antes se sentia culpado, agora queria morrer. Agora sim que ela iria odiá-lo ainda mais. Como iria conquistá-la daquele jeito? Provavelmente ela não queria vê-lo nem se fosse pintado de ouro.
Estava tudo indo por água abaixo. Se ele tivesse recapturado-a, não conseguiria conquistá-la, já que ela o odiaria ainda mais, exatamente o que tinha acabado de acontecer. Se ele tivesse deixado-a livre, não poderia conquistá-la nem se quisesse, já que teria sido morto pelo Lorde. Pela primeira vez ele sentiu que descobrira o significado daquele ditado trouxa: “Estar entre a Cruz e a Espada”.
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