Suor



                - Gina, o Harry pediu que você fosse à sala dele. – Avisou a secretária, logo que Gina chegou ao trabalho.


                - Ele disse o assunto?


                - Não. Ele disse que você saberia de que se trata.


                - Era o que eu temia.


                - Ele está te aguardando.


                - Tudo bem. Fala com ele para ir à minha sala. Eu preciso resolver coisas lá.


                - Certo.


                Gina sabia que Harry queria falar dos dois ou dos três ou dos quatro. Enfim, daquela lambança toda envolvendo dois casais teoricamente amigos. Não estava com muita paciência e estava machucada por ele e pela situação. Ele não custou a aparecer.


                - Toc toc.


                - Quem está aí?


                - Comensal desaparecido número 69.


                - Uh! Era exatamente o que eu procurava. Entre, Harry. – Ela acenou e ele entrou.  Ela não sabia o que ele falaria. Mas não se surpreendeu com as flores amarelas que ele tinha na mão. Ao contrário, doeu um pouco mais por saber a fugacidade daquilo. Os dois não tinham nada de concreto e talvez nunca tivessem. - O que foi, Harry?


                - Trouxe flores.


                - Eu vi. Bonitas.


                - Como você.


                - Isso foi clichê. Aliás, você é o rei do clichê. Quem canta “night and day”?


                - Cole Porter foi idéia sua.


                - Ok. Não precisa levar à sério assim tudo o que eu digo.


                - Estou separado. Acho que não tem volta. Nós vamos dar certo mesmo assim?


                - Harry. É melhor a gente parar. Isso foi só uma aventura e está ficando grave demais.


                - Grave demais por que, senhora Malfoy? Está se envolvendo com alguém de verdade?


                - Harry, corta essa. Um homem já dá trabalho demais. Quanto mais dois.


                - Elimine o outro. – Harry sugeriu.


                - Isso não é um jogo. – Gina disse, séria.


                Harry sabia que ela tinha razão, mas não sabia quando Gina tinha começado a levá-lo à sério. Talvez Draco tivesse feito algo de grave, ou talvez ela quisesse ser a única a ouvir “Night and Day”. Então ficaram mudos olhando um para a cara do outro com certa dificuldade. Entre os rostos e os corpos, um grande vínculo ofuscando a visão. Vínculo que parecia monstro, mas que, para Harry, já não significava traição.


                Entretanto, Gina estava confusa. Havia sim um Draco, mesmo quando tudo o que ela queria era Harry. Ela ficou parada, sentada em uma das cadeiras da sala. Teve vontade de chorar de raiva por tanto sentimentalismo surgido de uma música besta.


                Harry se perguntava quando tudo tinha ficado tão complicado. Talvez a única resposta possível fosse abraçar Gina e acariciar-lhe o cabelo. Então, Harry se aproximou da cadeira, abaixou-se e acariciou-lhe os joelhos (à mostra desde antes). Da carícia, Harry passou para um beijo. Depois mordiscou os joelhos de uma Gina atônita e apática que não se mexia na cadeira. Ele se sentou à vontade para avançar por entre as coxas dela. Mãos em coxas brancas, adentrando o vestido. Subia e descia gradativamente.


                - Harry, eu não acho que seja uma boa hora. – ela disse, tirando as duas mãos de dentro de suas pernas e ajeitando o vestido.


                - Quando vai ser uma boa hora?


                - Harry, você se lembra da parte em que eu não estou satisfeita?


                - Tudo bem, mas você tem belos joelhos.


                - Qual a graça dos joelhos?


                - São gordinhos, charmosos. Mereciam muitos poemas e canções.


                - Sabe? Joelhos não são coisas usualmente bonitas. Aliás, joelhos não foram coisas feitas para serem bonitas.


                - É por que você nunca olhou os seus com a devida atenção.


                - Harry, eu sou casada.


                - Semana passada você não se importava com isso.


                - Mas semana passada você me deixou de lado para correr atrás da sua digníssima e maravilhosa esposa.


                - Eu era casado.


                - E daí?


                - E daí que eu tenho prioridades.


                - Se eu não sou uma dessas prioridades, é melhor você ir embora.


                - Gina. Eu te chamei por que eu gosto de você. De estar com você. De conversar com você. Eu estou sentindo a sua falta.


                - Quanta coisa muda em uma semana, não?


                - Muda. Gina. Muda.


                - E de uma hora para a outra você ficou apaixonado.


                - Caramba, Gina. Eu estou apaixonado desde antes.


                - Conversa mole!


                - Não é.


                - Harry! Para mim, parece que isso é só por que você desistiu da Hermione. Mas você deve me achar uma completa idiota. Ontem mesmo você disse na minha cara que tudo o que queria era tê-la de volta. Sua esposa perfeita.


                - Ciúmes?


                - É. Ciúmes sim. Eu nunca disse que podia não ser ciumenta.


                - E seu marido?


                - Que se dane o Draco! Eu não estou bem com ele.


                - Deu para ver ontem. O que aconteceu?


                - Harry. Eu não quero falar disso.


                - Eu estou aqui para ouvir. Com quem mais você pode falar dele?


                - Ele sumiu.


                - E você ficou com ciúmes.


                - Não. Eu fiquei com medo. Ele não passa noites fora de casa. Ele não some sem avisar. Eu estou com medo desse casamento acabar. Harry! São dez anos construindo uma vida com uma pessoa. São mais. São doze anos com a mesma pessoa. Com a única pessoa. Você não entende. Eu tive sonhos. Eu queria família. Eu queria brigar contra o mundo junto com ele. Eu queria que acabássemos com todos os problemas externos e eles foram acabando, mas a gente continuou e sem mais problemas... eu acho que a gente foi se acabando. De repente, quando nós começamos a ter apenas um ao outro, com aprovação de todo mundo e com as pessoas sabendo que ele é um cara legal a gente simplesmente parou de funcionar.


                - Você cresceu, Gina.


                - Mas não devia ser assim. Onde é que fica o felizes para sempre?


                - Não fica, Gina. As coisas acabam.


                - Harry. Acorda! Eu nunca quis que as coisas acabassem. Eu quero manter as coisas. Eu gosto do Draco. Aliás, eu não sei o que eu vou fazer se eu não gostar mais do Draco. Nós somos um do outro até que a morte nos separe.


                - Gina, lembra do que a Hermione disse?


                - De novo a Hermione?


                - É. De novo a Hermione. Por que a Hermione tem razão. Isso não vai funcionar se você não entender que o Draco é um ser humano.


                - Mas eu não agüento mais tanto álcool. Tanto porre. Sumiço. Ele chegando tarde. Eu ficando sozinha. Harry, você entende que eu não sou o tipo de pessoa que foi feita para trair o marido? Eu fui feita para ter marido. Mas eu não agüento mais.


                - Isso está pertinente demais. Ele deve ter feito alguma coisa besta.


                - Ele foi um babaca.


                - Me conta.


                - Ele chegou em casa cheio de razão. Disse que me traiu. Disse que não teve importância. E eu disse que não queria que tudo acabasse. Depois eu disse que o amo. E ele respondeu: e eu compro pães.


                - Compra pães?


                - É. Para mim não tem lógica.


                - Ele foi um babaca. Às vezes os caras são babacas. Sossegue. O amor é isso mesmo.


                - Mas você me trouxe flores e me deixa tão confusa. Harry, eu não queria que isso ficasse grande. Só queria uma aventura.


                - Mas as pessoas não são objetos. Elas afetam. Nós nos afetamos.


                - Há três semanas atrás não tinha nada disso.


                - Tinha sim, Gina.


                - Não. Eu não tinha feito nada com você. Eu nem tinha tentado. Por que eu fiquei tão envolvida em tão pouco tempo? E você?


                - Gina, meu bem, não tem pouco tempo. As coisas entre a gente já aconteciam antes. A diferença é que a gente transou quando não conseguiu mais evitar. A gente deu certo. A gente funciona.


                - Mas e o resto?


                - Se acalme. – ele disse, dando um jeito de pegá-la no colo e sentar-se na cadeira em que ela estava antes.


                Acariciava os cabelos de Gina com uma mão e as suas mãos com a outra. Beijou a nuca dela de leve, depois começou a passear por ali com a língua. Devagar. As mãos então percorriam os braços nus da ruiva, que fincava as unhas nas coxas de Harry enquanto mordia os lábios. Então ele subiu dos braços ao pescoço e ao queixo e começou a mordiscar de leve a orelha dela. A língua contornava toda a volta da orelha e os dentes fixavam-se nos lóbulos. Então ele sugava os lóbulos e voltava com a língua para os contornos até ela se cansar daquilo e levar a boca dele ao encontro da sua.


                Línguas em sintonia. Rodantes. Bocas abrindo e fechando no mesmo ritmo. Dentes cravados de leve no lábio inferior dele. Depois, no lábio inferior dela. Línguas se roçando, depois rodando. Línguas roçando. Boca dela descendo o pescoço dele. Mãos desesperadas em desabotoar camisa e abrir zíper de vestido.


                Corpos no chão. Por que o chão é cama para o amor urgente. Mãos em coxas dela e em costas dele. Mãos nos seios dela. Língua dele nos seios dela. Fixa. Então ele sugava uma teta e era sugado por mais paixão.


                Unhas dela cravadas no ombro dele. Ele por cima. Dentro dela. Dentro. Fora. Dentro. Mãos desgovernadas. Tanto suor! Tanto barulho!


                O chão é cama para o amor urgente. Um beijo desgovernado.


                Draco Malfoy de casaco na mão olhando a cena calado.


                Então foi tudo muito rápido. Harry se cobriu. Gina se cobriu. Gina começou a chorar e Draco manteve-se calado, olhando enquanto eles se vestiam. Mil coisas passavam pela cabeça de Gina: feitiços, tranca, descuido, raiva, prazer de vingança pelos pães que ele comprava, vergonha. E Harry calado, olhando para o teto e Draco calado olhando para Gina.


                Aquele maldito silêncio.


                - O que nós vamos fazer? – ela perguntou.


                - Meu bem, você sabe que eu não curto um lance à três. – ele respondeu.


                - Eu acho que não é hora disso, Malfoy. – Harry falou.


                - Potter, você não faz meu tipo. Aproveite a ruiva, está na promoção. Eu acho, inclusive, que solteira agora.


                - Draco! – Gina tentou falar qualquer coisa, mas as palavras simplesmente não saiam.


                - Meu bem, a casa é sua. Eu vou para um hotel. Não se preocupe. Potter, enjoy the party. Parecia bastante divertida. E, Gina, você esqueceu o casaco em casa. Quis ser gentil. Hasta la vista. – e Draco jogou o casaco na cadeira e desaparatou, deixando uma Gina pensando apenas em como alguém pode ser tão frio.


                Mas o marido traído não tinha outra coisa na cabeça: Hermione Granger devia saber. Afinal de contas, se aquilo fosse um começo de coisa, Harry e Gina teriam tomado as devidas providências para se esconder. Aliás, ele não se importava. Gina com outro homem era a desculpa necessária para se focar em Diana Carter.


                Entretanto, nada daquilo era racional. Draco tinha raiva da mulher. Sentia o orgulho ferido. Se sentia menor. Pela primeira vez em anos lhe passava pela cabeça a hipótese de não estar dando conta da sua mulher. Talvez fosse melhor não ter visto nada. Aliás. Ele queria simplesmente deletar tudo da cabeça por instantes. Queria esquecer. A resposta óbvia seria encher a cara, mas Draco não beberia dessa vez.


                Em casa ele podia preparar uma poção do sono, mas ele precisava ir trabalhar. Era assim que Draco costumava odiar a vida profissional.


                Naquela sala, Gina apenas pediu que Harry não a tocasse e foi para casa, com nojo de cada resto de fluido seu e dele grudado no corpo. Com nojo de todas as gotas de suor.

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