No bar de sempre
Quando Gina viu, ele estava de novo jogado no sofá com cheiro de álcool. Ela não podia deixar de pensar que ainda era quinta feira e que ela não gostava daquelas situações. Ela não gostava desde que aquilo tinha começado. Por um instante ela desejou ter tido filhos, talvez isso freasse Draco em sua sandice. Ela sentou-se, então, aos pés dele. Apoiou os cotovelos nos joelhos e sentiu vontade de chorar. Ficou ali, naquela posição desconfortável, até ele acordar.
- Qual o motivo dessa vez, Draco?
- Nada, minha ruiva.
- Você disse que sempre tem um motivo. Você me disse sóbrio. Por que você bebeu de novo? Por que desse jeito? Qual é o seu problema? Eu não estou agüentando mais, Draco.
- Eu estou confuso. Eu queria clarear as idéias...
- Assim?
- É Guinevere... Assim.
- Eu não gosto quando você me chama assim. O que você quer?
- Ficar feliz.
- E isso funciona?
- O... Que... Vo... cê... Quer?
- Quero que você me dê flores amarelas. E que você diga que eu sou bonita. Eu quero sentir saudades de você. Eu quero não viver no passado. Eu quero que você não beba e que você se preocupe. E quero sentir ciúmes de você. Eu quero sentir um aperto no peito só de ficar longe. Eu quero ter medo de te perder. Eu quero que você me machuque. Mas eu não quero que você me machuque desse jeito que você faz. Eu quero aquela dor que a gente sabe de longe que é amor. Por que amor dói. Eu quero sentir amor que dói por você. Eu quero me sentir casada com você. Eu quero que você diga que se casaria comigo e tente se conter.
- Nós... Somos casados.
- É Harry, eu sei.
- De que você me chamou?
E Gina ficou muda e quis que ele não ouvisse nada. Quis não estar ali e não ter dito nada. Quis se enterrar num buraco. Gina quis não ter fundos, pra talvez se caber em si. Por que a quantidade de sentimento e confusão na cabeça dela parecia não ter fim e não caber ali. E ela deixou Draco bêbado e sozinho pra tentar se dopar com calmantes e dormir.
***
Hermione não se via bonita no espelho, não como Diana Carter. Mas ela não podia se ser. Tinha que acabar com aquela história de personagens. Depois de tanto tempo, ela tinha vontade de ser simplesmente aquela Hermione Granger de cabelos castanhos. Era bom finalmente ser sincera consigo. Ela tinha adiado o dia todo aquele momento, mas ela sabia que alguma hora ela tinha que aparecer. Tinha que falar com Draco. Tinha que tê-lo. Mas tê-lo não sendo ela mesma parecia vazio.
A imagem de Diana no espelho dizia que Hermione era melhor. E a pessoa por trás da imagem lembrava-se da velha teoria de que personagens são sempre um pedaço da gente. A máscara não era assim tão ruim, portanto.
- Eu não vou. Ele nem sabe que eu iria e eu não preciso mais de mentir. – ela disse arrancando as lentes com certa violência.
Te batizar de novo.
Te nomear num traçado de teias
E ao invés de Morte
Te chamar Insana
Fulva
Feixe de flautas
Calha
Candeia
Palma, por que não?
Te recriar num arco-íris
Da alma, nuns possíveis
Construir seu nome
E cantar seus nomes perecíveis.
Palha
Corça
Nula
Praia
Por que não?
Ela ainda não tinha perdido a mania velha de gravar poemas e esse voltou à cabeça. Hilda Hilst que ela tinha lido pouco e gravado muito. O jogo não podia ser o mesmo de antes e essa paixão não podia ficar entalada pra não ser morte. Ela não iria. Mas ele quereria que ela fosse. Era muito fácil ler e falar de vidas alheias e então ela precisava de uma poesia uterina. Uma coisa dela pra ele que não fosse presente, mas dor e incômodo feito paixão.
- Te batizar de novo é me rebatizar.- Ela pensava em seu surto poético que já nem era patológico, sim constante. E no jogo novo ela se seria com o mesmo orgulho de antes e a mesma pele fresca. Mas ele estaria no escuro. Hermione não gostava tanto de falar quanto de escrever e era hora de ser porta-voz de si, mais que comunicadora profissional.
E eu não sei bem em que ponto parei da última vez que estive com você. O que incomoda é que eu não tenho vontade de parar. Sempre estive lá. Tenho tido medo de continuar e você nem sabe.
- Sentimental demais.- Ela disse amassando o papel.
Eu não sei mais escrever poemas. Desaprendi aos 20, quando me casei. E é estranho não usar poemas pra dizer o que se quer ou o que se sente. Sinto. Sinto muito. Sinto saudades estranhas e você nem me sabe.
- Por que eu tenho que ser ridícula feito uma adolescente!?
É claro que sumo. Gosto de proteger visão e audição e olfato do que tato e paladar não alcançam. Então mantenho-me distante e inócua, pra ser próxima e fundamental.
- Muito confessional.
Se eu entregar tudo de uma vez você corre?
- É pra ele ler.
Isso é só pra você saber que estou viva e sou gente. Tão gente que quase animal. E você é uma lembrança que eu quero em carne no bar de sempre.
Ela mandou isso mesmo, por coruja sem assinatura ao gringottes. Sexta-feira era um dia arriscado, ainda mais em fim de expediente.
***
Harry se sentia apertado e só. Era a primeira vez que ficava assim, ao léu e sem ver saída alguma, desde seu segundo ano em Hogwarts. Ele sempre achou que seu amor e saudade dariam conta de tudo. Então ele estava vazio e sem forças pra se colar em qualquer pessoa.
***
- Eu não posso ir.- Draco pensava lendo um bilhete cuja remetente ele suspeitava ser Diana Carter, sem certezas.
Mas ele foi. Ele foi o mais rápido que suas pernas permitiam sem que o mundo percebesse que se tratava de desejo alucinado e infiel.
Chegou antes de qualquer outra mulher. Pediu vinho. Esperou. Bebeu. Sentiu toda angústia do mundo no peito em cinco minutos que passavam lentamente. Bebeu. Ela não chegava. Bebeu. Ouviu o passo de saltos que ele imaginava vermelhos e grandes. Bebeu. Não era ela. Bebeu. O vinho da garrafa acabou. Ele pediu mais. Diana apareceu à porta do bar. Ele tremeu e sentiu o álcool circulando nas veias, traiçoeiro. Pareceria um babaca mais uma vez. Ela se sentou e ele sentiu necessidade urgente de disfarçar a garrafa de vinho. Tocava tango. Havia uma pista naquele bar. Nenhum casal dançando.
Levantou da mesa e pediu com um sorriso que ela dançasse com ele. A música tinha um compasso forte e ela foi com ele pra onde ele guiou. Os olhos não perdiam contato e então eram os corpos que falavam.
Ela tinha mãos quentes e pernas fortes que seguiam bem o que ele ditava com suas pernas bêbadas. A respiração dela falhava e a dele era dura e forte. Os dois mantinham corpos próximos demais, quase se misturando. A cintura dela era fina e os braços dele eram fortes. Ele a jogou e segurou. Ela subiu devagar. Seguiram juntos e se olhando até ela rodopiar. Os ritmos dos corpos combinavam. As pernas se entrelaçavam. As peles se roçavam.
Draco tinha certeza. Já tinha dançado antes com aquela mulher. No entanto, sabia que nunca tinha dançado com Diana Carter. Talvez fosse culpa do álcool, mas ele sabia que a morena grudada nele tinha outra face, talvez não tão real.
***
Então era hora de assumir que tudo tinha acabado há uma semana, por uma discussão idiota. Até aquele momento, Harry ainda tinha esperanças de voltar, mas parecia que a ficha tinha caído e nada era estranho. Ele devia contar a Rony pra conseguir uma luz. Mandou uma coruja pedindo ao amigo que fosse à sua casa, ele retrucou dizendo que Pansy já tinha feito o jantar e que a casa estava aberta. Harry foi até lá.
- Eu e Hermione nos separamos. – Ele disse, na mesa do jantar.
- Não faz sentido. – Pansy disse, depois de engolir a maionese. – Vocês estavam aqui ontem e parecia apenas uma crise besta.
- Não era.
- O que aconteceu?- Rony perguntou.
- Nós brigamos no domingo e ela saiu de casa, eu fui atrás e ela não quis voltar. Na quarta eu tentei com a música e não deu certo. Eu não sei mais o que fazer, ela nem quer tentar continuar.
- Isso não faz nenhum sentido. Eu nunca vi vocês brigarem!- Pansy tentava buscar alguma resposta.
- Nós engolíamos bastante coisa, principalmente ela. A verdade é que nosso casamento já está em crise há muito tempo. Eu a traí.
- Ela sabe disso? – Rony perguntou.
- Ninguém sabe, só eu. Agora isso está me comendo por dentro. Eu me sinto culpado e sinto que não mereço a minha mulher. Talvez nem valha à pena lutar por um casamento falido como o nosso.
- Você a traiu com quantas? – Pansy parecia atordoada.
- Uma só.
- E ela?- a bruxa continuou perguntando.
- Quem?
- Hermione. Te traiu?
- Sim.
- Caramba. Com quantos?
- Não faço idéia.
- Você gosta dela?
- De quem?
- Dessa outra mulher com quem você traiu Hermione. Deve gostar, eu nunca pensei em você como um cafajeste.
- Não sei. Eu estou confuso. Quero a minha mulher de volta.
- Vale à pena? – Rony perguntou, pelo jeito nem ele acreditava no casamento dos Potter.
- Acabou.
- E essa outra? – Pansy futucava.
- Eu não sei o que vai ser agora.
***
Estava doendo dançar. Parecia que todas as coisas estavam a ponto de serem descobertas e talvez fossem mesmo. O contato das peles dizia que ambos combinavam. Parecia que aquela história estava em mais um de seus clímax e ela queria parar, não querendo parar. Cada passo machucava Hermione Granger e ela se esquecia de Diana Carter. Não saiba mais fingir mesmo. Queria correr.
- Vamos sentar, por favor?
- Vamos até o fim das música, ao menos, Diana?
- Preciso me sentar. Estou tonta.
- Como você quiser.
E os dois pediram mais vinho e brindaram à nada. Ela engolia a bebida sem nem sentir o gosto. Ele começou a se preocupar com ela, mas ela não ligava. Engolia mais e mais vinho e esquecia-se de falar qualquer coisa. Em alguns poucos minutos, ela estava embriagada e ele não sabia o que fazer.
- Onde é sua casa, Diana?
- Saí de casa.
- Onde eu posso levar você?
- Não sei. Não pode ir no hotel, se não você vai saber.
- Saber o que, Diana?
- Eu.
- Pra onde eu te levo, Diana? – Ele perguntou, pensando que queria sabê-la bêbada ou sóbria.
- Não me leva pra casa.
- Não levo. Confia em mim.
- Não... Confio...
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