A morena



Quando Draco saiu de casa, naquela manhã de terça-feira, ele lembrava de pouca coisa do dia anterior. Lembrava que tinha bebido, falado demais, ido pra casa. E lembrava que tinha uma morena que tinha cuidado dele. E ele lembrava que conhecia aquela morena de algum lugar. Mas o rosto dela não era fácil de lembrar. Ele lembrava da voz. Lembrava da voz e do olhar distante. Ele tinha tentado beijá-la. Ela tinha dito que não. Bom ela ter dito não. Ele ao menos não tinha traído a mulher. É fato que ele já não se importava em trair ou não trair. Mas algum conforto ele tinha que ter ao saber que não tinha tido aquela morena. Ele encarava a folha de pergaminho à sua frente, mas não por completo. A vontade dele era de fazer versos, não de escrever um relatório chato.
Ele queria eternizar a morena, mesmo sem saber. Ele queria pensar que sua vida não estava um caos e que nada além daquela folha de papel era importante. O mundo continuava girando e fazendo barulhos irritantes. E Draco Malfoy continuava sendo um ser arrogante e prepotente. Entretanto, aquela folha era encarada como ele normalmente encararia um ser que ele amasse. E, mesmo sem nunca ter sido mulher, naquele instante insano, Draco sabia como uma menina de doze anos se sentia ao estar próxima do seu amor platônico. Draco gostava daquela morena, por ela ser inatingível. Por essas, ele se sentia um idiota. Gina que se preocupasse em brigar com Narcissa Malfoy.
E no meio dos devaneios de pergaminho branco, surgiu um pensamento idiota e intruso que dizia: “E se ela também tiver um moreno, ou algo assim?”.
E a Granger e o vínculo voltavam à cabeça de Draco com força total. Não obstante, aquilo não era nada preocupante, ele deixou apenas de escrever um poema.
***
- Isso não vai dar certo, Harry. Cadê a Hermione e por que você está com essa cara estranha?
- Eu já disse que a gente não está bem, Gina.
- Dá um jeito de ficar bem com ela.
- Ela não parece querer.
- Não importa. Conserta a merda que você fez! Quanto antes, melhor.
- Eu não entendo por que você se preocupa com isso.
- Ah Harry!
- E a coisa lá com a Senhora Malfoy?
- O Draco ainda está fazendo drama.
- Era bom se você desse um jeito nisso, né?
- Como se você ganhasse alguma coisa com isso.
- Gina, vamos ser sinceros um com o outro. Você não ia me querer, se tivesse apenas a mim. Eu sou chato demais pra você agüentar ficar só comigo.
- Você agüentava ficar comigo, que eu sei. Mas sei lá... essa coisa de perigo e de proibido me instiga.
- Só você!
- Depois disso nosso affair vai perder a graça?
- Depois de que?
- A verdade costuma ser cruel, sabe?
- Bom, não era nenhum segredo, eu acho.
- É... mas uma hipocrisiazinha às vezes cai bem.
- Gina, adoro você.
- Eu sei.
- E essa coisa com o Malfoy, como é que você vai resolver?
- Champanhe, morangos... langerrie nova...
- Interessante... Dá conta da crise?
- Como não?
- É... dá conta da crise.
- E a Hermione?
- Flores...
- Mais.
- Eu não sei.
- Você toca alguma coisa?
- Piano, acho.
- Perfeito! Piano e Cole Porter. Você vai se virar e tocar “Night and day” pra ela.
- Eu me casaria com você, sabe?
- Perderia metade da graça.
- Desde quando a gente é cúmplice assim?
- Antes de mim, você tinha traído, Harry?
- Não.
- Nem eu. Daí vem a cumplicidade.
- Somos insanos?
- Somos ótimos.

***
Hermione sentia-se sem chão. Era a segunda vez que Draco Malfoy tentava algo com ela quando ela estava disfarçada. E ele sempre falava demais. Sentia falta de Harry. Ele era uma fuga, afinal.
Ela estava alojada num hotel pequeno. Não tinha vontade nenhuma de sair. Era amor, aquilo? Aquela coisa quente que doía dentro dela quando ele chegava perto, e aquela vontade que ela tinha de cuidar dele. E o conformismo todo por ele ter escolhido Gina, conformismo vindo do descrédito. A falta de vontade dela de acreditar naquilo, naquilo que já acontecia há anos. Ela não podia mais. Era demais que ele tentasse beijá-la. Hermione chorava feito uma criança. Aquilo tudo doía.
Draco Malfoy dentro dela doía e queimava. E ela simplesmente não sabia o que fazer. Não queria escrever ou ver gente, não queria nada. Não queria tê-lo deixado sozinho. Não queria ter que ficar até o fim. Mas ela tinha que estar ali onde quer que fosse e quando fosse e sem importar com os custos. Ela era dele mesmo sem que ele soubesse quem ela era. E ela aceitava aquilo, mesmo que doesse. Ou não aceitava. As marcas dele não saiam da cabeça dela. E ela tinha dores nos músculos de carregá-lo. Mas o pior era saber que carregaria quantas vezes ele precisasse ser carregado. E ela não mostraria a ele qualquer marca, nem faria questão que ele soubesse que era ela quem estava lá.
Era uma história bonita, a que ela vivia. Ela sabia que por mais que tudo a machucasse e por mais que ela não gostasse do que tinha se tornado, ela era toda poesia do mundo num corpo de mulher. E ela podia escolher qual seria o tipo de verso. Ela podia escolher o corpo e trocar as bases. Nessas de se camuflar, aprendeu a se agüentar. Hermione era mais forte do que se sabia.
Era hora de tirar as lentes. Era hora de usar o cabelo natural, era hora de mostrar o nome e dar a cara à tapa. Ele pulsava nela e não rasgava. Ele era grande nela, mas cabia. Ele era um pedaço de bala que não saía do céu da boca dela. E o cheiro dele ficava na pele dela. E ela queria se rasgar pra agüentar o quanto sentia tudo aquilo. Ela queria estar longe dele pra não explodir, mas ela explodia onde estivesse. Tinha passado do tempo. A panela de pressão não agüentaria mais fogo. Era hora de abaixar, era hora de fugir. Ela gostava dele um tanto que doía. Ela poderia fazer mil versos apenas pra um sorriso dele. E ela poderia dar a cara à tapa sempre, pra que ele não apanhasse. Ela poderia agüentar tudo. E ela não exigiria nada. Quereria um sorriso apenas, pra agüentar aquela explosão maldita.
Num impulso ela era de novo Diana e se via à porta do Gringotes. Não obstante, ela não pode prosseguir, teve que ficar sentada naquela escadaria tomando um fôlego eterno. E ela ficou ali mergulhada nos próprios sentimentos até sentir uma mão quente em seu ombro. Engoliu em seco, mas por sorte era um bruxo avulso que se preocupou ao vê-la estática. Ela sorriu e ele se foi. Todo sentimento do mundo continuava preso e solto na palma da mão de Hermione Granger.
Ela subiu e pediu a um duende que avisasse a Draco que Diana Carter esteve ali e que estaria no mesmo pub de sempre. Foi ela virar as costas que ele apareceu no saguão. Viu ainda de relance os cabelos dela e correria se não tivesse sido interceptado pelo duende que falava onde a garota estaria. Draco desaparatou no banheiro do bar, instantaneamente. Sentou-se numa mesa qualquer e esperou que a morena aparecesse. Em alguns segundos ela estava ali. Ele a reconheceu. Ainda havia algo nela que ele não compreendia, mas era aquela a morena das outras vezes. Ela se sentou na mesa dele e ele esperou frases que não vieram.
- Obrigado. – ele quebrou o silêncio e ela acenou com a cabeça, como se dissesse que não foi nada. – Eu devo ter te dado um trabalho enorme.- Draco esperava alguma resposta, mas ela não dizia absolutamente nada.- Diana, né? – Hermione assentiu.- Você me achou no trabalho como? Não faz sentido algum. Só se você fosse... Quem é você?
Hermione sorriu. Ela via a cara de susto dele e abriu o paletó, mostrando a varinha. Ele procurava respostas nas feições dela e ela tinha perdido completamente a vontade de se revelar. Talvez aquele fosse um jogo novo. Não queria que ele soubesse de nada, mas ao mesmo tempo queria se escancarar. Ela se levantou da mesa e ele segurou-a pelo braço. Ela se soltou, foi ao banheiro e não voltou mais. Tinha desaparatado novamente no quarto de hotel. Ele que ficasse sozinho a se morder e sem entender por que estava ali. Quem era aquela morena, afinal?

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