Revelações Perturbadoras

Revelações Perturbadoras



Capítulo 5: Revelações Perturbadoras


Três dias. Três dias inteiros sem notícias. Draco tamborilava os dedos na sua escrivaninha nervoso. As pessoas no Departamento estavam começando a perceber que algo não estava bem. Ele já era seco normalmente, mas, nos últimos dias, andava mal humorado, irritadiço e distante. Algo o preocupava — isso era óbvio —, mas ninguém sabia o quê. Olhou para o relógio pelo que pareceu a milésima naquela manhã. Três dias. Três dias desde que ele falara com os Morgans e até agora, O’Brien não dera notícia alguma, o laboratório ainda não enviara o laudo sobre a areia e Creevey continuava fazendo silêncio no rádio. Malfoy estava cansado. Não havia nada mais cansativo do que ter que esperar quando tudo o que ele queria era poder agir. Sabia que estava negligenciando seu trabalho, suas responsabilidades, mas aquele caso era mais importante do que qualquer outra coisa. Aquele caso redefiniria a sua vida.

Com um último suspiro, Draco levantou-se da cadeira e saiu do escritório. Não podia mais ficar ali,, andando de um lado para o outro como um bicho enjaulado. Deveria ter imaginado que seria inútil delegar qualquer tarefa a Creevey, especialmente a de pesquisar sobre Lindsey Morgan em edições antigas do jornal. Se quisesse descobrir alguma coisa, teria que fazer o serviço pessoalmente. Com essa decisão na cabeça, saiu do prédio em que trabalhava deixando um recado com Anne e encaminhou-se para a biblioteca que ficava no Beco Diagonal. Era a Biblioteca do Ministério e ele sabia que poderia encontrar lá todas as edições do Profeta Diário dos últimos cinco séculos, no mínimo.

Caminhou rapidamente até chegar ao edifício — uma construção antiga e imponente — e entrou sem prestar nenhuma atenção às pessoas ao seu redor. A Biblioteca possuía sete andares, mas ele sabia que os periódicos ficavam no terceiro, então passou direto pelo balcão de informações e subiu as escadas. No terceiro andar, esperou enquanto uma jovem que ele nunca vira antes pedia alguns exemplares de revistas médicas bruxas para a bibliotecária. Enquanto sua respiração voltava ao normal, Draco se convencia de que ele fizeram bem em ir até ali. “Eu deveria ter vindo antes”, pensou, “Ao invés de ficar esperando eternamente pelo Creevey...”.

— Bom dia! Em que posso ajudá-lo? — seus pensamentos foram interrompidos pela voz agradável da velha bibliotecária.

— Bom dia — ele respondeu saindo de seus devaneios — Eu queria dar uma olhada em edições antigas do Profeta Diário.

— Qual o período?

— Entre doze... não, melhor entre treze e dez anos atrás. E, se possível, eu gostaria de uma sala reservada.

— Isso é algum tipo de brincadeira? — a mulher perguntou sem demonstrar irritação. Apenas tinha um sorriso divertido no rosto.

— Brincadeira? Por quê?

— Bom, porque nos últimos dois dias outra pessoa tem consultado exatamente as edições do Profeta desse período e ele também pediu uma sala reservada.

— Outra pessoa? — Draco perguntou, subitamente alerta. Aquilo não podia ser uma mera coincidência. Qualquer pessoa que estivesse pesquisando aqueles registros tinha que saber algo sobre o caso! — E esse pessoa está aqui agora? — perguntou cuidadosamente.

— Sim, está. Praticamente não saiu daqui nos últimos dois dias!

— A senhora poderia me dizer em qual sala ele está?

— Bom, eu não acho que seja apropriado...

— A questão é a seguinte — Malfoy começou. Primeiro pensou em inventar alguma mentira, mas, por fim, chegou à conclusão de que talvez a verdade fosse mais convincente — Eu trabalho no Departamento de Pessoas Desaparecidas — ele falou, mostrando sua identificação — e esse homem que está pesquisando edições antigas do jornal pode ter informações relevantes para a solução de um crime. Será que a senhora poderia me levar até ele? — perguntou por fim, tentando parecer o mais sincero possível, o que nem era difícil, já que ele estava falando a verdade.

— Bem — a mulher falou, como quem pára um instante para pensar melhor — Se é realmente importante...

— É muito importante — frisou o outro.

— Nesse caso... Por favor, me siga.

Draco agradeceu mentalmente. Depois de três dias de completa estagnação, parecia que ele conseguiria finalmente fazer algum progresso. Silencioso, ele seguiu a velha bibliotecária segurando com firmeza a varinha no bolso das vestes. Talvez fosse preciso usá-la. Quem seria, afinal, essa pessoa tão interessada nos jornais daquela época? O que ela já sabia? O que estava tentando descobrir? A cabeça de Malfoy estava cheia de dúvidas, mas estranhamente ele não estava nervoso. Apenas atento e observador como um predador à espreita.

A mulher o guiou por entre as mesas até o fundo do salão da biblioteca, onde ficavam algumas cabines reservadas à prova de som, para discussões em grupo. Sem cerimônia, ela pôs a mão na maçaneta de uma das portas e a empurrou, sem nenhum aviso para o ocupante da saleta. De novo, Draco agradeceu mentalmente. Quem quer que estivesse ali, seria pego de surpresa.

— Por Deus, Mary! Você está tentando me matar do coração??? — perguntou o homem lá de dentro. Draco fechou os olhos ao reconhecer a voz. Ele deveria ter imaginado.

— Você me diga. O Sr. Malfoy aqui está dizendo que você pode ter informação sobre um crime. É para isso que você anda usando a minha biblioteca, menino?

— Ah, o Sr. Malfoy! Ele não tem idéia do que está falando, não é mesmo?

— Eu deveria saber que o desgraçado pesquisando aqui era você, né, Creevey? — Draco falou mal humorado. Aparentemente, não haveria descobertas significativas hoje.

— Ei! Nem vem que eu estou aqui para te ajudar!

— Senhores! — a bibliotecária exclamou, reprimindo-os com o olhar.

— Ah, Mary, não se preocupe! — Colin disse com um sorriso — Está tudo bem — a mulher o encarou incrédula — É sério! — ele reafirmou, passando o braço ao redor dos ombros dela e gentilmente a levando para a saída — Nós somos velhos amigos — nesse momento, Draco soltou uma risadinha seca — e vamos ficar bem.

— Tem certeza?

— Claro, Mary! Temos muito o que conversar! — Colin deu um sorriso que deixaria até Lockhart com inveja.

— Está bem, então — a bibliotecária respondeu saindo com um olhar severo na direção dos dois.

— Ah, isso foi lindo! — Draco exclamou logo que eles ficaram sozinhos — Tem certeza de que você não quer uns minutos a sós com ela não?

— Cala a boca, Malfoy. Eu apenas sou um freqüentador assíduo da biblioteca.

— Jura que é só isso? Eu apostava que ela fazia o seu tipo! — Draco falou cheio de sarcasmo.

— Que isso! — Colin respondeu no mesmo tom — Nós dois sabemos que as ruivas é que são o meu tipo...

— Ah, seu merda! — Draco exclamou, subitamente furioso, enquanto avançava sobre Creevey e o segurava pela garganta contra a parede — O que foi que você falou? Vamos, repita, seu desgraçado!

— Você é louco! — Colin gritou, empurrando-o de volta — Você e o seu ciúme insano!!! Nós dois sabemos que a Gina e eu nunca tivemos nada além de amizade! E mesmo assim, basta que eu faça uma pequena insinuação para você enlouquecer! —completou. Draco não respondeu. Apenas o encarou enquanto sua respiração voltava ao normal — A Gina era louca por você. Só Deus sabe o motivo, mas ela era! Não há razão para esse escarcéu.

— Eu não preciso que você me diga isso, Creevey.

— Ah, eu acho que precisa, porque você continua agindo como um imbecil. Como ela te agüentava?! — ele perguntou mais para si mesmo do que para o outro.

— Só Deus sabe — Draco respondeu e, mudando de assunto porque falar dela era doloroso demais: — A velha disse...

— O nome dela é Mary.

— A velha disse — ele frisou — que você está enfurnado aqui há dois dias. Descobriu algo interessante, pelo menos?

— Descobri — Colin respondeu após uma pausa — Muito interessante. Eu já ia te mandar uma coruja.

— Bem, eu estou aqui agora.

— Sim. Dê uma olhada nisso — ele começou, pegando algumas folhas separadas na mesa — Eu quase não acreditei quando descobri.

— O quê??? — Malfoy estava ficando impaciente.

— Eu comecei procurando informação sobre Lindsey Morgan, mas não encontrei nada. Em compensação, achei coisas mais interessantes. Olhe essas reportagens — Creevey falou, dispondo na mesa dois jornais diferentes — Hannah Abbott — ele apontou para uma das reportagens. Você se lembra dela?

— Deveria?

— Ela estava no seu ano em Hogwarts. Lufa-Lufa.

— E você ainda queria que eu lembrasse!...

— Eu estou falando sério, Malfoy.

— O que tem ela?

— Há treze anos atrás ela desapareceu. Tinha vinte anos na época.

— As condições foram semelhantes ao sumiço de Gina? — Draco perguntou sério.

— Mais ou menos. Não havia nada quebrado na casa dela. Nada fora do lugar. A única coisa estranha era um triângulo marcado na sua porta.

— Meu Deus! — Malfoy exclamou, pegando o jornal — O que a polícia descobriu na época?

— Nada. Foi apenas dois anos depois da queda de Voldemort. O Ministério ainda estava lutando com os remanescentes dos Comensais. Desaparecimentos não eram incomuns.

— E eu não sei? — murmurou Malfoy mais para si mesmo — Quem investigou o caso?

— Aqui não diz. Na realidade, foi um anúncio que os pais dela colocaram no Profeta Diário, para que se alguém a avistasse, pudesse avisá-los.

— Eles são trouxas — Draco falou olhando para o endereço que o anúncio dava — Lindsey Morgan também era trouxa.

— Eu também pensei nisso, mas depois achei essa outra notícia.

— Outro anúncio? — Malfoy perguntou, pegando o jornal.

— Não. Dessa vez é uma pequena reportagem. A garota sumiu doze anos atrás.

— Emma Dobbs. Ela só tinha dezessete anos.

— Sim. Tinha acabado de sair de Hogwarts. Recém-formada. Mas os pais dela não eram trouxas.

— Uma puro-sangue?

— Sim, como a Gina.

— Também havia um triângulo na porta da casa dela?

— Sim. É isso que todos esses casos têm em comum.

— Não pode ser só isso — falou Draco, sentando-se.

— O que mais você vê de semelhante entre eles?

— Quando elas sumiram? — Malfoy perguntou concentrado, sem prestar atenção no que Colin dizia.

— Eu já falei! Há treze e há doze anos atrás respectivamente!

— Não, Creevey! Eu quero saber da época do ano! Em qual época do ano elas sumiram?

— Bom, o primeiro jornal é de outubro, mas diz que Abbott estava desaparecida há quatro semanas...

— Setembro, então. E o segundo?

— Setembro também — Colin constatou.

— A Gina também sumiu em setembro.

— E quanto a Lindsey Morgan?

— Eu não sei. Não perguntei aos pais dela, mas posso mandar uma coruja.

— Seria bom — Colin concordou, sentando-se também. Ele tinha descoberto mais do que imaginara a princípio — Então os casos estão relacionados?

— Estão — Draco respondeu com firmeza — Preste atenção. Vamos organizar o que descobrimos. O que nós temos até agora? Quatro mulheres desaparecidas. As quatro entre dezessete e vinte e três anos. As quatro estudaram em Hogwarts...

— Isso não conta. Quer dizer, todo mundo daqui estudou em Hogwarts...

— Tem razão — Malfoy concordou. E, lembrando-se de outra coisa: — De que casa era Emma Dobbs?

— Corvinal. Ela entrou no ano do Torneio Tri-Bruxo.

— Você se lembra dela?

— Lembro que ela era uma gracinha, mas nunca me deu bola...

— Gina era da Grifinória — começou Draco, ignorando o último comentário — Morgan, da Sonserina. Abbott da Lufa-Lufa e Dobbs da Corvinal. Está vendo o padrão?

— Não se esqueça dos anos! — Colin falou, finalmente entendendo qual era o jogo — Gina há dez anos, Morgan há onze, Dobbs há doze e Abbott há treze...

— E todas em setembro — Draco completou pensativo.

— Quer dizer, isso se Morgan desapareceu em setembro, certo? — Colin retrucou.

— Quer apostar?

— Não — ele respondeu, desanimado — Eu vou perder.

— A mesma pessoa levou essas quatro mulheres — Malfoy concluiu — Não há dúvidas.

— Mas se...

— Se o quê?

— Se ele levou as quatro, ele... será que ele fez... fez a mesma coisa com as quatro?

— Assassinos seriais não mudam seu modus operandi — Draco respondeu frio — O que ele fez com uma, fez com todas.

— Mas então Gina...

— As chances são de que ela esteja... morta.

— Malfoy — Colin começou após uma pausa — Se isso é verdade... será que... será que vale a pena continuar com essa busca? — Draco o contemplou por um instante. O outro não entendia. Como poderia? Ele não a amava da mesma forma.

— Eu só paro — respondeu finalmente — quando vir o corpo. Enquanto eu não vir o corpo, a busca continua. Entendeu, Creevey? Com ou sem a sua ajuda, a busca continua.

— Com a minha ajuda, Malfoy. Eu também quero encontrá-la.

— Então continue olhando os jornais. Eu preciso escrever aos pais de Morgan e também preciso falar com outra pessoa que pode nos ajudar... — Draco falou, levantando-se e dirigindo-se para a porta.

— Malfoy — o outro o chamou de volta.

— O quê?

— Eu... eu realmente sinto muito.

— Eu também, Creevey... Eu também... — ele completou e, com isso, abriu a porta e saiu da sala.





Draco chegou ao seu escritório ainda com a cabeça cheia. Ele jogou suas vestes em cima da cadeira e começou a andar de um lado para o outro, ocasionalmente passando as mãos pelo cabelo. Aquilo tudo era súbito demais, perigoso demais, doloroso demais. “Não, não é súbito”, ele pensou depois, acalmando-se. Desde que Creevey lhe mostrara aquele recorte, era isso o que Draco temia. Pensando bem, desde o dia fatídico em que ela desaparecera, era isso o que Draco temia. E também era isso o que ele esperava.

Percebendo que seu comportamento estranho já estava começando a receber olhares curiosos de alguns dos seus investigadores, Malfoy obrigou-se a sentar-se na cadeira e, o mais calmamente que conseguiu, rabiscou um bilhete para os pais de Morgan, perguntando sobre a data do desaparecimento dela. Saiu, depois, da sua sala por um instante, e deu instruções a Anne para enviar a carta. Voltou, então, ainda nervoso e fechou suas persianas. Draco raramente fazia isso e com certeza as pessoas achariam estranho, mas ele estava preocupado demais para se importar.

Sem hesitar, então, jogou um punhado de pó-de-flu na lareira e chamou Matt. Em instantes, o rosto do outro apareceu em meio às chamas, surpreso.

— Draco, eu pensei que nós tivéssemos combinado que quando eu conseguisse os arquivos, eu entraria em contato...

— Eu sei, Matt. É que eu descobri mais coisas — ele respondeu, e prosseguiu descrevendo para o outro o que Colin achara na biblioteca.

— Meu Deus! — O’Brien exclamou quando terminou de ouvir — Isso é muito sério.

— Eu sei.

— E você acha que os outros arquivos sumidos são os de Abbott e Dobbs?

— Acho que sim. E, como eles não estão aqui, as chances são de que...

— Eles estejam aqui.

— Exatamente — e após uma pausa — Escute, Matt, eu sei que você está fazendo o melhor possível, mas...

— Não se preocupe, Draco. Confesso que não estava completamente convencido antes de que havia alguma ligação entre Gina e Morgan, mas estou agora. Não vai ser fácil conseguir as pastas, mas vou tentar mais. Levo-as para você nem que tenha que roubá-las.

— Obrigada, Matt.

— É para isso que os amigos servem, garoto — o outro ainda respondeu antes de sumir da lareira.

Draco encarou as chamas vazia por alguns instantes e quando já estava se levantando para voltar para a escrivaninha, a porta do seu escritório se abriu furiosamente:

— Malfoy! — exclamou a voz enraivecida de Ronald Weasley — O que isso significa??? — ele completou abanando na direção de Draco um maço de pergaminhos.

— Senhor, eu tentei impedi-los, eu... — a secretária falou sem fôlego.

— Está tudo bem, Anne. Você pode sair. E feche a porta atrás de você, sim? — completou.

— Você não vai responder minha pergunta, não? Hein?

— Weasley, se eu tivesse alguma idéia do que você está falando, eu responderia.

— Disso! Eu estou falando disso! — e ele jogou os pergaminhos sobre a mesa.

— E o que vem a seu “isso”?

— É um relatório — Hermione respondeu mais calma que o marido — da análise de uma amostra que você mandou para o laboratório.

— Finalmente! — Malfoy exclamou, pegando os papéis — Mas o que diabos vocês estão fazendo aqui?

— O laboratório nos notificou — Granger respondeu antes que Rony começasse a gritar de novo.

— O laboratório notificou vocês? — Draco perguntou furioso. Ele tinha conseguido se manter calmo até então, mas aquilo era demais — E por que diabos eles fizeram isso? — a simples idéia de que seus passos estavam sendo vigiados era suficiente para fazer seu sangue ferver.

— Por que diabos?! Por que diabos?!!! Ora, sinceramente, Malfoy! Não pense que você vai nos enganar assim tão fácil! E você ainda teve coragem de dizer que nós estávamos tentando roubar o seu caso quando a filha do Sirius foi seqüestrada?! E o tempo todo que você deveria estar procurando por ela, você estava fazendo o quê, hein? ROUBANDO UM CASO QUE ERA NOSSO!!!

— Rony, por favor... — Mione tentou contemporizar.

— Não! Não me peça para ficar calmo! Eu já estou com raiva de você há muito tempo, seu desgraçado! E isso — ele disse apontando para o relatório — foi apenas a gota d’água!

— Weasley — Malfoy respondeu no tom mais superior e arrogante que conseguiu — caso você não tenha percebido, eu não tenho idéia do que esse relatório diz. Será que eu ao menos poderia lê-lo para entender seus patéticos insultos melhor?

— Em resumo — interrompeu Hermione quando viu que o rosto de seu marido estava agora dois tons mais fortes de vermelho preparando-se para explodir — ele conclui que a amostra que você mandou para o laboratório é produto de uma mágica poderosa.

— E por isso vocês estão fazendo esse escarcéu todo?

— Não é uma mágica qualquer, Malfoy. É magia negra. Por isso, nós fomos chamados. O que quer que seja, nós deveríamos estar investigando. Não você.

— Que tipo de magia negra? — Draco perguntou esquecendo a raiva. Os outros dois apenas se entreolharam.

— A substância é o resíduo... ou melhor, o produto de uma poção...

— Mas isso não é possível! Havia uma quantidade imensa dessa areia. Quanta poção alguém teria que fazer para produzi-la?

— Malfoy, não é assim que funci... — Mione começou, mas Weasley a interrompeu.

— Não! Nós não podemos falar.

— Ah, não?

— O Rony tem razão, Malfoy. O assunto é confidencial.

— Confidencial? CONFIDENCIAL??? Então vocês vêm aqui me insultar e não podem sequer me dizer do que se trata? Como vocês esperam que eu lhes diga algo quando vocês não me contam porra nenhuma?

— Ah, mas você vai contar! — respondeu Rony ameaçadoramente — Como você explica ter em seu poder algo tão claramente conectado com as artes das trevas, hein? Deus sabe que seu nome não tem nada de respeitável nesse país! Você só está aí quietinho porque sua família perdeu tudo quando Voldemort foi destruído. Você perdeu tudo! Mas quem nos garante que isso não passa de fingimento? Quem é que sabe realmente o que você faz no apagar das luzes?

— Ah, seu filho da puta! Como você tem coragem de me acusar de algo assim? Seu...

— Eu tenho coragem sim porque não confio em você. Não confiei e nunca vou confiar. Minha irmã confiava e olha o que aconteceu com ela!

Pronto. Aquilo foi suficiente para levar Draco à loucura. Num movimento rápido, ele avançou na direção de Weasley pronto para matá-lo, mas inteligentemente Granger se colocou entre os dois. Por mais raiva que sentisse, Draco não poderia atacá-la. Ao contrário da crença popular, ele não batia em mulheres.

— Eu vou te matar, Weasley! — ele gritou sem conseguir atingi-lo — Mais cedo ou mais tarde, eu vou te matar!

— Eu não tenho medo de você, seu merda!

— Calados! — interrompeu Hermione gritando — Eu não quero ouvir nem mais um pio de nenhum dos dois fora de hora. Se eu ouvir — ela continuou, puxando a varinha — vou ser obrigada a azarar quem tiver aberto a boca!

— Mas, Mione...

— Calado, Ronald Weasley! Eu estou falando sério! — ela lançou-lhe um olhar férreo. Por alguns instantes, o silêncio tomou conta da sala — Pois bem — recomeçou — Agora que nós estamos mais calmos, podemos continuar — ao ouvir isso, Draco deu uma risadinha seca que foi retribuída com outro olhar reprovador de Granger — Malfoy, você realmente precisa nos dizer onde conseguiu a amostra. O caso é da nossa jurisdição. Nós devemos investigá-lo. Não você.

— Eu a consegui na cena de um crime na Escócia — ele respondeu a contragosto.

— Na Escócia? E o que diabos você estava fazendo...

— Rony! — Mione cortou-o — Quieto!

— Eu estava investigando esse crime — Draco respondeu estregando aos dois a pasta com o recorte do jornal e a reconstrução do rosto de Lindsey. Era tudo o que os aurores iriam conseguir dele.

— E por que você estava investigando esse crime?... — começou Weasley — O que...

— Porque ele tem a ver com Gina — respondeu Mione enquanto passava os olhos pela a reportagem —A mulher encontrada tinha um triângulo pintado na testa.

— O quê???

— Malfoy, você não acha que...

— Eu acho que sim — ele respondeu, mas não falou nada sobre as outras mulheres.

— Bom, o caso é nosso agora — concluiu Granger fechando a pasta — Não se preocupe. O que quer que seja, nós vamos descobrir.

— Nossa! Isso vai me fazer dormir bem mais tranqüilo essa noite...

— Nós queremos descobrir o que houve tanto quanto você!

— Eu duvido.

— Malfoy, seu...

— Rony, vamos embora — Hermione chamou dirigindo-se à porta — Essa conversa acabou.

— Ah, e Malfoy — Weasley ainda disse enquanto segurava a maçaneta — Se eu descobrir que você está se metendo na nossa investigação, eu mando te prender. Quem sabe agora, com o nosso departamento assumindo o caso, nós não conseguiremos finalmente descobrir o que aconteceu com a minha irmã, não é mesmo? — após terminar de falar, Rony teve apenas tempo suficiente para abaixar-se quando o cinzeiro de pedra de Draco veio voando na direção da sua cabeça e se chocou contra a parede — Ah, seu... — ele começou dando um passo para frente, mas Mione o puxou com força para fora e bateu a porta, deixando Draco sozinho com os seus próprios demônios.





Malfoy estava furioso. Ele estava tão furioso que passou o resto do dia andando de um lado para o outro no seu escritório. Parou apenas para mandar um bilhete a Creevey dizendo que os aurores estavam no pé deles e depois voltou a andar. Ele estava positivamente furioso. Estava também cansado das insinuações maldosas de que ele não havia feito todo o possível para encontrar Gina. Deus sabe que ele iria até o inferno se houvesse uma pista incriminando o diabo. Ele faria qualquer coisa. Trocaria de lugar com ela num instante. Seria capaz de tudo. E ainda assim era obrigado a aturar as piadinhas e as insinuações. Era enfurecedor. “Mas até eu tenho que admitir”, ele pensou finalmente com um suspiro resignado, “que é tudo minha culpa. Se eu não tivesse...”, ele deixou o pensamento se perder. No fim, Malfoy sempre concordava que fizera por merecer aquela tortura. Se ele apenas não fosse tão estúpido! Mas agora era tarde demais. A estupidez já lhe custara o que de mais precioso ele possuía.

Mal viu o tempo passar com toda a sua fúria. Quando deu por si, o escritório já estava praticamente vazio. As pessoas, percebendo que ele não se encontrava no seu melhor estado de humor, foram saindo aos poucos, sem se despedir. Não que ele estivesse reclamando. De forma alguma. Provavelmente teria sido capaz de fuzilar qualquer um que tivesse lhe dirigido a palavra. Não, do jeito que foi, ele teve tempo para se acalmar, para refletir. Por fim, mais conformado com a situação, Draco juntou suas coisas e aparatou para a sua casa vazia.

Na sala, a escuridão o saudou silenciosamente. Com um gesto de varinha, ele acendeu as luzes e, em seguida, largou sua pasta, suas vestes e seu paletó sobre a mesa. Sequer considerou a possibilidade de cozinhar algo. Não estava com fome de verdade. Naquele dia mais do que nunca, Draco Malfoy queria esquecer. Desfez, então, o nó da gravata, desabotoou os primeiros botões da camisa, deixou os sapatos no meio da sala e pegou de dentro do aparador uma garrafa de vinho. Sentou-se no sofá, levando-a consigo e encarou-a por alguns instantes. Gina não gostava quando ele bebia. Na realidade, Malfoy não era muito tolerante ao álcool e costumava ficar bêbado facilmente. Por isso é que ela não gostava. Da mesma forma, contudo, que ele não deixava de fumar quando ela pedia, Draco não deixou de beber quando tinha vontade. E naquele dia em particular, ele realmente pretendia beber até desmaiar.

Abriu, então, a garrafa e, sem hesitar, levou-a à boca, bebendo um grande gole do gargalo. Repetiu o gesto mais duas vezes e já começou a sentir os primeiros efeitos do álcool. O teto de seu apartamento já não estava completamente estático sobre sua cabeça. Mais alguns goles e ele poderia se considerar oficialmente bêbado. Levantou, então, de novo a garrafa, mas antes que ela chegasse a tocar-lhe os lábios, foi interrompido pelo barulho estridente do telefone.

Deixou seu braço cair ao lado do sofá surpreso. Seria Creevey querendo saber detalhes sobre o encontro dele com os aurores? Draco considerou a possibilidade enquanto o aparelho continuava tocando, mas algo lhe dizia que não era Colin. Talvez esse ‘algo’ fosse o seu próprio receio, mas independente disso, ele sabia. Apoiou a garrafa na mesa de centro e, sem pressa, levantou-se para atender a ligação. Sentia sua cabeça um pouco leve e xingou-se mentalmente por ter começado a beber. Iria precisar de todos os seus sentidos alertas agora.

— Alô — ele falou finalmente tirando o fone da base.

— Aprendeu a atender o telefone direito, Sr. Malfoy? — perguntou a voz já familiar do outro lado.

— Eu vou falar isso uma vez e devagar para você não perder nenhuma síbala: vai-se-foder. Eu não estou com paciência para os seus joguinhos hoje.

— É uma nota de álcool que eu detecto na sua voz? — a voz respondeu em tom divertido — Que coisa feia, Sr. Malfoy.

— Você vai me fazer repetir?

— Realmente, você anda muito desbocado ultimamente.

— É você que tem o talento de despertar o melhor em mim.

— Ah, vejo que a bebida não afetou completamente o seu pensamento. Ainda capaz de dar uma resposta inteligente, sim?

— Olha, se você não tem nada de importante para falar...

— Eu não disse isso.

— Então, desembuche porque como eu disse, não estou com paciência.

— Sim, eu entendo. Teve um dia cheio, não é mesmo?

— O quê?

— O seu dia. Eu sei da sua pequena ‘reunião’ com dois aurores...

— Seu desgraçado! Como?!...

— Ah, como! Essa é a pergunta dos sessenta e quatro mil dólares, Sr. Malfoy.

— Não, a pergunta de sessenta e quatro mil dólares é: quem diabos é você? E qual afinal é a porra da sua ligação com o seqüestro da Gina?!

— Eu não acredito que você ainda não tenha deduzido isso.

— Por acaso você é a droga do detetive que investigou o desaparecimento das outras mulheres?

— Ah, você já descobriu sobre elas?! Que interessante!

— Sim, eu descobri sobre elas: Lindsey Morgan, Hannah Abbott, Emma Dobbs e Gina. A questão é: o que você sabe sobre elas???!!!

— Tem certeza de que você quer descobrir?

— Eu estou perguntando, porra! É claro que eu quero descobrir!

— Pois bem: eu sei muitas coisas. Eu sei, por exemplo, o tamanho de roupa que elas vestiam. Sei o número dos seus sapatos. Ainda consigo me lembrar do cheiro dos seus cabelos.

— Seu desgraçado!...

— Principalmente, contudo — o homem continuou ignorando a interrupção — eu sei quais foram as últimas palavras de cada uma delas.

— Você está mentindo!!! — Draco gritou ao telefone, tentando fechar seus ouvidos, não querendo acreditar no que escutava. Sua mente estava a mil.

— Sim, você gostaria disso, não é mesmo? Mas eu não estou mentindo.

— Você está! Você não passa de um mentiroso desgraçado! Você não é ninguém!

— Eu sou o último rosto que a sua mulher viu. Eu sou a última boca que tocou os seus lábios...

— Eu vou te matar! — Draco trincou os dentes.

— Você quer saber como ela chorou? Quer saber como ela implorou? Como ela sofreu até que tudo estivesse acabado?

— Eu vou te MATAR! Eu juro por Deus, eu vou...

— Não que ela não tenha lutado, entenda você. Não... ela lutou mais do que todas as outras, mas isso só tornou as coisas mais divertidas para mim...

— Seu filho da puta, eu vou te matar!

— Isso não vai trazê-la de volta, vai?

— Eu não me importo! Onde quer que você esteja, eu vou te caçar até o fim do mundo se for preciso e quando te encontrar, eu vou te matar! Eu vou acabar com você. Se você acha que a fez sofrer, eu vou te fazer sofrer três vezes mais, seu desgraçado! Seu...

— Primeiro, você vai ter que me encontrar, não é mesmo, Sr. Malfoy? — o outro observou friamente, quase como um desafio.

— Mas eu vou te encontrar! Eu vou... — Draco ainda gritou contra o telefone, mas era em vão. O homem já havia desligado e ele estava apenas gritando para o vácuo. Furioso, ele atirou com força o fone contra a parede. Depois, num acesso, arrancou a base da parede e jogou-a também. Estava fora de si. Nunca em toda sua vida havia se sentido tão perdido, tão sem chão, tão descontrolado. O pior de tudo, entretanto, era a impotência. Não havia nada que ele pudesse fazer. Da mesma maneira que ele não pudera fazer nada há dez anos atrás, quando Gina mais precisara da sua ajuda. Empurrou a mesa com força, fazendo-a virar no chão. Depois, chutou o aparador e quebrou com as mãos os pratos e vasos que ficavam em cima do móvel. Por fim, ainda descontrolado, jogou a garrafa de vinho contra a lareira, sujando o chão de vermelho. Ele estava perdido. Ela estava morta e ele estava sozinho. Quando o pensamento finalmente pareceu atingir a parte consciente de sua mente, Draco parou de quebrar as coisas. Ele sentia-se... desamparado. Deixou-se escorregar para o chão com um soluço e encolheu-se em posição fetal. Depois do primeiro soluço, outros o seguiram e, quando percebeu, Malfoy estava chorando desesperadamente. Levou as mãos ao rosto, tentando controlar o pranto, mas era inútil. Por fim, rendeu-se e deixou-se ficar lá, deitado, sem esperança, o sangue dos cortes em suas mãos misturando-se ao vinho caído no assoalho e o tempo todo murmurando para si mesmo: “Meu Deus, o que eu vou fazer agora?!...”

Ele realmente estava perdido.

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