Alguém para culpar



Capítulo 11 – Alguém para culpar


Os seus passos ecoavam no caminho de gravilha, enquanto observava o jardim silencioso envolto na bruma da madrugada. Caminhava desalentado, com as mãos nos bolsos, se sentindo realmente miserável por tudo o que fizera e dissera naquele dia. Mas nada o magoava tanto quanto as palavras duras que tivera para a mulher que mais amava. Depois de sair da casa de Seamus, onde se desculpara pela agressão violenta (e aproveitara para ameaçar repetição caso ele voltasse a, sequer, dirigir um olhar para a ruiva), deambulara durante horas pelas ruas desertas da cidade. Agora, finalmente, se sentia mais calmo e consciente das suas acções, pelo que decidira voltar para casa e se ajoelhar perante Ginny Weasley, implorando o seu perdão.


Ergueu os olhos para a casa que se agigantava, agora que rodeara a sebe, e um impacto abateu-se sobre si. Sentiu como se o ar de dentro dos seus pulmões tivesse sido expelido todo de uma vez enquanto, com horror, dirigia o olhar para a porta da cozinha e se apercebia que o vidro fora partido e que ela pendia nas dobradiças.


- Gi…não! – murmurou, antes de correr como nunca antes em toda a sua vida, entrando como um furacão pela cozinha. Varreu com os olhos a divisão e com uma tontura, que o obrigou a apoiar-se com a mão na bancada, deparou com o corpo inanimado de Padfoot, claramente morto. Mas o choque foi breve, todo o seu pensamento dirigido para Ginny e para o medo de que o invasor ainda estivesse no interior da residência. Cerrou os punhos com toda a força e caminhou lentamente, os passos ecoando levemente com o peso do seu corpo másculo, na direcção do corredor que desembocava na sala – Por favor…permiti que nada tenha acontecido com ela…por favor… – rezava em silêncio, os olhos dardejando em busca de qualquer sinal de perigo. Quando chegou à ombreira da porta e observou o interior da sala, o seu coração parou.


Ginny estava deitada no chão, as roupas completamente rasgadas e um punhal cravado no seu abdómen, assim como múltiplas marcas de violenta agressão.


- Não…não…NÃO! – as palavras saíram da garganta de Harry, a voz rouca e cava, com uma nota de desespero que ele não se lembrara de sentir em toda a sua existência. Correu para perto dela, debruçou-se sob o seu corpo e observou que respirava muito fracamente. O pulso era débil e estava completamente lívida, mesmo para os parâmetros da pele alva dela. O sangue ensopava tudo ao seu redor e Harry calculou, com uma calma fria que apenas o desespero puro pode conferir, que ela não teria muito mais em si para perder. Colocou-a com o máximo de cuidado nos seus braços, tentando mover o mínimo possível de forma a não danificar mais tecidos na ferida e olhou a face dela fixamente, sentindo um horror negro invadi-lo. Se ele a perdesse…se ela morresse…


Tentando apressar o passo e simultaneamente não a balançar demais, levou-a até ao carro. Deitou-a com cuidado no assento traseiro, despindo o casaco e colocando-o debaixo da cabeça dela, para que ficasse mais confortável. Em seguida entrou e respirou fundo, tentando conter o pânico, sabendo que isso não a ajudaria em nada. Pôs o carro em marcha e dirigiu rumo ao hospital. Pensara em chamar uma ambulância mas sabia que demoraria demasiado tempo a encontrar a casa e esse tempo poderia ser tempo precioso…




Harry irrompeu pela porta do Hospital, carregando Ginny nos braços.


- Por favor…alguém me ajude…ela deixou de respirar… – gritou, olhando perdido em volta. Um médico e uma enfermeira acorreram, trazendo uma maca onde a depositaram, e entrando de imediato por uma portinhola metálica. Harry ia segui-los, mas uma segunda enfermeira, com cara séria, interceptou-o.


- Não pode entrar aí.


- Mas eu não posso deixá-la sozinha…não de novo… – clamou, desviando-se da mulher, o rosto endurecido e os olhos flamejando.


- Nós vamos cuidar dela, você será chamado quando tivermos notícias. Tenha fé – acrescentou, deixando-o e entrando pela porta. Harry recuou até as costas baterem na parede branca, nua e fria, do corredor deserto da emergência hospitalar, parcamente iluminado. Deixou que o seu corpo escorregasse até ao chão, o peso da culpa tomando conta de si. Ele deixara sozinha a mulher que amava mais do que a própria vida, ignorando os seus pedidos para que ficasse. Colocou a cabeça entre os joelhos e chorou amargamente, como um menino que há muito deixara de ser.




-…Não, ainda não sei de nada. Por favor, não demorem…até já, então – a voz do moreno tremia enquanto falava ao telefone com Arthur pela segunda vez num espaço curto de tempo. Quando conseguira recuperar um pouco da clareza mental, compreendeu que era imprescindível avisar a família do que estava acontecendo. Artur, a sua mãe e Belle chegariam em breve, mas nem esse pensamento lhe trazia nenhum tipo de consolo. Observava os médicos entrarem e saírem daquelas portas, interpelando-os inicialmente, mas depressa chegara à conclusão de que não valia a pena. Quando o estado de Ginny fosse avaliado eles iriam falar com ele.


A inactividade estava-o matando, quase tanto quanto o medo, por isso decidiu andar um pouco e procurar um lugar onde pudesse lavar o rosto. Umas placas indicavam o caminho e ele seguiu por um corredor lateral. Quando estava quase chegando aos lavabos, viu uma porta larga e pesada, de madeira escura, entreaberta. De dentro dela escoava uma luz vaga, mas algo naquela sala o chamava. Olhando com atenção, percebeu que estava perante a capela do hospital, uma vez que uma cruz encimava a entrada. Entrou, empurrando a porta, e viu duas alas com cadeiras e um corredor no centro por onde se chegava ao altar.


Respirou fundo e percorreu lentamente o espaço que o separava do coração da capela. Sem hesitar, caiu de joelhos, uniu as mãos e deixou que o coração pedisse por ele.


- Você sabe que eu não rezo. Sabe que eu não sigo as regras, sabe que já fiz o mal. Sabe que nem tenho fé, que me nego a acreditar em Você. Sabe que renego o seu nome, alguns dos seus ensinamentos, o perdão pelos meus pecados. Eu nem sei se me está ouvindo, ou se eu ainda estou entre os seus protegidos. Mas se há algo que eu sei, é que eu amo aquela garota. Eu sei que ela não merece isso, que ela merece uma vida pela frente. Por isso, eu peço…não por mim, mas por ela…eu imploro…que ela se salve. Ela tem de se salvar… – uma lágrima solitária caiu dos olhos verdes. Ele ergueu-se devagar e voltou costas à cruz, caminhando em passo decidido para junto da porta que levava à mulher da sua vida.


Esperou ainda por duas horas, altura em que Arthur, Lily e Belle já se haviam juntado a ele. Contara o que sabia e descobriu que, no seu íntimo, desde que a vira abandonada no chão, ele conhecia o nome do culpado. A voz mesquinha e as ameaças dele rodavam na sua cabeça, contribuindo ainda mais para o peso de responsabilidade que se abatera sobre si. Ele sabia do perigo que ela corria e, ainda assim, voltara-lhe costas e deixara-a desprotegida. Ondas de raiva por si, por Antonio Firenzzi e pelo mundo em geral, vergastavam-lhe o corpo.


- Harry… – ouviu a voz de Belle chamando baixinho pelo seu nome. Virou a cabeça e viu que a irmã se sentara junto dele, os olhos cheios de lágrimas, esperando dele uma palavra de conforto, de esperança. Uma palavra que ele não tinha. Então, o médico saiu pela porta e dirigiu-se ao grupo.


- Familiares de Ginevra Knight-Weasley? – questionou, ao que eles acenaram positivamente – Ela entrou com um quadro de múltiplas agressões, incluindo uma perfuração por arma branca. Quando chegou a nós estava em parada cardio-respiratória, mas conseguimos resgatá-la. De momento ela encontra-se na zona de cirurgia, para reparação abdominal. Os exames indicam uma fractura do maxilar e de duas costelas, contusões e cortes profundos. Quero que estejam perfeitamente cientes da gravidade da situação de Ginevra, o estado dela é extremamente delicado. Por outro lado, caso ela se recupere ela precisará muito do vosso apoio, especialmente no respeitante à violação… – Harry tremeu como uma folha no vento, enquanto Lily e Belle choravam silenciosamente e Arthur estava lívido como mármore, os olhos dilatados em horror – …as autoridades foram contactadas e já foram recolhidas amostras para investigação. Quando a intervenção for concluída eu virei informá-los de como correu – fez um breve cumprimento com a cabeça e retirou-se.


Arthur sentou-se com a cabeça entre as mãos, parecia prestes a desfalecer, pelo que Lily acorreu para o acalmar. Belle aproximou-se do irmão e tentou olhá-lo nos olhos, esperando oferecer algum apoio, mas ele tinha a cabeça baixa e os punhos cerrados. Com um salto de choque, viu quando um deles voou contra a parede por repetidas vezes, até que os nós dos dedos derramaram sangue. A garota abraçou o irmão fortemente e ele apertou-a entre os braços, chorando baixinho, enquanto ela acariciava o cabelo dele e sussurrava:


- Vai ficar tudo bem…eu prometo…tudo bem…schh… – levou-o até uma fila de cadeiras e sentou-o, tremendo por dentro ao ver o irmão de uma forma que nunca vira antes, perdido e desesperado. Encostou a cabeça dele no seu colo e embalou-o como um bebé, esperando que a escuridão fosse embora.




- Ela já saiu da sala de operações e estou feliz por anunciar que a intervenção foi um sucesso, esperamos uma recuperação completa. Ela teve muita sorte por não ter danificado seriamente nenhum órgão vital. Já está num quarto individual, sob efeito da anestesia, daqui a pouco poderão passar a vê-la – o médico sorriu brevemente, antes de se afastar para ir conversar com alguns auxiliares.


- Você ouviu, Harry? Ela vai ficar bem! – Belle disse, sorrindo para o irmão. Ele acenou, os olhos ocultos sob as suas mãos. O sorriso da irmã murchou e ela perguntou, baixando o tom de voz – O que se passa?


- A culpa é minha, Belle – murmurou ele, finalmente, afastando as mãos e olhando-a nos olhos – MINHA! Eu deixei-a lá, praticamente a entreguei para o Firenzzi – a voz era dura e o rosto denunciava o seu cansaço. A tarde já ia a mais de meio e nenhum deles saíra dali.


- Harry, não seja idiota – Belle repreendeu duramente – Ninguém podia prever uma coisa assim, ninguém…


- Eu podia. Ela me disse que tinha um pressentimento ruim, que me queria perto dela e eu ignorei… – Belle bufou de impaciência. Ficaram em silêncio durante muito tempo, até que uma enfermeira os chamou para que entrassem dois a dois e a vissem, ainda que ela continuasse dormindo. Primeiro foram Lily e Arthur, mas a mulher saiu quase em seguida, as lágrimas caindo silenciosas pelo rosto.


- É tão difícil ver ela ali, assim… – a voz doce estava carregada de dor – O Arthur pediu que eu fosse a casa buscar algumas coisas para ela, volto logo. Pode entrar, Belle.


- Você quer ir primeiro? – questionou a morena. Harry abanou negativamente a cabeça – Tem certeza? – insistiu ela.


- Sim. Eu preciso de mais um tempo para me preparar… – a voz saiu abafada e mais baixa do que o normal. Belle lançou-lhe um olhar afectuoso antes de entrar. Harry ficou ali, olhando para a porta e temendo o que veria quando passasse por ela. Queria vê-la, sentir a respiração dela, olhar nos seus olhos, saber que estava viva e que era a mesma. Mas temia ter diante de si o resultado do seu temperamento tempestuoso, da sua falta de confiança e capacidade de entrega total.


Arthur saiu passados longos momentos, amparado por Belle, ambos lívidos e de olhos inchados. Belle fez sinal para que ele entrasse, mas antes que ele obedecesse ela murmurou:


- Vai ter de ser forte…Muito forte, Harry. Por você…e por ela – deu-lhe um aperto encorajador no ombro e afastou-se com o pai.


Harry entrou no quarto de olhos baixos, não muito certo da sua vontade de a ver. Mas os seus olhos foram atraídos como um íman para o rosto da ruiva e todo o horror que sentira voltou na máxima força. A pele da face dela, outrora sedosa e levemente rosada, estava coberta de hematomas e arranhões, vários cobertos por curativos. O seu lábio superior estava rebentado, tal era visível apesar do tubo que auxiliava a ventilação, e uma crosta de sangue formava-se agora. A maçã direita do rosto dela era uma nódoa negra gigante e Harry viu, apesar dela estar coberta com o lençol até ao peito, que o seu colo tinha cortes profundos. O inchaço dos seus ferimentos começava a aumentar e, ainda assim, o garoto admirou a beleza daquela mulher extraordinária que a vida se encarregara de lhe trazer. O peso no peito ameaçava sufocá-lo e, por isso, sentou-se numa cadeira perto da cama dela e agarrou uma das mãos de Ginny. A mão dela, com os nós dos dedos feridos, na mão levemente ensanguentada dele, fruto da explosão que tivera no corredor, estava gelada. Harry apertou-a e beijou-a, falando silenciosamente com a ruiva.


- Não se atreva a me abandonar, Ginny Weasley. Eu amo você…só agora descobri o quanto posso amar alguém. Me perdoa…por não ter estado lá. Se eu soubesse, tudo teria sido diferente… – uma lágrima escapou dos seus olhos, a sua expressão numa máscara de dor e mágoa. Sentiu um leve estremecimento da mão e viu que a garota se mexia levemente. Saltou da cadeira e correu para a porta, abriu-a com um puxão e chamou por um médico.




Há duas semanas que Ginny estava internada no hospital. Depois de sair do coma induzido, ela recuperava lentamente mas de forma confiante. A polícia passara por lá para recolher o seu depoimento, que tivera de ser interrompido por várias vezes para que ela pudesse recuperar as forças. No entanto, Antonio Firenzzi parecia ter sido engolido pelo chão e nenhuma busca surtira efeito.


Harry saía do hospital apenas para ir a casa tomar banho e trocar de roupa e, ocasionalmente, dormir por algumas horas. Passava os dias sentado perto da porta do quarto dela. Perto, mas não dentro. Todas as vezes que entrara para a visitar, esperando poder falar com ela e dizer tudo o que sentia, ela estava virada para a parede e recusava encará-lo. Se ele rodeasse a cama, ela simplesmente fingia estar a dormir até que ele desistisse e saísse. Não podia realmente culpá-la, mas aquele silêncio e desprezo doía demais. Tudo o que sabia sobre ela vinha por intermédio de Belle. Arthur e Lily adiaram o casamento por tempo indeterminado, mas ausentavam-se por vezes por motivos de força maior. Arthur parecia ter tomado a seu cargo a procura pelo culpado do estado da sua filha e era sabido por todos que contratara detectives para que o trouxessem, vivo ou morto.


Naquele dia Harry estava sentado na cafetaria do edifício, perto de uma grande janela. A chuva caía com força e o mundo parecia envolto em escuridão e melancolia. Belle aproximou-se dele, puxou uma cadeira para o seu lado e sentou-se, imitando-o no gesto de contemplação. Contudo, acabou por suspirar e fitou-o gravemente.


- Eu estou muito preocupada com a Gi, Harry – começou, o seu rosto jovem repleto de uma expressão de rara maturidade. O irmão ofegou e retribuiu o olhar.


- E acha que eu não?


- Eu não quis dizer isso – afirmou ela, afastando os cabelos que caíam de um rabo-de-cavalo – Eu me preocupava com a saúde dela também, mas os médicos já disseram que é uma questão de dias até que ela possa ter alta.


- Então, o que há mais? – perguntou ele, sabendo perfeitamente para onde aquela conversa se dirigia.


- Eu…ela… – respirou fundo – Ela não chorou uma única lágrima, Harry. Desde que acordou naquele dia, ela fala e sorri, e parece quase ela. Mas há uma frieza que vem de dentro dela que não existia antes. Não é normal! – exasperou-se – Ela devia estar gritando de dor e ódio, e não sorrindo e fingindo que nada aconteceu. Ela está em choque…e… – hesitou, mas decidiu ir até ao fim – ela age como se você não existisse.


- Belle…eu sei de tudo isso – Harry colocou a cabeça entre as mãos, tentando conter a dor que vinha sentindo desde o dia trágico – Por isso, fala logo o que você veio aqui realmente dizer.


- Eu perguntei para ela porque está fazendo isso com você – continuou – E ela simplesmente ignorou e falou de qualquer outra coisa.


- Eu também já sei disso…


- ÓPTIMO! – retorquiu ela, quase zangada – Então talvez hoje você possa ir lá e deixar de fingir, tal como ela. Ela precisa de achar um culpado para aliviar a dor. A culpa não é sua Harry! Não deixe que ela faça isso com você! – pediu tristemente.


- O pior…é que é mesmo – murmurou ele e sem dar tempo para que ela respondesse, levantou-se e saiu pela porta de ligação para a rua, caminhando sem rumo sob a chuva que caía. A chuva que se misturava com as suas lágrimas.




Finalmente o dia em que Ginny teria alta chegou. Arthur, Belle e Harry foram buscá-la ao hospital, enquanto Lily ficava em casa para preparar tudo para a receber. A morena entrou para a ir ajudar a se arrumar, enquanto os dois esperavam perto da recepção hospitalar. Alguns minutos depois surgiu Ginny, ainda de rosto profundamente marcado, amparada pela irmã. Os dois homens seguiram-nas até ao carro, onde instalaram confortavelmente a ruiva, com a cabeça apoiada no colo de Belle. Arthur iria guiar, por isso Harry entrou para o lugar do pendura. Olhava de vez em quando para trás, sentindo-se a mais miserável das criaturas no mundo, mas Ginny fez toda a viagem de olhos fechados, embora Harry pudesse jurar que ela não dormia. Lembrava-se das noites que passara acordado, vendo-a dormir, e algo naquela cena era diferente da que observava agora. O rosto dela estava tenso, a respiração rápida e rasa, diferente do sono descansado de outrora.


Quando o carro avançou pelo caminho de sebes, Harry pensou que seria muito difícil para ela continuar a viver ali, perto das memórias cruas e dolorosas de tudo o que vivera. Belle, mais uma vez, auxiliou-a a entrar em casa, mas não teria forças para a ajudar a erguer-se de forma a subir as escadas. Tendo em conta que o quarto que haviam preparado para ela era no andar de cima e que o lanço de escadas era bastante considerável, Harry avançou para a pegar ao colo. Sentiu todo o corpo dela contrair-se, tentando evitar o seu toque, mas o moreno procurou ignorar os gritos da sua própria dor e pegou-a delicadamente nos seus braços. Aquele contacto marcou a fogo o rasto da sua culpa, mas a ruiva desviou a face da sua, ignorando-o. Belle subiu à frente deles e abriu a porta do quarto. Harry colocou Ginny sobre a cama e a irmã fez-lhe sinal para que saísse, ao que ele obedeceu.


Mais tarde, quando o resto da família descansava, Harry respirou fundo e ganhou coragem para a conversa que sabia ser necessária. Subiu lentamente as escadas e colocou-se em frente da porta do quarto, ainda fechada. Levantou a mão para bater, mas acabou por rodar a maçaneta e entrar. Ela estava deitada na cama, mas não dormia. A sua cara marcada pela violência estava voltada para a janela e o seu olhar perdido num local muito para além dali. Entrou dentro do quarto e ela virou a cabeça rapidamente para o ver entrar na divisão.


- Gi…nós precisamos de falar – começou, humedecendo os lábios ressequidos – Eu lamento tanto…quero que você saiba. Eu não consigo me perdoar por ter deixado você, pelas coisas que disse…por não ter te protegido – engoliu em seco ao ver o olhar inexpressivo que ela lhe lançou.


- Saia – ordenou ela, secamente.


- Não – ele avançou, ficando a apenas alguns passos de distância da cama – Nós precisamos ter esta conversa, não posso continuar assim. Preciso que você me perdoe!


- Perdão? – ela repetiu, parecendo não compreender onde ele queria chegar.


- Sim, Gi. Eu preciso que você diga que não me odeia pelo que aconteceu, eu preciso estar perto de você…


- Você precisa? – os olhos castanhos dela reflectiam gelo puro.


- Sim. Eu preciso que você reaja, que diga alguma coisa! – percorreu a distância que o separava dela – Não aguento te ver desse jeito. Você não é assim! Quero que você diga o que sente, o que quer, que me deixe ajudar…quero estar perto de você – a mão dele quase tocou a bochecha magoada dela, antes que ela se afastasse com um salto, como um animal assustado. A sua cabeleira ruiva desalinhada quase lhe ocultava os olhos e, por isso, ela sacudiu-a antes de voltar a fitá-lo frontalmente.


- Desde que eu te conheço, que é sempre sobre você Potter! O que você quer, o que você precisa, o que você deseja. Isso acabou… – o tom definitivo dela fez tremer o garoto, que a olhava assombrado.


- Eu só quero que me perdoe – a voz dele saiu embargada e dolorida.


- Pois desista – os olhos dela ganharam uma vida que ele não voltara a ver desde o dia do ataque – Sabe porquê…? Porque eu odeio você – Harry sentiu como se tivesse levado um estalo e recuou um passo – Odeio…odeio…eu te odeio…EU TE ODEIO! – ela começou a convulsionar, as lágrimas rebentando nos seus olhos, a ruiva invadindo a sua expressão – A CULPA FOI SUA – acusou – TODA SUA! As suas mãos estão tão cheias do meu sangue quanto as dele. Você arruinou a minha vida, só queria nunca ter te conhecido. Eu odeio você – Harry pôde sentir o quão verdadeiras eram aquelas palavras e isso o destroçou por dentro. Olhou para a doce Ginevra, a sua Gi, que recuperara o domínio e já não chorava. Havia apenas raiva e ressentimento, onde antes existira amor e entrega – Sai daqui…SAI!


Harry voltou costas e saiu do quarto, sentindo que perdera algo muito valioso, para sempre. O peso da culpa caiu sobre si com uma intensidade ainda maior e desejou ter estado no lugar dela e não ter sido salvo. Teria dado a sua vida por ela se tivesse estado lá. Mas não estivera.




N/A – Capítulo inteiramente dedicado à Miaka, que fez aniversário. Esse é todinho seu, você que foi a primeira a me apoiar para valer nessa fic. Um beijo assim enorme! :)


E aí está. A fúria da Gi começou agora, mas infelizmente não acaba por aqui. Nós apenas começámos a ter uma vaga ideia das marcas que esse episódio causou no casal maravilha e no próximo capítulo…bom, teremos o casamento de Arthur e Lily e uma decisão. Uma decisão que mudará o rumo da história e nos levará até ao objectivo final: a cura de Ginny, em todos os aspectos possíveis. Eu não vou adiantar mais nada, podem inventar aí umas teorias para que eu ria muito a ler! Ahah Eu estou realmente precisando de umas reviews porque estou bem triste…eu não entrei na faculdade (medicina) e vou ter de ficar um ano melhorando notas. A má notícia que as aulas começam agora e a boa é que provavelmente terei mais tempo para escrever do que se tivesse entrado. Ou seja, eu vou passar a demorar um pouco mais mas não devo levar vocês ao desespero muahah.



Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.