O pior dia das nossas vidas



Capítulo 10 – O pior dia das nossas vidas


Ginny estava deitada debaixo da sua árvore, observando a brisa acariciar as folhas das árvores e lembrando alguns momentos particularmente felizes que já vivera com Harry, naquele mesmo sítio. Contudo, ele estava estranho desde o dia anterior e saíra sem lhe dar nenhuma explicação. Não que ela fosse do tipo controlador, mas a sombra que cobria aqueles olhos espantosamente verdes já lhe era familiar e, em geral, sabia que não indicava boa coisa. Ouviu o som de um motor se aproximando e ergueu-se de um salto, sabendo que era Harry. Lily e Belle haviam saído para fazerem a última prova dos seus vestidos e Arthur tivera que se ausentar para tratar de negócios e, como tal, estariam sozinhos nesse dia, pois os restantes elementos da casa apenas voltariam no dia seguinte. Correu para a estrada de acesso à casa e observou enquanto o moreno saía do carro, mal se contendo para não saltar sobre ele e enchê-lo de beijos. Sempre que ele se afastava sentia como se parte de si também se ausentasse. No fundo, isso era o amor: entregar-se tão completamente a uma pessoa que ela passa a carregar parte de nós consigo, para onde quer que vá.


- Harry! – exclamou, aproximando-se dele e abraçando-o. Ela adorava ficar assim, encostada no peito dele, sentindo o coração amado bater e o calor dos seus braços. Mas, por ser um gesto habitual, apercebeu-se imediatamente de que algo estava errado – O que se passa? – se afastou de forma a poder encará-lo directamente.


- Não foi nada, Gi. – respondeu o moreno, de forma seca.


- Como assim, nada? Essa não é a sua cara de nada, Harry James Potter! – insistiu.


- Já disse que não aconteceu nada! – afirmou, categórico.


- Pensei que já tínhamos ultrapassado a fase de escondermos coisas um do outro…que você confiava em mim – a voz da ruiva era triste e ia dar meia volta quando Harry a interceptou.


- Eu…me desculpa – pediu, baixinho. A garota acenou com a cabeça – Eu encontrei Antonio Firenzzi quando fui à cidade. Ele praticamente riu da minha cara por ter sido inocentado, Gi. Eu não posso sequer colocar em palavras o quão terrível é ter diante de você o assassino do seu pai e não poder fazer nada…por enquanto – acrescentou com um leve sorriso – Penso que encontrei algumas provas sólidas sobre os seus negócios obscuros. Se ele não vai ser condenado por homicídio, será por outros motivos. Eu não vou deixar por aqui, não vou mesmo – o seu olhar era duro e convicto, e nele ardia um fogo que Ginny identificou como desejo de vingança – Eu disse isso a ele, que estou perto de o apanhar.


- Você não devia ter feito isso, pode estar se arriscando – ajuizou a ruiva – Mas foi só isso?


- Como assim só? Acha pouco? – Harry perguntou, tentando sorrir. Mas Ginny conseguia ver que a sombra continuava lá e que o moreno não tinha contado tudo. Fez uma cara de ponto de interrogação e ele suspirou – Pronto. Ele já sabe que você está aqui comigo, não faço ideia como, e disse coisas muito pouco simpáticas sobre você…


- Acreditou no que ele disse, foi? – questionou a ruiva, cerrando os olhos.


- Não, mas fiquei furioso por ele se atrever a tocar no seu nome – murmurou ele, acariciando a face dela – Ele fez uma série de acusações e ameaças, mas nada de importante. Tenho certeza! – disse, vendo a expressão de dúvida de Ginny.


- Ok, então está tudo bem – suspirou. Pegou-lhe na mão e entraram para o fresco interior da casa. Foram até à cozinha, onde Ginny preparou um lanche para os dois.


- Eu combinei me encontrar com dois amigos de infância daqui a pouco. Você quer vir? – convidou, passados uns instantes. Ginny ponderou por breves momentos, não muito certa da sua vontade de o acompanhar, mas ele pegou na sua mão e a beijou com tanto carinho que ela não conseguiu dizer não.


- Vou sim, vou só trocar de roupa. Espera um momento – deu um beijo estalado nos lábios de Harry e correu até ao quarto, onde colocou um vestido azul de linho, leve e fresco. Desceu novamente e se reuniu a Harry, que a esperava perto do carro.




- Gi, posso te apresentar? Esse aqui é o Seamus Finnigan – Harry apontou para um homem com o cabelo de uma tonalidade semelhante à da areia, que acenou com a mão. Ginny retribuiu com um sorriso agradável – E esse é Neville Longbottom – a garota apertou a mão de um homem mais baixo, de cara redonda e amável. Tinham deixado a mansão Potter e ido até à cidade mais próxima, onde entraram num restaurante para encontrarem os amigos de Harry.


A conversa transcorreu de forma simpática e serena, enquanto os três homens recordavam episódios da sua infância. Ginny ouvia atentamente, disposta a apreender tudo o que a fizesse conhecer melhor Harry. Ele parecia estar feliz naquele momento, relembrando as brincadeiras e travessuras, mas a ruiva saberia dizer, sem sequer hesitar, que ele sofrera profundamente durante grande parte da sua vida. E o motivo, ela apostaria, tinha sido a morte prematura do seu pai e a vida atribulada da sua mãe. Olhando com atenção para os traços faciais daquele rosto que ela já conseguia definir de olhos fechados, ela decidiu que ele se tornara adulto muito cedo, perdera a sua inocência ainda antes de compreender realmente o mundo. Esse pensamento a entristecia mas também a fazia amar e respeitar ainda mais aquele ser maravilhoso e complexo que tinha diante de si.


- …e então, o Harry aqui diz: “Devolvo seu livro se você aceitar sair comigo!”. E não é que ela aceitou mesmo? Se bem me lembro uma série de coisas aconteceu no seu carro naquele dia…e não só nesse dia, obviamente – Seamus contou, rindo maliciosamente entredentes.


- Ah, ele não era tão dado assim – defendeu Neville – Ele apenas gostava demasiado de garotas para a sua própria segurança – acabou por dizer, fazendo Harry abanar a cabeça e rir baixinho.


- Você devia ter cuidado com ele, sabe Gi? – a garota levantou uma sobrancelha em sinal de interrogação, enquanto brincava com uma longa madeixa vermelha – Ele não é confiável quando o assunto é mulheres. Mas devo dizer que ele tem realmente bom gosto, sempre… – Seamus mencionou, olhando de lado para ela. Ginny se sentiu desconfortável e percebeu que eles já deviam ter bebido um pouco demais – Você me agrada particularmente. Bem perfeitinha, hein? – sussurrou de forma a que só ela ouvisse. Ela tentou fazer um sorriso amarelo, mas realmente não estava gostando nada naquela intimidade forçada – Sem dúvida, eu escolheria você para dar uns amassos, entre todas as garotas que ele tem tido de há um tempo para cá – ele continuou. Ginny apertou os lábios e tentou ignorar, mas Harry e Neville estavam embrenhados numa conversa animada sobre futebol e não pareciam estar minimamente cientes da situação – Ele te satisfaz? – questionou Seamus, de rompante. Aproximou-se mais dela e murmurou quase ao seu ouvido, enojando-a profundamente – Eu posso tratar disso… – e, aproveitando o facto de estarem sentados ao lado um do outro, colocou a mão na perna dela, por cima do vestido. A ruiva respirou fundo, tentando impedir uma explosão e um escândalo que deixaria mal o moreno e, por isso, agarrou no pulso dele e o retirou categoricamente de perto de si.


- Olha, eu não te conheço – disse, tentando falar baixo também – Mas se você quer continuar com a possibilidade de satisfazer alguém, não acho boa ideia dizer essas coisas perto dele – apontou para Harry, que ria de uma piada que Neville lhe dissera – E nem longe, porque aí teria de ser eu a tratar do assunto…e não garanto que você saísse melhor – tentou encerrar por ali.


- Você é brava…eu gosto assim – soprou ele, lambendo os lábios de forma lasciva, que fez com que o estômago da ruiva desse uma volta de cento e oitenta graus – O Harry nunca se importou com as outras namoradinhas dele, não vejo porque seria diferente com você.


- Ele me ama! – rosnou ela.


- Ama, é? Eu também diria que te amo só para dormir com você, gostosinha – ele voltou a aproximar-se e colocou a mão na perna dela, por baixo da saia do vestido, subindo até à coxa. A ruiva levantou imediatamente e disse em voz bem alta:


- Nunca mais se atreva a me tocar, seu porco – Harry finalmente apercebera-se que algo de errado estava acontecendo e levantou, indo até ela.


- O que se passa, Gi? – questionou, olhando dela para Seamus.


- Nada, não. Eu não estou me sentindo bem, podemos voltar para casa? – pediu, com urgência na voz. Harry franziu o cenho.


- Você disse para ele não voltar a te tocar, porque não está se sentindo bem? – perguntou, ironicamente – O que é que ele te fez? – insistiu perigosamente. Ginny observou com apreensão enquanto os olhos dele escureciam para um verde seco e repleto de electricidade.


- Foi um mal entendido, Harry…vamos, por favor – implorou, puxando a mão dele. Harry soltou-se delicadamente e foi até Seamus. Sem dizer uma palavra ergueu o punho e socou-o com toda a força na boca. O outro reagiu, alterado pela bebida, saltando sobre o moreno e devolvendo a porrada. Os donos do restaurante oscilavam entre o susto e a alegria de uma luta, rondando o local não muito preocupados, uma vez que eles eram os únicos clientes. Engalfinharam-se como dois cães de rua, socando-se e pontapeando, rebolando pelo chão e derrubando cadeiras e mesas. Contudo, Harry estava mais sóbrio e conseguiu levar a melhor, deixando o outro no chão enquanto lhe pontapeava as costelas.


- Não, Harry! Pára! PÁRA! – gritou Ginny, colocando-se entre ele e Seamus. Espalmou as mãos no peito do moreno, tentando contê-lo e acalmá-lo.


- Porra, Harry! Eu não acredito que você me tenha feito isso por causa dessa aí… - berrou Seamus, enquanto se levantava auxiliado por um apreensivo Neville. Cuspiu um pouco de sangue, aparentemente de um dente – Toda a gente sabe que ela não presta! O Firenzzi parece ter-se divertido muito com ela! Será que você vai bater em todo o mundo que queira provar o que outros já tiveram? – provocou triunfante. Harry ia avançar novamente sobre ele, mas Ginny impediu-o.


- Não faz isso, Harry, ele não merece! – advertiu – Vamos, agora! – arrastou-o para fora do estabelecimento e Harry deixou-se ir, parando apenas para enfiar umas largas notas na mão de um dos donos, que sorriu aliviado. Quando chegaram ao carro, Ginny deitou um breve olhar ao moreno e viu que ele estava bem machucado também, cambaleando um pouco agarrado à omoplata. Abriu a porta e ajudou-o a sentar, dirigindo-se depois ao lugar do condutor. Não conduzia desde que tirara a licença, mas esperava ainda ser capaz, até porque Harry não estava em condições de guiar para lugar algum. Arrancaram e a viagem decorreu num silêncio quase palpável, interrompido apenas por indicações breves e ásperas dele sobre o caminho a seguir. Deixou o carro no sítio de sempre, no caminho da casa, e saiu, seguida por Harry que parecia estar a recuperar. A noite chegava e o jardim era todo sombras. Um vento cortante e frio levantara-se. Ginny encarou Harry e viu, de imediato, que ele tinha algo a dizer.


- Fala de uma vez – disse.


- Eu só queria entender – assegurou ele, a expressão sombria e o maxilar cerrado – Seamus nunca fez nada assim, gostava de saber o que você fez ou disse para ele.


- Como assim? – ela não estava entendendo, ou pelo menos, não queria entender aonde ele estava querendo chegar.


- Você…o provocou? – a voz dele era baixa e rouca.


- QUÊ?! – não podia ter ouvido bem, ele não estava perguntando se ela tinha provocado o amigo dele e depois recuado.


- É incrível, sabe. Desde que te conheço que só faço dar porrada ou defender a sua honra. Os homens perdem a cabeça perto de você, começo a achar que você deve fazer algo para que isso aconteça…


- Como pode dizer uma coisa dessas…? – questionou, incrédula e magoada – Ele me apalpa e diz coisas horríveis e a culpa é minha? – a ruiva desejou que ele estivesse mais bêbado, pois talvez fosse mais fácil escutar aquelas palavras.


- Pode não ser consciente, mas algo em você… - prosseguiu ele, desviando os olhos dela – Algo em você chama pelos homens, ele nunca tinha feito nada assim.


- Isso não tem só a ver com o Seamus, pois não? – apercebeu-se ela, jogando o cabelo para trás das costas - Também tem a ver com o Firenzzi. Você vai acreditar mais no assassino do seu pai do que em mim? – a sua voz saiu fria e vazia, reflectindo na perfeição o que ela estava sentindo.


- Eu não quero tocar mais nesse assunto – ele voltou costas e entrou em casa, mas ela seguiu-o de perto.


- As suas inseguranças em relação a mim vão acabar com o nosso amor, Harry. Diz de uma vez, você acha que eu sou uma devoradora de homens? Seduz, leva à loucura, e abandona?


- Eu não acho nada – suspirou ele e entrou no quarto de banho, batendo a porta. Ela arquejou e lançou-se sobre a cama, ansiando simultaneamente não deixar a conversa por ali e esquecer todo aquele dia. Fechou os olhos e enrolou-se, abraçando os joelhos. Ouvia o som do chuveiro, a água caindo sobre o corpo de um Harry cheio de nódoas negras e furioso consigo próprio, o vento vergastando os ramos das árvores, o tiquetaque de um relógio de pêndulo no corredor. E então, quando o sono estava quase tomando conta de si, sentiu uma onda gelada no peito e um aperto no peito, quase a sufocando. Levou a mão até lá e abriu os olhos, vendo tudo enevoado. Quando começava a temer pelo que estaria lhe acontecendo, Harry abriu a porta de comunicação e regressou ao quarto, indo até ao armário e pegando uma camisa, calças e um casaco. Pensou se estaria ficando louca, porque toda a sensação desaparecera de repente.


- Onde você vai? – questionou, tentando não dar nenhuma conotação específica à voz.


- Sair – retorquiu ele, rápido e seco.


- Vai ficar assim durante muito tempo? – suspirou ela, esticando-se como uma gata sobre a cama.


- Assim como? – ele parou e olhou-a.


- Amuado, zangado, inseguro…jogando em cima de mim seus traumas e frustrações – respondeu a ruiva, erguendo-se da cama.


- Talvez. Não sei a que horas volto – terminou de se vestir e avançou para a porta, mas Ginny empurrou-o contra a parede e prendeu-o.


- Por favor, fica. Eu estou com um pressentimento muito mau, ficaria melhor se você estivesse do meu lado – pediu ao ouvido dele, encostando depois a testa no seu tórax.


- Se eu ficar, vamos acabar discutindo, direi coisas das quais me arrependerei mais tarde e que nem sinto – afirmou, levando a cabeça para trás, contra a parede – Preciso de ficar longe de você hoje.


- Mas eu preciso de você, eu senti um aperto…há algo de errado – insistiu, procurando os olhos verdes dele.


- Não, Gi. Você está sendo ridícula com essa história, eu sei que quer fazer as pazes. Mas hoje não, eu não me sinto realmente em paz – pousou as mãos grandes sobre os ombros dela e afastou-a do seu corpo – Eu vou em casa do Seamus, falar com ele e pedir desculpas.


- DESCULPAS?! – Ginny sentiu-se à beira do colapso – Esse filho da mãe causa tudo isso e você vai pedir perdão? – deu um passo atrás, procurando o verdadeiro Harry, o seu Harry.


- Sim, Ginny. Pela sova, ele deve ter quebrado uma série de costelas. Não pelos motivos – agarrou a maçaneta de costas para ela – Ele é meu amigo desde que me conheço. Não posso deixar tudo assim.


- Eu não sei por você – afirmou ela, a voz suave mas cheia de mágoa – Mas quando alguém ofende uma pessoa que eu amo, me ofende a mim. E, como tal, não é minha amiga – voltou costas à imagem dele e se jogou de volta na cama, escutando a porta bater quando ele saiu.




Acordou com o corpo gelado, coberto de um suor frio. Sentia-se como se tivesse mergulhado no mais puro gelo e estivesse sucumbindo às águas, se afogando cada vez mais…Olhou para o lado e viu o travesseiro de Harry vazio, sinal de que ele ainda não voltara. Levantou-se da cama e foi até ao lavatório, passando a cara com água quente e aproveitando para mudar de camisa de noite, uma vez que a que usava estava encharcada. Quando afastou as cobertas para voltar a deitar-se, ouviu um som lá em baixo. “Deve ser o Harry”, pensou imediatamente. Resolveu descer para se juntar a ele e fazerem as pazes, aquela situação estava ridícula demais. Mas dessa vez ele teria que rastejar, ah se teria. Não ia deixar barato aquele ataque de ciúmes, mas também queria compreender as inseguranças dele. Harry era um homem atormentado pelo passado, pela história da sua família e a sua própria, pouco consciente dos meandros do amor verdadeiro e estável, e ou a deixava se aproximar para o ajudar ou teriam sérios problemas. Avançou pelo corredor até ao cimo das escadas


- Harry? – a sua voz saiu apenas como um murmúrio, pelo que tossiu para aclarar a garganta e chamou mais alto – Harry?


Mas ninguém respondeu e ela ouviu um estalido do lado da cozinha. “Será que o Padfoot acordou e anda fazendo estragos?”, ponderou franzindo o sobrolho. Colocou uma madeixa atrás da orelha e desceu as escadas. Os seus passos eram delicados e silenciosos, estava descalça e era bem leve. Sorriu, pensando que devia ver menos filmes de terror porque estava realmente se sentindo um pouco sugestionada, com a casa na obscuridade e sons estranhos ecoando na cozinha. Abriu a porta da cozinha e o que viu fez o seu sangue congelar nas veias. A porta que dava para o terraço tinha o vidro partido e estava completamente aberta, sinal claro de arrombamento. Recuou um passo, lívida e tremendo, e o seu olhar deparou-se com uma visão horrível. Arregalou os olhos. Padfoot estava ali, deitado no chão da cozinha. O seu pêlo estava molhado com uma substância viscosa e escura e Ginny não precisou de muito tempo para saber que era sangue. Aproximou-se lentamente e se baixou, tocando com a mão no grande dorso do animal, sabendo mesmo antes de sentir que este não respirava.


- Não…! – as lágrimas assomaram aos seus olhos e começaram a cair numa cascata silenciosa. Ficou ali, ajoelhada ao seu lado, acariciando o corpo outrora cheio de vida, inundada por um horror maior do que jamais sentira, sem mesmo se aperceber do perigo que corria. Alguém estava ali e não viera pelo bem.



Ouviu um rangido e antes de ter tempo de reagir foi agarrada pelas costas por uma mãos fortes e nojentas, com as unhas grandes e amareladas. Debateu-se, tentando escapar ao controlo daquelas manápulas, mas o homem empurrou-a contra a bancada da cozinha e ela caiu no chão, impotente. A sua cabeça bateu com violência no soalho duro e no último instante de consciência, forçou-se a voltar a cabeça e viu o seu atacante.


Era Antonio Firenzzi.




Abriu os olhos lentamente, sentindo-se despertar. Estava sentada numa cadeira, as mãos presas por uma corda atrás das costas e Firenzzi estava bem à sua frente, olhando para ela com a expressão de maior prazer sádico que vira na sua vida. Aparentemente estava à espera que ela acordasse, porque avançou para ela com um punhal prateado em punho. A ponta era fina e aguçada, quase um espeto, e Ginny não conseguia deixar de pensar na dor terrível que deveria ser ver-se perfurada por aquela lâmina. Ele aproximou-se o suficiente para que a lâmina deslizasse pela sua cara, sentindo a pele em contacto com o frio do metal. Encolheu-se levemente, mas logo o encarou, tentando não demonstrar medo.


- Isso é uma visita social agradável ou existe algum motivo para que você esteja aqui, depois de ter arrombado a porta e morto um animal? – a voz tremeu à menção de Padfoot, mas tentou não pensar nisso e apenas se concentrar em encarar o que lhe estava acontecendo. Ele riu selvaticamente, mostrando alguns dentes podres e os olhos lunáticos nas órbitas dilatadas.


- Ouvi dizer que você estava com o Potter e resolvi vir dar um olá, já que tinha um assunto pendente com ele mesmo – a voz era arrastada e baixa e a proximidade lhe trazia o hálito dele, por sinal extremamente desagradável e acre.


- Os seus informadores deviam trabalhar melhor, sabe? Ele não está em casa. Porque é que não volta num outro dia? – perguntou, quase delicadamente, como se estivessem a falar sobre uma reunião de vizinhos. Estava tentando demonstrar uma coragem que não estava certa de sentir, mas não lhe daria o prazer de a ver aterrorizada.


- Ah, eu sei… – um murmúrio perigoso – Mas o assunto que tenho com o Potter pode ser resolvido com você mesmo.


- Não me diga – respondeu ela, secamente. Ele chegou mais perto dela, e os dedos compridos e cadavéricos fizeram uma carícia na sua face que a fez desejar arrancar aquele pedaço de pele. A mão dele deslocou-se até uma madeixa do longo cabelo ruivo e cacheado dela, e ele a agarrou, inspirando o perfume.


- Eu desejei você desde que apareceu na minha casa. Mas você foi embora – fez uma careta quase tristonha – E eu não pude fazer nada, ele te levou de mim à traição – O punhal passeava agora pelos cabelos dela até à madeixa que segurava, e cortou-a de um golpe, quase experimentando a perfeição da lâmina. A ruiva soltou um grito abafado – O Potter é muito intrometido, tal como o pai dele era. – prosseguiu, fazendo a arma dançar agora pela pele do braço da garota – Eu já tentei dar um jeito nele, mas ele sempre escapa. É bem esquivo, o seu amiguinho<7i>. E então eu pensei: “Se eu não posso atingir o Potter, talvez deva atingir algo que ele ame mais do que a si próprio. A mãe ou a irmã”. A irmã dele, Belle, é bem bonitinha também… – lambeu os lábios e Ginny ofegou horrorizada – Mas ele protege-as o tempo inteiro e quando não é ele, ou alguém a seu mando, é o Weasley. Esse é outro… – o punhal saiu da sua pele e ele brincou com ele, girando-o entre as mãos. Ginny pôde ver, à meia-luz que se escoava pela porta, que estava manchado de sangue. O sangue de Padfoot – Também será um recadinho para ele, sempre metendo o bedelho nos meus negócios. E aí eu pensei…pensei…pensei…e descobri. Foi só perguntar para umas duas ou três pessoas, todo o mundo já sabe, ele não faz questão de esconder. Ele ama você. Eu nunca diria que ele tinha essa capacidade, tsc tsc – andou de um lado para o outro em frente de Ginny – Então, hoje eu soube da briga dele com o Finnigan e o vi na cidade, entrando na casa dele mais tarde. Logo, eu soube que você estaria aqui, sozinha e desprotegida, todinha para mim.


“Faça com que alguém chegue, por favor” – implorou Ginny aos céus, sabendo que o discurso dele estava chegando ao fim – “Harry, eu preciso de você” – chamou silenciosamente.


- E agora, finalmente, eu tenho você onde eu sempre quis. E esse será o meu recadinho para o Potter. Um recadinho que ele nunca esquecerá, você se encarregará disso – e debruçou-se sobre ela, arrastando-a pelos cabelos para o chão e ao longo do corredor ate à sala. Atirou-a como uma boneca de trapos para um tapete. Ginny lutava desesperadamente contra a corda que lhe prendia os pulsos, tentando ao máximo ignorar a dor na sua cabeça causada pelo puxão da sua cabeleira. Firenzzi parecia algo perdido no seu contentamento e isso deu a Ginny a hipótese de se atirar sobre a aresta da mesa de costas e cortar as cordas. Ergueu-se de um salto e correu, mas sentiu as suas pernas serem agarradas e um forte puxão que a fez tropeçar. Caiu desamparada no chão, voltada de barriga para baixo, com o homem em cima de ti. Lutou para se voltar, acabando por ter sucesso, e socou-o na cara com toda a sua força, evitando que ele se colocasse perfeitamente sobre si, altura em que sabia estar condenada. Os seus braços dardejavam, arranhando, socando, perfurando a pele do homem, enquanto as suas pernas davam esticões e pontapés como uma gata selvagem. Contudo, o homem parecia ter recuperado o punhal que lhe caíra da mão na atrapalhação da queda e encostou-o ao pescoço alvo da garota. Ela parou de se debater, fitando a lâmina fria em contacto com a sua pele, e o olhar selvagem e retorcido do seu agressor.


- Agora, fica quietinha…você vai gostar, vai ver – murmurou ele, perto da sua orelha, mordendo-a com força e fazendo-a gritar de dor e desespero – Quero ouvir os seus gritos, eles só me dão mais força, mais prazer.



Com a mão do punhal permanecendo encostada ao seu pescoço, ele rasgou com um puxão a camisa de noite dela sobre os seus seios e as lágrimas começaram a jorrar dos seus olhos. Disposta a morrer, mas não a ceder àquele homem perverso, voltou a debater-se selvaticamente, apelando às forças e à coragem escondidas em si. Antonio aplicou todo o seu peso sobre ela, imobilizando-lhe o corpo, enquanto a mão livre prendia os pulsos de Ginny. Sentiu o punhal deslizar sobre a pele nua do seu peito, sobre os seus seios, antes de ele largar o punhal e se dedicar a acariciar. Carícias não seria o nome mais apropriado, uma vez que ele apertava com toda a força, batia e beliscava a sua pele imaculada. Com as unhas imundas arranhou-lhe o peito de uma ponta à outra, ardendo com aquela agressão cruel. Mergulhou a sua boca sobre a camisola aberta dela e mordeu ferozmente um dos seus mamilos, causando uma dor excruciante que ela verbalizou num grito agudo e em mais uma tentativa de se soltar. Quando a carantonha dele ficou ao nível da sua e os lábios dele esmagaram os seus, ela deixou que as lágrimas corressem livremente, enquanto a sua boca era invadida sem piedade por aquele homem odioso.


“Harry, porque você me deixou?”


Conseguindo libertar uma das mãos do aperto dele, socou-lhe os rins mas ele levantou a mão para tomar balanço e lhe deu uma bofetada na cara que a deixou sem conseguir respirar durante tempo suficiente para que voltasse a dominá-la.


“Preciso tanto de você…”


Sentia os pulsos latejarem com a força que ele fazia neles e foi com verdadeiro horror que observou enquanto ele buscava o punhal para lhe rasgar o resto da roupa de noite. Ela prendeu a respiração e o atacou enquanto ele estava distraído admirando as suas formas, sentindo as forças minguarem a cada instante, e ele esbofeteou-a e desferiu murros no seu estômago e peito até que ela estivesse próxima da inconsciência. Desejou que ela chegasse, que essa graça lhe fosse concedida, a ausência de compreensão daquilo que ele estava prestes a fazer. Mas ele parou, parecendo ter-se dado conta disso mesmo. Ginny soube que ele a desejava acordada e ciente e uma única lágrima caiu-lhe dos olhos.


“Eu sou de Harry, sempre serei”


Ele desapertou as calças e baixou-as e Ginny soube que o momento estava próximo, que nada aconteceria para o impedir, que Harry não viria.


“Você não veio…Porquê?...Eu sou sua, não quero ser de mais ninguém…”


Ele arremeteu contra ela, penetrando-a com uma brutalidade imensa. Ginny sentiu a sua carne rasgar e ceder, enquanto ele a invadia sem piedade, a boca arreganhada num sorriso enquanto ela gritava e se debatia, lutando para que ele não prosseguisse.


“Você me abandonou…”


Ele bombeava para dentro dela, com uma força animalesca e Ginny gritava e implorava, mas nada o detia. A boca asquerosa dele percorria o seu corpo, passava aquela língua obscena pelos mesmos sítios onde Harry a beijara com carinho e cuidado, despertando nela o maior prazer e amor.


“Harry…”


Firenzzi era dor e horror onde Harry era carinho e compreensão. Buscou na sua memória as noites em que ele a teve nos seus braços e a fez sua, tratando-a como uma flor delicada, regando-a de cuidado e dedicação. “Eu amo você”, ouvia a voz dele dizer. Mas nada a distanciava daquele suplício, do terror que se apoderava dela e a devorava viva.


- Assim…isso…grita…o Potter também faz você gritar? – urrou ele.


“Eu te amo…Harry…”


Quando Firenzzi chegou ao fim, derramando ódio amargo entre as suas pernas, ela pensou que terminara e que ele iria embora, que a deixaria ali, perdida nas memórias de como era ser amada por alguém de verdade, perdida no seu desespero. Ele levantou de cima dela e Ginny tentou mover-se, mas o seu corpo não obedecia. Ele fechou as calças e apanhou o punhal do lado dela.


- Já sei porque o Potter quis comer você, realmente vale a pena. Eu pensei até em te deixar assim e voltar cá um outro dia, para fazer você gritar um pouco mais. Mas mudei de ideia… – um sorriso grotesco e hediondo invadiu-lhe os lábios.


Acercou-se dela e, na sua semi-inconsciência, Ginny sentiu o gelo aguçado do punhal penetrar na sua barriga. Viu pelos olhos quase fechados quando ele voltou costas e saiu. Fechou os olhos e orou para que o esquecimento chegasse, para que a morte a levasse para onde ele não pudesse alcançá-la. Para onde ninguém a pudesse seguir.


“Harry…”, murmurou. E o mundo escureceu.




N/A – (Esconde debaixo de uma pedra e se recusa a sair) Eu sei. Foi mau. Aliás foi horrível. Eu sou uma pessoa malvada e sem coração. Pelo menos nesse capítulo fui. Mas essas coisas acontecem de verdade e para mim só faz sentido escrever coisas que tenham a ver com a vida real. Para que exista felicidade tem que existir sofrimento, mais sofrimento do que o simples “Gosto de você, mas não sei se você gosta de mim”. Não que não seja mau, apenas existem sofrimentos maiores. O que será que vai acontecer com a Gi? E com o Harry quando descobrir? E com o super-hiper-mega-malvado Antonio Firenzzi?
Peço (ok, imploro) para que não deixem de ler a minha fic. A partir de agora as coisas vão entrar numa nova fase, que não será tão triste assim. Novas personagens (sendo que as que já existem continuam), novas surpresas, novos mistérios, novos locais…e um final feliz prometido. Bom, me digam o que acharam do capítulo. Com toda a sinceridade :)



Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.