O Lobo desmascarado
Do meio de setembro até o começo de outubro, nada de muito especial aconteceu, exceto pelas aulas de Defesa Contra as Artes das Trevas, que estavam a cada dia mais excitantes.
O professor havia se decidido, por fim, por não entrar na caverna sob a árvore novamente, não com a turma, desde que Harry lhe explicara que esta pertencera à Voldemort. Mas ele começara o assunto de Legilimência e Oclumência, que Harry já possuía alguma experiência.
Agora, na verdade, três coisas ocupavam completamente o espaço da cabeça de Harry: tentar falar com o professor Smith sobre sua herança, conseguir a lembrança de Malfoy, e, é claro, reatar com Gina.
Ele já se pegara zilhões de vezes pensando nos beijos da namorada, lembrando-se do seu namoro...
Mas Gina estava completamente convicta de sua razão. Não olharia para Harry nem mesmo se o garoto se atirasse da torre de Astronomia gritando seu nome.
Já Malfoy, ele parara de insultar, na tentativa de amaciar o inimigo, e também por que realmente já estava enjoado de tirar onda com a cara dele.
- Muito bem, Harry, isso mostra que você está muito maduro! – aprovou Mione, escapando de um beijo que Rony tentara de supetão.
- Ah, Mione, não me faça sentir mal – respondeu Harry, rindo-se.
Hermione riu também, voltando sal atenção para seu livro, Numerologia e Simbolismos desvendados.
Eles estavam sentados sob a faia na beira do lago, local onde eles sempre tinham o costume de passar algum tempo. Harry observou, desejoso, Gina passar com o nariz empinado, e suas amigas, entre elas Luna Lovegood, passando por ele.
Quando virou-se para encarar os amigos novamente, viu os dois olhando pra ele, com uma expressão entre piedosa e animadora.
- Que foi? – perguntou ele, cauteloso.
- Fala com ela, Harry – sugeriu Hermione, cansada, pela terceira vez naquela semana. – ela pode ter alguma coisa pra te contar...
- Não – respondeu ele, firme. Estava decidido a fazer com que Gina viesse pedir perdão.
E não cederia à nenhuma ajuda sentimental de Hermione Granger.
- Harry? – perguntou uma voz, nas suas costas.
- Ah, oi, Colin – cumprimentou ele, com cautela, olhando para o rosto ansioso do colega sextanista.
- O professor Fullham mandou entregar isso para você... – ele entregou um pedaço de pergaminho enrolado, na mão de Harry. Hermione olhou nervosa, de Colin para Harry, por algum motivo.
- Ah, valeu, Colin – agradeceu o garoto. Colin saiu, nervoso, e foi se reunir ao seu irmão, Denis, que lhe fez um gesto excitado, e os dois saíram olhando amedrontados para Harry.
- Hum, Harry? – chamou Rony, hesitante, trocando um olhar inseguro com Mione, que confirmou, igualmente nervosa.
- Hum... – repetiu Rony, se aprumando. – a coisa é que... Bem, a coisa é... É a coisa que...
- O que é a coisa? – perguntou Harry, impaciente, começando a achar engraçado.
- É sobre a Gina, ela, bem, ela, está, bem, ela, a Gina, sabe, ela, sabe?...
- Fala logo, cara! – apressou Harry. – temos uma aula de feitiços em três minutos!
- A Gina está saindo com Colin Creevey – completou Hermione, respirando profundamente.
Houve um silêncio quase audível. Harry teve noção de que os dois amigos o encaravam ansiosos, e falavam coisas indistintas, que soavam como pedido de desculpas, ou palavras de consolo.
- Hum – falou Harry, encarando as próprias mãos. – é... Isso é... É verdade?
- É, ah Harry, sentimos muito, de verdade, mas ela começou a sair com ele à três dias, ele já era afim dela desde o ano passado, mas ela disse que ele nunca tinha criado coragem...
- EU – NÃO – QUERO – SABER! – berrou Harry, atraindo a atenção do pátio inteiro.
Sem ter noção do que fazia, ele puxou a varinha, se levantou e saiu pisando forte, deixando seu material no gramado, junto aos pasmos Rony e Hermione.
Harry passou pelo saguão de entrada e localizou as costas dos irmãos Creevey no meio da escadaria de mármore. Ouviu o chamado dos amigos ás suas costas, ambos aterrorizados, gritando à plenos pulmões.
- HARRY, PARE! NÃO FAÇA NADA ESTAMOS INDO PARA AÍ!
Mas Harry ignorou. Subiu as escadas, olhando para as costas de Colin, e na mesma hora em que o menino se virou para ver a fonte da gritaria, junto ao irmão, Harry berrou:
- CREEVEY! – Colin pulou bem uns trinta centímetros no ar. Virou-se para encarar Harry, esvaziando como um balão. Olhou por cima do ombro, para Denis, e depois voltou a encarar Harry.
- Então – Harry começou, apreciando a expressão mortificada de Colin Creevey -você... Está saindo com a... Com a Gina, não é mesmo?
O garoto murmurava aterrorizado, os olhos abertos e o rosto branco de susto. Parecia estar tentando explicar alguma coisa, mas não conseguia tirar os olhos da varinha de Harry, apontada para seu rosto.
Agora todo o saguão observava, tenso, mas Harry não sentia a menor vergonha.
- Então? – repetiu agora decididamente furioso.
Diante do rosto assustado de Colin, ele perdeu a cabeça, queria acabar com aquele pirralho, sempre no seu pé, agora tinha lhe traído na maior cara de pau...
- FALA ALGUMA COISA, SEU... – Colin tomou uma atitude. Saiu correndo escadaria acima, tropeçando nas próprias vestes, esbarrando nos alunos, que apontavam e riam, debochados.
- Volte aqui, seu covarde, seu pequeno inseto, sujo, traidor...
Harry corria atrás dele, quando eles atingiram o patamar e desabalaram pelo corredor do primeiro andar, empurrando todos em seu caminho a varinha ainda firme na mão, sua expressão de raiva quase letal, Harry berrou:
- VOLTE AQUI, EU FALEI – Harry parou, fez pontaria e ordenou: Mobilicorpus!
Na mesma hora em que o sinal batia para avisar do começo da próxima aula, Colin foi arrebatado enquanto corria, paralisado, e no segundo seguinte ele estava pendurado no ar, de cabeça pra baixo, como se estivesse preso pelos tornozelos num gancho, balançando os braços, berrando por ajuda...
- AGORA VOCÊ QUER AJUDA, SEU TRAIDORZINHO!... – berrou Harry com repulsa, erguendo a varinha; mas uma mão segurou seu braço, que agia como que por vontade própria. Harry se debateu por um instante, e então caiu no chão, sentindo alguém pressiona-lo com toda a força.
- Calma aí, cara – falou a voz de Rony, tensa, próxima ao seu ouvido.
- Eu não preciso me acalmar, estou perfeitamente calmo! Se preocupe com esse pequeno traidor, nojento...
- HARRY! – exclamou uma voz fina e chocada no patamar da escadaria de mármore.
Harry ergueu a cabeça e viu Gina parada, abismada, seu rosto branco encarando a cena: Colin pendurado no ar de cabeça pra baixo, Rony tentando conter a mão de Harry, e o próprio Harry se debatendo, branco e furioso.
A garota se deteve por um instante, ainda chocada, mas então pareceu recobrar o movimento, e uma expressão de pura raiva lhe cobriu os olhos amendoados, como se pegassem fogo.
Ela caminhou até Harry, que se desvencilhou de Rony e ficou de pé, para encarar a garota, tentando manter uma pose de superioridade e indiferença.
PÁ!
Harry viu estrelinhas. Quando reabriu os olhos, todos no corredor estavam de olhos arregalados, murmurando agitados, incluindo, pelo que Harry podia ver, o professor Slughorn, Argo Filch, e a Madame Pince, a bibliotecária.
Gina ainda estava com o braço no ar, pronta para desferir outra pancada, e foi a vez de Hermione segurar o braço da garota.
Tinha uma grande clareira em volta do flutuante Colin, e os quatro no meio. Todos pareciam querer distância.
- Como você ousa, Harry, atacar o Colin desse jeito – começou Gina, tremendo de fúria. – Você não...
- COMO VOCÊ OUSA SAIR COM OUTRO CARA SÓ POR QUE NÓS BRIGAMOS E...
- Não me diga o que eu devo fazer, Harry! Eu nem estava saindo com ele, estava só pedindo para ele ficar comigo, sem beijos, sem nada; pra te fazer ciúmes, ele aceitou por que tem uma enorme queda por mim...
- VOCÊ É QUE... – Harry parou, desconcertado - O que? – sentiu seu rosto corar e Rony relaxou o aperto em seu braço. Mione soltou o braço de Gina, hesitante, e ela e Rony se afastaram.
Colin despencou às suas costas, e Rony amorteceu a queda com um movimento da varinha.
Harry olhava fixamente para Gina, que retribuía indignada.
- Vou-me embora, Harry, antes que você...
O garoto agarrou-a pela cintura e deu o maior beijo que imaginava possível. Gina estava completamente dura, mas segundos depois passou o braço pelos ombros de Harry, os dois ficaram naquele beijo por um segundo que pareceu uma eternidade, todos no corredor dando viva, uma ovação tremenda...
- Senhor Potter e Senhorita Weasley como vocês se atrevem! – madame Pince chiava descontrolada, agitando os braços indignada, saliva voando da sua boca escandalizadamente escancarada.
Mas Harry sinalizou com a mão direita para a mulher ficar quieta, os olhos fechados, e o beijo continuou, enquanto a multidão aplaudia...
- Nós vamos ficar muito enrascados – murmurou Gina, rindo, sem desgrudar os lábios dos de Harry, mas o garoto simplesmente puxou as pernas da namorada para cima com o braço, ela berrou e os dois saíram dando gargalhadas pela escada de mármore, que Harry desceu aos pulos, até os jardins ensolarados.
Ele chegou até atrás da faia onde seu material estava ainda junto com o de Rony e Hermione, e deitou na grama ao lado de Gina, sorrindo feliz, apertando-a contra o peito, lágrimas de felicidade escorrendo dos olhos dela para seu ombro...
Harry sentiu algo apertado na mão esquerda. O pedaço de pergaminho de Fullham.
Só dizia:
“Conversaremos na aula de quarta-feira, Sr. Potter.”
Harry olhou pra carta meio intrigado, mas sem realmente se importar. De que valia o resto do mundo quando tinha Gina Weasley nos seus braços, debaixo da sombra de uma árvore, mesmo que a professora McGonagall estivesse descendo as escadas de mármore parecendo indignada, prestes a passar em Harry o maior carão de sua vida?
A noticia de que Harry Potter e Gina Weasley haviam reatado se espalhou pela escola mais depressa do que gripe.
A fofoca foi tema das aulas durante três dias, sob várias versões.
Alguns diziam que Harry havia feito uma serenata debaixo da janela de Gina, com as Esquisitonas ao lado, cantando “This is the Night”. Outros, entre eles Romilda Vane; diziam que Harry havia feito uma tatuagem com o nome de Gina no peito, ao lado do famoso rabo-córneo Húngaro.
Havia apenas uma verdade escandalizada no meio de tantas: todos os alunos do sétimo ano da Grifinória haviam perdido a aula de Feitiços, no frenesi da novela que se sucedera no corredor do primeiro andar.
Colin Creevey andava evitando Harry (muito sensatamente, na verdade: Harry ainda achava muita traição da sua parte aceitar fazer joguinhos de ciúme), se escondendo debaixo da mesa quando Harry chegava na sala comunal, ou então se refugiando no dormitório do sexto ano.
Estava também muito magoado com Gina, que por sua vez não demonstrava muito peso na consciência. Harry não tinha a menor pena do garoto: estava mais preocupado em passar cada segundo atado à Gina pelos lábios.
McGonagall não se importara muito com todo o bafafá, no fim, apenas dissera que por sorte Rony aparara Colin e evitara que o garoto quebrasse a cabeça.
Mas Malfoy parecia achar toda essa atenção para o arquiinimigo algo muito aborrecido. Principalmente por que agora que Gina estava novamente apoiando Harry, e ele se sentia muitíssimo mais impulsionado a ofendê-lo nos corredores, coisa que Gina, ao contrário de Hermione, achava muito engraçada, algo para passar o tempo, como ela costumava dizer.
Durante a aula de poções na segunda feira seguinte, Malfoy esteve no limite de sua paciência.
Harry, logicamente, obtera os melhores resultados com sua poção Envelheçedora; e Malfoy conseguira derreter um caldeirão; acrescentando uma raiz de asfódelo inteira. O professor Slughorn deixara muito claro que um tantinho assim de raiz iria ser mais do que o suficiente, mas Malfoy estava muito ocupado respondendo a insinuação que Harry fizera, algo mais ou menos como “tem gente que não sabe realizar um feitiço nem que sua vida esteja correndo risco dentro de um trem submerso”, e cuja resposta de Malfoy ele ignorara completamente. E também fingiu que não ouviu Hermione falar, irritada, que ele não se recordara desse feitiço no quarto ano, durante o torneio Tribruxo.
Quarta-feira, durante a aula de defesa Contra as Artes das Trevas, Harry finalmente falou com o professor sobre conseguir a memória de Malfoy.
- Bem, Harry, eu preciso tirar essa informação, não é?
- Sim, mas quando é que vai tirá-la?! – perguntou, exasperado – senhor. – acrescentou, rapidamente.
- Bem, façamos assim, eu... Senhorita Brown, por favor, - acrescentou ele, olhando por cima do ombro de Harry - largue esse verme, ele pica! – Lilá olhou assustada e jogou o verme do tamanho de um gatinho que ela pegara, pensando ser um dos Vermes-Negros que eles estavam estudando, para cima, e ele caiu no cabelo de Hermione. A garota berrou, e Rony correu para tirar o bicho de cima da cabeça da namorada. Lilá riu de um jeito cruel.
- Como ia dizendo Harry – continuou Fullham, revirando os olhos – eu posso tentar fazer isso ainda hoje, e você vem aqui amanhã pra que nós possamos estudar a lembrança em paz... Apareça aqui lá pelas... Oito, está bom para você?
- Ótimo – apressou-se Harry à dizer.
- Bem, então, vá se sentar, seu verme está se arrastando um tanto depressa.
Harry voltou para o seu lugar e contou rapidamente a sua conversa com Oxfrom Fullham para Rony e Hermione, que ainda olhava para cima nervosa, como se esperasse mais um verme voar no seu cabelo.
- Bem, então ele vai roubar hoje essa lembrança e vocês vão ver amanhã? – perguntou Hermione, pegando seu verme e fazendo anotações. – muito bem, Harry, agora você vai poder saber quem te quer morto. Além do Voldemort, digo – acrescentou ela, olhando nervosa para o amigo.
- É. – confirmou ele.
- Mas pra que diabos servem esses vermes nojentos? – perguntou Rony, exasperado, virando o seu de cabeça para baixo, e estudando sua barriga mole.
- Bem, Rony, ele é muito usado por causa do seu veneno não é? – respondeu Hermione, paciente. – o veneno dele é muito conhecido por enfraquecer o bruxo, e não mata-lo. Te lembra alguma coisa, Harry?
- Dumbledore – respondeu ele, triste.
- Isso mesmo. – confirmou ela, igualmente deprimida. – os bruxos das Trevas usam esse veneno para deixar o bruxo vulnerável. Ele conta seus segredos na mesma hora se você quiser. Tão eficaz quanto o Veritaserum, e, vamos admitir, muito mais fácil de arranjar.
- Diabolicamente genial – amargurou Harry, parando de escrever e olhando ressentido para o bicho de aparência frágil na sua frente.
- Com certeza, Potter – falou uma voz debochadamente ao seu lado. Malfoy estivera ouvindo sua conversa. – foi isso que enfraqueceu o Dumby, não é?
- Bem, se você não sabe, Malfoy não vou ser a te contar. – respondeu Harry, aborrecido – agora vá arranjar alguma coisa pra fazer... Sem uma varinha... Deve ser muito difícil de achar não é? Se bem que, quando você quase cometeu um assassinato – ele parou e sentiu o efeito da palavra no rosto pálido de Malfoy – você não se importou muito com esse detalhe, não é? De quase matar um bruxo desarmado...
- Vai tirando onda, Potter, vai tirando onda... O mundo dá voltas. – respondeu Malfoy irritado.
- É, e por enquanto o nosso lado está pra cima – falou Hermione aos arrancos, sem parar de escrever – agora cai fora, seu prego.
Malfoy saiu, xingando Hermione baixinho.
- Babaca – comentou Rony. – mas eu ainda não sei por que estamos vendo esses vermes, e não Oclumência...
- O professor quer dar uma folga pra nossa cabeça... Esse assunto pode ser muito exaustivo, e agora, com os N.I.E.M. ’S...
- Exaustivo? – comentou Harry, com um bufo – é mais do que isso!
- Sim, e de qualquer modo, ele falou isso na aula passada, bem no finalzinho, Rony, Você não?...
- Não, Mione, eu estava mais preocupado com o cheirinho de rosbife do almoço! – respondeu Rony inocentemente.
Depois do término da aula, Harry demorou o máximo que pode para arrumar seu material, enquanto o professor conversava com Draco, o garoto com a cabeça muito abaixada, e a voz do professor quase inaudível. Malfoy parecia muito amargurado, mas balançou a cabeça afirmativamente e se deixou guiar por Fullham para fora da sala, provavelmente para o escritório dele.
- Bom almoço – falou Harry, sarcástico, para Malfoy. Rony soltou uma gostosa gargalhada. Draco fez um gesto obsceno pelas costas do professor.
A caminho do salão Principal, Rony ainda discutia com Harry sobre quem era a pessoa que enfeitiçara Malfoy.
- Pra mim foi Você-Sabe-Quem – falou ele, sacudindo a cabeça, depois que o amigo expressou sua opinião de que um comensal poderia ter feito, para se livrar da própria tarefa de matar à Harry.
- Vamos parar por aqui – interferiu Hermione, cutucando o braço de Harry e apontando para a mesa dos professores, onde Fullham não era visível, e logo depois para a mesa da Sonserina, onde Malfoy também estava ausente.
- Ótimo – comentou Harry, abrindo um largo sorriso e se sentando no banco da Grifinória.
Colin viu ele chegando e saiu correndo aos atropelos, caiu de cara no chão, mas se levantou berrando e saiu do salão sem olhar pra trás.
Na altura em que Harry escolhia um bom pedaço de frango, de ótimo humor, Gina chegou e escolheu um lugar ao lado do namorado, com uma expressão de puro descontentamento.
- O que foi? – perguntou Harry, preocupado.
- Mamãe – respondeu ela, puxando o jarro de suco de abóbora para perto de si e derramando uma admirável quantidade dele na sua taça. Bebeu um grande gole e então terminou a frase.
- está me deixando maluca! Diz que eu preciso parar de namorar todos os caras do colégio, ou vou ficar com fama de Jezabel!
Harry, que esperava algo muito mais sério, riu-se dentro do próprio copo de suco, derramando um pouco na roupa.
- Você acha que eu estou exagerando, é? – perguntou a garota, alterada, enquanto Harry secava a roupa com a varinha.
- Não é isso – Harry respondeu na mesma hora. – só acho que você deve saber que ela tem uma certa razão, não é?
Ela abriu a boca indignada, mas Harry logo cortou:
- Uma certa razão, Gina, uma certa razão. Você fica mesmo com muitos caras...
- É, pode até ser. – admitiu a garota, tomando outro gole – mas agora estou só com você.
- Valeu...
Gina riu-se, dando um beijo na bochecha do namorado.
- Preciso ir – falou ela, tomando o resto do copo, e se levantando completou: vou encontrar a Luna... Precisamos estudar um feitiço para o Flitwick...
- Boa sorte – desejou Harry, carente.
- Valeu... – ela deu um último beijo e um abraço e saiu correndo do salão, parando ao lado de Luna, que esperava na porta. Simas, que tinha acompanhado Gina com o olhar, avistou Luna e deixou cair seu garfo com estrepito.
Vinte minutos depois ele saiu também, acompanhado por todos os alunos do sétimo ano; para a sala de Transformação.
No dia seguinte, quinta-feira, Harry acordou tão repentinamente que pensou ter caído da cama.
Se vestiu com impressionante rapidez e desceu as escadas até o salão principal num só fôlego.
Depois do café da manhã subiu com Rony e Hermione para a sala de Feitiços, dez minutos antes de todos os outros.
Isso por que Harry e Rony precisavam tirar uma duvida sobre o movimento da mão no Feitiço Separador; feitiço que consiste na livre separação de um objeto, como separar a sola do sapato do restante, bem, não que Harry tivesse conseguido: em vez de separá-lo, fizera o sapato inteiro voar na cabeça do professor Flitwick.
Depois de ensinar aos garotos o movimento certo (com um feitiço cabeça-de-bolha) o professor voltou à sua mesa para fazer a chamada, altura em que todos os alunos já estavam presentes.
Vinte minutos depois haviam várias solas de sapato, cadarços, e sapatos inteiros voando pela sala, ou virando coelhos, ou, no caso de Hermione, separando completamente.
Ela, no fim do dia, foi a única à conseguir, pela segunda aula consecutiva. Lilá não gostou muito, e fez o seu sapato voar no meio do nariz da garota, se desculpando e dizendo que fora sem querer. Rony corou furiosamente, desviando os olhos da ex.
Na aula de Transformação ele praticamente nem prestou atenção ao longo discurso do professor sobre as dificuldades de se transformar em objeto; como o professor Slughorn podia fazer; tal era sua ansiedade para mais tarde, quando Fullham iria arrancar a memória de Draco Malfoy.
Saiu da sala à passos largos, apressado. Comeu sem realmente perceber o que colocava na boca, e mal ouviu o discurso de Gina contra o professor de Transformação, que lhe pregara uma detenção por ela ter usado um feitiço para repelir Bicho-papão num colega Sonserino.
Assistiu às aulas de Poções sem nem ao menos limpar o caldeirão, ignorando o chamado de Slughorn.
Às sete e quarenta e cinco ele estava andando pra lá e pra cá diante da porta de Fullham, e quando seu relógio mostrou que eram oito horas ele ficou parado com o nariz a três centímetros da entrada, respirou fundo e bateu três vezes na porta.
Ela abriu-se, e a careca do professor reluziu diante da luz exterior ao escritório. Sua sala estava por demais escura, iluminada apenas pela luz azul prateada da penseira de Dumbledore.
Harry entrou sem esperar convite, e se sentou diante da escrivaninha.
O professor imitou-o, sentando-se na poltrona de couro do lado oposto. Tirou do bolso um frasco transparente de ensaio, cheio de uma substância prateada que Harry conhecia mais do que bem.
- Foi difícil – começou ele, despejando o conteúdo do frasco para a penseira – arranjar essa memória do garoto Malfoy. Precisei procurar pela última lembrança dele antes de acordar na ala hospitalar da escola; após o incidente no trem... Foi realmente difícil... E o garoto não queria ceder essa... Facilidade... Para o nosso lado. Mas no fim – ele deu uma leve balançada na penseira, como um garimpeiro procurando ouro, e pousou a bacia de pedra novamente sobre a mesa. – minha perícia em Legilimência foi mais forte do que a recusa dele.
Falava como se tivesse feito nada de mais, quase monotonamente, seus lábios mexendo pouco e seus olhos, sem expressar emoção.
“Agora, Harry – ele se aprumou, erguendo a varinha – se você me faz o favor.”
Ele apontou para a bacia, e Harry inclinou-se para frente, tocando o nariz na superfície vítrea da Penseira. Sentiu-se, como era normal nessas situações, caindo pela escuridão, no ar gelado, e logo depois numa paisagem estranha...
Estavam parados numa rua vazia de Londres; King’s Cross via-se um pouco mais distante.
Malfoy andava pela calçada, pouco reconhecível com um gorro negro sobre os olhos e uma capa de viagem verde musgo. Parecia muito diferente da costumeira pompa que a família Malfoy ostentava, Harry pensou, antes de se lembrar de que o pai de Malfoy estava em Azkaban (para o seu próprio bem, como Dumbledore mesmo dissera no ano anterior), e a mãe escondida em algum lugar.
Andava furtivamente, sem olhar para os lados, Harry e o professor seguindo-o sem cansar. O garoto andou até uma placa manchada, balançando ao vento: O Caldeirão Furado. Harry imaginou, na mesma hora, que o garoto estava ali para comprar provisões, para ele e a mãe.
Draco entrou quase sem fazer ruído, atravessou o bar, e se deteve na porta dos fundos, meio encurvado.
Um raio de luz prata-claro; quase invisível, atingiu-o nas costas, e ele cambaleou.
Harry seguiu correndo para o lugar de onde viera o feitiço, e encontrou o rosto de Lobo Greyback por trás de um armário, se escondendo na escuridão, um sorriso maldoso e carnívoro distendendo seu rosto lupino. Então uma escuridão ainda maior aveludou-se sobre Harry, e ele voou para cima velozmente, indo parar sentado diante da escrivaninha de Fullham.
- Por que Greyback faria isso? – foi a primeira coisa que ele perguntou.
- Bem – balbuciou Oxfrom, se sentando na poltrona, com uma mão na testa. Por mais incrível que poderia parecer, ele estava realmente demonstrando preocupação nos olhos – não sei, não tenho idéia, a não ser que...
Os dois fizeram silêncio por um tempo, os dois pensando vertiginosamente.
- Tinha alguma coisa que ele queria; ou não... Fazer. Alguma coisa... – a cabeça de Harry quase dilacerava, com o esforço de pensar em possibilidades, e, de repente; se iluminou com uma idéia – É claro... – Harry fez uma pausa, olhando para o professor desconcertado - Ele sabia... Que mais tarde haveria o ataque ao trem. Ele sabia que quem fosse tentar me capturar, ou matar, iria arriscar a própria vida, também... Claro! Todo mundo sabe que Lobo Greyback tem gosto pelo sangue de criancinhas! Ele não iria querer perder essa grande chance de morder umas gargantas, e também de se arriscar menos. E... Também; Voldemort estava, com certeza, querendo se livrar de Malfoy. Provavelmente ele só pediu ao Greyback... Ou mandou, acho que é mais provável... Que ele matasse o Draco, mas o homem teve uma idéia melhor, claro: ficar livre para atacar crianças e não arriscar a vida, deixar com que Draco se matasse tentando me matar, seria completamente compreensível, quero dizer – Harry se levantou da cadeira sem perceber, e começou a caminhar. – Todo mundo sabe que nós, eu e Malfoy; nos odiamos... Aposto o que o senhor quiser que Greyback explodiu a ponte por conta própria, sem ordem superior, no desespero de cumprir a ordem de Voldemort: matar Draco Malfoy... Com um bônus... Eu.
O professor o encarava boquiaberto. Parecia estar considerando as possibilidades,
- Bem, é uma teoria, realmente, incrível, digo...
- Mas ele não atacou nenhuma criancinha... – continuou Harry, pensativo. – então por que...?
- Atacou, sim – falou Fullham sombriamente, retomando seus modos secos. Mas o ministério resolveu abafar o caso. O aluno foi encontrado por um aluno antes de o trem ser esvaziado. Sangue por todo o lado. Horrível. Ele ficou lá, com o aluno que o encontrou, inconsciente, quando o trem caiu nas águas do lago, e uma equipe do St. Mungus foi chamada logo depois que vocês voltaram para a escola. Ele foi levado. Ainda nem voltou.
- Quem? – perguntou Harry, se aproximando da mesa num passo rápido, os olhos arregalados.
- Justino Finch-Flethley – respondeu ele, pesaroso.
A boca de Harry se abriu de assombro e choque. Era amigo de Justino, o conhecia desde o segundo ano de escola. Mas então Harry percebeu que, de fato, nunca mais vira Justino.
- Sinto muito – falou Fullham, de repente, trazendo Harry de volta à terra. – parece que vocês eram amigos...
- Sim – respondeu Harry depressa. – acho que... Que preciso ir embora, desculpe senhor...
- Bem – falou ele, seus olhos opacos refletindo um trovão que caíra lá fora. – contava discutir isso com você por mais tempo, mas...
- Realmente, senhor – insistiu o garoto, se levantando. – preciso ir.
- Bem, então – conformou-se o homem, erguendo-se da cadeira também.
- Noite, senhor.
- Boa noite, Sr. Potter.
O garoto seguiu até a porta, abriu-a e foi andando rápida e pensativamente para a Torre da Grifinória, comichando para contar as novidades à Rony e Hermione.
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