Revelações de um ex-Comensal
Algumas horas depois, já tendo jantado na cozinha subterrânea, Harry se dirigiu a Lupin, falando com cuidado.
- Ah... Professor?
- Sim, Harry – o homem o encarou, do outro lado da mesa, enquanto Tonks aparecia atrás dele, trazendo uma bandeja com sorvete de chocolate e nozes.
- Eu andei pensando, nós, andamos pensando, - ele lançou um olhar rápido para Hermione - agora que somos maiores de idade... Nós poderemos, você sabe, entrar para a Ordem? – o garoto respirou fundo, tentando manter a expressão sóbria e neutra.
- Bem – começou Lupin, inseguro, procurando com os olhos a ajuda de Moody, que comia seu sorvete separando as nozes para o canto do pratinho. – eu não sei... Hermione não fará aniversario só no mês que vem?
- Eu não me importo – se apressou a dizer a garota.
- Mas seus pais se importam. – argumentou Tonks, se sentando ao seu lugar entre Lupin e Moody. – e, que eu saiba, os trouxas consideram maioridade depois dos dezoito anos. Meu pai é trouxa, sabe.
- Mas... Mas... – ela parecia estar procurando um argumento, a testa franzida. Harry a interrompeu:
- Mas o fato de já termos salvado a pedra Filosofal, descoberto a Câmara Secreta, lutado no ministério com doze comensais, e ainda essa semana com mais seis, sem nenhuma ajuda, não no habilita? – perguntou ele, olhando de um para o outro. Ficou satisfeito de descobrir que os deixara desconcertados.
- Mas, Harry – recomeçou Lupin, com o primeiro argumento que lhe veio a cabeça – é muita responsabilidade, e ainda mais que vocês estarão voltando à Hogwarts este ano...
- Isso não é motivo. Eu posso muito bem... – mas suas palavras foram morrendo na garganta quando Snape entrou, imponente, na cozinha. Usava as vestes negras de sempre, e deu um sorrisinho cínico quando avistou Harry.
- Já aqui, Potter – desdenhou ele, se sentando à sua frente – imaginei te-lo ouvido.
- Oi, Snape – cumprimentou o garoto, realizando um desejo que guardava a muito tempo: chamar o homem pelo nome, com todo o desrespeito que ele merecia. – e ai? – continuou - Como é ficar escondido, enquanto os outros fazem o trabalho sujo? – indagou ele, fingindo inocência. Ele notou os nós dos dedos do homem ficarem muito brancos, e seu rosto ficou cor de cera. Ignorou os olhares preocupados dos outros adultos na cozinha.
- Muito criativo, Potter, meus parabéns – respondeu ele, entre dentes – mas, enfim, o que você quer comigo?
- Como você sabe... – perguntou o garoto, rapidamente.
- Você continua um péssimo oclumente, Potter.
- Ótimo – respondeu Harry, fingindo não se importar com a alfinetada. – eu quero conversar com o senhor sobre... – ele olhou para Tonks e Moody, e resolveu alterar o fim da frase. – coisas... Importantes.
O homem encarou-o por uns instantes, e o garoto manteve o contato visual. Snape arregalou os olhos, apertando ainda mais o tampo da mesa, os dedos agora deliberadamente transparentes.
- Pra sala, Potter.
Ele se levantou, arrastando a cadeira. Harry imitou-o, indo subir as escadas antes do homem, que ainda o encarava misteriosamente.
Eles subiram as escadas até o hall, e dali para a sala de estar no segundo piso.
Assim que eles atravessaram a porta, Snape a trancou com a varinha. Se deteve de costas para Harry por algum tempo, murmurando um feitiço na tranca da porta. Houve um ruído engraçado como o de uma almofada abafando todo o som que vinha lá de fora, incluindo os gemidos dos quadros adormecidos.
Snape se virou pra ele com agilidade, guardando a varinha no bolso interior da capa.
- Impertubalizei a porta – explicou ele, secamente. Apontou para uma cadeira, como um gesto para que Harry se sentasse, mas o garoto continuou de pé.
- Estou bem, obrigado – falou ele, mais uma vez extravasando seis anos de ódio pelo professor.
- Como queira. – respondeu o homem, indiferente. – agora aos negócios. O que você fez com a Horcrux? – indagou, parecendo ansioso.
- Destruí – ele pensou, por um instante, e pensou em usar um tom mais neutro – na verdade... Deixei Crabbe destruir. Ele... Hm... Morreu, depois disso.
Snape caiu numa cadeira, apertando o braço esquerdo, sem perceber.
- Então foi isso. – falou ele, tentando manter a voz neutra, assim como fizera Harry – você foi ousado, Potter. Poderia ter acabado com a própria vida, se ele tivesse errado o alvo.
- Eu sei – falou o garoto, corajosamente – mas, assim como você, eu não pensei nisso na hora.
Severo Snape ignorou a insinuação, e, em vez de repreender Harry, se levantou e foi até a janela aberta, por onde se podiam ver os lampiões acesos do Largo, e a rua encharcada pela chuva, que continuava a cair insistentemente.
- Então – recomeçou ele, se virando, e, novamente, revelando agilidade – faltam três horcruxes e a parte no corpo dele.
- Sim. – o garoto respondeu, olhando para o mapa múndi na sua frente. Vários alfinetes coloridos brilhavam na sua superfície, com pequenas anotações escritas em pergaminhos mínimos. – eu acho... – Ele parou, lembrando de suas aulas com Dumbledore no ano anterior. – que são: alguma coisa de Corvinal ou Grifinória... A cobra dele, Nagini... Eu não sei dizer com certeza.
- Naturalmente – disse Snape, andando até onde estava o garoto – ele não me falou muito sobre suas Horcruxes. Mas eu sei que ele havia perdido uma delas para Régulo Black. Ele foi perseguido até a morte, mas antes ele usou seus últimos poderes para resguardar o medalhão no interior do túmulo dos seus pais...
Então Harry teve um súbito clarão de duvida, que tirava todo o sentido de tudo o que acontecera...
- Profess... – ele parou, ignorando o sorrisinho cínico de Snape – Snape, - ele fez questão de sublinhar a palavra - como ele pode ter escondido a Horcrux tendo morrido antes de meus pais? Quero dizer... Não faz sentido algum!
- Ah. – o homem olhou pra ele, parecendo extremamente desdenhoso. – isso. Bem, achei que você iria me perguntar, mas não achei que demoraria tanto – ele parou, sentindo o gostinho de alfinetar Harry novamente, e então foi em frente – ele se consultou com Sibila Trelawney. Ele a aprisionou, sob ordem do Lorde, para fazê-la falar sobre a profecia. Depois de alguma persuasão... Ele a fez se lembrar do que contara a Dumbledore, atingindo sua mente de modo quase irreparável... E logo depois limpou sua memória. É muito para um bruxo só. Por isso ela não é mais nem capaz de contar o que você comerá no jantar.
“Sabendo da queda iminente de seu Lorde, Black fez a coisa que lhe pareceu mais certa: furtou a medalha, para que, caso um dia a guerra acabasse favorecendo o lado de Dumbledore, ele pudesse ser protegido, sob o pretexto de ter mudado de lado no ultimo instante. Como eu.”
“Então ele foi até o lugar que seus pais já haviam comprado para seu enterro. Naturalmente eles já não tinham mais nenhuma família, para se importar com o funeral, então, sabendo da quase certa chance de morte, eles compraram o tumulo. Mas isso antes da falsa esperança de que Rabicho iria ser seu fiel do segredo. Antes de realizar o feitiço que eles acharam que lhes salvaria a vida... Mas seus túmulos foram usados, como eles previram, muito cedo. Nesse ponto Black já estava morto, é claro, e o medalhão bem guardado ali no jazigo.”
“Mas antes de tê-lo matado, o Lorde das Trevas lhe fez contar onde ele guardara a Horcrux. Naturalmente foi muito fácil, sendo um ótimo legilimens. Mas com a tirada esperta de Régulo, com essa ele não contara... Ele não poderia, nem sendo tão poderoso, quebrar o encantamento que Black lançara no jazigo. Nem mesmo lançando a maldição Imperius em Black, pois ele já estava, naturalmente, morto.”
- Então – quis saber Harry – Voldemort realizou um tipo de encantamento para que, quando eu achasse o medalhão, ele soubesse e pudesse mandar uma frota de seus comensais para roubá-lo?
- Isso. – confirmou Snape, indo ver mais de perto uma das anotações. Ele olhou pra ela por um instante, e então deu um passo pra trás pra encarar Harry. – mas agora aquela Horcrux, ele já deve ter percebido, ele perdeu.
- Bem, foi mais fácil do que eu pensei – falou Harry, levianamente, mais uma vez querendo bancar o corajoso.
- Foi fácil desta vez, Potter – cortou Snape, friamente. – ele não lhe subestima mais. Achou que seus patéticos comensais poderiam cuidar do assunto. Não quis se expor. Mas agora isso não acontecerá mais... Ele começará a nos fazer visitas constantes...
Harry engoliu em seco, desviando os olhos para a janela encharcada pela chuva. Se virando, ele destrancou a porta, deixando Severo Snape perdido em seus pensamentos. Sem olhar pra trás, ele desceu os degraus para o hall, onde Rony e Mione ainda o aguardavam, nervosos.
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