Ranhoso em maus lençóis



Ele olhou por cima do ombro e jogou a capa por cima de si. Então, com discrição, e cuidando para não esbarrar nas cadeiras, agora fora dos lugares, ele foi em direção às árvores, onde o menininho ainda tentava subir nos galhos, para pegar uma fada que dormia profundamente. Harry apanhou a varinha no bolso interior das vestes e avançou, pulando o murinho do jardim.
Ele andou até o povoado, que se encontrava vazio, exceto por alguns homens num bar de esquina. Um deles, podre de bêbado, dizia “Eu juro, a nuvem caiu, me entende, caiu, mesmo!”, e um outro, por sua vez, respondia “Eu já lhe disse pra parar de beber! Pombas!”.
Harry continuou seu caminho, sem rir, cauteloso, a varinha ainda em punho. Ao fazer a curva, ele divisou, então, a torre da igrejinha. Ele continuou, andando mais depressa, o coração martelando o peito, com os olhos bem abertos. Então, dois minutos depois, ele estava em frente à igreja, olhando a fachada branca.
Naquela hora, ele divisou um vulto com capa negra, que se escondia nos fundos da capela. Harry começou a andar, lentamente, até o local onde ele vira a capa... seu coração, ele imaginou, poderia sair pela boca a qualquer momento, mas ele não parou de andar. Ao chegar no fim da parede paralela à ele, ele se virou com rapidez, jogando a capa pro alto, apontando a varinha pro homem que estava parado à sua frente.
O garoto avançou correndo até ele, mas o ex-professor, a varinha em riste, desarmou-o com um rápido feitiço não-verbal. O homem olhou-o de cima a baixo, ainda apontando a varinha para seu peito, encarando o garoto nos olhos. Harry, a raiva latejando em suas veias, levantou os olhos, e falou, com toda a raiva que conseguiu reunir:
- Assassino – ele observou, com selvagem satisfação, o rosto do professor se deformar de raiva – Traidor. Covarde. Assassino.
O professor continuou a apontar a varinha, e disse, aos arrancos:
- Atrasado, Potter. Sempre atrasado.
- Sai-de-cima-de-mim! – berrou o garoto, reunindo toda sua força, mas não foi o suficiente.
- Potter, cale a boc...- mas ele não terminou a frase. Uma voz rouca e conhecida, atrás dos dois, berrara “Expelliarmus”, e Snape voou dois metros para trás, batendo na parede, a varinha escapando das suas mãos. Então ele divisou Olho-Tonto Moody apontando para o corpo de Snape a varinha.
O homem se virou para Harry, e deu-lhe uma olhada muito feia, antes de se virar para o outro lado, em direção à estrada e chamar;
- Tonks! Lupin! Ele está aqui. Junto com... Com... Eh...
Então, levantando-se, Harry viu o casal vindo correndo, a varinha apertada na mão.
- Harry! – gritou Lupin - Como você sai por aí sem avisar ninguém...! – ele parou de chofre, vendo o corpo de Snape deitado junto à parede.
Ele pareceu estar inchando de raiva. Uma cólera que Harry nunca imaginara vindo dele na forma humana. O professor ergueu a varinha, mas Tonks, com seu vestido de festa roxo-berrante, segurou sua mão, falando com os dentes cerrados.
- Remo, não! Ele precisa de julgamento! Por favor!
O homem lutou consigo mesmo, e por fim abaixou a mão, olhando para Harry, que ainda o olhava, espantado.
- Harry, você está bem? – começou ele, olhando dele para Snape, que já estava acordando.
- Sim, eu...
Mas Lupin o interrompeu, com raiva:
- Harry como você ousa sair da companhia dos adultos, abandonar toda a cautela e vir atrás de um assassino perigoso como este! Você não pensou nas conseqüências...?
- Poupe-nos, Lupin, da faladeira irrefreável! – disse Snape lá do chão, levantando-se e espanando as vestes. Moody, talvez pelo choque, não reagiu, apenas apontava a varinha frouxamente para o chão. Snape parecia até entediado. – por favor. Dê-me uma chance para me explicar, eu...
Mas Lupin correu até ele, jogando a varinha no chão e, branco de fúria, ele pegou o outro pelo colarinho e encostou-o na parede, o olhar lupino mais acentuado do que nunca. Os pés de Snape nem tocavam mais o chão, e os olhos de Lupin tinham se colorido de amarelo.
- Como você... Assassino... Como...? Seu...
- Lupin – começou Snape, com a voz estrangulada. – você não pode... Me largue, seu...
Então, Snape começou a empurrar o outro pelo peito, e Tonks se adiantou, aflita. Harry, embora chocado com a atitude de Lupin, não queria que a mulher interferisse... Queria que Lupin fizesse com que Snape sentisse toda a dor que o garoto sentia... Queria vê-lo no chão... Mas então Lupin se afastou, soltando a gola das vestes do ex-colega, e colocou as mãos no rosto. Quando ele baixou-as, seus olhos estavam, novamente, humanos. Tonks estava na sua frente, com as mãos no seu peito, murmurando palavras de calma para o namorado. Moody, então, apontou a varinha para o lado da casa dos Weasley, pelo outro lado da igreja, e um Patrono saiu dela, enorme e prateado, e foi flutuando silenciosamente. Quando o feitiço se afastou, ele se virou com surpreendente rapidez e apontou a varinha novamente pra Snape.
- Ora, ora... – começou ele – você se tornou mais ousado, Severo... Tentar pegar Potter na frente de todos que o protegem. Muito ousado, mesmo – terminou ele, em tom de aprovação.
- Eu não queria pegar ao Potter. Precisava falar com ele, pois eu sei que ele era o único presente no local da morte de Alvo... Queria explicar...eu nunca pretendi matá-lo...
- O QUE?! – berrou Harry, finalmente recobrando a fala, indo até Snape. Parecia que a raiva voltara ao seu corpo mais terrível do que nunca – COMO VOCÊ NÃO MATOU-O? EU ESTAVA LÁ, EU VI! VOCÊ ASSASSINOU ALVO DUMBLEDORE, SEU SUJO, SEU COVARDE!...
- Cale-se, Potter. Não berre nos nossos ouvidos! Sim, eu matei Alvo Dumbledore, mas vocês têm que entender que nunca foi minha vontade...
- VOCÊ SEMPRE ODIOU A ELE, POR QUE VOCÊ É UM TRAIDOR, IMUNDO...
- CALE-SE, POTTER! Você não entende! Todos vocês, me ouçam, agora!
“Eu havia, antes do começo do ano letivo, feito o juramento inquebrável com Narcisa Malfoy e Belatriz Lestrange. Eu jurei pra elas que no caso de Draco não conseguir completar a tarefa que o Lorde lhe havia reservado, que eu a completaria. Contra a minha vontade, obviamente. Dumbledore havia me pedido que eu conquistasse a confiança de todos os comensais, principalmente a de Belatriz Lestrange, que além de nunca ter confiado em mim, era uma das mais fiéis servidoras do Lorde. Eu não poderia negar. Então passei o ano inteiro tentando que Malfoy conseguisse faze-lo. Não queria terminar essa missão. Dumbledore me estendera a mão uma vez, e eu não trairia sua confiança, muito menos queria ser responsável por sua morte. Então, no meio do ano passado, expus ao diretor minhas preocupações, por que Malfoy não tinha nenhuma idéia brilhante. Claro que ele nunca havia sido nenhum gênio, e ainda por cima... mas de qualquer jeito, o diretor não me deixou voltar atrás. Estava sobrecarregado, agindo de agente triplo, mas me mantive fiel à Hogwarts. Me esforcei para não deixar minha mente aberta nenhum instante. Eu sou, sem favor nenhum, um ótimo oclumente. Mas na noite em que os Comensais chegavam, e eu percebi que Dumbledore não estava na escola, eu enfeiticei Filio Flitwick para não deixar suspeitas, e fiquei muito preocupado. Então, fui atrás de Malfoy, e o encontrei na torre de Astronomia, e segui as ordens de Dumbledore. Ele me pediu, antes de morrer, que eu não hesitasse. Eu fiquei com ódio de mim mesmo. E quando Potter me seguiu, eu juro, eu não lancei nele um só feitiço. Tentei ensina-lo os feitiços não-verbais, mas essa cabeça-dura dele...então ele me deixou fugir, é claro, patético como ele só, e eu voltei para o Lorde.
Passei esse último mês na minha casa, e nunca deixei minha mente aberta para o Lorde das Trevas.
Malfoy, é claro, fugiu com a mãe, mas é só uma questão de tempo para algum comensal acha-los e descarta-los. Eu vim aqui hoje de acordo com as informações do idiota do Rabicho, ele anda... xeretando...na antiga casa dele. Ele diz que quase foi pego por aquele gato da Granger, bem na vista dela, do Potter e do Weasley, mas eles nem desconfiaram. Então eu mandei uma coruja mais cedo pra ele vir me encontrar aqui nesse lugar. Mas eu sabia que seus olhos não seriam facilmente enganados, Olho-Tonto, e isso foi muito bom, por que vocês nunca acreditariam no Potter, achariam que ele estaria sob a maldição Imperius, e agora eu vim aqui pra avisar vocês, antes que alguém me encontrasse e fizesse o que esse ai – ele apontou com a cabeça para Lupin, cujo rosto estava intrigado, como se tentasse resolver uma conta gigantesca de matemática. – quase fez pra mim.
Ele terminou com um sorrisinho enviesado, mas ele ainda parecia preocupado com a reação dos outros. Moody ainda o encarava com uma expressão indiscernível. Parecia estar considerando toda a história, mas ainda assim se mantinha alerta, com a varinha bem firme.
Lupin continuava intrigado, mas olhava para Snape com uma expressão ainda mortífera.
Tonks parecia extremamente confusa, se sentara numa pedra e apoiara a testa nas mãos, pensativa.
Harry, por sua vez, estava atônito... Tudo fazia sentido, contudo era difícil acreditar naquele homem que ele vira assassinar Alvo Dumbledore um mês antes... Então ele começou a andar, de um lado para o outro, na hora em que Hagrid chegava correndo, enquanto falava, afobado:
- Recebi sua mensagem pelo Patrono, Olho-Ton... Mas o que?...O QUE ESSE FILHO-DA-MÃE ESTÁ FAZENDO AQUI COM VOCÊS, O ASSASSINO PODRE?!
- Calma, Hagrid! – disse Tonks, se adiantando, com as mãos erguidas – ele veio explicar... Mas, por Merlim, é difícil, eu... Nem sei.
Ela se sentou novamente, o vestido de festa roxo todo sujo.
Lupin mantinha silêncio, cobrindo os olhos, e Moody ainda apontava a varinha, firme, para Snape.
Hagrid olhou de um para o outro, meio exasperado, meio curioso.
- Hagrid... – começou Harry, andando até o guarda-caças, hesitante – o Snape...ele...bem. Ele parece não... Ser, quem a gente achou que ele... hm... Era. Ele não matou Dumbledore. Pelo menos eu acho.
- Eu nunca encostei o dedo em Alvo Dumbledore, Hagrid. Estou disposto a tomar a poção da verdade, em qualquer caso.
- Vamos... Vamos pra casa de Molly e Arthur... – disse Tonks, levantando-se.
- Não, Ninfadora, nós não podemos mandá-lo pra lá, com todos aqueles convidados doidos por vingança, se é que me entende – contestou Lupin, finalmente - Vamos pro Largo Grimmauld.
- Eu levo Harry pr’A Toca – rosnou Moody, lá do seu canto.
- Mas eu quero ir junto! – exclamou Harry, indignado.
- Sem Weasley e Granger? – debochou Snape.
- Não abuse, Snape! – disse Lupin, entre dentes. – Vamos, Harry. Segure o braço de Olho-Tonto.
Harry, contrariado, foi até Moody, que lhe estendeu o braço, e o garoto agarrou-o, dando uma última olhada para o grupo: Snape se levantava, sob a guarda de Lupin. Tonks e Hagrid estavam em volta, olhando atentamente para os arredores, provavelmente à procura de uma arapuca.
Então Harry sentiu a conhecida e detestada sensação de estar sendo sugado por uma mangueira de borracha muito estreita, e num momento depois ele sentiu que batia no chão, e quando levantou os olhos, viu as árvores por onde passara mais cedo, na sombra d’A Toca. E da porta, Rony e Mione vinham correndo em sua direção, meio preocupados, meio indignados.

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