Através do Espelho
Naquela noite, logo após o jantar, o jovem Le Fort, Rowena e Helga conversavam na sala de estar enquanto Godric servia um vinho forte que adquirira em Londinium. Apreciava bebidas intensas e mais ainda de saboreá-las na companhia de amigos. Helga questionava o jovem sobre seus feitos em batalha e pedia notícias da capital.
- Richard-meu-querido, conte-me tudo o que acontece em Londinium. Estamos muito afastados apesar de termos amigos com quem nos comunicamos mas nunca sabemos da boca de quem as viu de perto.
Rowena escondeu um incontido sorriso com a mão, mas não podia evitar que seus olhos a traissem. Le Fort percebeu o trejeito mas não sentiu-se intimidado, passando a narrar as justas das quais participara. Helga deliciava-se com essa nova versão dos fatos, que anteriormente arrancara de Zibby com promessas de magias únicas que a faria ter os cabelos mais brilhantes que estrelas.
- Então você participou dessas justas como prêmio pelo seu magnífico desempenho na batalha de Hastings, quando salvou William, o duque! Que maravilha ouvir de um herói seus feitos, da própria boca e com tanta humildade... – Helga enternecia-se e curvava a cabeça para o lado, como se estivesse a falar com um gatinho. – Mas soube que você ganhou um novo nome por conta disso – acrescentou, arregalando os olhos claros. – Que nome, diga-me.
– Fortescue, respondeu Richard, por ter salvo com o escudo a meu rei de uma lança que lhe trespassaria o peito.
– Fortescue - repetiu Helga. – Hmm, Fortescue.... Creio ter ouvido esse nome em algum lugar....
E quedou-se pensativa, tentando localizar na memória em que circunstâncias tinha tomado ciência daquele nome, quando nisso entra Godric, trazendo a garrafa de vinho e antes que venha a dizer qualquer palavra, faz-se ouvir um estrondo seguido de um zumbido.
- O que será isto? - perguntou ele.
- Onde está Zibby? - preocupou-se Rowena.
- O que aconteceu? - sobressaltou-se Helga.
Todos sairam do salão rapidamente na direção do quarto de Zibby mas ela já descia as escadas, correndo.
- O que foi esse barulho?
Olharam na direção da ala oeste, de onde parecia que o zunido se mantinha, mais baixo, agora.
- O espelho – sussurrou Rowena para si mesma.
Dirigiram-se para lá, cautelosamente, temendo uma armadilha.
Godric procurou com os olhos ao redor por uma indicação do que provocara o estrondo, mas o espelho estava ao fundo da grande sala de paredes de pedras, próximo a uma janela embaçada, com sua moldura de madeira escura intacta bem como a lâmina de raríssimo vidro metalizado.
– Mas o que ... começou Rowena, intrigada com a falta de evidências da fonte do som, quando foi silenciada por uma suave vibração de corda, um som delicado e melodioso, que provinha do outro extremo da sala. Voltando o olhar para a fonte do som, puderam vislumbrar um vulto, indefinido na penumbra em que se encontrava.
Helga puxou sua varinha mais que depressa, puxando Zibby para trás de si, a protegê-la, enquanto Godric já apontava a sua para o intruso. Rowena não teve reação, olhando quieta para o canto, esperando um movimento.
- Quem é você? – perguntou Griffindor, com autoridade e aspereza na voz.
Outra nota soou, reverberando no quarto escuro antes que a voz fosse ouvida.
- Trago mensagem da Senhora do Lago.
A figura começou a avançar na direção dos fundadores quando foi interrompido por Godric.
- Mas quem você é? Diga seu nome e mostre-se, antes de dizer a que veio.
– Taliesin é meu nome, o último druida que anda entre os mundos, e trago um pedido da Senhora do Lago. É grave o que se aproxima e devo falar-lhes sem demora.
Griffindor relaxou um pouco e lentamente abaixou a varinha mas não a guardou no casaco, mantendo-a na mão, caso o intruso não fosse quem dizia ser.
- Como entrou aqui? - perguntou Godric, que havia cercado o castelo e as terras no entorno com poderosos feitiços protetores.
- Vim pela terra dos ancestrais, através do espelho, para trazer a mensagem d'Aquela que serve à Deusa.
Rowena adiantou-se, resoluta, ficando ao lado de Griffindor.
- O que a Senhora da Avalon deseja de nós?
- A ligação que existe entre os mundos, entre a Terra do Verão e a Bretanha, corre grave risco de ser rompida para sempre. Se os acontecimentos que estão em andamento tiverem sucesso, logo a Bretanha não poderá contar com o poder de Avalon e a Terra do Verão desaparecerá para sempre, levando consigo toda a magia que existe no mundo.
Helga teve um estremecimento. Que dizia aquele homem? A magia iria desaparecer? Como viveriam os bruxos?
Godric percebeu que o que o homem dizia era grave e apenas com maiores explicações poderia saber se eram verdadeiras.
- Avance, senhor, para possamos ver-lhe o rosto.
Taliesin caminhou para fora das sombras, e mostrou sua face. Tinha longos cabelos louros, olhos azuis muito claros feito água dos lagos, e trazia uma harpa encostada ao ombro. Sua pele era morena como a dos ancestrais da terra encantada e não era muito alto. Trazia um crescente na testa, prateado e com reflexos azuis, e seus braços portavam tatuados dois dragões, também azuis, um em cada antebraço, que pareciam mover-se junto com seu dono.
Zibby nunca tinha visto uma criatura dos pântanos e estava deliciada. Seus supiros puderam ser ouvidos pelo jovem Le Fort, que franziu o cenho e apertou a boca, desagradado de ver-se trocado tão facilmente por uma figura exótica qualquer, mesmo impressionante. Olhou o homem com reprovação e adiantou-se, inquirindo-o.
- Senhor, porque nenhuma mensagem nos chegou antes de sua entrada intempestiva?
Taliesin avançou mais alguns passos e sorria, parecendo muito divertido. Mas logo encarou Richard e, assumindo uma expressão séria, disse-lhe:
- É o senhor mesmo que eu procurava, Lord Fortescue. A vós a tarefa será entregue.
- Que tarefa? - perguntou Godric?
- Salvar o Mundo Mágico.
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