Xícara de Chá
Xícara de Chá
Ela soltou um grito de ódio, que desencadeou uma nova onda de lágrimas, e depois gritou: — Rony! — Sem ouvir resposta. Hermione odiou-se por não ter conseguido reagir contra Malfoy e Parkinson quando conseguira recuperar a varinha. Temeu que houvesse alguma maneira de ser punida por tê-los agredido. Os arredores estavam desertos, Rony estava sozinho em algum lugar se culpando e ela nem ao menos poderia ir ao lugar em que iria numa situação como aquela: a cabana de Hagrid.
Bateria à porta, Hagrid abriria, a abraçaria carinhosamente, ouviria seus problemas e lhe serviria uma xícara de chá, tentando distraí-la com as últimas notícias a respeito da plantação de abóboras. A saudade e a preocupação com Hagrid intensificaram seu choro. Ela ainda segurava a varinha debilmente, sem coragem de guardá-la, lembrando-se com muita raiva de sua falta de coragem de usá-la. Somente depois de alguns minutos conseguiu secar as lágrimas e seguir o caminho de volta ao castelo, decidida a não contar a ninguém sobre o duelo com Malfoy e Pansy.
Não houve sinal de Rony ao longo da tarde. Hermione passou a maior parte do tempo na sala comunal com Gina, que tentava acalmá-la.
— Ele só precisa de um tempo sozinho — dizia ela. — Só precisa pensar, conversar com ele mesmo, pôr as idéias em ordem.
— Perfeitamente, Gina: — Hermione retrucou com energia. — ponha Rony sozinho em algum lugar, cheio de culpa e com aquela música ridícula ecoando dentro da cabeça e veja em que ordem ele vai colocar as idéias.
Houve momentos em que ela tornou a sair do castelo para procurá-lo, mas antes que se afastasse muito, a idéia de que ele poderia ter voltado à sala comunal durante a sua ausência a fazia retornar às pressas. Gina só conseguiu convencê-la a jantar dizendo que achava que Rony apareceria no salão principal.
— Acha mesmo que ele vai ter coragem de sentar à mesa da Grifinória com toda a vergonha que está sentindo? — perguntou.
— Claro! Você o conhece; nenhuma vergonha supera a fome que ele sente.
Incerta, mas agarrando-se àquela esperança, Hermione desceu com a amiga. Mal comeu durante o jantar, ocupada demais em vigiar as portas à procura de Rony ou correr os olhos pelos lados esperando achá-lo caso tivesse perdido o momento em que ele entrara no salão. Ele não apareceu.
— Você nem ouviu, não é? — Gina perguntou, quando subiam as escadas.
— Ouvi o quê?
— O que aconteceu com Crabbe, depois de ter jogado aquele balaço que acertou Harry. Montague estava contando às gargalhadas que o único castigo que ele recebeu foi escrever umas frases. Você acredita?
— Hum... Horrível, mesmo.
— Você acha que existe alguma chance de Harry e Jorge terem recebido a mesma punição, depois que bateram em Malfoy?
A expressão “bateram em Malfoy” trouxe a pequena quantidade de arroz com calda de abóbora que Hermione comera de volta à sua garganta.
— Não — respondeu, certa de que Umbridge jamais perderia uma oportunidade de dar um jeito para que Harry recebesse uma punição severa. Ao pensar nisso, ficou preocupada com ele também.
Pouco depois de as duas terem chegado à sala comunal após o jantar, Harry e Jorge apareceram para contar o que acontecera na sala da profa. McGonagall depois de terem sido mandados para lá por Madame Hooch. Harry soltou algo dourado que saiu voando loucamente pela sala; o pomo de ouro. Bichento alarmou-se e começou a persegui-lo.
— McGonagall já tinha decidido, — Jorge começou. — ela tinha dito que ia nos dar uma semana de detenção cada um, quando...
— Umbridge chegou lá de repente, — Harry continuou com desânimo. — desacatando a decisão de Mcgonagall. Ela mostrou o mais novo decreto do ministério, um que dá a ela plenos poderes de interferir em qualquer decisão dos professores que se refira aos alunos. Com isso, ela passou por cima da decisão de McGonagall e...
— Acabou com o time! — sibilou Angelina, segurando a testa com as duas mãos como se pesasse toneladas. — Eu sei que ela acabou com o time! Eu tinha certeza!
— Ela não fez isso — Jorge protestou, com calma. — Ela disse que tudo bem o time continuar jogando... Sem problemas.
Hermione julgou ter entendido errado. Harry, entretanto, não deixou que as pessoas ficassem surpresas e confusas por muito tempo.
— Isso mesmo. — ele disse. — Só que ela proibiu que eu, Jorge e Fred continuássemos no time. Na verdade, usando as palavras dela, ela nos proibiu “para sempre de jogar quadribol”.
Gina não se segurou; a garota levantou-se de um pulo e pareceu disposta a correr para o sofá onde Harry estava. Como ela olhasse para Hermione, aparentemente arrependida do movimento brusco e pedindo ajuda, ela também se levantou. Andaram até o sofá e sentaram-se cada uma a um lado do garoto.
— Proibidos? — Angelina repetiu em voz baixa, aparentemente demorando a absorver a informação. — Proibidos? Sem apanhador e sem batedores? O que diabos vamos fazer?
Hermione olhou para a janela, vendo a neve cair lá fora. Estaria Rony ainda na rua? Se estivesse, devia estar sentindo muito frio... Será que ele tinha se perdido? Afinal, se passara muito tempo desde que o jogo terminara, ele já tivera tempo suficiente para pensar, se sentir culpado e tudo o mais; aquilo já estava passando dos limites.
O movimento do time de quadribol deixando a sala comunal em direção aos dormitórios a fez voltar de seus pensamentos. Gina também se levantara e piscou-lhe o olho com um meio sorriso antes de seguir os outros, provavelmente querendo dizer-lhe que não se preocupasse, que tudo ficaria bem e que Rony apareceria a qualquer momento.
Não havia mais ninguém na sala agora com exceção dela e de Harry. E de Bichento, que finalmente agarrara o pomo de ouro. Hermione olhava ainda pela janela, através da qual era possível ver uma combinação interessante; os flocos de neve, do lado de fora, e o reflexo do fogo da lareira, do lado de dentro.
— Você... — ela começou. — Viu Rony em algum lugar?
— Não. — Harry respondeu. — Deve estar nos evitando... Onde você acha que...
Naquele exato instante, porém, Rony entrou pelo buraco do retrato. Estava muito pálido e tinha neve nos cabelos. Provavelmente não esperara encontrar ninguém, pois quando os viu parou de andar com uma expressão esquisita.
— Rony! — Hermione exclamou, levantando-se apressada e correndo até ele. — Rony, onde você estava?
— Andando — ele murmurou.
Ela puxou-o pelo braço, sentindo a manga úmida das vestes de quadribol.
— Você está congelando, venha sentar aqui!
Tentou levá-lo até o sofá onde estivera sentada com Harry, mas ele mudou o caminho para sentar-se numa poltrona mais afastada. Bichento devia ter perdido o pomo, pois ele voltou a voar pela sala, fazendo um som semelhante ao de um mosquito. Rony não olhava para direção alguma que não fosse a de seus pés.
— Sinto muito — ele murmurou.
— Por quê? — Harry perguntou.
— Por ter pensado que podia jogar quadribol. A primeira coisa que vou fazer amanhã é sair do time.
— Bem, — disse Harry, sem muita paciência — se você fizer isso então só sobrarão três pessoas no time. Fui proibido de jogar quadribol. Fred e Jorge também.
— O quê? — Rony exclamou, finalmente levantando o rosto.
Como Harry não parecia disposto a narrar a história toda outra vez, Hermione ajoelhou-se em frente à cadeira de Rony e disse-lhe tudo. Ao invés de encarar a realidade de que agora só havia ele e mais duas pessoas no time, porém, ele pareceu ainda mais preso a sua culpa. Seu rosto exprimia sofrimento.
— Foi tudo por minha causa... — ele murmurou.
— Não é, — protestou Harry. — você não me fez bater em Malfoy.
“Bater em Malfoy”. Hermione sentiu um arrepio de nojo subindo pela espinha.
— Se eu não fosse tão ruim em quadribol...
— Isso não tem nada a ver...
— A música me deixou nervoso...
— Deixaria qualquer um nervoso.
Hermione decidiu ausentar-se da discussão dos dois. Levantou-se, andou até a janela e observou distraidamente os flocos de neve caindo lentamente, o movimento das árvores, a luz que se acendeu na cabana de Hagrid... E então arregalou os olhos; seria Hagrid ou outra pessoa? Quis chamar os garotos, mas resolveu observar mais um pouco...
— Pare com isso — estava dizendo Harry, agora sem nenhuma paciência. — Já é ruim o suficiente sem você se lamentando!
Havia movimento dentro da cabana, uma sombra se movia pelas janelas. Ansiosa, ela esperava que a pessoa aparecesse para que ela pudesse logo ver que era Filch procurando alguma coisa, ou Grubbly-Plank querendo algum material de Trato das Criaturas Mágicas ou qualquer outra pessoa com qualquer motivo. Era insuportável aquela esperança, tão encoberta pelo medo de logo descobrir que a pessoa que estava ali dentro não era a que queria que estivesse... Não demorou muito, porém, até que Hagrid aparecesse em pessoa para jogar algum líquido no canteiro.
— Nunca me senti tão mal... — dizia Rony, atrás dela.
— Junte-se ao clube, então. — respondeu Harry.
— Bem... — Hermione disse, sua voz saindo tremida de agitação. — Acho que sei de uma coisa que vai animar vocês dois.
— Ah é? — Harry a olhava completamente cético.
Ela alternou o olhar entre aquelas duas caras péssimas antes de anunciar, com seu maior sorriso e uma lágrima pronta para lhe escapar do olho esquerdo:
— Hagrid está de volta.
Harry ficou boquiaberto. Rony alternava o olhar entre Harry e ela, como se quisesse ter certeza de que ouvira certo. Os dois foram para o seu lado olhar pela janela e sorriram ao ver a luz dentro da cabana.
— Tem certeza de que é ele? — Harry perguntou com alguma apreensão. — Quer dizer, pode ser...
— Eu o vi — ela disse sorrindo, enquanto algumas lágrimas desciam sem pressa por suas bochechas.
— Então vamos lá vê-lo, agora! — o tom de Harry foi imperativo; parecia até que queria deixar claro que não aceitaria objeções. Objeções, aliás, que Hermione não faria, pois não havia nada que quisesse mais naquele momento do que ir até aquela cabana. — Vou pegar a capa da invisibilidade.
Harry saiu em disparada pelas escadas. Hermione virou-se para Rony, cujo rosto ainda tinha resquícios de mal estar misturados à expressão causada pela boa surpresa. Ao perceber que ela o observava, ele virou-se levemente, como que para perguntar qual era o problema, a cor voltando a seu rosto pálido.
— Onde você estava? — ela perguntou.
— Já disse, — ele respondeu com maus modos. — andando.
— Por onde?
— Por que você quer saber?
— Talvez porque perdi o dia inteiro procurando por você?
Ele pareceu vacilar por um instante em sua aspereza, mas logo a recuperou.
— Porque quis. — ele disse.
— Sim, eu quis, e quero agora saber onde você estava.
— Não é da sua conta.
Ele se distanciou bruscamente. Ela se ofendeu, como de costume.
— Vá buscar um casaco, ou vai congelar na rua. — ordenou em voz baixa.
— Você não é minha mãe. — retrucou ele energicamente, olhando na direção oposta.
Hermione vasculhou na cabeça alguma ofensa. Pensou em dizer que ele realmente era péssimo em quadribol e não merecia a vaga no time, mas optou pelo silêncio e subiu correndo as escadas para o dormitório feminino. Estava ainda tomada pela raiva, mas lutou para fazer silêncio e não acordar as colegas. Abriu o malão, pegou cachecol, luvas e um dos gorros que tricotara. Ainda sentou por um tempo na cama, pensando, tentando relevar a atitude de Rony.
Quando voltou à sala comunal, Harry e ele já a esperavam também agasalhados, Harry segurando a capa da invisibilidade nas mãos e Rony parecendo mal-humorado, lançando-lhe um olhar feio de impaciência, como se a estivesse repreendendo por ter ido buscar roupas.
— Está frio lá fora! — ela exclamou em resposta.
— Podemos ir? — Harry perguntou, impaciente com a atmosfera de discórdia entre os dois. Hermione assentiu com a cabeça. — Ótimo.
Com o auxílio do mapa do maroto e escondidos sob a capa da invisibilidade, os três deixaram o castelo em direção à cabana de Hagrid. Agora, que estavam muito mais altos, era difícil acomodarem-se sob a capa. Harry liderava o caminho com pressa, enquanto Hermione e Rony tentavam acompanhá-lo acidentadamente, batendo e tropeçando um no outro sem querer. Quando finalmente estavam batendo à porta de madeira da cabana e Harry anunciou que eram eles, Hagrid respondeu:
— Eu devia saber!
Os três se entreolharam sorrindo ao ouvir a voz do amigo. — Acabo de chegar — ele continuou, o barulho de seus passos se aproximando em direção à porta. — Sai, Canino!
A visão que Hermione teve do rosto de Hagrid quando ele apareceu foi totalmente diferente do que esperava; com o susto, gritou.
— Pelas barbas de Merlim, fale baixo! — gritou ele.
Os três entraram na cabana e saíram debaixo da capa.
— Desculpe — Hermione disse, aproximando-se para vê-lo melhor. — Eu só... Ah, Hagrid!
Ela admirou-se de não ter percebido o estado em que ele se encontrava quando o vira pela janela da torre da Grifinória. Ele estava cheio de cortes no rosto e nas mãos, que eram as únicas partes do corpo dele não cobertas pelas roupas, e tinha o olho esquerdo muito roxo e inchado e os cabelos encharcados de sangue.
— Não foi nada — ele se apressou em dizer, tentando parecer displicente e andando até a lareira para pendurar uma chaleira.
— O que foi que aconteceu? — Harry insistiu, mas Hagrid evitou a pergunta novamente.
— Hagrid, você foi atacado! — disse Rony, agora em sua vez de insistir pela resposta.
— Pela última vez; não foi nada!
— Você diria que não foi nada se um de nós aparecesse com um quilo de carne moída no lugar da cara? — Rony retrucou.
— Você devia procurar Madame Pomfrey — Hermione disse, com a voz fraca. — Esses cortes estão muito feios...
— Vou cuidar deles, está bem? — Hagrid andou até a mesa e pegou um pedaço enorme de carne crua esverdeada.
— Não vai comer isso, vai? — Rony perguntou em tom preocupado. — Parece envenenada.
— É assim que deve parecer, é carne de dragão. Eu não trouxe para comer. — Hagrid colocou aquele pedaço enorme e nojento de carne sobre o rosto. — Assim está melhor. Alivia a dor, sabem.
— Não vai nos contar o que aconteceu com você? — tornou a insistir Harry.
— Não posso, é ultraconfidencial.
Hermione puxou pela memória o que sabia a respeito da missão secreta que Hagrid tinha ido cumprir para Dumbledore; sabia apenas que era algo que envolvia gigantes, que podiam ser bem violentos.
— Foram os gigantes — perguntou com cuidado — que espancaram você, Hagrid?
— Gigantes? — espantou-se ele. — Quem contou a vocês?
— Adivinhamos...
— Ah, foi, é? — o tom dele era repreensivo e fez Hermione sentir-se mal.
— Foi meio óbvio — disse Rony, enquanto Harry sacudia a cabeça afirmativamente para confirmar o que o amigo dizia.
— Nunca vi outros garotos para saberem mais do que devem como vocês. E isso não é um elogio! — ele agora servia a água fervente em xícaras. — Abelhudos, intrometidos.
— Então, você foi procurar os gigantes? — Harry perguntou sorrindo.
— Está bem,— Hagrid respondeu de má vontade. — fui.
— E os encontrou? — Hermione quis saber.
— Bem, eles não são difíceis de encontrar, sabem. Bem grandinhos, eles.
— Onde eles ficam? — Rony perguntou.
— Nas montanhas.
— E os trouxas não...?
— Os encontram? Ah, encontram sim. Só que as mortes sempre são divulgadas como acidentes de montanhismo, não são?
— Mas o que você andou fazendo, como foi atacado pelos gigantes? Conte, e então Harry pode contar a você sobre como foi atacado pelos dementadores.
Rony acertou na proposta; Hagrid não soubera sobre o incidente de Harry com os dementadores devido ao longo tempo que passara fora, e por isso aceitou a permuta de informações. Ele narrou a história de sua viagem com Madame Máxime rumo às montanhas dos gigantes. Segundo ele, Dumbledore lhes dera o local exato aonde ir e dicas de como se aproximar dos gigantes de forma que conquistassem sua simpatia.
O objetivo da missão era transmitir-lhes o recado de Dumbledore, garantindo-lhes que o bruxo estaria inteiramente do lado dos gigantes, e convencê-los a se juntarem à luta contra Voldemort e os comensais da morte. No final, a missão não fora bem sucedida; nenhum gigante se convencera a ficar do lado de Dumbledore, e alguns até já estavam entrando em acordo com comensais da morte.
Hermione apertou com mais força a alça de sua xícara, nervosa com a perspectiva da pergunta que estava prestes a fazer.
— Hagrid? — sua voz saiu quase num sussurro. — Você... Ficou sabendo de... Alguma coisa, alguma coisa sobre... Sobre a sua mãe?
Ele a olhou com uma inexpressividade que a assustou mais do que o teria feito uma cara de fúria. — Eu... Esquece... Me desculpe...
— Morta — ele respondeu de repente, ainda com a mesma cara. — Há anos. Me contaram.
— Ah... Eu... Eu lamento muito.
— Não precisa, — disse Hagrid bruscamente, dando de ombros. — Não me lembro muito dela. Não foi uma boa mãe.
Houve um momento de silêncio constrangedor. Hermione olhou para Rony e Harry, esperado que eles pudessem dizer alguma coisa.
— Mas você ainda não explicou como ficou nesse estado — disse Rony.
— Ou por que demorou tanto para voltar — acrescentou Harry. — Sirius disse que Madame Maxime voltou já faz tempo.
— Quem atacou você? — Rony insistiu.
— Não fui atacado! — respondeu Hagrid. — Eu...
Batidas na porta o interromperam e fizeram Hermione derrubar sua caneca, que espatifou-se ao chegar no chão. O vulto por trás da cortina da janela ao lado da porta não deixava dúvidas de que era Dolores Umbridge quem estava ali.
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