Capítulo XXVII
Foi com alívio que ela alcançou a cozinha e dedicou-se ao trabalho de guardar as sobras das pizzas, limpar as superfícies e levitar os pratos e copos até a pia. No entanto, algo a intrigava. Como uma cozinha tão grande podia parecer tão pequena?
Onde quer que limpasse, Harry estava atrás dela, provocando seus sentidos com uma presença máscula e imponente.
- Pode me dizer a verdade enquanto Rony e Bryan estão fora. – ele disse, despejando detergente na pia cheia de água morna.
- Verdade? – Hermione repetiu curiosa.
- Minha pizza foi a melhor. – As sombras que antes dominavam seus olhos haviam desaparecido, deixando em seu lugar a confiança, o leve toque arrogante que ela sempre considerara tão atraente. Hermione riu.
- Para ser bem honesta, todas tinham o mesmo sabor. Por outro lado, devo admitir que a sua foi a mais… organizada. Podia dizer quem havia preparado cada uma das pizzas apenas olhando para elas. A de Bryan estava coberta com seu sabor preferido: pimentão. A de Rony era uma mistura confusa de ingredientes, e a sua era o retrato de um empreendedor organizado e metódico.
Harry riu, provocando uma nova onda de calor que a tomou de assalto.
- O que comprou como prêmio para o vencedor?
- Um bolo de abóbora com sorvete. Assim, todos poderiam compartilhar dos louros da vitória.
- Boa idéia. Quando terminarmos de limpar toda esta bagunça acho que merecemos um pedaço desse bolo.
- Tem razão. – Talvez o sorvete pudesse baixar a temperatura de seu corpo e interromper o fluxo de pensamentos impróprios envolvendo a figura do ex-melhor amigo.
Por alguns momentos trabalharam em silêncio. Era difícil adivinhar se ele também sentia as centelhas de eletricidade que a sacudiam a cada contato casual. Não era o que parecia. Na verdade, Harry se mostrava distante, e ela sentiu um enorme desejo de poder penetrar em seus pensamentos.
- Alguma vez pensou que estivesse fazendo demais por Bryan?
- É claro que sim. Penso que estou fazendo muito. Depois penso que estou fazendo pouco. Quer um pedaço do bolo?
- É claro que sim.
- Por que perguntou sobre Bryan? Acha que faço demais por ele?
- Não, de jeito nenhum. Você é uma ótima mãe. É que às vezes penso que não fiz o suficiente, ou que fiz mais do que devia por Rony. Ela sorriu.
- E também se preocupa por ter sido duro demais, ou excessivamente brando. E por ter passado muito tempo com ele, ou pouco. É normal.
Harry assentiu e cortou um pedaço do bolo.
- Estava apenas imaginando se você e eu não colaboramos para que Rony fosse imaturo e irresponsável.
O que quer dizer? – Ele não podia culpá-la pelos problemas de Rony. Havia se casado com um menino… que permanecera um garoto, apesar de todos os anos de convivência.
- Relaxe. Não pretendo julgá-la como esposa. Só estava dizendo que nós dois sofremos da mesma condição.
- Qual?
- Uma auto-suficiência que acaba afetando de maneira negativa a todos que nos cercam. Durante todo o tempo que passou casado com Rony, nunca pediu minha ajuda para nada. Quando ele esquecia de pagar alguma conta ou qualquer coisa, você resolvia o problema sozinha. Enfrentou um milhão de crises distintas sem nunca ter pedido auxílio.
- Teria cortado meu braço antes de pedir sua ajuda.
- Por quê?
- Sabia que não aprovava o nosso casamento, que nos considerava jovens demais… e também sabia que não me aprovava como esposa pra ele. Além do mais, a responsabilidade não era sua. Sempre tive o hábito de resolver meus problemas sozinha.
Hermione olhou para o pedaço de bolo em seu prato, incapaz de revelar o verdadeiro motivo pelo qual nunca havia solicitado sua ajuda. Não conseguira superar o temor de descobrir que se casara com o amigo errado, caso ele corresse em seu auxílio.
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