Natal
Capítulo IV
So what if i´m a baby bird
Hanging upon your every word?
Quando Bellatrix abriu os olhos, a primeira coisa que viu foi outro par de olhos, estes castanhos, em contraste com os seus cinzentos, a lhe encarar.
Não foi capaz de reconhecer o dono dos olhos, porque sua cabeça doía demais para que fosse capaz de erguer a cabeça e olhar.
Tentou pegar neles, mas encontrou sua mão direita enfaixada até o pulso, e o peso das compressas forçava seu braço fraco para baixo.
Então fechou os olhos novamente, desejando aparecer em outro lugar muito distante, outro país, talvez, para que não tivesse de lidar com a vergonha que as memórias frescas de seu último ato perante o Lorde das Trevas trazia à sua mente.
Ainda meio inconsciente, gemeu baixinho de desgosto.
Em resposta, recebeu uma risada baixinha e fria, que pôde reconhecer imediatamente, mas não soube como reagir; se ria ou se chorava, ou ainda, se tornava a enterrar o rosto no travesseiro e fingia não ter visto nem ouvido nada.
“Você nunca foi muito boa da cabeça, Bellatrix.” – Disse o Lorde das Trevas, divertido.
“Mestre...” – Ela choramingou, mas Voldemort aproximou um dedo de seus lábios e a impediu de completar a frase.
“É melhor ficar calada, minha cara. Só Merlin sabe que tipo de besteira você poderia dizer nesse estado.”
Ele abriu um novo sorriso e com isso, se distanciou, permitindo que ela identificasse onde se encontrava.
Com um repentino assomo de choque e espanto, Bellatrix percebeu que estava na cama dele.
“Peço desculpas por tê-la mantido aqui.” – Ele falou, parecendo ler seus pensamentos – “Mas você perderia muito sangue se eu tivesse de leva-la até seu quarto no terceiro andar.”
Ele parou por um instante para analisa-la, lançando um olhar calculista que fez Bella se arrepiar toda. Por que tinha sempre a impressão de que ele escondia um segredo muito profundo?
Bem, certamente o Lorde das Trevas era cheio de seus próprios segredos escabrosos, mas não com ela, sua mais fiel e competente serva...
E sem dizer mais nada, Voldemort saiu, deixando Bellatrix sozinha no quarto.
E Bella não conseguia pensar. Simplesmente não sabia o que fazer. Estava no quarto dele, na cama dele, envolta nos lençóis dele, e...
Riu baixinho, pensando na sorte que era estar ali, em como qualquer Comensal daria tudo para estar em seu lugar...
E abraçou o travesseiro com força, inspirando profundamente. Aquilo era com certeza melhor do que qualquer noite que tivesse passado com Rodolfo, embora estivesse sozinha e tudo o que pudesse ver fossem estrelinhas brilhantes que estouravam diante de seus olhos apertados firmemente, tentando reter na memória cada mínimo detalhe daquele momento de sublime satisfação...
Mas o que Bellatrix não sabia é que o Lorde das Trevas não a havia mantido em seu quarto para evitar uma hemorragia.
Tomado por ondas de choque cada vez maiores, Lord Voldemort sentia a pouca cor em seu rosto sumindo pouco a pouco, enquanto observava sua Comensal rindo bobamente enquanto abraçava seu travesseiro como quem abraçaria o corpo de um amante.
“Mas que grande merda!”
Suas suspeitas estavam se revelando corretas...
[...]
“Malfoy falhou miseravelmente.” – Disse Rabicho sem emoção – “Podmore resistiu à Maldição Imperius e agora está internado no St.Mungus sem nem ao menos lembrar do próprio nome.”
“Bem, isso pode ser um problema.” – Respondeu Voldemort, estreitando os olhos castanhos que, tomados de fúria, tornavam-se vermelhos. – “Realmente preciso ter uma conversinha com o Lúcio. E em falar nisso, você sabe do Snape? Achei que ele fosse sair do castelo durante as férias... Talvez vá passar o natal com Dumbledore onde quer que fique a sede da Ordem.”
“O velho Snape? Não, não, não creio que ele seja capaz de conviver com outros seres humanos durante mais de uma hora, senhor.”
“Não, creio que não” – comentou Voldemort, divertido – “De qualquer maneira, ando sentindo falta de relatórios regulares sobre as atividades da Ordem da Fênix, que vêm se provando tão útil aos meus planos...”
Mas uma rajada de vento entrou na sala de repente, fazendo voar uma pilha de pergaminhos.
Voldemort e Rabicho se viraram para ver quem acabara de entrar.
“Com licença, senhor...” – Anunciou Bellatrix; a voz carregada de desprezo – “Alguém que insiste em vê-lo.”
“Pode deixar, Bellatrix” – Disse Snape. A voz dele, por sua vez, era de puro deboche.
“Falando no diabo...” – Rabicho revirou os olhos.
Snape se aproximou, lançando um olhar de nojo para o ex-colega e abaixou a cabeça numa reverência. Depois ergueu-se e começou seu relatório:
“Bem, o senhor deve saber que Arthur Weasley foi atacado pela cobra.” – Voldemort assentiu – “Mas ele sobreviveu, e agora estão mais alertas do que nunca, guardando a profecia como uns cães de caça.”
Snape de repente levantou a cabeça, encarando seu Mestre face a face.
Os pensamentos de seu espião passaram todos diante de seus olhos, e Voldemort verificou-os um a um.
Confiava em Snape, na medida em que podia, mas era de sua natureza jamais confiar cegamente em pessoa alguma...
“Fui destacado para ensinar Oclumência a Potter.”
“Oclumência? Para quê?”
“Potter anda tendo vislumbres de sua mente, Senhor. Ele pode senti-lo quando o senhor é tomado por emoções muito fortes. Pode acessar sua mente durante o sono, e sonhar com as coisas que o senhor vê. Foi assim que pôde alertar a Ordem da Fênix sobre o ataque ao Weasley.”
“Mas sendo assim, por que Dumbledore iria querer acabar com as visões do Potter? Elas têm sido bastante úteis, afinal...”
Snape meramente crispou os lábios finos num sorriso de desdém.
“Dumbledore se preocupa, antes de tudo, com o bem estar de Potter...”
Foi a vez de Voldemort sorrir. Era exatamente por isso que desprezava tanto o amor, em todas as suas formas...
Pessoas faziam as maiores estupidezes quando amavam...
“Muito bem, Snape. Pode ir. Você tem a gratidão do Lorde das Trevas.”
“Obrigado, senhor.”
[...]
Bellatrix sentiu vontade de voltar a deitar naquela imensa e confortável cama em que passara boa parte da manhã. Na verdade, se não fosse por Snape ter aparecido na casa, teria passado o dia todo no quarto, ainda que tivesse de mutilar a outra mão.
Mas o maldito morcegão crescido batera na porta do quarto, como se soubesse exatamente onde ela estava – talvez Rabicho tivesse lhe contado – e clamara por auxílio em sua “dificílima” missão de descobrir onde o Lorde das Trevas se encontrava.
Como se ele pudesse estar em outro lugar senão o escritório no sótão...
Mas ela pôde ver que Snape se divertia imensamente em atazana-la. Aliás, a missão da vida de Snape parecia ser encher o saco do maior número de pessoas no menor intervalo de tempo possível.
“Bellatrix…” – Ele sussurrou; os olhos negros estreitando e cintilando – “Você por aqui?”
“Que é que você quer, Snape?” – Rosnou.
“Apenas saber onde eu poderia encontrar o Lorde das Trevas. Tenho um relatório muito importante para apresentar. Mas, naturalmente...” – Seus olhos brilharam e os lábios finos se curvaram num sorriso de puro desdém malicioso – “Se você estiver ocupada, posso voltar mais tarde...”
“Cuide da sua vida, Snape!” – Como se ela não soubesse que ele estava fazendo aquilo pura e simplesmente pelo prazer de atormenta-la!
“Eu estou cuidando da minha vida, Bellatrix, eu estou... Agora, você poderia fazer a gentileza de me ajudar? Ou será que está esperando café na cama?”
Ela teve de se segurar muito para não dar na cara dele.
Então, profundamente contrariada, Bellatrix tomou o caminho das escadas para o sótão, e mesmo indo na frente, podia sentir as ondas de escárnio vindos de Snape.
Então anunciou a chegada do colega:
“Com licença, senhor...” – Anunciou Bellatrix; a voz carregada de desprezo – “Alguém que insiste em vê-lo.”
E fechou a porta. Não agüentaria ficar mais nem um segundo respirando o mesmo ar que ele.
Mas o relatório de Snape era realmente curto, ou não era tão importante quanto ele dizia ser – o que confirmava sua teoria de que o morcego crescido estava simplesmente a fim de tirar uma com a sua cara. Dez minutos depois, Snape saiu da sala, e, encarando Bellatrix, disse baixinho:
“A julgar pela sua cara quando saiu do quarto, sua noite deve ter sido realmente divertida, Bellatrix. Ou isso, ou você perdeu seu último parafuso.” – E aparatou.
Ai, o ódio!
[...]
Bellatrix encarava a grande e velha árvore de natal da sala.
Por que diabos havia uma árvore de natal naquela casa, se as três pessoas que moravam ali eram a personificação de tudo que contrariava o famigerado espírito natalino?
Ainda assim, Rabicho, confirmando a máxima de que a falta do que fazer leva muita gente à loucura, agora pendurava bolas vermelhas nos ramos.
“Para que serve sua varinha, se não consegue sequer colar uma maldita estrela no topo de uma maldita árvore de natal?”
Rabicho corou profundamente e, apanhando sua varinha, fez uma dúzia de enfeites natalinos saírem voando e se chocarem contra a árvore. Rindo alto, Bellatrix deixou Rabicho catando os objetos do chão, e voltou para o quarto, esperando encontrar alguma coisa mais útil para fazer, avaliando que se as coisas continuassem daquele jeito, logo estaria assando biscoitos em forma de bonequinhos e preparando a ceia de natal.
E pensando bem, aquela idéia não era de toda ruim. Se ao menos tivessem um elfo doméstico por ali...
Suspirou, pensando se deveria voltar à sua própria casa onde certamente estaria mais confortável, e se perguntando por que ainda não havia feito isso.
Depois se lembrou do porquê, e avaliou a idéia de nunca mais tornar a olhar para Rodolfo como uma idéia decididamente tentadora...
Rumou para seu quarto – seu próprio quarto – e pegou aleatoriamente um dos livros na estante.
“Romeu e Julieta.” – irritada, atirou o livro para o lado. Puxou outro da estante:
“Orfeu e Eurídice” - decididamente, sorte não era seu negócio... Puxou mais um:
“Lolita”
“Crime e castigo”
E com um rugido de fúria, atirou um dos livros na lareira.
Será que até os livros conspiravam contra ela?
“Por que você atirou um ‘Romeu e Julieta’ em mim, Bella?” – Perguntou a cabeça de Narcisa Malfoy que acabara de surgir no fogo.
“NARCISA!” – Exclamou Bellatrix, abaixando-se para olhar a irmã – “Você está bem?”
“Escute, Bella...” – Começou Narcisa. Falava como se estivesse prestes a contar uma fofoca particularmente quente – “Você não vai acreditar no que aconteceu...”
“O quê?!”
“O Monstro apareceu lá em casa!”
“O Monstro...? Mas ele não é o...?”
“Elfo da casa dos Black, sim!” – Exclamou Narcisa, excitada – “Sirius mandou que ele fosse embora, e bem, ele foi embora de verdade! Apareceu aqui em casa, e bem, achei que ele pudesse ser realmente útil...”
“Útil, o Monstro? Em quê?”
“Aí é que vem a melhor parte... Ele diz que não pode revelar onde fica a sede da Ordem da Fênix, porque não é o fiel do segredo, mas pode dizer onde Sirius está, e que Sirius está na sede da Ordem da Fênix, e que Sirius está...”
“Grimmauld Place!”
“Isso!” – Disse Narcisa, abrindo um imenso sorriso, mostrando todos os seus dentes brancos e brilhantes.
Sorriso este que Bellatrix não chegou a ver, porque já estava correndo em direção ao sótão, derrapando nos degraus, e finalmente, irrompeu dentro da sala.
“Mestre... A Ordem da Fênix, ela...”
“O que?!” – Exclamou Voldemort, asustado.
“A Ordem da Fênix fica em... fica em...” – Mas sua boca parecia ter travado. – “Mestre, o Elfo que trabalha na Mansão Black fugiu. E... Ele diz que Sirius Black está na sede da Ordem da Fênix. E que Sirius Black está em Grimmauld Place, número doze.”
Bella viu os olhos castanhos lentamente tornarem-se vermelhos, conforme Voldemort abria um sorriso maldoso.
“Naturalmente, não poderíamos ir à Sede sem ouvirmos o segredo da boca do fiel, mas essa informação já é por si muito valiosa. Traga o elfo aqui.”
Bellatrix voltou minutos depois com Monstro a seus calcanhares, resmungando ofensas inaudíveis ao dono. O elfo prestou uma profunda reverência, e em seguida caiu prostrado diante de Voldemort.
“Diga-me, elfo: O que você sabe sobre a Ordem da Fênix?”
“Meu senhor deve perdoar Monstro, mas Monstro foi proibido de falar qualquer coisa sobre a Ordem, senhor...”
Voldemort bufou irritado, e já ia expulsando o elfo de sua sala, quando este o interrompeu:
“Mas Monstro sabe de coisas importantes, senhor, coisas que Monstro não foi proibido de contar...”
Até Rabicho tinha parado á porta para escutar o que Monstro estava dizendo...
“...os melhores amigos de Harry Potter são um traidorzinho do sangue, Ronald Weasley, e uma sangue-ruim chamada de Mione Granger, senhor. E ainda...” – O elfo ofegou, nervoso – “A pessoa com quem Sirius Black mais se importa é Harry Potter senhor. Ele estaria disposto a fazer qualquer coisa pelo pirralho Potter. E o pirralho Potter, por ele.”
“Você disse qualquer coisa?”
“Qualquer coisa, senhor.”
Voldemort sorriu novamente. Bellatrix quase podia ver as engrenagens de seu cérebro funcionando a todo vapor por debaixo dos cabelos negros.
“Pode ir, elfo. Você foi muito útil.”
Monstro prestou uma última reverência e foi embora parecendo muito cheio de si.
“E então, mestre?” - perguntou Bella, insegura.
“Bem, isso facilita as coisas. Mas não é sobre isso que eu queria falar com você...” – O Lorde das Trevas parou diante dela, muito sério.
“O senhor quer saber porque eu cortei a mão?” – arriscou Bella
“Não.”
Voldemort virou a cara, e foi a primeira vez em muitos anos que Bellatrix o viu fazer isso. Não lhe pareceu um bom sinal.
“Eu quero saber o que você sente por mim.”
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