Fuga à Meia-Noite



— CAPÍTULO DEZ —
Fuga à Meia-Noite




Hermione, Rony e Harry tomavam o café da manhã no Salão Principal no momento em que dezenas de corujas fizeram sua entrada habitual para a entrega de correspondências. Hermione depositava uma moeda na bolsinha de couro amarrada à pata da coruja que lhe entregara o Profeta Diário quando Harry mostrou a ela e a Rony, sentado ao lado dela, um bilhete que acabara de receber. Nos garranchos inconfundíveis de Hagrid, apenas duas palavras:

“Está furando.”

O que se seguiu a esse fato, ao longo do caminho até as estufas onde teriam aula de Herbologia, foi uma longa discussão entre Hermione e Rony. Ela não considerava de maneira nenhuma a idéia dele de faltar à aula para visitar Hagrid.
— Pense bem, Mione. Quando teremos outra chance de ver um dragão nascendo?
— Podemos ir mais tarde, Rony.
— Mas ele disse que o ovo já está furando!
— Mas...
— Calem a boca — interrompeu Harry, até então neutro. Draco Malfoy estava parado perto deles, prestando atenção na conversa. Os três se entreolharam, imaginando o que exatamente Malfoy teria escutado. Hermione puxou Rony pelo braço, acelerando o passo. O ato pareceu assustá-lo, mas ela ignorou e disse:
— No intervalo, depois de Herbologia.
— Mas, Mione...
— Está decidido.
Talvez o motivo fosse a tensão instaurada por Malfoy, mas Rony não argumentou mais e acatou a decisão de Hermione.
Tão logo a aula acabou, os três correram em disparada para a cabana de Hagrid. Ele, excitado, recebeu-os alegremente e fechou a porta depois de fazê-los entrar.
Em cima da mesa, o ovo se remexia fazendo um barulho esquisito. Os quatro sentaram-se ao redor, observando. Hagrid falava sem parar, incapaz de se conter.
— É um dragão norueguês, andei lendo sobre eles e acho que estou preparado, espero ser uma boa mãe para ele...
Não demorou muito e o ovo quebrou, revelando uma criatura preta e molenga, com asas enormes se comparadas ao corpo. Hermione achou-o tão feio que chegou a esquecer o receio de estar a meio metro de um dragão.
— Ele não é lindo? — disse Hagrid, à beira das lágrimas. — nisso o dragão tentou morder seus dedos e ele se emocionou ainda mais. — Vejam, ele reconhece a mamãe!
— Com que rapidez um dragão norueguês cresce, Hagrid? — Hermione perguntou, receosa.
Quando Hagrid ia responder, seu olhar se voltou para a janela e ele ficou pálido. Levantou-se dizendo:
— Alguém...
Harry precipitou-se para fora da cabana e voltou logo em seguida, com uma expressão de desgosto.
— Malfoy... — disse.
Draco Malfoy acabara de ver um dragão ilegal nascendo dentro da cabana do guarda-caça de Hogwarts.


Na semana seguinte, Hermione, Harry e Rony fizeram visitas regulares à casa de Hagrid, que decidira chamar o dragão de Norberto, e estava tão ocupado cuidando dele que já nem cumpria mais seus deveres como guarda-caça. Os três, preocupados por causa de Malfoy, tentaram convencê-lo a soltar o dragão, argumentando como podiam.
— Deixe-o ir, a natureza dele é selvagem. — disse Rony.
— Malfoy pode procurar Dumbledore a qualquer momento. — disse Hermione.
— E ele já está o triplo do tamanho em apenas uma semana! — disse Harry.
— Sei que não poderei ficar com ele para sempre, mas ele ainda é muito pequeno para ser solto... Não posso fazer isso com ele. Ele não sobreviveria sozinho...
Nesse momento, Norberto arrancou com violência a cabeça de uma galinha viva, e Hermione sentiu um arrepio na espinha. Provavelmente ele não teria problemas para sobreviver, ela imaginou.
Foi então que Harry teve uma idéia brilhante.
— Carlinhos — disse ele, olhando para Rony. — Seu irmão, Rony, ele não estuda dragões na Romênia? Ele pode cuidar de Norberto até ele ficar grande o suficiente para voltar para a natureza!
A idéia era tão perfeita que Hagrid foi obrigado a concordar, diante do perigo de continuar mantendo o dragão dentro de sua casa. E isso causou nele uma choradeira interminável. Hermione abraçou-o, embora seus braços não alcançassem nem mesmo as laterais do corpo dele.

Naquela noite Rony enviou por Edwiges uma carta para Carlinhos, e ficaram a aguardar a resposta durante a semana seguinte. Ela chegou em uma noite em que Hermione e Harry estavam sentados sozinhos na sala comunal, esperando Rony voltar. Ele fora ajudar Hagrid a alimentar Norberto, usando a capa da invisibilidade de Harry.
Hermione, aflita, apertava as mãos uma na outra, temendo que Rony fosse pego fora da torre à noite. Quando ele se materializou ao tirar a capa, já do lado de dentro da sala, uma onda de alívio invadiu-a. Ele não estava exatamente bem, no entanto.
— Norberto me mordeu, e Hagrid brigou comigo por irritá-lo.
Sua mão estava enrolada em um pano ensangüentado. Hermione correu para pegar algo com que fazer um curativo, e quando viu o ferimento disse:
— Tudo bem, você é irritante. Mas não é para tanto...
Inacreditavelmente, Rony sorriu. Hermione, por sua vez, corou.
Uma batida à janela denunciou a chegada de Edwiges. Em sua resposta, Carlinhos concordava em ficar com Norberto, e marcava um encontro entre uns amigos que iam visitá-lo e os três, na torre mais alta do castelo. Nessa ocasião, marcada para o sábado seguinte à meia-noite, eles entregariam Norberto e esses amigos o levariam até Carlinhos.
A mordida na mão de Rony piorou muito. Além da dor, a mão inchara e ficara esverdeada. Apesar do medo de que Madame Pomfrey descobrisse de que era aquela mordida, não houve alternativa senão levar Rony à ala hospitalar.
Hermione passou o dia aflita, e depois do fim das aulas foi com Harry visitá-lo.
— Como está? — perguntou ela, correndo para o lado da cama onde Rony estava deitado. Ele pareceu gostar da atenção e fez uma cara de dor profunda.
— Péssimo... A dor começa a se espalhar pelo braço e em breve estará pelo corpo todo...
— Meu Deus! — Hermione apertou os olhos e mordeu o lábio. Rony, como que se lembrando de algo muito importante, esqueceu que exagerava em seu péssimo estado e sentou-se repentinamente.
— Malfoy esteve aqui para rir de mim e me ameaçar de contar a todos o que foi que me mordeu. Como desculpa para Madame Pomfrey, disse que queria um livro emprestado. — e então ele abriu a boca, numa expressão de pânico. — Oh não, oh não! A carta de Carlinhos estava dentro do livro que ele levou!


Mesmo que Malfoy agora soubesse do plano, ele não foi cancelado. Era tarde demais para mandar outra coruja a Carlinhos, e Norberto crescia exageradamente, dando a impressão que estouraria a cabana se ficasse um dia a mais.
— Temos a capa da invisibilidade — disse Harry. — Disso, Malfoy não sabe.
No sábado, então, Harry e Hermione entraram juntos debaixo da capa e saíram da torre da Grifinória, sorrateiros, com destino à cabana de Hagrid. Lá, pegaram a caixa em que um choroso Hagrid tinha posto Norberto. A despedida foi um pouco mais longa do que o necessário, Hermione pensou. Não podiam demorar, já estavam correndo riscos demais... Assim que Hagrid liberou-os, eles voltaram ainda cobertos e cobrindo também a caixa com a capa.
Era difícil carregar aquela caixa, por ser pesada e se remexer muito, mas o medo que Hermione e Harry sentiam de que algo desse errado os anestesiava completamente conforme eles subiam correndo as intermináveis escadas. No meio do caminho depararam-se com uma cena que os tranqüilizou quase que completamente: a profa. Minerva McGonagall arrastava Draco Malfoy pelo corredor.
— Ficará detido — dizia. — Como se atreve a andar pela escola a essa hora?
— A senhora não entende... Harry Potter também está fora da cama agora, e ele carrega consigo um dragão ilegal!
— Isso é ridículo, Malfoy! Conversarei com o prof. Snape sobre você.
O resto do caminho foi mais tranqüilo para Hermione e Harry. Ficaram na torre mais alta esperando, e logo um grupo de vassouras se aproximou. Sem muita demora, todos se cumprimentaram, Hermione e Harry agradeceram a ajuda e entregaram Norberto. Quando o grupo desapareceu no céu, os dois puderam respirar aliviados. Desceram felizes com o sucesso do plano, mas não por muito tempo. Filch estava em um patamar de escada e disse, quando os viu:
— Estamos encrencados...
A capa da invisibilidade ficara esquecida no alto da torre.


Filch conduziu Hermione e Harry até a sala da profa. McGonagall, caminho esse que pareceu a Hermione o mais longo que ela já percorrera. Só pela burrice de terem esquecido a capa da invisibilidade na torre já mereciam a expulsão. Se ela fosse pensar em todas as regras da escola que haviam desrespeitado, então...
Hermione sentiu uma imensa vontade de chorar, mas segurou-se; achava que não merecia sentir-se vítima daquela situação. Cometera um erro e cometera outro ainda mais grave ao se deixar ser descoberta. Era obrigada agora a arcar com as conseqüências, fossem elas quais fossem.
Era impossível, no entanto, refutar a idéia terrível de que estava a poucos passos de deixar Hogwarts para sempre. Pensou em Harry, para ele a expulsão seria ainda pior; ela ainda tinha seus pais para quem voltar. Ele tinha apenas os tios, que o desprezavam. A vontade de chorar voltou aterradora, mas novamente ela se conteve.
Chegando finalmente à sala, Filch fez os dois sentarem-se para esperar a professora, e se retirou. Hermione e Harry não trocaram nenhuma palavra ou mesmo olhar. Era óbvio, porém, que as cabeças de ambos estavam na torre da astronomia, revivendo toda a cena, sem o esquecimento da capa da invisibilidade desta vez. Teriam passado ilesos por Filch e ele ficaria ali, à espera de alunos infratores para punir. E iria deitar-se, depois, completamente frustrado.
Minerva McGonagall entrou, causando em Hermione uma tremedeira incontrolável. Ela trazia consigo Neville Longbottom. Conforme ele contou depois, saíra da torre para procurá-los quando ouviu os boatos espalhados por Malfoy.
A professora tremia de raiva. Ressentida, declarou que nunca antes sentira tanta vergonha de alunos da Grifinória — e tirou da casa cento e cinqüenta pontos, cinqüenta para cada um dos três. Com o desfalque de pontos, Grifinória não só perdia a liderança do Campeonato das Casas conquistada com a última vitória no quadribol, como postava-se no último lugar da classificação. Ainda por cima, os três receberiam detenções.

Hermione e Harry foram buscar Rony na ala hospitalar, no dia seguinte. Recuperado, ele já podia voltar às aulas e ao convívio da escola. Foi bom tê-lo de volta, pois o resto da escola não se dirigia a eles. Os colegas de Grifinória não aceitavam os pontos que tinham perdido. E os das outras casas tampouco, pois queriam ver Sonserina perder depois de uma longa série de vitórias consecutivas.
— Não é tão mau assim. — disse Rony tentando consolar os amigos. — Fred e Jorge sempre perdem muitos pontos para a Grifinória e todos continuam a gostar deles.
— Mas eles nunca perderam cento e cinqüenta pontos de uma só vez, não é? — perguntou um Harry desanimado. Rony foi obrigado a admitir.
— É verdade.
Hermione não se importava com o desprezo dos colegas, mas sentia um peso enorme na consciência, na mesma medida em que sentira orgulho todas as vezes que ganhara pontos para a casa com suas respostas precisas aos professores. Sentia muita vergonha de todos eles, e não mais se sentia digna de levantar a mão para responder às perguntas que faziam. Trabalhava agora sempre em silêncio.
Vendo seu sofrimento, Rony até se tornara mais gentil e cuidadoso com ela. Quando alguém dizia algo contra ela devido ao incidente, ele a defendia.
— Deixe-os para lá, Mione — ele dizia, para acalmá-la.
No café da manhã de sexta-feira, Hermione, Harry e Neville receberam bilhetes iguais, que diziam: “Sua detenção será hoje à noite. Encontre o Sr. Filch no saguão de entrada às 23h”. Hermione não reclamou. Achava que merecia a punição.

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