O Frasco de Fogo
O Frasco de Fogo
Entrou novembro, a temperatura despencou e a neve cobriu as terras de Hogwarts. Não houve um decreto, ou anúncio; simplesmente da noite do dia das bruxas em diante, Harry e Rony se tornaram amigos de Hermione. Contudo, mesmo que os três tivessem passado a andar sempre juntos, Rony ainda parecia incomodado com a presença da nova amiga. Hermione, por sua vez, ficava na defensiva; e o resultado eram freqüentes discussões entre os dois.
— Você não pára de ler nem enquanto come? — cutucou Rony, certo dia no café da manhã, quando Hermione ignorava seu prato de salsichas, completamente absorta na leitura de um livro. Aborrecida, ela levantou os olhos apenas o suficiente para encará-lo e respondeu, com simplicidade:
— Nem todos precisam abastecer mais o estômago do que o cérebro, Ronald.
Harry tinha sido escolhido como apanhador do time de quadribol da Grifinória, e se aproximava o início do campeonato. O primeiro jogo seria contra Sonserina. Como Hermione não dominava praticamente nada do esporte, pegou na biblioteca o livro Quadribol através dos séculos, e depois de ler emprestou a Harry que, criado com trouxas, estava apenas descobrindo o mundo da magia, como ela. Rony, vindo de família bruxa, era absolutamente fanático por quadribol, e podia dizer a escalação de times inteiros.
Os outros jogadores do time da Grifinória eram todos mais velhos, inclusive os gêmeos Jorge e Fred Weasley, irmãos de Rony. Hermione gostou deles quando os conheceu, mas ouviu dizer que eles eram quebradores de regras praticamente profissionais em Hogwarts. Hermione ainda soube que Rony tinha, além dos gêmeos e de Percy, monitor da Grifinória, outros três irmãos: Gui e Carlinhos, que já tinham se formado, e Gina, que entraria na escola no ano seguinte.
Hermione, Harry e Rony costumavam fazer os deveres à noite, na sala comunal, e era Hermione quem verificava as respostas dos amigos para ver se estavam corretas. Não deixava que copiassem dela, no entanto.
— Como é que vocês vão aprender? — dizia.
No tempo livre, Rony demonstrava enorme talento no xadrez de bruxo, vencendo sempre Hermione ou Harry. O jogo era praticamente igual ao dos trouxas que Hermione conhecia, com exceção de que neste as peças batiam umas nas outras. Era uma sensação ótima ter dois amigos como eles, passando praticamente o tempo todo junto com ela. Na escola de trouxas não tivera amigos, e nem nos arredores de onde morava.
Hermione mandou uma coruja aos pais, como de costume, contando-lhes sobre como estava, e citou os meninos. “Eles estão sendo uma ótima companhia para mim aqui na escola, embora nem sempre me acompanhem à biblioteca, só porque acham que eu vou demais lá”, dizia o trecho.
Na véspera da primeira partida de quadribol, Hermione, Rony e Harry sentaram-se nos arredores do lago, que estava congelado devido ao frio. Hermione fez aparecer um fogo azulado para aquecê-los, que podia depois ser guardado em um frasco de geléia. O prof. Snape passava perto e se aproximou deles. Hermione notou que ele mancava.
— O que estão fazendo aí?
— Nada, professor — ela apressou-se em dizer. Snape ignorou-a e se dirigiu a Harry.
— O que tem aí, Potter?
— Um livro...
— Me dê, agora.
Contrariado, Harry entregou ao professor o Quadribol através dos séculos que Hermione lhe emprestara. — É proibido levar os livros da biblioteca para fora da escola.
Assim que Snape se retirou, Hermione disse:
— É incrível como ele não gosta de você, Harry! Essa regra que ele disse não existe, ele acabou de inventar!
À noite, na sala comunal, Harry contou a Rony e Hermione que se sentia muito ansioso por causa do jogo na manhã seguinte, e que sentia falta do livro que Snape confiscara.
— Estaria me distraindo, pelo menos.
— Harry — disse Hermione — se você quiser outro livro, eu tenho muitos e...
— É lógico que você tem, Hermione — interrompeu Rony, ríspido. — Harry sabe muito bem disso, então fique tranqüila que ele lhe pedirá outro livro se quiser outro livro.
— Eu não estava falando com você, Ronald.
— Por favor, parem com isso! — pediu Harry. — Vou até a sala dos professores pedir o livro de volta.
Hermione teve a impressão de que Harry queria apenas retirar-se do clima pesado que ela e Rony tinham gerado, mais uma vez. Quando se viram sozinhos, ela disse a Rony:
— Você poderia ser um pouco menos desagradável, de vez em quando. Não vê que Harry está nervoso? Eu só estava tentando ajudá-lo!
Rony pareceu constranger-se. Hermione perguntava-se qual era a necessidade que ele tinha de lembrá-la o tempo todo o quanto sua presença o incomodava. Ao pensar nisso, sentiu os olhos começarem a marejar. Seu estúpido!, pensou. Ainda esperou um pouco que ele dissesse alguma coisa, mas sabia que não ouviria um pedido de desculpas.
— Hermione — começou ele. Ela encarou-o, apreensiva. — Por favor me alcance a minha mochila? Está em cima da mesa.
Ela pegou a mochila e atirou-a no colo de Rony bruscamente. Sentou-se em uma poltrona mais longe dele, lendo, e os dois permaneceram em silêncio até Harry voltar. E ele entrou pelo retrato da Mulher Gorda sem o livro — mas com as bochechas escarlates de excitação.
— Vocês não podem imaginar o que eu vi!
— O que foi, Harry? — perguntou Hermione, ansiosa.
— Eu vi Filch fazendo um curativo na perna de Snape! Era um corte horrível, era por isso que ele estava mancando! Nós o vimos no dia das bruxas, perto do banheiro das meninas, quando estávamos voltando para avisar você.
— No dia das bruxas? Mas o que isso tem a ver?
— É óbvio que ele soltou o trasgo para distrair a todos enquanto ele tentava ultrapassar o cachorro de três cabeças, para roubar o que ele guarda!
— Será, Harry? Mas... Acho que Snape não faria isso, ele é um professor!
— Francamente, Hermione, você pensa que os professores são santos ou coisa parecida! — pronunciou-se Rony pela primeira vez.
Hermione fechou a cara, mas pôs-se a pensar seriamente nas suspeitas de Harry.
No café da manhã do dia seguinte, Hermione tentou convencer Harry a comer alguma coisa antes do jogo, mas ele se dizia sem fome e nervoso demais para comer. Separou-se dela e de Rony para se juntar ao time, e o jogo começaria às onze da manhã.
Mais tarde, quando Hermione e Rony se dirigiam juntos para o campo de quadribol, encontraram Draco Malfoy e seus inseparáveis amigos enormes, Crabbe e Goyle.
— Weasley! — disse Malfoy. — Eu sempre soube o quanto você era pobre e decadente, mas não sabia que era também mal-relacionado!
Estavam todos parados. Rony e Malfoy se encaravam ferozmente, e Hermione olhava de um para o outro e para os amigos de Draco, atentos a qualquer movimento ameaçador de Rony. — Andando por aí com uma... Uma sangue-ruim! Ora, Weasley!
Rony avançou um passo à frente, com uma fúria que o impedia de dizer qualquer coisa. Assustada, Hermione segurou o braço do amigo.
— Vamos, não queremos nos atrasar para o jogo — disse, tentando puxar Rony. Ele acabou cedendo e os dois seguiram andando, deixando Malfoy, Crabbe e Goyle para trás. Hermione tentou se lembrar se já tinha visto alguma vez a definição de “sangue ruim” em algum livro, mas acabou por perguntar a Rony o que o termo significava. Rony parou de andar, um pouco constrangido.
— Pensei que você soubesse — disse ele, com um cuidado que Hermione nunca o vira ter para com ela.
— Não me lembro de ter lido isso em lugar algum...
— Não está nos livros... É um xingamento. — Rony evitou os olhos dela. — Mas esqueça, pois é uma idiotice, completamente sem importância.
Hermione não se sentiu convencida por aquelas palavras, depois da reação tão anormal que Rony tivera.
E o jogo teve início. Entusiasmadas, as torcidas da Grifinória e da Sonserina vibraram quando os jogadores entraram em campo. Os jogadores voavam em vassouras, e o objetivo era acertar uma bola vermelha, chamada goles, dentro de algum dos quatro aros chamados balizas. Para protegê-los, cada time tinha um goleiro. Para atrapalhar os jogadores, haviam duas bolas chamadas balaços, que ficavam tentando acertar ou derrubar alguém. Era função dos batedores afastá-las de seus companheiros de time. O arremate final era dado pelo apanhador, que tinha como tarefa procurar a quinta bola envolvida no jogo: o pomo de ouro. O pomo era uma bola pequena que tinha asinhas em suas laterais, e movia-se ao redor dos jogadores durante a partida. O fim de um jogo de quadribol seria apenas quando o pomo fosse capturado pelo apanhador de um dos times, o que também rendia à equipe cento e cinqüenta pontos.
A certa altura do jogo, alguém se aproximou de Hermione e Rony na arquibancada, dizendo:
— Cheguem para lá.
Era aquele homem enorme que conduzira os alunos do primeiro ano até Hogwarts. Hermione vira a profa. McGonagall chamá-lo de Hagrid, e agora Rony cumprimentava-o, entusiasmado. — Eu estava assistindo de casa — disse Hagrid — mas não tem a mesma graça.
Hermione sabia que ele era o que se chamava de guarda-caça de Hogwarts, e que ele tinha uma casa nos terrenos da escola, onde morava. Pelo que pôde perceber, era amigo dos garotos, pois discutia agora com Rony o desempenho de Harry.
Hagrid, ao notar a presença dela, disse:
— Olá, mocinha, como vai? Também está prestigiando Harry?
— Sim — ela respondeu sem jeito, olhando para Rony em um pedido de socorro. Se Rony percebeu, ignorou.
Com o passar do jogo, Hermione perdeu o receio e a vergonha de Hagrid. Os três torciam juntos e dividiam o enorme binóculo de Hagrid, para ver melhor os lances. Até que a vassoura de Harry começou a fazer movimentos estranhos, o que acabou fazendo com que ele ficasse pendurado nela por uma mão apenas. Desesperada, Hermione pegou o binóculo e começou a procurar algo por entre a multidão. E viu Snape, olhando fixamente para Harry e mexendo os lábios ininterruptamente.
— Snape está azarando a vassoura de Harry! — anunciou. Rony ficou boquiaberto e Hagrid não ouviu. — Eu já volto, darei um jeito nisso.
Hermione saiu correndo por entre as arquibancadas, até chegar atrás daquela em que Snape estava. Ao se aproximar, acabou derrubando o prof. Quirrell, mas a pressa a impediu de desculpar-se. Tirou de dentro das vestes o frasco onde o seu fogo azulado estava contido e fê-lo começar a queimar a barra das vestes do professor de Poções. Saiu correndo imediatamente, para não ser vista. Quando retornou para o lado de Rony, Harry já tomara novamente o controle da vassoura.
— Genial, Hermione! — disse Rony.
Pouco depois, Harry desceu ao chão, triunfante, trazendo consigo o pomo de ouro.
— Eu conheço uma azaração quando vejo uma — disse Hermione, com veemência. — É preciso manter contato visual, e Snape não tirava os olhos de Harry!
— Não seja boba, Mione — disse Hagrid, carinhosamente. Hermione gostou de ser tratada pelo apelido, seus pais costumavam chamá-la assim. — Snape é um professor, ele não faria isso.
— Sabemos que ele está atrás da coisa que o monstro esconde, temos certeza — disse Rony esganiçado.
Hagrid arregalou os olhos. Harry complementou:
— Vimos o cachorro de três cabeças por acaso, uma noite dessas.
— Mas aquele corredor é proibido justamente para que ninguém chegue perto do Fofo!
— Fofo? — perguntou Rony, desconcertado. — Aquela coisa se chama Fofo?
— Fofo está escondendo alguma coisa, não está Hagrid? — perguntou Harry. Hagrid sacudiu a cabeça, impaciente.
— Estão se metendo em assuntos que não dizem respeito a vocês. Isso é problema de Dumbledore e Nicolau Flamel.
— Quem é Nicolau Flamel? — perguntou Harry.
Hagrid bufou, visivelmente furioso consigo mesmo por ter falado demais.
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