Vingardium leviosa!



— CAPÍTULO SEIS —
Vingardium Leviosa!




Na manhã seguinte, Hermione se recusou a sequer cumprimentar Harry e Rony. Ficara completamente indignada com a atitude egoísta dos dois, arriscando pontos da Grifinória. Mal podia acreditar que um dia quisera ser amiga de Potter... Claro que era incrível o que lera sobre ele, mas não poderia ser amiga de um desrespeitador de regras. Ele devia pensar que, por sua fama, poderia quebrar normas e sair ileso.
Talvez ele não fosse o único a pensar assim, entretanto. Na hora do correio, durante o café da manhã, chegou um pacote enorme para Harry. Era óbvio que se tratava de uma vassoura... E os alunos do primeiro ano não podiam ter vassouras pessoais. A surpresa de Hermione foi enorme quando ouviu dizer que a própria Minerva McGonagall, vice-diretora de Hogwarts e diretora da Grifinória, mandara a vassoura em vista de que ele se tornaria membro do time de quadribol. De tão indignada com o fato, Hermione esqueceu-se que estava ignorando Harry e Rony e se dirigiu a eles na escada.
— Você pensa que recebeu um prêmio por desrespeitar o regulamento, suponho.
— Pensei que não estivesse falando com a gente — disse Harry.
— É, continue não falando, está nos fazendo tão bem... — disse Rony, e ela se retirou, furiosa.

Na manhã do dia das bruxas, um cheiro delicioso de abóboras sendo preparadas perfumou a escola, e na aula de Feitiços o professor Flitwick anunciou que ia ensinar aos alunos o feitiço da levitação.
“Vingardium Leviosa”, pensou Hermione, orgulhosa por já saber de cor todos os feitiços que aprenderiam no primeiro ano. O professor explicou como era o movimento a ser feito com a varinha e a pronúncia do feitiço, e então os alunos começaram a praticar, em duplas. Hermione e Rony Weasley foram obrigados a trabalharem juntos, e era difícil dizer quem estava mais irritado com isso. Nenhum aluno estava conseguindo fazer a pena branca levitar, e Hermione observava enojada Rony tentar, desajeitado. Acabou por não se segurar e interrompeu-o.
— Você está dizendo errado. É “leviôsa”, e não “leviosá”.
— Diga você então, se é tão esperta.
Hermione respirou fundo e, num movimento preciso da varinha e pronunciando o feitiço com segurança, fez com que a pena flutuasse mais de um metro acima das cabeças dos colegas.
— Vejam, Hermione Granger conseguiu! — disse o prof. Flitwick, entusiasmado. Rony fechou ainda mais a cara, e não se dirigiu mais a Hermione, que também não fazia questão de conversar com ele, e ficou agitando graciosamente a varinha para movimentar a pena flutuante.
Ao final da aula de Feitiços, Hermione guardou os livros, penas e pergaminhos na mochila e começou a se dirigir para fora da sala. Aproximou-se de Harry e Rony o suficiente para ouvir Rony dizer:
— Não admira que ninguém a suporte. Francamente, ela é um pesadelo.
Lágrimas brotaram imediatamente nos olhos de Hermione, e ela apertou o passo para ultrapassá-los, fazendo questão de esbarrar em Harry para demonstrar que ouvira. Foi até o banheiro das meninas onde soluçou tanto que quase faltou-lhe o ar. Entrou em uma cabine e trancou-se lá dentro, chorando muito, sentada no chão e encostada na porta.
Hermione perdeu a noção de quanto tempo passou dentro daquele banheiro, alternando períodos de soluços estridentes e outros de choramingos ressentidos. Naquela noite haveria a festa do dia das bruxas, mas o que tinha ela a comemorar? Acabaria por beber sozinha um copo de suco de abóbora e retirar-se mais cedo ao dormitório, entediada por não ter conversado com ninguém. Ninguém! Ninguém a suporta., dissera Rony Weasley cruelmente. Ela desconfiava, mas era duro ouvir essas palavras.
A janela basculante do banheiro já denunciava a escuridão lá fora, quando uma voz de menina perguntou:
— Hermione, você está bem? É hora da festa. — disse Parvati Patil. Hermione não soube por que, mas sentiu um toque de ironia e deboche no tom da outra.
— Me deixe em paz. — limitou-se a dizer, com a voz anasalada. Quando ouviu a porta do banheiro se fechar, suspirou. Já não chorava mais, mas não tinha a menor vontade de levantar-se dali. Tinha vontade de reencontrar seus pais, pois, pensou com amargura, eles a suportavam.
Poucos minutos depois, ela começou a sentir um cheiro muito ruim e muito forte. Sentiu algo se aproximando, e por algum motivo olhou para cima; preferia não tê-lo feito. Pôde ver, como se fosse um pesadelo terrível, a cabeça de uma criatura enorme, esverdeada e imensamente malcheirosa, que estava ali, dentro do banheiro das meninas. A seguir ouviu um girar de chave, mas não quis acreditar em suas suspeitas. Abriu cuidadosamente a porta da cabine onde estava e conteve um grito com a mão na boca ao ver o trasgo — já lera sobre eles na Enciclopédia das Criaturas Mágicas.
Hermione correu para a porta só para confirmar a suspeita em que não queria acreditar; alguém a trancara. O trasgo percebeu seu movimento e começou a andar em direção a ela. Foi impossível se conter; Hermione soltou um grito esganiçado e desesperado, correndo novamente para dentro da cabine e trancando-se lá.
Com o bastão que segurava, o trasgo destruiu todas as cabines do banheiro, inclusive aquela em que Hermione estava, derrubando pedaços de concreto em cima dela, que não se machucou muito, porém. Assim que pôde, ela levantou-se e correu para a extremidade do banheiro em que ficava mais longe do trasgo. Sem ter mais para onde fugir, encolheu-se no chão, encostada na parede e encarando o trasgo, tremendo até o último fio de cabelo. Tinha a boca aberta de terror e uma lágrima a marejar o olho esquerdo.
Foi nesse momento que a porta se abriu; eram Harry Potter e Rony Weasley. Harry atirou alguma coisa no trasgo, mas foi seu grito para Rony — Tente distraí-lo! — que chamou a atenção do monstro.
Hermione ficou a observá-los tentando desajeitadamente distrair o trasgo, o que o fez parar a um metro de distância de onde ela estava, paralisada de pânico. Não conseguiu se mexer nem quando Harry gritou para ela:
— Corra!
Rony atirava pedaços de concreto no trasgo, sem resultado. Harry por sua vez pulou no pescoço do trasgo, e acabou enfiando a varinha na narina do monstro, sem querer, fazendo-o urrar de dor e derrubar o bastão no chão. Rony, desesperado, sacudiu a varinha de qualquer jeito e gritou:
Vingardium leviosa!
O bastão do trasgo começou a levitar, e com um movimento da varinha de Rony, caiu bem na cabeça do monstro, que tombou no chão com estrondo. Depois de um momento de silêncio, Hermione conseguiu dizer, ainda trêmula:
— Ele está... morto?
— Acho que não — respondeu Harry. — Só perdeu os sentidos.
Antes que os três pudessem raciocinar, da porta vieram a profa. McGonagall, o prof. Quirrell e Argo Filch.. Quirrell era o professor de Defesa Contra as Artes das Trevas, e comentava-se que ele era na verdade muito medroso, e que o turbante arroxeado que usava ao redor da cabeça estaria cheio de alho para protegê-lo. Ele sentou-se em uma privada, respirando fundo, no que pareceu ser uma tentativa ligeiramente frustrada de se acalmar de um susto muito grande. Argo Filch examinava o trasgo.
Já Minerva McGonagall olhava de Harry para Rony, absolutamente furiosa.
— O que pensam que estavam fazendo? — disse ela, por fim, as narinas tremendo de raiva. — Poderiam ter sido mortos!
Hermione respirou fundo, na tentativa de absorver além do ar, coragem para fazer o que julgava ser o mínimo depois do que acabara de acontecer.
— Eles vieram me procurar, professora. — disse, na voz mais fina e estranha que já deixara escapar pela garganta.
— Srta. Granger! — exclamou a professora, completamente admirada. Harry e Rony tinham expressões de surpresa semelhantes.
— Vim atrás do trasgo porque pensei que poderia enfrentá-lo sozinha. Sabe como é, já li tudo sobre trasgos. Harry e Rony distraíram e derrubaram o trasgo, não tiveram tempo de chamar por ajuda. Se eles não tivessem vindo me procurar, eu estaria morta agora.
As últimas palavras saíram quase num sussurro. Hermione sentiu os olhos marejarem, e olhou fixo para o chão para que ninguém pudesse perceber.
— Foi uma atitude totalmente estúpida, Srta. Granger! Como imaginou que poderia enfrentar um trasgo montanhês sozinha? E logo você, desrespeitando regras, enquanto devia estar no dormitório como o prof. Dumbledore mandou assim que soubemos que havia um trasgo solto na escola!
Agora aquela lágrima que dançava por entre os cílios inferiores de Hermione soltou-se e despencou até o chão, movimento que ela observou como se durasse uma eternidade. A voz da professora era dura quando ela disse: — Grifinória perderá cinco pontos pela sua imprudência. Agora volte para a sala comunal.
Hermione andou rapidamente até a porta, sem olhar para ninguém. Quando chegou ao corredor vazio, pôs-se a correr, chorando muito agora. Não sabia o que pensar sobre o que acontecera, o que fizera e os pontos que perdera para a casa. Sentira-se no dever de tentar ajudar Harry e Rony a não serem expulsos, depois de terem salvado a sua vida. Outra coisa, porém, que ela não conseguia compreender... Por que eles tinham enfrentado um trasgo para salvá-la? Quando chegou ao retrato da Mulher Gorda, esta perguntou:
— O que houve, garotinha? Caiu, se machucou?
— Não importa... — disse Hermione, dizendo depois a senha e enxugando o rosto. Na sala comunal, todos os alunos da Grifinória continuavam comemorando o dia das bruxas, com comida do banquete, que tinha sido dividida entre as casas. Lilá Brown e Parvati Patil se aproximaram dela.
— Está melhor, Hermione? — perguntou Lilá. — Seu rosto está muito inchado.
— Estou bem — respondeu, fungando fundo.
— Tome — disse Parvati, entregando a ela um copo de suco de abóbora. — Venha comemorar.
— Já vou... Obrigada. — ela pegou o copo, um tanto desconcertada com a gentileza. As duas se afastaram e ela continuou ali, ao lado da porta, esperando e sorvendo o suco aos poucos.
Quando Harry e Rony chegaram, ficaram ao lado dela sem dizer nada. Ela não soube se eles a olhavam nos olhos, pois olhava fixamente para seus pés, constrangida. Depois de alguns momentos de silêncio, os três disseram, ao mesmo tempo e sem se olhar:
— Obrigado.
E foram se servir de comida, juntos.

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