Donaghan Tremlett



16 de Julho de 2000.


Ressaca.

Foi a primeira coisa da qual Tonks teve consciência naquela manhã, antes mesmo de abrir os olhos. A cabeça pesava uma tonelada e ela se sentia muito, muito enjoada. Resmungando por causa da luz, escondeu a cabeça debaixo do travesseiro e tentou achar uma posição mais confortável. Mas posição alguma seria confortável naquele estado. Então, num flash, os acontecimentos da noite anterior espocaram em sua mente; e ela abriu, arregalou os olhos de repente, jogando para longe o travesseiro.

_ Ai meu Merlin.

Olhou em volta (e as paredes acompanharam o movimento da cabeça, fazendo o enjôo se tornar ainda mais forte). E respirou aliviada ao reconhecer as paredes de seu quarto... e o pôster desbotado das Esquisitonas atrás da porta.

_ Droga. Droga. Droga _ ela repetia, socando o colchão.

Pelo menos estava em casa. Porque em algum ponto daquela noite havia perdido o controle sobre si mesma; e não fazia sequer a menor idéia de como tinha chegado até seu quarto. Com algum esforço, Tonks se sentou, apoiando a cabeça latejante sobre as palmas das mãos. Precisava, antes de qualquer coisa, dar um jeito naquela ressaca dos infernos. Com o quarto oscilando a cada passo, ela se arrastou até o banheiro, abriu o armário e, depois de derrubar no chão quase todo seu conteúdo, conseguiu encontrar um frasco do “Elixir Extraordinário de Efeito Imediato para Embebedamento”; e virou metade do vidro de um gole só. Aquilo era horrível, pensou consigo mesma enquanto o corpo se sacudia em arrepios. Se ao menos Snape estivesse ali... saberia com certeza preparar alguma coisa com um gosto melhor e... bolas. Se Snape estivesse ali, a maldita ressaca não teria sequer motivo para existir.

Tonks fechou os olhos e inspirou profundamente, sentindo a ressaca ir embora e tentando juntar os pedacinhos do que havia acontecido na infeliz noite anterior.

*

Primeiro, acentuou as curvas do corpo e modificou as feições do rosto, para que ficasse absolutamente irresistível. Era algo costumeiro em seus tempos de auror; quando era comum virar a mais estonteante das mulheres para conseguir informações ou despistar algum parceiro. E, bem. Tudo bem. Ela já havia feito aquilo também para chamar a atenção de um ou outro rapaz. Mas só quando era mais nova. Bem mais nova. Porém, jamais havia feito aquilo com o propósito daquela noite. Na hora, não pensou muito no que estava para fazer, porém agora, analisando tudo friamente... como havia sido precipitada e impulsiva...! (Como sempre, aliás).

Então, transformada na mais bela mulher do pub, Tonks se postou junto ao balcão, bem ao lado dele, e tudo o que teve de fazer foi pedir uma cerveja amanteigada. No mesmo segundo, sentiu os olhos dele colando-se em sua nova aparência e não se desgrudando mais. Ele se ofereceu para pagar a bebida e pronto, o jogo já estava ganho.

_ Donaghan _ ele se apresentou, com a voz rouca, estendendo uma das mãos e usando a outra para tirar a franja da frente dos olhos _ Mas pode me chamar de Don.

Donaghan Tremlett. O baixista das Esquisitonas. Sua eterna paixonite adolescente. Ali, bem do lado dela, sorvendo cada palavra, cada gesto e cada nova curva de seu corpo como se fossem água no meio do deserto. Era absolutamente tudo o que ela poderia desejar... se não fosse tão errado.

Sim, porque ela não o queria. Não conseguia sentir desejo ou sequer a mínima atração por ele. Não com Snape o tempo todo em sua mente. Mas precisava fazer aquilo. E que se danasse a moral, o certo e o errado. “Don” não tinha problema algum em conseguir uma garota; e não iria fazer a menor diferença para ele aquela pequena encenação. Então, Tonks fingiu-se completamente fisgada por aquele sujeito caladão, misterioso e soturno (exatamente o seu tipo, quem diria!); fingiu adorar todas as vezes em que a mão dele “acidentalmente” tocava seu braço; e até mesmo fingiu estar se divertindo muito ao lado do famoso rockstar bruxo, de cabelos negros ainda mais espetados que o dela, franja caída sobre os olhos e roupa cheia de brilhos, que não parava de passar os olhos pelo bar, para confirmar se estava sendo suficientemente observado.

Mas na verdade mesmo, Tonks daria tudo para aparatar dali naquele mesmíssimo instante... e consertar a situação com Severus. Mas era justamente por ele que tinha de ser forte e continuar ali. Gina andava curiosa demais, insinuando-se demais sobre sua vida amorosa. Bem, talvez ela, Tonks, estivesse mesmo era ficando paranóica. Fosse o que fosse, antes que perguntassem o que não deviam, ela os faria de bobos, fingindo estar muito interessada em... “Don”. Era mesmo muito simples e engenhoso.

E agora, ela tinha de fingir entusiasmo com a idéia de irem até “algum lugar mais calmo”; fingir estar amando a mão daquele sujeito grudento e egocêntrico em sua cintura. Mas tudo tinha um limite. Assim que se viu fora do pub, Tonks se lembrou de que “havia esquecido” a capa lá dentro; e teve de voltar para buscá-la. E pronto: estava livre. Pegou o sobretudo emprestado com Harry, metamorfoseou-se na face mais comum em que conseguiu pensar e passou por um “Don” que, de novo, não parava de olhar para todos os lados (mas dessa vez ela podia apostar que o motivo era outro) e a ignorou solenemente. Dobrando uma esquina, aparatou. Mas não para casa, pois sabia que não dormiria, passaria a noite toda rolando na cama, pensando “nele” e no quanto estava com raiva dele.

E foi assim que Tonks encerrou sua noite se embebedando em um bar trouxa.


*

E o pior: fazia *anos* que ela não se embebedava daquela forma, anos! Provavelmente, desde um fora que Remus lhe dera logo após a morte de Sirius. E agora... tudo por causa de Severus. Daquela maldita insegurança e daquela maldita possessividade dele. O que ela precisaria fazer, oh Merlin, para deixá-lo mais seguro, mais confiante naquilo tudo que ela sentia por ele? O que dizer para fazê-lo acreditar... acreditar que mesmo que ela quisesse, sim, curtir a vida de vez em quando, isso não significava de forma alguma que gostava menos dele, ou que o estivesse abandonando ou trocando por coisa melhor?

_ Droga.

Tonks suspirou. Tudo bem que Snape tinha, sim, motivos de sobra pra não ser uma pessoa que tivesse muita confiança na raça humana. Mas ainda assim... Eles já estavam juntos há *meses*... tempo suficiente para que ele soubesse que ela o amava, do fundo de seu coração. Ela era durona, nunca desistira fácil de um amor e não seria agora que o faria. Mas, poxa, seria estúpido demais deixar um relacionamento tão especial como o deles se desgastar por coisinhas à toa como aquelas. Eles teriam que se sentar e ter uma conversa séria. Ela fazia questão. Eles eram diferentes, sim, até demais. Mas aquele tempo juntos já havia provado que podiam se entender. Só dependia dele.


*

_ Ela o quê? _ perguntou Ron, os olhos se arregalando até ficarem quase do tamanho de um pires.

_ Foi embora com o cara das Esquisitonas.

Harry concordou com a cabeça.

_ E isso simplesmente não bate... Tonks não devia sequer olhar pra outro cara sob o efeito da poção.

_ E agora, cara?

A idéia da Poção do Amor era convincente demais, perfeita demais para ser simplesmente abandonada. Havia ainda Tonks, que tanto tinha feito por eles durante a guerra, que havia perdido o amor de sua vida; e agora se via naquela situação... *tinham* que fazer algo por ela; eram os únicos que sabiam e que podiam livrá-la da mesquinha armação de Snape. Além disso, qualquer coisa que servisse para irritar o Ranhoso e tirar-lhe aquele arzinho de arrogância do rosto era tentadora. Resumindo: nenhum deles jamais abriria mão daquela chance.

_ A gente deve levar o plano em frente assim mesmo... só por precaução. Se ela realmente não tiver nada com o Snape, a poção não vai fazer mal algum _ resolveu Gina, com as mãos nos quadris; e se virou para o irmão _ Conseguiu o livro?

Com um ar de vitória, Ron tirou um livrinho minúsculo do bolso de trás da calça, ergueu a varinha e, com um “Engorgio”, o fez voltar ao seu gigantesco tamanho normal.

_ Foi mais fácil do que pensei. Hermione simplesmente apagou depois do jantar; e tudo o que tive de fazer foi vasculhar as estantes... por horas, é claro.

Então, sentados lado a lado sobre um velho sofá caindo aos pedaços, instalados no sótão iluminado pela luz da manhã, os três se puseram a folhear o grosso livro.

*

17 de Julho de 2000.


_ Foi um engano.

_ Engano? Dora, é simplesmente impossível uma pessoa matar... e depois chegar à conclusão de que não matou _ disse Ted Tonks, fitando a filha _ Que tipo de raciocínio é esse?

Ela o olhou de volta, os cabelos castanho-claros entremeados de fios grisalhos, a expressão atenta e preocupada, as mãos envolvendo as dela. Ted era uma pessoa bastante compreensiva, mas ela duvidava de que ele aceitaria o pretenso assassino do ex-namorado de sua filha única. Contar aos pais estava se mostrando mais difícil do que o previsto; mas ela não agüentava mais aquela situação não-resolvida; e as perguntas de Gina tinham funcionado como um sinal de alerta para que se apressasse.

_ Vocês não entenderiam.

_ Não há o que entender, Nymphadora _ a mãe a repreendeu _ Esse... Snape fez tanto mal e agora... você o defende?

Ah, droga. O porquê estava ali, na ponta da língua como sempre, mas ela havia refreado seu instinto impulsivo. Oh sim, claro, Snape tinha se enganado quanto ao autor da morte de Lupin, chamando a culpa e responsabilidade para si porque a amava. Realmente, era uma paixão completamente aceitável, levando-se em conta que, nos últimos seis meses, seus pais acreditavam que Snape não passava de um assassino frio e calculista. E aquilo era muito, muito pior do que um lobisomem.

_ Foi um mal entendido _ resmungou.

_ Seja mais explícita _ pediu Andrômeda, dando voltas e voltas pela sala; e lançando-lhe de quando em quando aqueles costumeiros olhares penetrantes.

Ela não sabia ser sutil, nunca saberia. Snape tinha toda a razão quanto aquilo; e aquela noite já havia consumido toda a sua mínima capacidade de sutileza. Mais uma chance perdida. E ela não poderia ficar insistindo no tema “Snape” muitas vezes mais... tinha certeza de que os pais já começavam a desconfiar de alguma coisa. Às vezes, tinha vontade de desistir de tudo e soltar a bomba na mesa do café da manha, “Eu e Severus estamos juntos”, simples assim. Mas se a mãe sequer sonhasse aquilo, sabendo o que sabia até então, não ouviria mais nada e aparataria imediatamente até Hogwarts e... bem, Tonks podia apenas ter uma vaga idéia de como as coisas se desenrolariam a partir de então.

_ Deixa pra lá _ disse Tonks, chateada, indo para o quarto.

Ted e Andrômeda se entreolharam.

_ Já é a terceira vez que ela toca nesse assunto _ disse o pai, atônito.

_ Ela definitivamente está escondendo alguma coisa.


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Sem-graça, né? =P Mas a Tonks ama meeesmo o morceguinho, não trairia ele com um qualquer \o/ A propósito: o nome desse baixista das Esquisitonas parece fake, inventado. Mas eu juro que é assim mesmo... tá inclusive no HP Lexicon.

Empolguei nesse capítulo, ficou enorme! E espero que a empolgação e a média de dois capítulos por semana se mantenha agora ;D de qualquer forma, essa fic vai ser curtinha, acho que chegamos na metade dela. Mas não se preocupem (ou se preocupem, mwahaha!), aquelas milhares de idéias ainda vão acontecer, só estou sem tempo pra mais de uma fic por vez, mesmo.

Agradecimentos: vansnape, senhorita granger, morgana, hannah, vinola e lillith =)

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