O primeiro dia de aula
Ela abriu os olhos. Piscou algumas vezes, sua cabeça ainda doendo sensivelmente. Estava escuro, e apenas uma luz opaca que entrava pela janela aberta, por onde também entrava uma leve brisa da noite, iluminava o ambiente.
Hermione fez um ligeiro esforço para se sentar, sua cabeça ficando um pouco tonta por causa do movimento. Ela olhou ao seu redor e viu várias outras camas, iguais à dela, onde havia outros alunos, todos dormindo profundamente.
"Estou na ala hospitalar?", perguntou a si mesma em pensamento.
Parecia que sim. Ela tentou se sentar mais ereta na cama, mas tomou um sobressalto ao sentir algo se mexer ao seu lado. Foi então que sentiu algo sobre sua mão direita. Quando abaixou os olhos para ver o que era, viu Rony adormecido. Ele se moveu ligeiramente, resmungando alguma coisa no meio do sono, e segurou ainda mais a mão de Hermione entre as suas.
A garota sorriu ao vê-lo. Não dava para acreditar que ele estivesse fazendo vigília ao seu lado todo o tempo. Rony, apesar de sempre estar fazendo de tudo para irritá-la, era mesmo um garoto especial. E Hermione agradecia por tê-lo ao seu lado.
Delicadamente, ela retirou sua mão entre as dele. Foi um pouco complicado fazer isso sem acordá-lo, mas com jeitinho, ela conseguiu. Hermione beijou a mão dele com carinho antes de se levantar e caminhar até a janela aberta.
A brisa noturna acariciou seu rosto, e ela fechou os olhos por um segundo. Veio-lhe, então, à mente, suas lembranças mais recentes. A chuva... ela e Rony juntos... Rony quase pedindo desculpas a ela pela última das brigas idiotas dos dois... ele a abraçando para protegê-la... aquela maldição...
Hermione abriu os olhos, encostou seus cotovelos no parapeito da janela e os queixos nas mãos. A noite não estava estrelada. Daquela janela, ela tinha a vista da Floresta Proibida, ao longe, e o lago mais próximo. Os jardins estavam vazios e escuros.
Às vezes, ela não conseguia entender por que tudo aquilo tinha que acontecer. Aquela guerra... não tinha nenhum sentido. Tantas pessoas se feriam sem motivo, sem terem culpa... Tanta gente envolvida sem saber o porquê... Ela pensou nos seus amigos, e em quantos sobreviveriam a tudo isso. Ou, quem sabe, se até ela mesma sobreviveria. Hermione respirou fundo, sentindo um arrepio. Desde que tudo isso começou, ela quase podia sentir que as coisas não terminariam bem. Mas talvez fosse só um pressentimento idiota. E ela não acreditava em pressentimentos. Se havia uma matéria que ela achava completamente inútil, era Adivinhação.
Ela sentiu outro arrepio, mas esse foi porque alguém tocou seu ponto sensível: a parte de trás da sua orelha esquerda. Quando Hermione olhou de esguelha para ver quem era, enxergou exatamente a pessoa que imaginou ao sentir o arrepio.
Rony roçava seus lábios na orelha dela, sorrindo. Hermione também sorriu. Só Rony conhecia esse seu ponto fraco. Ele escorregou seu queixo para cima do ombro dela, observando a noite através da janela. Hermione fez o mesmo, e eles ficaram por alguns instantes em silêncio, apenas apreciando o momento. A brisa ficou um pouco mais fria, e ele a abraçou por trás. Hermione sentiu um arrepio bom percorrer sua espinha até chegar na sua nuca e eriçar seus pêlos e o cabelo. Ela esticou o braço e correu o vidro da janela, mas não a fechando totalmente. Dessa maneira, tanto ela, quanto Rony, podiam ver a noite e observar seus reflexos no vidro.
Hermione observou tanto o seu rosto, quanto o do garoto. Ambos pareciam cansados. Rony tinha olheiras fundas, enquanto ela estava ligeiramente pálida e descabelada. Ela viu e sentiu quando Rony tirou sua mão direita, que estava apoiada na cintura da garota, e levou-a até o rosto dela, acariciando-o de leve.
- Por que você não me avisou quando levantou? - ele murmurou na sua orelha esquerda, fazendo ela se arrepiar novamente ao ouvir aquela voz doce e ao mesmo tempo forte ao pé do seu ouvido.
- Você estava dormindo tão bem... não quis acordá-lo. - ela respondeu com um sussurro. - Além disso, você parece tão cansado que eu...
- Não importa. Eu posso ficar acordado por uma semana só para te ver sorrindo novamente.
Ele beijou sua orelha esquerda. Rony realmente sabia como derretê-la. Hermione deixou sua nuca apoiar-se no ombro largo dele, descansadamente. Ela sorriu ao observar novamente o reflexo dos dois no vidro. Eles faziam um belo quadro.
- Eu estava preocupado com você. - ele continuou, sua voz assumindo um tom mais sério. - Você esteve dormindo desde ontem.
- Tudo isso?
- Eu tive medo de te perder.
Hermione se virou, mas Rony não a largou do abraço. Seus corpos estavam grudados, e ela teve que levantar ligeiramente a cabeça para olhá-lo nos olhos. Podia sentir, agora, ambas as mãos do garoto segurando delicadamente sua cintura, ao mesmo tempo em que ele não deixava de observá-la por um único segundo. Hermione levou suas duas mãos no rosto dele, sentindo alguns pêlos teimosos que cresciam no seu rosto, deixando-o ligeiramente áspero. Ela passeou sua mão direita pelos cabelos extremamente vermelhos dele, sentindo cada fio por entre seus dedos. Com a ponta do dedo polegar da mão esquerda, ela sentiu todas as curvas dos lábios dele, contemplando-os como se fosse a primeira vez que os sentisse.
Ela ainda se lembrava perfeitamente do primeiro beijo deles. Foi seu primeiro beijo também. Rony tinha pego uma detenção feia com Snape. Apesar de ele ter se esforçado de todas as maneiras para escapar de uma profissão que tivesse Poções no meio, Rony acabou optando, assim como Harry, pela carreira de Auror. Já Hermione tinha escolhido trabalhar no Ministério da Magia, e sua maior ambição era chegar ao topo do Departamento para Regulamentação e Controle das Criaturas Mágicas, para que, assim, pudesse expor suas idéias sobre os elfos domésticos. Dessa maneira, Rony e Harry ainda tinham que, obrigatoriamente, ter as terríveis aulas com Snape, pois a profissão de Auror exigia essa matéria. Já ela, Hermione, preferiu continuar com a matéria, mesmo que não fosse necessária a sua profissão, assim como fez com várias outras matérias que também não eram necessárias.
Naquela noite, Rony tinha ficado preso na masmorra do Snape limpando caldeirões sem magia até de madrugada. Hermione se lembrava que Harry tinha desistido de esperar, mas ela não. Aproveitou para ficar estudando para os exames do sexto ano, mas no final das contas não conseguira se concentrar nos estudos por ficar pensando em Rony. Não era recente a descoberta que ela tinha feito de que gostava realmente do garoto. Mas Hermione tinha dois problemas quanto a isso: medo de que Rony não correspondesse a ela e o seu orgulho incontrolável que a impedia de admitir, até para si mesma, que o amava. E uma coisa que Hermione fez bem durante todos esses anos foi esconder seus sentimentos, mesmo que fosse bastante complicado às vezes.
Quando Rony chegou, exausto e irritado, eles acabaram, como sempre, tendo uma das suas famosas discussões. Hermione nem se lembrava direito do motivo, ela só sabia que envolvia os seus estudos para o exame e a detenção de Rony. A única coisa da qual ela se lembrava com perfeição naquela noite foi do beijo, seu primeiro beijo. E o primeiro beijo uma garota nunca esquece, ainda mais quando se é com o garoto que ela ama. E com Hermione foi assim. Depois de toda aquela discussão, Rony, num impulso descontrolado, a beijou, e os dois descobriram que era exatamente aquilo que queriam desde o começo.
- Eu estou aqui... com você... - Hermione sussurrou, encarando Rony profundamente.
Ele a apertou mais contra si, como se tivesse medo de que ela fosse deixá-lo. Hermione ainda segurava o rosto dele entre suas mãos. Rony passeou suas mãos grandes pelas costas dela, por cima da roupa, e Hermione sentiu o tecido roçar no seu corpo a cada movimento que ele fazia. E era como se seus pulmões estivessem começando rapidamente a ficar sem ar.
Ela sentia as coxas dele encostando-se às suas e a respiração quente dele sobre seu rosto, de tão próximos que estavam. Uma das mãos dele subiu pela suas costas, percorrendo-as como se estivesse explorando-a por inteiro, até chegar na sua nuca, que começava a suar, e tocar seus cabelos crespos entre os dedos. Rony sorriu, parecendo saborear aquilo, bem como Hermione. Ela deixou o corpo mais amolecido, permitindo que ele a segurasse.
Rony abaixou a cabeça, aproximando seu rosto do dela. Ela podia sentir o cheiro forte dele invadindo suas narinas e entorpecendo ainda mais seu corpo. Alguns fios do cabelo dela se movimentaram pela respiração dele sobre ela e entraram sorrateiros dentro da boca entreaberta dele, fazendo-o sorrir. Hermione sentiu quando uma mecha do cabelo ruivo dele acariciou seu rosto, de tão junto que estava do dela. Rony encontrou uma brecha na roupa dela, e começou a passear sua mão sobre a pele nua das costas da garota, arrepiando seus pêlos com o seu toque carinhoso.
Hermione entreabriu seus lábios, à espera do inevitável. E ela queria aquilo, desejava com todas as suas forças senti-lo na sua boca. Rony roçou seus lábios nas bochechas suadas da garota, e ela sentiu o toque suave de seus lábios quentes. Ela fechou os olhos, apreciando o momento, suspirando com força, seus pulmões parecendo que iam explodir e seu corpo derreter. Um formigamento caminhava desde os seus pés até o alto de sua cabeça, e seu corpo estava cada vez mais amolecido, porém seguro, ela sabia, entre os braços dele. Rony encostou seus lábios nos dela, lentamente...
- O que está acontecendo aqui? - uma voz sussurrante, porém repreensiva, exclamou atrás deles.
Rapidamente eles se soltaram com um sobressalto, como se tivessem acabado de serem banhados por um balde de água gelada. Hermione cambaleou, mas conseguiu se manter de pé. Rony se virou num segundo, como se estivesse pisando em brasas. Os dois engoliram em seco, e Hermione sentiu como se fosse capaz de fritar um ovo na cara ao ver a expressão brava e as mãos na cintura de Madame Pomfrey.
- Erm... bem... - Rony tentou explicar, balbuciando inutilmente. A enfermeira se virou enraivecida para o garoto.
- Não há explicação para isso, Sr. Weasley! Aqui é uma enfermaria, e não é lugar para... indecências!
Hermione engoliu em seco. Se ela contasse para a Profª. McGonagall... Madame Pomfrey se virou para a garota, que teve outro sobressalto e enrijeceu todos os membros.
- E a senhorita, hein? Parece que já está bem melhor, para já estar fazendo isso...
Hermione abaixou os olhos, envergonhada. Tinha sido uma loucura sua, mas como imaginaria que Madame Pomfrey fosse entrar bem no meio da noite? Com uma voz sussurrante e amedrontada, ela perguntou:
- A senhora... não vai contar isso para... a Profª. McGonagall, vai?
- Pois eu deveria! - Hermione escutou Rony se mexer desconfortável. - Onde já se viu, os dois monitores-chefes... se agarrando na ala hospitalar? No meio da noite?
- Isso quer dizer que a senhora não vai contar? - Rony se atreveu a perguntar.
Madame Pomfrey soltou um resmungo de indignação.
- Não, não vou contar. Mas eu vou me lembrar de nunca mais deixar o senhor passar a noite aqui de novo, Sr. Weasley!
Hermione levantou os olhos e viu Rony muito desconcertado, tentando argumentar:
- Mas, Madame Pomfrey...
- Nada de mas! - ela exclamou irritada, apontando para a porta. - Fora daqui agora, Sr. Weasley!
- Por favor, eu...
- Saia!
Rony soltou o ar longamente pela boca, e olhou de esguelha para Hermione, que mordia os lábios, tensa. Ele ainda teve a coragem de piscar para ela, sorrindo pelo canto da boca, e dizer:
- Até amanhã, então.
- Saia, Sr. Weasley! - Madame Pomfrey insistiu, mais enfurecida do que nunca.
Hermione viu Rony rir baixinho enquanto saía apressado da ala. Ela o acompanhou com o olhar, examinando-o por inteiro.
- Srta. Granger! - Hermione levou um susto. - Cama, agora! - a enfermeira exclamou, apontando a cama que Hermione tinha abandonado há pouco.
Em menos de meio minuto, Hermione já estava debaixo das cobertas, os olhos fechados, fingindo que já estava começando a dormir novamente. Ainda ouviu Madame Pomfrey fechando a janela com estrondo e correndo as cortinas, e depois quando ela percorreu cada leito verificando os pacientes adormecidos. Hermione abriu apenas um dos olhos e pôde ver quando a enfermeira deixou a sala, pela mesma porta que Rony saíra.
Um pequeno sorriso maroto se formou no canto dos lábios da garota, que novamente fechou os olhos, apesar de estar completamente desperta. Se ao menos Madame Pomfrey tivesse chegado dois minutinhos mais tarde...
Hermione se virou na cama, e quando finalmente adormeceu, sonhou com a continuação daquela cena.
*******
Neville estava caminhando distraído pelo corredor do segundo andar do castelo naquela manhã nublada de início de outono. Queria ver se encontrava uma pessoa, para agradecer a ela por uma certa visita a ala hospitalar, mas não queria fazer isso na frente de todo mundo no Salão Principal. Mas também não podia se atrasar para as aulas do dia, porque a primeira, para seu desespero, era Poções com o temível Prof. Snape.
É, ele também não tinha conseguido se livrar das aulas do mestre mais temido e odiado de Hogwarts. Apesar de ter procurado escolher uma carreira que não tivesse a matéria e, ainda por cima, tivesse bastante de Herbologia, sua matéria preferida, Neville não obteve sucesso. Todas as carreiras que lhe apeteciam tinham, necessariamente, Herbologia e Poções. Quando ele perguntou o porquê disso à Profª. Sprout, ela lhe respondeu que essas eram duas matérias que caminhavam juntas. Neville se resignou com o seu destino e a única coisa que lhe animava era que, depois desse ano, nunca mais teria que suportar as humilhações que Snape e os sonserinos lhe faziam passar em todas as aulas de Poções.
POF.
- Ai!
- Ops, sinto muito, Neville... - Rony parou de correr e deu meia volta para se desculpar do esbarrão que deu no colega. Ele parecia afobado e com muita pressa.
- Aconteceu alguma coisa? - Neville perguntou intrigado.
Rony abriu a boca e desembestou a falar tão rápido e em tão pouco tempo, que foi difícil para Neville acompanhar o seu ritmo.
- É que eu estou apressado para fazer uma coisa e depois encontrar alguém, sabe, eu preciso achar também uma cois -
Rony parou de falar bruscamente e olhou para Neville como se o visse pela primeira vez. Parecia que tinha acabado de ter uma idéia brilhante. Neville não gostou muito daquilo. Sempre era ele que saía perdendo com essas coisas.
- Neville! - Rony exclamou, batendo suas mãos nos ombros do garoto, que se sobressaltou. - Você pode me ajudar!
Não era uma pergunta. Era uma afirmação.
- Exatamente com o quê, Rony? - ele perguntou incerto.
- Vem comigo que eu te explico no caminho!
- Tem certeza de que é seguro? Eu não vou acabar numa detenção com a Profª. McGonagall como da última vez que eu lhe prestei um favor?
Neville se lembrava perfeitamente da recente ocasião em que Rony lhe pedira um favor. E não tinha dado nada certo. Neville acabara se metendo numa encrenca das grandes. Tá bom que ele tinha sido um pouco desajeitado na ocasião, mas Rony também teve sua parcela de culpa.
- Neville, o que é isso? - Rony perguntou sorrindo. Ele parecia realmente feliz e animado naquela manhã. - Eu sou um monitor-chefe, você acha que eu lhe meteria numa encrenca?
- Acho.
Neville foi sincero e sabia que era por uma boa causa. Tanto Rony, mesmo depois de ter se tornado monitor e, posteriormente, monitor-chefe, assim como até mesmo Hermione, nunca deixaram de se meter em confusão junto com Harry simplesmente por causa da monitoria. E desde o quinto ano que eles acabavam colocando Neville, Gina e Luna nessas confusões também. Ou então os três se colocavam sozinhos nas confusões.
Não adiantou argumentar. Quando Neville se deu por si, já estava junto com Rony na estufa quatro, a das flores mágicas. E aquilo não estava certo. Neville possuía a chave daquela estufa porque a Profª. Sprout a tinha confiado por ele ser o melhor aluno do ano em Herbologia. E agora Neville estava entrando lá, às escondidas, para roubar flores junto com Rony.
- Por que você tinha que cismar em pegar uma flor daqui, Rony? - Neville perguntou, irritado consigo mesmo por ter-se deixado levar. - Não podia ter escolhido uma dos canteiros dos jardins?
- Mas aquelas são normais! - Rony respondeu em um sussurro, observando com curiosidade o canteiro dos Girassóis Espinhados, uma variedade de flores que, ao invés de girar na direção do sol, soltava espinhos quando o sol aparecia. - Eu quero coisas exóticas hoje!
- E por que tinha que escolher justo eu pra te ajudar?
- Porque você é o cara mais entendido em Herbologia que eu conheço. A única pessoa que entende tanto quanto você é a Mione, só que as flores são exatamente para ela, de modo que você é minha única alternativa. Além disso, você tem as chaves de todas as estufas.
- Quem te contou isso?
- A Luna.
- Luna fofoqueira. Nunca mais abro meu bico perto dela.
- Essa! - Rony exclamou, apontando uma Limblus Livlitúnea.
- Não toque nela!
Tarde demais, o estrago já estava feito. A flor que Rony tinha tido a estupidez de tocar era sensível a qualquer perturbação, e seu mecanismo de defesa era espirrar um ácido extremamente poderoso através de suas pétalas. Neville deu um empurrão no amigo para que o ácido não os atingisse, e ele foi parar na parede oposta, abrindo um buraco na estufa. Neville levou as mãos à cabeça.
- Tô ferrado.
- Por que você não avisou, Neville? - Rony perguntou, levantando-se e limpando as folhas que tinham grudado no seu uniforme, como se aquilo fosse a coisa mais normal do mundo.
- Eu avisei! Falei pra você não tocar nela! - Neville retrucou desesperado.
- Falou muito tarde!
Neville bufou e, como dificilmente fazia, ficou nervoso a ponto de intimidar Rony.
- Então agora você não vai tocar em mais nada!- ele falou alto, apontando um dedo no meio dos olhos de Rony, que deu um passo para trás. - Entendeu?
- Entendi... Relaxa, Neville...
- Eu só vou estar relaxado quando sair daqui. - o garoto respondeu bravo, batendo os pés e olhando para os lados à procura de uma flor que servisse. Rony o seguiu.
- Que tal aquela? - ele apontou para uma flor rosada, de uma beleza peculiar.
- Venenosa. - Neville retrucou.
- E aquela outra? - era laranja.
- O perfume dela pode deixar uma pessoa adormecida por até trinta e oito horas.
- Não... definitivamente... - Rony falou, fazendo uma careta. - Hermione já dormiu demais.
- Aquela! - Neville apontou para uma flor roxa.
- Roxa? - Rony fez outra careta. - Não gostei dela não...
- É porque você não viu nada. - Neville retrucou, aproximando-se da planta e tocando de leve suas pétalas.
- Ei, você tocou nela!
- Eu posso tocar!
- Ah, tá... isso é injusto, mas tudo bem.
Neville suspirou.
- Ela é linda, não é?
- Não tô vendo nada de mais. - Rony disse emburrado. - Ela nem tá aberta ainda. O que essa flor faz de útil, afinal?
- Observe.
Neville tocou numa parte sensível da planta, bem abaixo da corola, e ela se abriu em pétalas que passavam, gradualmente, do roxo para o azul claro. Um perfume doce e agradável encheu todo o ambiente. Rony sorriu.
- Eu sabia que você iria me ajudar, Neville. - o garoto bateu de leve nas costas do outro. - Agora é só arrancar ela daí, não é? - ele perguntou, estendendo suas mãos perigosamente.
- Não! - Neville deu um sonoro tapa na mão do colega. - Não é assim que se faz.
Rony soltou um muxoxo, muito aborrecido.
- E como é então, Sr. Bruxo Verde?
Neville lançou um olhar mortal para o garoto, mas deu de ombros e começou a desenterrar, lentamente, a raiz da flor.
- Isso vai demorar semanas! - Rony exclamou. - Preciso dessa flor para essa manhã ainda!
- Não me apresse! - Neville retrucou irritado. - Você não entende a natureza das plantas... Elas têm que ser tratadas com -
- Tá bom, tá bom, já entendi. Apenas tire ela daí, sim?
Neville suspirou, revirando os olhos, e jurou que, se aquilo não fosse por Hermione, ele teria desistido.
*******
- Surpresa!
Hermione olhou da flor que Rony estendia bem à frente de seus olhos para o garoto. Suas sobrancelhas se ergueram.
- O que é isso, Rony?
A ala hospitalar estava cheia novamente. Era manhã, e a grande maioria dos pacientes já estavam acordados. Rony entrou sorrateiramente pela porta aberta, tentando de todas as formas não esbarrar no meio do caminho em Madame Pomfrey. Não queria receber um carão logo pela manhã.
- Uma flor, oras!
- Eu percebi isso. - Hermione retrucou revirando os olhos.
- É pra você... - Rony falou timidamente.
Hermione estendeu o braço e apanhou a flor com cuidado. Rony se sentou na beirada da cama dela e começou a observar cada traço da garota, enquanto ela examinava a flor, tentando sentir seu perfume.
- Como você a conseguiu? - ela perguntou subitamente. - Esse espécime só tem na estufa quatro.
Incrível como Hermione não deixava nada passar em branco. Rony se perguntou por que tinha que gostar justo de uma garota que não era como as garotas normais. Qualquer mulher ganha flores e apenas sorri, agradece e beija seu namorado. Hermione não era assim. Ela tinha a mania de perguntar a procedência, como ele tinha arranjado-a, qual era a espécime, e se não soubesse, era capaz de procurar um livro de Herbologia na biblioteca apenas para saber que diacho de flor Rony tinha lhe dado.
- Neville me ajudou.
Os olhos dela se arregalaram.
- Vocês invadiram a estufa? - ela perguntou surpresa, contendo uma exclamação de susto.
- Não invadimos... não no sentido real da palavra. Apenas entramos... escondidos, é diferente. Além disso, ele tinha a chave.
- Rony! Vocês poderiam ter sido pegos! Você é um monitor-chefe, tem que dar o exemplo!
- Blá, blá, blá...
- Francamente... Roubar uma flor?
- Eu não roubei uma flor... não no sentido real da palavra. - ele repetiu displicente. - Apenas peguei emprestado, é diferente.
Hermione revirou os olhos novamente. Rony bufou.
- Ora, qual é, Mione? Nós não fomos vistos, e tinha muitas flores iguais a essas naquela estufa, ninguém vai notar que ela desapareceu. E também, você não pode dizer nada. Quantas regras você já não quebrou junto comigo e Harry?
Hermione preferiu não responder. Rony sentiu que poderia provocá-la.
- Eu me lembro... posso até enumerá-las... Começa quando nós...
- Não precisa me lembrar, eu sei perfeitamente. - ela o parou, colocando um dedo na boca dele. Rony sorriu marotamente e o beijou, segurando a mão dela. Hermione a retirou rapidamente. - Aqui não.
- Mione... vamos, por que você apenas não esquece por um segundinho que existem regras?
- Regras foram feitas para serem seguidas.
- Regras foram feitas para serem quebradas.
Hermione abaixou os olhos para sua flor, bufando exasperada, enquanto se ocupava em, exatamente como Rony tinha visto Neville fazer, tocar suavemente a parte da corola sob as pétalas, fazendo com que a flor se abrisse em sua total exuberância. Rony suspirou; quando Hermione estava daquele jeito, era porque tinha se arrependido de algo errado.
- A Madame Pomfrey brigou com você ontem à noite?
- Não exatamente.
- Brigou ou não brigou?
Ela revirou os olhos até finalmente pousá-los sobre Rony.
- Não, mas ficou decepcionada.
Rony respirou fundo, cruzou os braços, e encostou-se ao espaldar da cama, oposto ao de Hermione. Ele a olhou com atenção antes de começar a falar.
- Mione, você não precisa ser a garota perfeita todo o tempo, sabia disso?
Ela bufou mais uma vez e abaixou os olhos para a flor, desviando-os de Rony.
- Eu tenho medo que ela conte à Profª. McGonagall.
- Ela não vai contar nada à McGonagall.
- A professora confia em nós, Rony, eu não queria perder essa -
Rony fez um gesto para que ela se calasse.
- Corrigindo: a McGonagall confia em você, Hermione.
- Não é verdade! Ela confia em nós dois, e eu sei que ela tem orgulho de nós. Ela mesma já me disse que está muito feliz em ter dois grifinórios como monitores-chefes. E se ela souber -
- Pelo amor de Deus, a gente só ia se beijar! - Rony falou mais alto, abrindo os braços, e alguns colegas nas camas e ao redor delas o encararam intrigados. Hermione olhou para Rony como se tivesse vontade de estrangulá-lo. - Nós estamos juntos, há algo proibido em nos beijarmos?
- Nós não estamos juntos, Rony.
Ele se calou prontamente e engoliu em seco.
- Pelo menos nenhum de nós declarou isso... hum... oficialmente...
Parecia custar a Hermione todo o seu orgulho e coragem falar aquilo, e ela rapidamente abaixou os olhos para o lençol, e aparentemente as suas linhas soltas começaram a ser muito interessantes. Rony olhou para seus tênis e ficou espantado em como seus cadarços poderiam ser atrativos; ele se abaixou, desamarrou-os e fingiu estar amarrando-os novamente.
Os dois sabiam perfeitamente o que passava na cabeça do outro, e se Harry tivesse visto essa cena, provavelmente os xingaria de idiotas por serem tão patéticos. Era óbvio, era estupidamente claro que os dois se gostavam mais do qualquer outra coisa no mundo. No entanto, eles também eram estúpidos demais para admitirem isso para si mesmos e publicamente (mesmo que todos enxergassem aquilo), e continuavam naquele impasse. Nunca namoraram de verdade, quer dizer, ficaram juntos tempo suficiente para se estabelecer um namoro. E nenhum dos dois, tampouco, teve coragem o bastante para tocar no assunto, porque toda vez que isso acontecia, até mesmo comentar como as paredes do castelo estavam desgastadas parecia ser mais interessante.
- Rony... - Hermione quebrou o silêncio primeiro. Ele a olhou de esguelha, mas ainda estava com os dedos sobre o cadarço, caso fosse necessário usar aquela desculpa para não olhar para a garota.
- Quê? - ele perguntou, sentindo uma contração involuntária no estômago, o medo de que ela voltasse ao assunto constrangedor assolando seu peito.
- Você não está atrasado para a aula?
Ele largou o cadarço, e seus pés bateram sonoramente no chão quando ele os deixou cair. Não se importou e olhou para Hermione.
- Não, pelo menos eu acordei cedo para chegar aqui.
Ela pareceu respirar mais aliviada.
- Ah, pensei que estivesse cabulando aula para estar aqui...
- Hermione... - ele começou com um sorriso cínico no rosto. - Olha para mim, você acha que eu faria uma coisa dessas?
Ela não se deu ao trabalho de responder.
- Se bem que... - Rony continuou, sorrindo marotamente. - Não é uma má idéia. A primeira aula é com o Snape, então -
- Você está doido? Você não vai cabular uma aula do Snape!
Rony a encarou como se ela fosse burra.
- Eu estava brincando. Não vou dar chance para ele me colocar em outra detenção... Lembra que ele está na minha cola desde meu último "D" no dever de segunda passada?
- Ah, que bom que você vai... quero que anote tudo que ele disser, não quero me dar mal nos N.I.E.M.s por ter faltado um dia nas aulas...
- Faltado? Mas eu pensei que -
- Madame Pomfrey não me deu alta. - Hermione disse, como se o que a enfermeira fizera fosse a coisa mais reprovável do mundo. - Disse que ainda estou "em observação". Vou perder todas as aulas do dia!
- Diz isso como se fosse uma coisa ruim... - Rony comentou com inveja.
- E é horrível!
- Olha, vamos fazer o seguinte: eu troco de lugar com você, coloco uma peruca castanha cheia na minha cabeça e deito aí; você pinta o cabelo de vermelho, coloca sardas no rosto e vai assistir à aula do Snape, o que acha?
Ela tentou segurar o riso, mas não conseguiu.
- Ora, não ria... era um bom plano...
Hermione parecia dividida entre rir e olhar feio para o garoto. Acabou não fazendo nenhuma das duas coisas.
- Peça para o Harry copiar também. Aliás, como ele está?
- Você confia mais no Harry do que em mim? - Rony falou num fingido tom choroso.
- Pare de dizer bobagens e me diga como ele está.
E então Rony passou os cinco minutos posteriores discorrendo sobre a estranha aparição de Harry e Gina, e sobre suas preocupações sobre os dois estarem juntos. Hermione riu dele e falou que ele estava sendo ridículo.
- Harry e Gina simplesmente não podem estar juntos, Rony. - ela falou, como se ele fosse uma criança de cinco anos que não entendesse sua língua. - Gina desistiu dele há eras, e Harry anda tão chateado e revoltado que não tem tempo para ver garotas à sua frente.
- Eu não sei, Mione. Eu achei esquisito, sabe? Encontrei os dois conversando em sussurros ontem, quando ele ainda estava aqui na ala hospitalar. Gina disse que tinha vindo ver como ele estava.
- Provavelmente ela só estava preocupada com ele, são amigos, não vejo problema algum nisso. Além disso, você disse que eles foram atacados juntos, é natural que ela tenha vindo ver como ele estava depois disso.
Rony resmungou.
- E tem mais... - Hermione prosseguiu. - Se eles estiverem juntos, o que não estão, qual o problema?
- Qual o problema?
- Rony, você mesmo já me disse uma vez que acharia legal se os dois tivessem algo. Harry é um cara legal, e você sabe disso. E Gina faria bem a ele.
- É só que... - Rony estava relutante em dizer aquilo, achava-se um canalha de pensar assim do melhor amigo, não queria repetir nem para si mesmo, quanto mais Hermione, mas estava se sentindo assim. - Bem... Harry é meio que... um... imã para desastres, não é?
Hermione pareceu absorver suas palavras por alguns segundos.
- Não acredito que está dizendo isso!
- E não é?
Ela engasgou.
- Bem... em termos, mas... ah, Rony, nós nunca nos importamos com isso!
- É diferente quando se está falando da sua irmã mais nova, que conhece desde que nasceu.
- Gina não é de vidro, se você não notou. Ela é uma bruxa forte que já enfrentou muitas coisas na vida.
Rony resmungou novamente. Um sinal tocou ao longe.
- Mas...
- Pare de bobagens e vá para a aula! - Hermione exclamou.
- Você está me expulsando?
- E não esqueça de copiar tudo que o Snape disser!
Rony se levantou, olhando bravo para ela.
- Pode deixar... vou limpar meus ouvidos para ouvir cada palavra do gorduroso...
E Hermione apenas ficou observando o garoto ir embora, batendo os pés, pensando no que ele tinha acabado de lhe dizer. Tinha que conversar com Gina assim que tivesse uma oportunidade.
*******
Ela olhou para suas mãos sujas de adubo de bosta de dragão, o preferido da Profª. Sprout. Levou uma das mãos ao nariz, cheirando-o. Aquilo fedia mais do que ovo podre misturado a repolho velho. Luna fez uma careta e voltou a mexer nas raízes de sua planta, afundando-a mais na terra.
CRASH.
Luna se limitou a um olhar de esguelha para o lado. Já era a terceira vez que Gina, que dividia a mesa com ela, derrubava seu vaso no chão. Naquele dia ela parecia mais "Di-Lua", do que a própria Luna. A sorte dela era que a Profª. Sprout estava muito ocupada examinando o trabalho de Colin Creevey do outro lado da estufa, que tinha problemas mais sérios com a sua planta, que agora decidira mastigar sua mão.
- Reparo! - ela ouviu Gina murmurar, restaurando o vaso. - Droga, vou ter que começar tudo de novo!
- O que está acontecendo? - Luna perguntou em um tom desimportante.
- Quê?
- Você não costuma derrubar vasos, Gina. - a corvinal continuou, dando um passo para trás e examinando sua planta. - Sabe, meu pai conseguiu mais um Bufador de Chifre Enrugado semana passada. Eles são difíceis de achar, da última vez que fomos à Suécia não conseguimos capturar nenhum.
Gina olhou aturdida para a amiga. Em certos momentos, não conseguia compreender como a cabeça de Luna funcionava. Mas, de qualquer maneira, ficou feliz que ela tivesse esquecido os vasos.
- E então, você não vai dizer o que está acontecendo com você hoje?
Às vezes Gina se perguntava se Luna apenas fingia que era maluca.
- Não está acontecendo nada. - ela murmurou, enchendo seu vaso de terra pela terceira vez.
Luna olhou novamente de esguelha para a garota. Não precisava ser muito esperta para entender que Gina estava escondendo alguma coisa.
- Está preocupada com o quê?
Gina deu um sobressalto e deixou cair o vaso novamente.
- Francamente, Srta. Weasley! - a Profª. Sprout exclamou do outro lado da estufa. - Então é daí que vem o barulho? Cinco pontos a menos para a Grifinória.
Bufando, a garota murmurou "Reparo", e o vaso se refez novamente. Luna tinha razão; ela estava preocupada. Naquele exato momento, em que ela enchia vasos idiotas com terra, Harry deveria estar na masmorra de Snape, tendo sua primeira aula de Poções depois de perder a memória, provavelmente não entendendo absolutamente nada do que Snape dizia, e entendendo menos ainda por que Snape implicava tanto com ele. Ela até poderia vê-lo fazendo a poção errada, perdendo pontos para a Grifinória, ouvindo provocações do mestre de Poções, e não entendendo nada do que acontecia.
E Gina não estava lá para ajudá-lo. Aliás, ela não pode fazer muita coisa. Harry, novamente, se distraiu quando ela tentou lhe explicar o que ele teria que enfrentar no seu primeiro dia de aula. Aliás, Gina achava que seria praticamente um milagre se, na hora do almoço, metade da escola já não soubesse o que acontecera com Harry. Era mais fácil os tais Bufadores de Chifre Enrugado que Luna falava com tanto entusiasmo serem verdadeiros, do que o segredo dela e de Harry permanecer escondido do mundo mágico até o fim do dia.
Poderia estar sendo egoísta e até mesmo burra, mas Gina ainda assim não se sentia segura para contar a qualquer pessoa o que tinha acontecido com Harry. Ele parecia tão frágil e vulnerável depois de perder a memória, que ela tinha receio de que, se ela simplesmente repetisse aquilo para alguém - até mesmo alguém confiável -, alguma catástrofe horrível pudesse acontecer com o garoto. E digamos que Harry atraía catástrofes tão facilmente quanto Neville derrubava caldeirões na aula de Snape.
- Então, você vai me ignorar?
A voz de Luna acordou Gina de seus pensamentos com mais um sobressalto, e dessa vez foi à própria Luna que segurou o vaso dela antes que caísse e se espatifasse no chão pela quinta vez. Ela se virou emburrada para Gina, mas falou muito calmamente:
- Tudo bem, Gina. Eu entendo se você não quiser dividir comigo as suas aflições.
Mas pela expressão magoada no rosto da amiga, Gina não tinha certeza se ela realmente entendia.
- Luna...
- Você acha que Colin Creevey se importaria em tirar algumas fotos do Bufador de Chifre Enrugado que meu pai arranjou? É que ele é bom em fotografias, e o fotógrafo do Pasquim saiu de férias, disse que precisava visitar alguns parentes na Holanda. A matéria tem que sair na próxima edição.
O tom de Luna era novamente sonhador e aéreo. Gina suspirou. Sabia que não adiantaria voltar ao outro assunto com a amiga, e também não tinha certeza se queria isso agora que ela tinha parado de lhe bombardear de perguntas.
- Eu posso conversar com ele, se você quiser. Acho que Colin não fará objeção.
- Valeu, Gina.
Luna sorriu, dando mais um passo para trás para examinar sua planta, enquanto Gina afundava tristemente mais terra no vaso.
*******
- Quem é aquele cara?
Gina levou um susto. Harry nem ao menos lhe disse "oi". Parecia ter se materializado na sua frente, e Gina por um instante pensou que ele tivesse atravessado a parede. Mas Harry não era um fantasma e, por isso, era ridícula a idéia de que ele pudesse atravessar paredes.
Luna assobiou. Ela e Gina tinham acabado de vir dos jardins de Hogwarts, e sua próxima parada era o Salão Principal, para o almoço. As pessoas tinham que se desviar dos três, parados no meio do Hall de Entrada, e algumas resmungavam com eles ao passar. Tanto Harry, quanto Gina, olharam para Luna, que apenas deu de ombros.
- O.k., eu sei quando não sou bem-vinda. Vou comer que ganho mais.
- Espera, Luna!
Mas ela já estava distante, ou então ignorou o grito de Gina. Harry olhou intrigado para Gina. Ela estava desanimada. Sabia que Luna estava chateada com ela. Droga, por que ela tinha que ser assim? Às vezes, Luna parecia interpretar os pensamentos de Gina, e ela não descansava enquanto não soubesse se estava certa. Mas daquela vez, Gina realmente não queria dizer nada.
- Vem cá, Harry... Vamos sair do meio dessa gente.
Gina, então, conduziu-o até um canto mais afastado do salão, onde não poderiam ser ouvidos, tal era o barulho que os alunos faziam, conversando e rindo. Ela observou Harry, que estava com o rosto avermelhado, como se tivesse corrido. Ele arfava de cansaço, seus cabelos estavam mais despenteados do que de costume, e a franja caía tanto sobre os olhos que Gina não sabia como ele estava vendo alguma coisa. Os óculos estavam ligeiramente tortos no rosto.
- Como você conseguiu despistar Rony? - a garota perguntou subitamente, e parecia que ela tinha pego Harry de surpresa.
- Eu... disse que ia no banheiro. Na verdade, eu até estava com vontade, mas não consegui achar o caminho, então vim pra cá te procurar. Corri por esse lugar inteiro e, nossa, como tudo aqui é enorme!
- O que aconteceu? - Gina perguntou, mas já podia adivinhar a resposta.
- Aquele cara! - Harry exclamou desesperado, em um tom urgente. - Como é o mesmo o nome dele? Sni... não, não é isso... Sna...
- Snape.
- Isso! Ele é um pesadelo! Eu tive a nítida impressão de que ele me odeia, e também...
- Não é impressão. - Gina suspirou. - Ele realmente te odeia.
Harry franziu as sobrancelhas e tirou os óculos, como se fosse enxergar Gina melhor sem eles. Ela ainda não tinha se acostumado a vê-lo sem óculos, mas Harry começara a ter essa mania de tirá-los.
- Como é que é?
- Ele te odeia, Harry. Ele simplesmente te persegue e te atormenta desde o primeiro dia que você pisou em Hogwarts.
Harry demorou alguns instantes para absorver a informação.
- E por quê?
- Não sei ao certo... Parece que ele não gostava do seu pai na época de Hogwarts, mas o motivo exato eu não sei. Pode ser que você saiba, mas é claro que não se lembra, naturalmente...
- Meu pai? - Harry repetiu pensativo, e Gina tomou um sobressalto; ela ainda não tinha mencionado nada sobre os pais de Harry. - Nós nunca falamos sobre ele... ou sobre minha mãe... Por que eles não estão aqui?
A boca de Gina estava terrivelmente seca. Ela permaneceu encarando aqueles olhos excepcionalmente verdes, agora mais acentuados sem os óculos, seguros entre os dedos da mão direita do rapaz. Ele olhava para Gina, esperando uma resposta, e ela simplesmente não sabia o que dizer. Estava adiando com todas as forças a hora que teria de dizer a Harry que seus pais estavam mortos.
- Ora, Harry... - ela começou nervosamente, procurando palavras e tentando parecer convincente. - Nós estudamos num internato, é óbvio que os pais dos alunos não podem estar aqui.
Harry pensou por alguns instantes, parecendo considerar a idéia.
- Mas... onde eles estão? Por que não me mandam cartas? Hoje, no café da manhã, você recebeu uma carta da sua mãe, não foi? E vários alunos também receberam... - ele deu um tapa na própria cabeça. - Droga, por que eu não me lembro? Não me lembro deles!
Gina sentiu um nó na garganta e o engoliu. Sentiu que aquele era o momento, e ela não poderia escapar de contar tudo para ele. Fechou os olhos por um instante, reunindo coragem, mas quando os abriu, decidida a contar tudo para Harry, levou um susto. O Prof. Snape tinha aparecido bem ao lado deles, e encarava Harry com desconfiança, enquanto o rapaz colocava os óculos para enxergá-lo melhor.
- Ora, ora... - Snape correu os olhos de Gina, que estava encostada na parede, para Harry, que tinha acabado de colocar os óculos e olhava intrigado para o professor. - Muito esquisito vocês dois aqui, quando deveriam estar no Salão Principal... Estão tramando alguma coisa? - ele completou com sua voz letal e venenosa.
Harry abriu a boca para dizer alguma coisa, mas provavelmente as palavras se perderam até o caminho para a boca, porque ele a fechou rapidamente. Snape se tornou para ele.
- Receio dizer, Potter, que não sou tão bondoso como o diretor é com você, portanto são cinco pontos a menos para a Grifinória por estarem atrapalhando a passagem dos alunos.
- Que eu saiba não é proibido conversar nos corredores! - Gina exclamou imprudentemente, suas veias latejando de raiva do mestre. - O que é isso, voltamos à ditadura da Umbridge?
Foi um erro. Até Harry percebeu isso. Gina respirou mais fundo quando Snape a encarou com um olhar cortante.
- Agora são dez pontos a menos, Srta. Weasley. E serão vinte se os dois não forem direto para o Salão Principal agora mesmo.
Não foi preciso dizer duas vezes. Um minuto depois, Harry e Gina já estavam se esgueirando pela multidão de alunos que entravam com barulho no Salão. Ao menos, Harry tinha esquecido o assunto de seus pais, para alívio de Gina. Mas antes que ela pudesse ficar tranqüila, ele a parou, puxando-a para um canto e olhando-a seriamente. Gina teve medo de que ele fosse mencionar o assunto que debatiam anteriormente. Mas ela estava errada.
- Eu acho que eu vou fracassar, Gina.
- Como assim?
- Eu não vou conseguir fazer essas coisas... Essas aulas, essas... mágicas. Eu não sei fazer essas coisas, vou acabar revelando o segredo em dois tempos. Não seria melhor contarmos tudo de uma vez?
Gina engoliu em seco. Também se preocupava com isso, e fazia essa pergunta um milhão de vez para si mesma desde o acidente. Ela olhou para o lado e viu Draco Malfoy entrar no Salão, contando algo muito engraçado para seus capangas, Crabbe e Goyle, que riam como trasgos. Se pessoas como Malfoy descobrissem o segredo de Harry... não, ela tinha que continuar escondendo. Enquanto somente ela soubesse aquilo, Harry estaria seguro.
- Não, Harry. E você não vai fracassar. - ele não parecia acreditar. Gina respirou fundo e continuou. - Eu mesma vou te dar aulas particulares, e da próxima vez que você tiver aula de Poções, Snape não vai ter um dedo para reclamar de você!
Harry suspirou desanimado, e meramente acenou com a cabeça. Pelo menos, Gina queria confiar que conseguisse fazer isso.
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