Flores e ervas
Harry, Rony e Hermione estavam sentados no salão comunal da Grifinória. Hogwarts reabriria dentro de poucos dias e ninguém tinha certeza se os alunos apareceriam para as aulas. Porém os três ficariam lá, como o retrato de Dumbledore pediu. Esperavam que assim pudessem obter mais informações sobre o paradeiro das outras horcruxes que precisavam ser destruídas.
Harry estava calado desde a revelação do ex-diretor sobre sua própria morte. Não importava o que Dumbledore dissesse, para ele Snape era e sempre seria um assassino covarde. Não importava se ele lutaria ao seu lado e pelos mesmos objetivos. Harry sempre o odiaria por tudo que aconteceu, por Sirius, por seu pai, sua mãe, por tudo que passou em suas mãos. Além disso, Harry ainda não acreditava na inocência dele. Só acreditaria se ele aparecesse trazendo a tal garota misteriosa, como Dumbledore esperava que Snape fizesse.
O silêncio tomava conta do salão comunal, o trio envolto em seus próprios pensamentos, cada um revivendo de uma maneira as palavras que Dumbledore usou para explicar os recentes acontecimentos. Snape o matou porque ele próprio havia ordenado. O professor quis relutar, mas aceitou a missão. E agora traria uma garota que Dumbledore não disse quem era, mas que parecia representar a chave para que Harry pudesse derrotar Voldemort.
- E aí, cara. O que você achou das coisas que Dumbledore nos contou? - perguntou Rony, quebrando o silêncio opressor que se instalou no salão comunal. – Acha que Snape é mesmo inocente?
Hermione lia um livro, mas resolveu deixá-lo de lado para ouvir a resposta do amigo:
- Não. Eu vi tudo que aconteceu, não consigo acreditar que Snape seja inocente. Mas darei uma chance a ele, como Dumbledore pediu. Agora, se ele não aparecer, se não trouxer essa menina em segurança e provar que está do nosso lado, não hesitarei em destruí-lo, assim como farei quando encontrar Voldemort – Harry se levantou e completou - Já vou indo, estou exausto. Boa noite.
Retirou-se para seu dormitório deixando Rony e Hermione sozinhos, conversando aos sussurros sobre o que aconteceu.
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Júlia estava sentada próxima à janela de seu quarto observando o anoitecer. Ela havia passado o dia todo trancada depois da discussão que teve com Snape. Sentia tanta raiva dele que não saiu do quarto para almoçar ou jantar e continuava sem fome. Perdida em seus pensamentos e em sua raiva muda. Então foi interrompida por uma batida na porta. Quando abriu não havia ninguém, apenas um pedaço de pergaminho dobrado no chão. Ela pegou, olhou para os lados procurando ver se havia alguém por ali. Ao constatar que o corredor estava deserto, fechou a porta.
Quando leu viu que se tratava de um bilhete... de Snape.
Se ainda quiser respostas te espero em cinco minutos.
Terceira porta à direita, a contar da sua. Não precisa bater, estará aberta para você.
S.S.
- Não vou! - disse para si mesma assim que acabou de ler, porém sem muita certeza em sua própria afirmação.
Sentou novamente próxima a janela, amassando o bilhete e segurando-o apertado na mão. Tentou não pensar no que leu.Não pensar em Snape. Ele mexia com ela, irritava-a, mas será que era só isso? Ficou olhando para os jardins, a estrada distante, a névoa estranha que pairava no ar dia e noite. Olhava e pensava enquanto os minutos passavam.Ficava cada vez mais angustiada. Até que se passaram quinze minutos e ela resolveu ver o que Snape queria. Levantou-se, olhou no espelho, prendeu os longos cabelos negros em uma trança e saiu.
Encontrou a porta destrancada como ele havia dito no bilhete e entrou. Era um cômodo bem maior que o quarto dela, um misto de escritório e dormitório, iluminado apenas pelas chamas de uma lareira. Snape estava sentado na escrivaninha escrevendo alguma coisa, muito concentrado. Quando ela ia anunciar sua presença ele disse com rispidez:
- Está atrasada!
- Como você consegue...? - perguntou a garota, sem completar a questão.
Ele deixou o pergaminho de lado e pousou os olhos negros sobre ela de maneira profunda ao responder:
- Consigo o quê? - disse e apontou a cadeira para ela se sentar.
- Ser tão insuportável!
Ele ergueu a sobrancelha, um gesto muito seu, e disse com calma e um pouco de ironia na voz:
- Anos de prática, minha querida.Mas com um pouquinho mais de esforço, você conseguirá se igualar a mim.
Ele sorriu e ela cruzou os braços emburrada.
- Deixemos para outra hora essa questão tão importante – continuou com ainda mais ironia. – Vamos ao que interessa: vou te contar tudo que precisa saber.
A menina permaneceu em silêncio e ele prosseguiu:
- O que houve ontem a noite não foi um acidente. Foi premeditado e o alvo era você. Porém tenho motivos para crer que o objetivo não era matá-la, e sim impedi-la de voltar para aquele hotel, só resta saber o...
- Qual a ligação do meu pai nessa história? – interrompeu Júlia bruscamente.
- Por que está perguntando isso? - disse Snape intrigado.
- Esta manhã ele me procurou para saber sobre o acidente e disse uma coisa que me deixou intrigada. Falou que se eu saísse daqui outros acidentes como aquele se repetiriam.
Snape lançou a Júlia um olhar penetrante, mas desistiu ao não conseguir ver nada em sua mente.
-Você nunca vai conseguir.
- O quê? - perguntou ele espantado, desviando o olhar.
- Você sabe do que estou falando.Ler minha mente. Você e meu pai vêm tentando isso desde que cheguei aqui, mas saiba que jamais conseguirão!
Então era intencional. Ela era uma grande Oclumente. Sabia o que fazia, estava fechando sua mente propositalmente, mas o que ela queria tanto esconder?
- Tem razão. Vejo que não devo subestimá-la mesmo. Então não farei rodeios, mas você tem que ser sincera comigo e precisa confiar em mim.
Ela concordou balançando a cabeça positivamente, e ele continuou:
- Antes de morrer, Dumbledore me pediu para encontrá-la e protegê-la, mas não teve tempo de me explicar o porquê disso. Aos poucos fui descobrindo, mas ainda não sei muita coisa. Existe um homem muito poderoso que quer dominar nosso mundo, instituindo uma linhagem de bruxos puros. Para isso, ele pretende escravizar todos aqueles que não tiverem sangue puro, acabar com os trouxas e eliminar todos aqueles que tentarem impedir seus planos. Ele é chamado de Lorde das Trevas ou Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado. E ele é seu pai! E acredito que é dele que devo protegê-la.
Júlia encarou Snape com uma expressão indecifrável.Ele esperava que ela ficasse chateada, chocada, que gritasse com ele, se negasse a acreditar, mas ela permanecia olhando para ele. Quase... indiferente.
- Já esperava por isso – falou com estranha calma na voz.- Senti um clima estranho no ar, pude ver a aura negra que o rodeia e também a muitos que vivem aqui. E não ache que isso é tolice minha! - concluiu com autoridade, já que Snape a olhava com ar de incredulidade.
- Não acho que seja tolice, pois já me mostrou que é uma bruxa poderosa. Mas não deve se basear apenas em premonições, porque elas não vão te ajudar a sobreviver! Tem razão quando diz que precisa sair daqui, mas não pode simplesmente correr feito uma maluca como tentou fazer hoje. Temos que agir com calma, com muita cautela. Vou tirá-la daqui, levá-la para um lugar seguro, mas saiba que não vai ser nada fácil. Estamos cercados por todos os lados, vigiados por todos os cantos. Precisa confiar em mim.
- Já disse que confio, pare de repetir isso toda hora. -respondeu a garota com sinceridade, mas uma leve irritação que foi ignorada por Snape.
- Trabalhei como espião de Dumbledore por anos. Seu pai acredita que eu trabalhava como agente duplo e que agora, com a morte do Diretor, voltei para ficar somente do lado das trevas.Ele me pediu para que lhe desse aulas particulares, mas é claro que isso seria apenas um pretexto para vigiá-la. Então usaremos estas “aulas” para encontrarmos uma maneira de fugir daqui. Nos encontraremos diariamente. Teremos que encenar bem, disso dependerá nossa sobrevivência.Pelo menos com Oclumência não terei preocupação, já que você se mostrou habilidosa no assunto, mas jamais subestime seu pai Júlia. Ele é muito poderoso.
- Tudo bem. Mas não demore em encontrar uma solução, preciso sair daqui. Eu sinto isso.
- Encontraremos. Agora é melhor ir. Volte amanhã, temos muito pra falar - ele se levantou, saiu de trás da escrivaninha e caminhou em direção à Júlia. – Mas saiba que não gosto de atrasos.
Ela sorriu para ele e levantou-se. Estavam próximos novamente. De repente, sentiu-se tonta, suas pernas ficaram sem força e ela ia cair, mas foi amparada por Snape. Suas forças foram voltando aos poucos, o calor do corpo e o aroma de ervas que ele emanava eram embriagantes. Júlia jamais se sentiu tão protegida, não tinha vontade de se afastar daqueles braços tão confortantes. Mas precisava, e se afastou constrangida com os próprios pensamentos.
- Está tudo bem? - perguntou o homem, preocupado.
- Sim... foi só uma tontura, acho que não me alimentei direito hoje.
- Não se alimentou mesmo. Não a vi em nenhuma refeição.
Ela sorriu para ele outra vez.
- Já vou, amanhã a gente se vê.
- Vou acompanhá-la.
Ele a acompanhou até a porta do quarto e lá se despediram. Snape voltou ao seu trabalho, tentando não pensar no sorriso e no perfume de flores que ficou impregnado em suas vestes. Júlia se deitou na cama e ficou relembrando o que ele havia lhe contado. Ficou pensando o quanto gostou de ser amparada por seus braços, o quanto gostava de estar perto dele.
“Pára com isso Júlia! Ele não passa de um homem arrogante e insuportável!” -pensou enquanto tentava esquecer o aroma de ervas que lhe despertava a sensação de borboletas saltitantes no estômago.
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