O Retorno de Voldemort



— CAPÍTULO VINTE E TRÊS —
O Retorno de Voldemort




— Harry! — Hermione gritou, desesperada, as lágrimas já lhe escorrendo pelo rosto, puxando as roupas de Rony como que para obrigá-lo a fazer alguma coisa.
Rony não disse nada, apenas puxou-a pela mão e os dois atravessaram a multidão para chegar até o corpo. Ela chorava copiosamente, deixando-se arrastar pelo amigo, e quando chegaram perto do corpo ela cobriu os olhos com as mãos para não ver.
— Não é ele! — disse Rony, sua voz vindo de muito perto do rosto dela.
Hermione tirou devagar as mãos do rosto para olhá-lo, o rosto dele estava a poucos centímetros do dela, e ele sussurrou: — É Cedrico quem está ali. Não é Harry.
Ela sentiu um alívio tão grande que chorou mais ainda, agora não de desespero. Rony a abraçou e eles ficaram assim por algum tempo, enquanto a multidão ao redor deles se empurrava e eventualmente também os empurrava. Ela começou a pensar subitamente nas palavras de Dumbledore: “ele voltou e alguém morreu”, e começou a absorver a idéia de que Voldemort matara Cedrico. Mas como? Estaria ele dentro do labirinto? O que teria acontecido? Ela pensava e chorava, encolhida nos braços de Rony, ouvindo de longe os gritos e murmúrios das outras pessoas, até que o eco da voz de Sirius em sua cabeça a trouxe de volta à realidade: “corram”, ele dissera.
— Vamos, temos que procurar Dumbledore — disse, afastando-se de Rony e tomando-lhe o braço.
Dumbledore não estava em lugar algum do campo de quadribol, então os dois resolveram procurá-lo dentro do castelo. Não havia ninguém no saguão de entrada ou no salão principal. Dirigiram-se para as escadas, correndo.
— Moody quis o mapa do maroto, lembra? — Rony disse, ofegante. — Ele queria controlar as coisas mais facilmente... Ele também apareceu na floresta na noite em que Crouch sumiu, deve ter sumido com ele!
— Foi ele quem deu a idéia de usar o feitiço convocatório para chamar a vassoura, na primeira tarefa. — acrescentou Hermione, com a voz tremendo de raiva. — Ele nos mandou desistir de procurar Crouch e nós pensamos que era preocupação, caímos como uns idiotas! Ele nos enganou o ano inteiro!
— Enganou a todos, até Dumbledore! — disse Rony, segurando o braço de Hermione ao final de um lance de escadas e dizendo: — Aqui é o andar da sala de Defesa Contra as Artes das Trevas. Vamos lá pegar o mapa do maroto para descobrir onde Dumbledore está.
— E se Moody levou? E se ele estiver fugindo?
— Precisamos tentar, venha!
— Sr. Weasley, srta. Granger! — disse a voz de Snape vindo de baixo, e os dois viram que junto dele estavam Minerva McGonagall e Dumbledore. — Qual o motivo de estarem perambulando por aí?
— Precisamos falar com o diretor! — disse Hermione. — Prof. Dumbledore, é urgente! Moody pode não ser Moody de verdade!
— Me conte uma novidade, srta. Granger! — disse Snape. — Agora dêem licença.
Dumbledore pediu silêncio ao colega com um movimento da mão, e disse:
— Já sabemos sobre Moody. Agora precisamos encontrá-lo o mais depressa possível, pois ele está com Harry. Vocês o viram?
— Não, estávamos procurando o senhor... — disse Rony.
— Voltem para... — começou a profa. McGonagall. — Não, não voltem para o campo de quadribol... Não sei para onde devem ir!
A professora estava pálida e parecia estar à beira das lágrimas. Os três professores passaram por eles e se dirigiram à sala de Defesa Contra as Artes das Trevas.
— E quanto a nós? — Rony perguntou. — Para onde vamos?
Hermione não tinha resposta, não apenas para aquela pergunta, mas para nenhuma outra que lhe fosse feita naquele momento. Foi então que ouviram a voz de Dumbledore gritar:
Estupefaça!
— Eles estão lá, Moody e Harry... — Hermione murmurou, com a voz fraca, e começou a dirigir-se para lá.
— Não — Rony disse, segurando-a pelo braço. — Ele é perigoso. Se Dumbledore, McGonagall e Snape não puderem detê-lo, então estamos perdidos, mas do contrário não há motivo para irmos até lá.
— Mas o que fazemos? Aonde vamos? — Hermione disse, sentindo a voz embargada por uma nova enxurrada de lágrimas.
— Não sei...
Os três professores tinham desaparecido dentro da sala. Os dois ficaram ali por mais alguns instantes, incertos do que fazer. Hermione derramava lágrimas silenciosas, olhando para os lados desertos. Snape e McGonagall tornaram a sair da sala.
— O que estão fazendo parados aí? Sumam! — disse Snape, ríspido, passando por eles. McGonagall parou perto deles e disse:
— Potter está bem, não se preocupem. Tudo ficará bem, vocês logo saberão o que aconteceu. Weasley, sua mãe deve estar preocupada com Harry, vá tranqüilizá-la. E você acalme-se, srta. Granger.
A professora também deu as costas e deixou-os, descendo as escadas como Snape tinha feito.
— Eu queria um vira-tempo — Hermione murmurou, lembrando-se do objeto mágico que tivera permissão de usar no ano anterior, capaz de fazer um bruxo voltar no tempo. — Queria impedir isso tudo de acontecer.
— Não adianta pensar nisso. Vamos procurar a minha mãe. — disse Rony, começando a descer também.
Quando ele já estava perto da metade do lance de escadas, ela convenceu-se e o seguiu. No saguão de entrada, viram que as pessoas começavam a voltar para dentro do castelo, ainda muito atordoadas e confusas. Correram até o campo de quadribol e encontraram Gina, Fred e Jorge. Gina chorava, então Hermione a abraçou e sussurrou em seu ouvido que Harry estava bem.
— Onde a mamãe está? — Rony perguntou.
— Não sabemos, também estamos procurando — disse Fred.
— Levem Gina para a torre — ordenou Rony — e nós acharemos mamãe e Gui. Harry está bem, digam isso a todos que encontrarem.
Os três tomaram o caminho de volta ao castelo e Rony e Hermione ficaram ali, olhando para os lados, sem saber onde mais procurar.
— Isso não está acontecendo... — Hermione murmurou, mas naquele momento ouviu um zunido que a alarmou. — Isso foi um besouro?
Rony franziu o cenho.
— De que importa?
— Acho que foi por ali... — ela disse, e saiu correndo na direção em que o zunido parecia ter ido.
— Hermione! — Rony gritou. — Ficou maluca? Aonde você vai?
Hermione correu tanto que depois de algum tempo até já perdera o zunido, não conseguia mais ouvi-lo em lugar algum. Já estava nos arredores da casa de Hagrid, e Rony vinha chegando. — Você perdeu a cabeça de vez, é? — gritou ele, furioso.
A profa. McGonagall vinha vindo com Sirius na forma de cachorro.
— O que estão fazendo aqui? Já encontraram sua mãe, Weasley?
— Estamos procurando — os dois disseram, juntos.
McGonagall olhou para o cão e depois para eles, e disse:
— Não façam nenhuma pergunta, é assunto do diretor. — e ela tomou seu caminho, andando apressada.
O cachorro dirigiu um olhar a eles, e Hermione viu que Bichento vinha vindo logo atrás, da mesma direção da qual McGonagall e Sirius tinham vindo. Ela abaixou-se para pegá-lo no colo.
— Onde eles podem estar? — Rony murmurou.
— Não devem ter ido para a torre da Grifinória, não é? — Hermione disse, apertando Bichento no colo.
— Vamos lá ver, aí você aproveita para deixar o Bichento.
— Certo.
Os dois andaram devagar até a escola. A sala comunal da Grifinória estava cheia, mas as pessoas faziam comentários em voz baixa. Não havia sinal da sra. Weasley ou de Gui ali. Rony esperou Hermione lá embaixo enquanto ela subia para prender Bichento.
— Minha mãe não pode ter voltado para casa, não é? — Rony perguntou, quando ela vinha descendo as escadas de volta à sala comunal.
— Não sei. — ela sussurrou, vagamente.
— Vamos procurar mais, não dá pra ficarmos parados aqui sem fazer nada.
Hermione e Rony andaram pela escola, devagar, nem tanto mais procurando a sra. Weasley e Gui, mas mais tentando abstrair-se daquela situação caótica. Não conversavam, apenas andavam pelos corredores, um ao lado do outro. Ela não soube por quanto tempo ficaram vagando, mas só tomaram um rumo certo quando Rony disse:
— Será que Harry já está na ala hospitalar?
Andaram apressados para lá, e quando chegaram a sra. Weasley e Gui estavam exigindo de Madame Pomfrey uma resposta para o paradeiro de Harry. Aproximaram-se, tentando chamar a atenção deles para dizer que Harry estava bem, mas no instante seguinte as portas se abriram e Dumbledore entrou com um Harry todo machucado, mancando, e com Sirius em sua forma de cachorro.
— Ah, Harry! — gritou a senhora Weasley, adiantando-se na direção dele.
Dumbledore impediu-a.
— Harry passou por uma provação terrível esta noite, — disse o diretor. — e acabou de contá-la para mim em detalhes. Peço a vocês que não lhe façam perguntas de nenhum tipo, o que ele precisa agora é silêncio e descanso. Se ele quiser, no entanto, vocês podem ficar com ele.
Madame Pomfrey olhava espantada para o cão, e disse:
— Diretor, o que...?
— Este cão ficará com Harry por algum tempo, mas não se preocupe, pois posso assegurar que ele é muito bem treinado.
O diretor saiu, e Madame Pomfrey trouxe Harry para uma cama. Ele parecia, além de machucado, muito exausto e extremamente chateado. Só então Hermione percebeu que Moody também estava ali, em uma cama, mas um Moody muito mais magro e com os cabelos cortados de modo muito irregular, provavelmente para serem acrescentados a uma poção Polissuco.
— O verdadeiro Moody — sussurrou para Rony.
Harry notou Moody também, pois perguntou à enfermeira como ele estava.
— Vai ficar bom — foi a resposta dela, colocando biombos ao redor da cama de Harry e entregando-lhe um pijama.
Depois que ele se vestiu e deitou, Hermione, Rony, Gui e a sra. Weasley sentaram-se em cadeiras ao redor da cama, e o cachorro preto sentou-se no chão, bem perto do afilhado. Mesmo que seu rosto fosse agora o de um cachorro, Hermione percebeu que os olhos de Sirius emanavam tristeza. Depois olhou para Harry, sem idéia do que poderia dizer.
— Eu estou bem — o amigo murmurou, olhando para ela e depois para Rony. — Só estou cansado.
Madame Pomfrey trouxe uma poção para Harry, dizendo que ela o faria dormir sem sonhar. Ele tomou alguns goles e logo depois adormeceu. Hermione levantou-se e contornou o biombo para sair dali. Andou até a janela, por onde observou o céu estrelado. No instante seguinte, Rony estava a seu lado, perguntando:
— Que houve?
— Nada... — ela respondeu, quase num sussurro. — Eu só queria saber o que realmente aconteceu.
O cão preto agora se aproximava dos dois, e fez um movimento em direção à porta.
— Acho que está pedindo que nós o sigamos. — Rony murmurou.
Os dois seguiram Sirius por algum tempo no corredor, e o cão escondeu-se em um canto escuro, onde retomou sua forma humana. Hermione e Rony ficaram junto dele, que disse sem rodeios:
— Estava junto com Dumbledore quando Harry contou o que aconteceu. Basicamente, o que precisam saber é que Voldemort voltou, de fato, e que matou Cedrico Diggory.
— E onde ele está? — Hermione sussurrou, desesperada. — Ele estava dentro do labirinto? Onde está agora?
— A taça do torneio era uma chave de portal. Harry e Diggory chegaram juntos a ela, a agarraram e foram arremessados ao túmulo dos pais de Tom Riddle, ou lord Voldemort. Lá... — Sirius hesitou, mas quando voltou a falar havia muita raiva impregnada na voz: — Rabicho o ajudou a retornar à vida, tornar a ter um corpo. Havia uma poção, à qual Rabicho acrescentou ossos do pai de Voldemort, sangue de Harry e um pedaço do próprio braço. E eles lutaram, Harry e Voldemort. Harry fugiu, trouxe o corpo de Cedrico de volta com a chave de portal. Não sabemos onde Voldemort está agora.
Hermione e Rony trocaram um olhar horrorizado. Uma lágrima escorreu pela face esquerda dela, bem devagar.
— Daremos um jeito. Agora vamos voltar lá para dentro. Ninguém pode me ver assim.
— Sirius... — disse Rony, e o padrinho de Harry virou-se para olhá-lo. — Quem estava se passando por Moody?
— Vocês não vão acreditar... Alguém que julgávamos morto. Bartolomeu Crouch Junior.
Ele virou cão outra vez e saiu andando em direção à ala hospitalar. Hermione e Rony entreolharam-se, incrédulos. Depois de uma longa pausa, Hermione choramingou:
— Ele enfrentou Você-Sabe-Quem... Tínhamos que ter estado lá com ele! Tínhamos... Sempre estivemos, não é justo que no momento mais difícil não tenhamos podido estar com ele... — ela agora empregou fúria na voz: — Queria ter a chance de matar Você-Sabe-Quem com as minhas próprias mãos, por tudo o que ele fez e para impedi-lo de fazer mais!
— Você não sabe o que está dizendo! — exclamou Rony. — Com toda a certeza não sabe!
— E por que diabos deixaram Harry competir, se já desconfiavam que era um plano de Você-Sabe-Quem desde o início? Nada disso estaria acontecendo!
— Não adianta pensar nisso agora, Mione — disse Rony, pondo a mão sobre o ombro dela. — Vamos voltar lá para dentro, aí você senta, se acalma.
Um tanto relutante, ela seguiu Rony de volta até a ala hospitalar. Sentaram-se outra vez perto de Harry, mas não deu tempo de ela se acalmar, pois foram ouvidos gritos; aparentemente, duas pessoas discutiam acaloradamente e se dirigiam para a ala hospitalar. Hermione reconheceu a voz da profa. McGonagall, impregnada de raiva:
— Eu não consigo acreditar que o senhor fez isso! Eu o julgava um pouco mais sensato!
— Sensato, não; sensato eu fui agora, pois a última vez que fui displicente com um criminoso, ele acabou fugindo! — respondeu uma voz de homem, igualmente irritado.
O cão preto rosnou baixinho. As vozes se aproximavam cada vez mais.
— O senhor se esquece de que estamos, por incrível que pareça, dentro de uma escola! Há crianças aqui dentro! Imagine se alguma se depara com... com aquilo! Foi uma atitude lamentável!
— Vão acordar Harry se não pararem com isso — sussurrou a sra. Weasley, irritada. — São as vozes de Cornélio Fudge e Minerva McGonagall, não são? Mas por que gritam?
— Lamentável, mas mesmo assim...
— O senhor nunca deveria tê-lo trazido para dentro do castelo! Quando Dumbledore descobrir...
Hermione ouviu as portas da ala hospitalar sendo escancaradas, mas só conseguiu ver alguma coisa quando Gui afastou os biombos que estavam ao redor da cama de Harry. Fudge entrou primeiro, seguido por McGonagall e Snape.
— Onde está Dumbledore? — Fudge perguntou.
— Não está aqui, ministro, — respondeu a sra. Weasley irritada. — e isto é uma enfermaria, o senhor...
As portas se abriram novamente e agora foi Dumbledore quem entrou.
— O que está acontecendo aqui? — perguntou o diretor. — Minerva, eu pedi que ficasse vigiando...
— Não há mais necessidade de vigiar ninguém, Dumbledore, pois o ministro já tomou suas providências! — berrou McGonagall.
— Quando eu avisei o ministro de que tínhamos apanhado o comensal da morte responsável pelos acontecimentos desta noite, — disse Snape, com calma. — ele sentiu-se ameaçado e trouxe um dementador junto com ele para fazer o interrogatório.
— Acontece que não houve interrogatório! — disse McGonagall. — Tão logo aquela... aquela coisa entrou na sala, aproximou-se de Crouch e... e...
Hermione percebeu o que a professora queria dizer, e os outros ocupantes da enfermaria também. O dementador aplicara seu beijo fatal no filho de Bartô Crouch, sugando-lhe a alma pela boca, algo pior do que a morte.
— Pelo que dizem não se perdeu muita coisa! — exclamou Fudge com displicência. — Afinal, aparentemente foi responsável por várias mortes, não é?
— Mas agora ele não pode prestar depoimento — disse Dumbledore, com a voz controlada mas extremamente firme. — Nunca saberemos qual foi o motivo de tais mortes. Poderíamos ter a confissão dele de que essas mortes não foram mais que um efeito secundário de um grande plano para restaurar as forças de Voldemort.
Fudge fazia movimentos rápidos e desconexos, mexia a boca sem emitir som, alternava olhares entre todos os ocupantes do recinto. Por fim, disse:
— Você-Sabe-Quem? Retornou? Isso é um absurdo...
— Agora você não poderá saber, Cornélio, mas eu, Minerva e Severo ouvimos a confissão de Bartolomeu Crouch Junior. Sob a influência do Veritaserum, a poção da verdade, ele nos disse como foi contrabandeado para fora de Azkaban e como Voldemort, tendo sabido por Berta Jorkins que ele continuava vivo, foi libertá-lo da guarda do pai, e usou-o para capturar Harry. O plano funcionou, posso lhe garantir. Crouch ajudou Voldemort a retornar.
— Mas são as palavras de um doido! Como pode tomá-las como verdadeiras?
— Harry presenciou tudo. Ele presenciou o renascimento de Voldemort.
Fudge sorriu de maneira estranha, como se tivesse ouvido uma piada.
— E o senhor está disposto a aceitar a palavra de Harry? Um garoto que... bem...
— O senhor anda lendo Rita Skeeter, sr. Fudge? — disse Harry, e Hermione virou-se assustada para ver que ele estava acordado, sentado na cama.
— E qual o problema? — disse o ministro, olhando para Dumbledore. — Só assim pude descobrir que Dumbledore tem me escondido fatos importantes relacionados ao garoto, como por exemplo o de que ele é um ofidioglota! E quanto às dores de cabeça, os desmaios freqüentes e as alucinações?
Hermione não acreditava no que estava ouvindo. Agarrou o braço de Rony, sentado ao seu lado, e trocaram um olhar de espanto.
— Escute aqui, Cornélio. — disse Dumbledore, furioso mas ainda contido. — Harry é tão são quanto eu ou você; a cicatriz na testa dele não afetou seu cérebro. Acredito que ela dói quando Voldemort está perto ou quando sente raiva.
Fudge soltou uma risada sarcástica.
— Você vai me desculpar, Dumbledore, mas nunca ouvi falar em uma cicatriz que funcionasse como alarme antes!
— Eu vi Voldemort ressurgir! — berrou Harry, ainda sentado na cama. — Vi os comensais da morte, posso lhe dar os nomes! Lúcio Malfoy! Mcnair! Avery, Nott, Crabbe, Goyle!
— Eles todos foram absolvidos das acusações de serem comensais da morte, há treze anos! — disse Fudge, parecendo ofendido. — Não acredito que você engula as invencionices desse garoto, Dumbledore! Aparentemente, vocês estão todos dispostos a instaurar o pânico, destruir tudo o que reconstruímos nos últimos treze anos!
— Voldemort voltou, sim. — disse Dumbledore. — Se você aceitar imediatamente este fato, Fudge, e tomar as medidas necessárias, talvez ainda possamos salvar a situação. O primeiro passo, e o mais essencial, é retirar Azkaban do controle dos dementadores. Afinal, você deixou os seguidores mais perigosos de Lord Voldemort aos cuidados de criaturas que irão se juntar a ele no momento em que ele pedir!
— Mas isso... é um desaforo!
— Eles não irão permanecer leais a você, Fudge! Voldemort pode oferecer um espaço muito maior para os poderes e prazeres deles do que você! O segundo passo é mandar enviados aos gigantes.
Fudge parecia, além de profundamente ofendido, extremamente surpreso.
— Gigantes? Mas que loucura é essa?
— Estenda-lhes a mão da amizade, agora, antes que seja tarde demais ou Voldemort irá persuadi-los, como já fez antes, dizendo que somente ele entre os bruxos concederá aos gigantes direitos e liberdade!
— Se a comunidade mágica ouvir falar que eu procurei os gigantes, as pessoas os odeiam, Dumbledore... a minha carreira termina!
— Você está obcecado pelo cargo que ocupa, Cornélio. — disse Dumbledore, seus olhos cintilando de raiva, parecendo ameaçador como Hermione nunca vira. — Você atribui demasiada importância, como sempre fez, à chamada pureza do sangue! Você não consegue reconhecer que não faz diferença quem a pessoa é ao nascer, mas o que ela vai ser ao crescer!
Hermione sentiu uma pontada incômoda no peito ao ouvir aquilo. Por mais que não concordasse com o preconceito, o sentia na própria pele por ser filha de trouxas. Ela abaixou os olhos, ainda apertando o braço de Rony com os seus. Dumbledore continuou falando. — Tome as medidas que sugeri e você será lembrado, no cargo ou fora dele, como um dos Ministros da Magia mais corajosos e sábios que já conhecemos. Não faça nada, e a história irá lembrá-lo como o homem que se omitiu e permitiu que Voldemort tivesse uma segunda oportunidade de destruir o mundo que tentamos reconstruir.
Fudge recuou, com uma careta que misturava nojo com incredulidade, e murmurou:
— Está demente... enlouqueceu!
Agora todos pareciam incrédulos com o que estava acontecendo.
— Se sua determinação em fechar os olhos o levou a este ponto, Cornélio — disse Dumbledore, como se estivesse concluindo uma idéia simples. — então é aqui que nossos caminhos se separam. Cada um de nós agirá como acha que deve.
— Escute aqui! — gritou o ministro, sacudindo o dedo na cara de Dumbledore. — Sempre o deixei agir normalmente, mesmo que não concordasse com suas idéias, pois tenho muito respeito por você! Agora, se você vai trabalhar contra mim...
— A única pessoa contra quem pretendo trabalhar é Voldemort — respondeu o diretor, sem se alterar. — Se você também está contra ele, então continuamos do mesmo lado.
Fudge parecia procurar por palavras para responder, enquanto balbuciava:
— Ele não... não pode estar de volta... Simplesmente não pode...
Snape então se adiantou, puxou a manga das vestes e esfregou o braço na cara do ministro, dizendo:
— Olhe, olhe! A marca negra! Não está tão nítida quanto estava há pouco mais de uma hora, quando ficou realmente negra, mas o senhor ainda pode vê-la. O lord das trevas marcou com este sinal todos os comensais da morte. Era uma maneira de nos reconhecermos e um meio de nos convocar à presença dele. Quando ele tocava a marca de qualquer comensal, devíamos desaparatar e aparatar instantaneamente ao seu lado. A marca se tornou mais nítida durante esse ano. A de Karkaroff também. Por que o senhor acha que o professor fugiu esta noite? Nós dois sentimos a marca queimar. Nós dois sabíamos que ele havia voltado. Karkaroff teme a vingança dele, por ter traído muitos companheiros comensais.
Rony olhou para Hermione, muito desconfiado, e ela teve de reconhecer para si mesma que apesar de Snape estar defendendo Dumbledore, ele falava de Voldemort de uma maneira estranha, quase passional, quase como se falasse de um deus.
— Já ouvi o bastante. — disse Fudge, retirando-se, mas antes de ir voltou para entregar a Harry o prêmio pela vitória no torneio; um saco contendo mil galeões.
Dumbledore suspirou longamente e voltou-se para a sra. Weasley.
— Temos trabalho a fazer. Posso contar com você e Arthur?
— Claro — disse ela, pálida mas decidida.
— Então preciso mandar uma mensagem a ele. Precisamos começar a entrar em contato com todos que não forem tão cegos quanto Fudge, precisamos mobilizar tantas pessoas quantas pudermos.
— Eu faço isso, — disse Gui. — pode deixar que mando a mensagem a ele.
— Excelente. Outra coisa... Quero que duas pessoas deste grupo se reconheçam pelo que são. Sirius, se puder retomar sua forma habitual...
Quando Sirius tornou-se homem outra vez, a sra. Weasley deu um salto e gritou:
— Sirius Black!
— Calma, mamãe — disse Rony, se levantando. — Está tudo bem.
Ele voltou a sentar-se, com Hermione ainda agarrada a seu braço como se fosse uma corda que sustentasse sua vida. Ela sentia-se sem coragem de mudar de posição, deixar aquela ala hospitalar ou qualquer outra coisa. Sentia-se acuada, como se o mundo estivesse desabando do lado de fora da ala hospitalar e fosse ficar ali dentro para sempre, presa com aquelas pessoas. Nesse meio-tempo Sirius e Snape tinham trocado olhares furiosos, e Dumbledore queria justamente obrigá-los a reconhecerem que agora estavam do mesmo lado.
— Apertem as mãos — o diretor ordenou.
Hermione não saberia dizer quem fez o esforço maior, pois tanto Snape como Sirius pareciam igualmente enojados e contrariados ao darem-se as mãos e logo soltarem-nas.
— Está bom por enquanto. Sirius, agora preciso que você alerte Remo Lupin, Arabella Figg, Mundungo Fletcher, a turma antiga. Fique escondido com Lupin por enquanto, entrarei em contato com você lá.
Sirius despediu-se de Harry, que parecia contrariado em vê-lo partir, e deixou a sala.
— E você, Severo, sabe o que preciso lhe pedir para fazer. Se estiver disposto... se estiver preparado...
— Estou — disse Snape, retirando-se em seguida também.
Dumbledore ficou alguns minutos em silêncio e depois também saiu. A sra. Weasley foi consolar Harry, e Hermione ouviu algo que a fez soltar o braço de Rony repentinamente, levantar-se e sair de perto da cama de Harry.
Alguma coisa zunia em algum canto da ala hospitalar, quase como se estivesse tentando ser discreta, não chamar a atenção. Hermione andou cautelosamente até a janela, notando que o zunido se tornava mais alto a cada passo que dava. Ela pôde ver, então, que havia um pontinho preto no parapeito, um pontinho preto que zunia e que deu-lhe a impressão de que, se fosse um ser humano, estaria asquerosamente sentado de pernas cruzadas com um óculos feioso à ponta do nariz.
O besouro estava parado no parapeito da janela como nenhum besouro normal faria; como se estivesse assistindo à cena que acabara de se passar, coisa que os besouros provavelmente não faziam. Ela pôde, aliás, enxergar que ao redor daqueles olhinhos minúsculos havia uma marca, uma estranha marca de óculos.
Rita Skeeter, em sua forma de besouro, pareceu desconfiar da observação prolongada de Hermione, pois fez menção de voar. Num movimento rápido e apressado, Hermione deu uma batida forte no parapeito, com a mão em forma de concha, depois fechou-a, sentindo uma coceirinha na palma da mão enquanto o besouro se debatia lá dentro. Como Rony, Harry e a sra. Weasley tivessem se virado para olhá-la, espantados, ela disse, sentindo o rosto corar.
— Desculpem.

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