Capítulo XXIV



Os Marotos e o Segredo de Sangue


 


Capítulo XXIII – Um aviso.
 


Enquanto Thiago caminhava devagar, com as mãos no bolso e o olhar baixo, ao lado de Rabicho, que parecia exultante e mais tagarela do que de costume, ele tentou responder brevemente às perguntas do amigo, ou apenas incentivá-lo com “huums” para continuar a narrativa sobre sabe-se lá o quê. Distraído, mal percebeu quando passaram pela cabana do guarda-caça Hagrid e ele lhes acenou com a mão enorme pela janela, e teve que receber um cutucão na costela para retribuir.


 Ele refletia. Estava desligado do mundo, desconectado das sensações à sua volta, imutável quanto à escuridão que começava a se fazer à sua volta e às sombras das imensas árvores da orla da floresta proibida, que pareciam chamá-los para o seu íntimo. Isso tudo porque pensava. Thiago não conseguia esquecer tudo o que Sasha lhe dissera há minutos antes sobre uma ruiva, e cada frase rodava em sua mente como um turbilhão de peças de um quebra-cabeças que se mexessem mais um pouco iriam se montar.


 As peças pareceram fazer algum sentido quando ele chutou um monte de folhas secas grande demais, e as folhas rodopiaram com o vento ao seu redor, fazendo ele erguer o olhar. Rabicho continuava a tagarelar, e dava risada da própria história. Thiago limitou-se a seguir as folhas com os olhos, e quando ficalizou mais adiante, havia alguma coisa se mexendo entre as árvores. Pareciam... fantasmas. Eram vultos brancos que pareciam se esconder atrás de um tronco grosso. Piscou várias vezes sob os óculos, e sua curiosidade instantaneamente ligou-se, mas quase se sentiu desapontado quando percebeu o que era, ou quem eram. Sirius tinha os braços fortes envolvendo a cintura fina de Sasha, e esta estava agarrada ao seu pescoço, em um beijo entre risos e carícias divertidas. Ele sorriu para si mesmo, e meneou a cabeça lentamente enquanto desviava o olhar.


 Ali estava seu melhor amigo. E ele estava ao lado de quem amava. Thiago sempre tivera certeza que amor mesmo demoraria para acontecer, e nunca teve a menor noção de que seus dezessete anos, sua maioridade, traria junto este novo sentimento. Não era o amor que Thiago imaginara, um dia: na mente dele, conheceria uma mulher no curso de auror que seria tão enigmática e irresistível quanto ele, que fizesse os homens enlouquecer ao olhar suas curvas, mas ela seria só dele, e amaria só a ele. Ele nunca imaginava que uma garota da escola, uma ruiva não menos enigmática mas não tão sedutora quanto ele imaginara (se bem que ele nem ao menos sabia dos poderes de sedução daquela ruivinha) e tão bonita quanto a dos seus sonhos. Diabos, tudo aquilo havia começado com uma brincadeira. Uma brincadeira idiota de convidar a mesma garota irritante para sair todas as vezes que a via. E agora sentia que não havia ninguém naquela escola e nem no mundo que pudesse viver o futuro com ele. Estava encrencado.


 


 


 


*****


 


 


 


 A semana dos exames chegou rápida e quente, muito quente. Era verão, e o sol irradiava com furiosidade, deixando-os com os olhos cerrados no gramado verde que parecia fluorescente de dia, e fazendo a beira do lago Negro parecer o salão principal de tão apinhado; às vezes, alguns aventureiros faziam a proeza de pular dentro das águas geladas para se refrescar, e não é preciso dizer quais eram os que o faziam com mais freqüência, além dos outros.


 Sasha tivera mais tempo de estudar depois, que estava se sentindo mais disponível, e seu primeiro exame de História da Magia foi excelente. Saiu da sala com um enorme sorriso – de todos os dentes brancos perfeitos e brilhantes – estampado no rosto, e Lílian estava com uma careta.


 - Eu esqueci – a ruiva disse, descolada – esqueci sobre os duendes. Esqueci de comentar qual era o tipo de roupa que eles usavam nas batalhas e...


 - Eu fui ótima! – a morena exultou, abraçando-a antes que ela agourasse mais.


 - Parabéns!


 - Acha mesmo que ele vai dar importância às roupas dos duendes?


 - Não sei, mas ele realmente enfatizou e...


 - Poções. – suspirou Sasha, referindo-se ao próximo exame da manhã.


 - Sim – Lily abriu um sorriso – vamos arrasar. Estamos preparadas até demais.


 - Poções?! – a morena repetiu tristemente.


 - Qual é, pessimismo! O professor gosta de você, sab...


 - Porque eu dou sorrisos imensos à ele, não porque eu sou boa.


 - Um sorriso vale mais do que você acha. – a ruiva piscou, e amarrou os cabelos acaju em um amarrador, enquanto Sasha abria um caderno de resumos da amiga.


 - Ainda mais um seu. – uma voz grave surgiu atrás delas.


 Sasha virou-se, reconhecendo a voz de imediato. Gregory Davies tinha um sorriso curto no rosto e os olhos verdes brilhantes. Ela respondeu o sorriso, maior que o dele.


 - Hey! – ela cumprimentou, beijando-lhe o rosto – você realmente sumiu! De novo.


 - Você deveria se acostumar... – ele disse, revirando os olhos.


 - Eu não quero. Não diga isto, ou eu vou pensar que vai se isolar do mundo de novo e me meto embaixo da chuva! – ela ameaçou, sorrindo.


 - Golpe baixo... – Gregorio murmurou, fazendo ela rir.


 - Então, como foi seu exame?


 - Acho que fui bem... e você?


 - Também!


 - Que bom! Sasha, eu não falei com você desde aquele dia de Hogsmeade, não é...


 - Nem foi na Enfermaria me visitar.


 Ele deu um sorriso amarelo e sem vida que não parecia nada com ele.


 - Desculpe.


 - Você foi?


 - Erm...


 - Foi? Você foi, mesmo?


 - Pare com isso! Fui, mas você estava dorm...


 - E porque não veio falar comigo?


 - Eu ia lhe dar um pito de novo por andar na chuva, mocinha! Mas parece que alguém já voltou a se atarefar de lhe dar broncas...


 Lílian, que até o momento havia fingido estar lendo o caderno nas mãos de Sasha, fechou-o bruscamente, fazendo barulho e puxando-o para si.


 - Pois é... quem diria! – Sasha falou, sentindo a pele da bochecha queimar.


 - Está brincando! A escola inteira diria...


 - Humpf. Não pense que eu gosto disso.


 - Eu não mandei você arrumar um namorado desses, Sah. Popular entre as menina


 - Arght! Se me disser mais uma palavra, eu arranco seu crânio! – ameaçou, segurando a cabeça dele entre suas mãos docemente.


 Gregor sorriu e não deu um passo para trás como ela havia previsto, deixando-os naquela proximidade embaraçadora. Sasha não quis piorar as coisas com Sirius – agora, que finalmente estavam bem - então soltou a cabeça dele e deu um passo largo para trás, ao mesmo tempo que disfarçava e dava um tapinha em seu ombro. Gregorio riu baixinho.


 - Venha tentar arrancar então. Eu vou continuar dizendo.


 - Você é bem popular entre as meninas também, Gregor. Elas suspiram por seus olhos verdes.


 - Pena que nenhuma delas me interesse de verdade...


 - Deveria começar a ir procurar alguma! – ela falou, encabulada.


 - Tem razão. Mas as garotas boas de hoje em dia já foram fisgadas...


 Sasha sorriu brevemente, e depois fingiu dar uma olhada para Lily, tentando parecer desinteressada no assunto da conversa.


 - Então, bom exame de Poções para você! – ele desejou, saindo para a beira do lago onde os alunos refrescavam-se.


 Sasha e Lílian começaram a revisar as poções principais, mas não demoraram dois minutos para que Sirius e Remo aparecessem, sorridentes, acabando de sair do exame de História. Sirius abraçou Sasha e prendeu os braços firmemente em torno de sua cintura, enquanto Lily continuava a lhe dizer os principais ingredientes sem se importar com a presença dos dois – ou dos três, pois olhava tão fixamente para Sasha que parecia estar falando tudo para si mesma.


 - Ok... o seu auto controle parece bom – Sasha murmurou para Sirius quando Lily e Remo haviam começado uma discussão sobre um último ingrediente que havia sido descoberto naquele mesmo ano pelos medibruxos.


 - Se ele parece assim, é porque eu não vi nada. – ele respondeu com um sorriso.


 - Tem certeza? Não sei porque, mas a verdade não está muito estampada na sua cara...


 - Humpf. – Sirius riu e bufou ao mesmo tempo.


 - O que foi?


 - Tudo bem, eu vi. Meu auto-controle está realmente melhor do que eu pensava, mas não aposte muito nisso. Se acha que pode abraçá-lo, e outras coisas, faça escondido de mim. Eu vi como ele gostou quando prendeu a cabeça entre as suas mãos. – ele falou tudo rapidamente e baixo.


 Sasha mentalizou Sirius e Remo perto da porta e quis matá-lo pela falta de confiança. Depois de tudo o que acontecera?


 - Droga, Sirius! – ela rugiu, socando seu braço com raiva, e depois voltou os olhos para ele na defensiva – por que você tem que fazer isso? Sabe perfeitamente que eu não faço nada que eu não faça na sua frente!


 Sirius arregalou os olhos. Não havia esperado aquela reação. Suas demonstrações de ciúmes de uns dias para cá – desde que haviam resolvido tudo em uma enfermaria – haviam sido ironias e brincadeiras bobas. Esperava que ela não levasse aquela à sério também.


 - Hey, calma – ele chamou com a voz baixa e melodiosa, segurando seus braços com leveza – eu estava só brincando! Sabe que eu confio em você, não é? Sabe que eu sei que não vai agarrá-lo às escondidas, não sabe? – ele segurou seu queixo e fez com que ela erguesse seus olhos para os dele.


 Sasha não respondeu. Fitou aqueles olhos preocupados por um instante e sacudiu a cabeça, aflita.


 - Tudo bem, extrema seriedade.


 - Isso – Sirius olhou-a divertido.


 - Idiota – ela grunhiu entre os dentes enquanto ele a puxava pelos pulsos para beija-la.


 - Você é doida. – sussurrou, para enfim grudar seus lábios.


 - Todos doidos – murmurou Lily para Remo, o fazendo rir – parecem que se odeiam por um segundo e depois fazem isso. Estou começando a ter distúrbios.


 Remo assentiu e não disse nada. Apenas lembrou-se que Thiago, certa noite, havia dito a mesma coisa sobre as atitudes imprevisíveis de Lily, e também que podia estar começando a devenvolver algum tipo de distúrbio.


 


 


*****


 


 


 Os exames pareciam prolongar os dias como se o relógio parasse para os seus nervos ficarem à flor da pele, e mente trabalhar tão rápida e nervosamente quanto era possível. Todos os dias, quando acordavam, mal escovavam os dentes para revisar as matérias que teriam que lembrar durante os exames. As manhãs e tardes eram passadas sofregamente entre o salão principal e os jardins, onde conseguiam se encontrar para relembrar as últimas dúvidas e outras coisas. Nesse tempo, Sasha nem se lembrou que havia pago uma fortuna em um livro que estava agora, entre suas roupas no malão, intocado. As únicas páginas que estava disposta a ler – ou se forçando a estar disposta a ler - eram as de livros de Transfiguração, Herbologia, e cadernos rabiscados cheios de anotações. Ela achou os exames relativamente fáceis – logo que Lílian conseguira convencê-la de que seriam os mais difíceis do mundo com seu desespero – e considerou que teve um ótimo desempenho em Feitiços e até mesmo em Poções. Bem, em Adivinhação, tinha quase certeza que a professora estava de brincadeira...


 - Me diga! O que há por trás? – a professora insistia, balançando seus ombros para trás insistentemente.


 Sasha arregalou os olhos para ela. A cadeira de madeira rangeu embaixo de si e nas condições que parecia ter não duvidava que se partisse em mil pedaços e a derrubasse no chão. Não estava entendendo um milésimo de segundo daquele exame, e olha que estudara os pensadores da arte da Adivinhação e as técnicas da xícara de chá quase quinhentas vezes.


 - Professora... sinto diz...


 - Oras, não me amole! – ela interrompeu rabugenta; Sasha nunca havia visto a professora tão mal-humorada – passaram um monte de alunos aqui hoje só me dizendo baboseiras. Vamos, é a sua vez de falar. O que há por trás, senhorita Mills?


 - Mas por trás de quê?


 O olhar da professora foi penetrante.


 - Diga.


 - Desculpe, eu não sei o que há por trás. – Sasha falou confusa, inclinando a cabeça para o lado.


 A professora recuou a cabeça e sua expressão se suavizou de repente.


 - Ótimo. Boa sorte, senhorita Mills.


 - É só isso? – Sasha indagou aflita.


 - Sim.


 - Mas...


 - Só isso. Obrigada. – um sorriso duro surgiu nos lábios cansados e moles da professora.


 Sasha percebeu que não havia o que discutir. Quando encontrou os outros, assustada, e comentou do exame, eles disseram que não havia acontecido nada daquilo com eles.


 - Bem, ela me perguntou sobre os símbolos da xícara... os principais – Sirius disse passando as mãos pelos cabelos despreocupadamente – é claro que eu sabia todos.


 - Humpf. Convencido – ela brigou – ela endoidou comigo. Acho que vou reprovar nessa.


 - Impossível. Ela nunca reprova ninguém – assegurou Alice – uma vez, ela prescreveu que meus pais iriam passar por maus bocados por causa de um contrabando que eles traziam... mas meus pais nunca saem de Londres! E mesmo assim, eles não contrabandeiam nada para o mercado negro – seu tom rabugento fez os outros sorrirem – briguei com ela e fui ver Dumbledore. Excelente. – concluiu com um sorriso de todos os dentes.


 - É. Só que não tem como eu falar para os meus pais. – Sasha falou amargamente.


 Alice abraçou-a de lado com uma preocupação sincera que tentou não deixar transparecer na voz melodiosa:


 - Mas você tem a gente! E se reprovar nesta matéria, todos ficamos com você!


 - Er... me tire dessa. – Pedro falou com a voz mais aguda que o normal – é que eu já fui bem mal nos exames, sabe. Não espero reprovar de maneira alguma.


 Sasha rolou os olhos, impaciente. Não toleraria aquele garoto só porque ele era o retornado das profundezas misteriosas e era o amiguinho do seu namorado. Mas apenas bufou, decidindo que arrumar encrenca não era uma coisa boa a se fazer quando os professores estavam fiscalizando e punindo demais estas infrações dos estudantes, por causa do nervosismo dos exames. Não obstante, ela não precisava que Pedro fizesse nada por ela.


 - Calma, respira... não precisa matar o pobre garoto só porque ele não quer reprovar, é bem compreensível. – Sirius sussurrou em seu ouvido com uma voz engraçada.


 Só ela e Alice poderam ouvir, e a última deu uma risada abafada, afastando-se do casal. Sasha franziu a sobrancelha e sorriu para ele com uma expressão desconfiada.


 - Também não preciso matar ele porque ele ainda é seu amigo. – ela completou com a voz tão baixa quanto a dele.


 Sirius lançou-lhe um sorriso fascinante. A proximidade dos seus rostos e o hálito quente perto do rosto dela a fez sentir-se levemente embriagada, mas talvez fosse apenas o calor do verão.


 - Não descobriram nada? – ela perguntou quando percebeu que Sirius avaliava seu rosto com seus olhos ágeis e azuis acinzentados.


 Sirius abraçou-a e começou a puxá-la para longe do grupo com um sorriso em suas costas, para os amigos que ficavam para trás. Sasha tentou se soltar dos braços dele, mas era impossível que aqueles músculos cedessem às suas tentativas.


 - Hey, hey... ele estava olhando demais – ele falou, e Sasha olhou para cima, onde os amigos conversavam alegremente e um deles os observava. Pedro Pettigrew.


 - Ok... descobriram?


 Sirius coçou o nariz e depois olhou ao seu redor. Parecia tentar disfarçar, ou fugir do assunto.


 - O que foi? – Sasha insistiu, segurando sua mão para que ele olhasse para ela.


 - Olha, é difícil de explicar... não posso te contar aqui.


 - Não pode? – ela encarou seus olhos sinceros confusamente – como assim? Então descobriram?


 - Sim – ele suspirou, afagando sua bochecha com um toque suave – mas ainda não é a chave final, Vic. Não é uma prova.


 - O que é então? - ela perguntou irritada.


 Ele suspirou de novo.


 - Pare com esse drama! Me conte de uma vez! – Sasha percebeu que a sua voz subia várias notas e tentou se controlar.


 - Bem... encontramos uma coisa. Um desenho. – ele segredou misteriosamente, a voz bem baixa e sussurrada que foi o suficiente para deixá-la mais calma do que o normal – não é nada demais. Apenas um desenho estranho.


 - Um desenho estranho, hãn? – ela fez, pensativa – e como era?


 - Não tem como explicar. Eram vários traços... que se cruzavam em um círculo e depois pendiam para baixo como uma cachoeira.


 Sasha não foi capaz de pensar em nada. Teria que se lembrar depois de dar uma folha à Sirius para que ele tentasse representar o desenho ao máximo para ela – quando Pedro não estivesse tão atento à conversa dos dois que chegava a se inclinar para o lado na tentativa de ouvir, fracassando.


 - Depois você me fala. – ela disse rapidamente quando percebeu que ele continuaria a falar.


 Ele olhou confusamente para Pedro e depois acenou para ela com um sorriso leve:


 - Agora você entende?


 - Não. Mas eu vou entender porque você vai me explicar.


 - Sasha! - Lílian chamava.


 Quando Sasha olhou, notou que Thiago havia chegado ao grupo com um sorriso nos lábios. Isso era outro progresso. Ele estava ao lado de Lílian, mas não parecia ter conversado com ela. E ela gritava porque?


 - Sasha, estamos atrasados! Exame de Trato de Criatu...


 Antes que a ruiva terminasse de dizer, Sirius puxou Sasha para um beijo rápido antes de se despedir.


 - Encontro você à noite no salão comunal – ele combinou – vamos fazer alguma coisa diferente hoje.


 - Tipo? – perguntou, esperançosa, mordendo os lábios.


 - Você vai saber.


 O exame de Trato de Criaturas Mágicas fora tão fácil que ela mal imaginava que o professor pudesse ter tanto talento em elogiá-la como estava fazendo. Na verdade, ela mal se lembrava das aulas no verde de fora do castelo, tamanha era a sua atenção em Sirius e somente em Sirius, e em como a sua pele parecia mais clara na luz do sol e seus cabelos negros eram brilhantes e cheios de balanço. O mais magnífico era a cor dos olhos dele. Ficavam a poucos tons do azul de Sasha, e aquilo a impressionava mais do que deveria. De qualquer maneira, à noite, Sasha tomou banho e encontrou Sirius no salão comunal com uma mochila nas costas. Sorriu.


 - Vamos sair? – deduziu, animando-se.


 - Garota esperta – Sirius levantou-se  do sofá onde estava esparramado para beijar seus lábios docemente.


 Sasha sorriu com energia para ele. Precisava passar algum tempo com Sirius, só com Sirius, para se distrair dos exames e de toda aquela ladainha da poção da vida eterna e do livro ultra caro.


 - Não vai me dizer onde? – ela fez um beicinho.


 Sirius ergueu o queixo para olhá-la de cima, e um sorriso torto desenhou-se em seus lábios.


 - Pode escolher. – falou.


 Era a última coisa que ela pensara que ele fosse responder. Para ser mais exato, algo como “espere e verá” era muito mais a cara de Sirius. Ela relaxou os ombros, tentando não deixar o desapontamento transparecer em sua expressão.


 - Eu estava brincando, bobinha – ele murmurou maliciosamente – é claro que você não vai escolher nada. Eu já escolhi.


 - Ham... ok. – ela acompanhou os passos de Sirius até saírem do quadro da Mulher-Gorda em silêncio.


 Ele parecia ligeiramente animado e seus passos pareciam flutuar no chão, de tão rápidos e graciosos. Sasha olhou-o pelo canto do olho.


 - O que você tem? – perguntou disconfiada.


 - Oras... nada! Por quê? Parece que eu tenho alguma coisa?


 - Bem, parece. – ela reprimiu, mexendo nos cabelos negros molhados.


 - Pois não há nada! – ele respondeu com um sorriso enorme.


 Sasha não se deu por vencida. No seu braço esquerdo pesava o livro de capa preta imaculadamente bem cuidado que decidira que talvez fosse a melhor noite para lê-lo, logo que estaria com Sirius e teria um tempo longe dos livros dos exames. Ela havia decidido que iria dividir tudo o que sabia com o garoto – mesmo que eles brigassem ou algo assim. Ele era esperto, e sempre sabia de algum detalhe que parecia impossível ser sabido por algum aluno normal. E ele ainda podia lhe descrever o desenho que encontrara no dormitório.


 Ela viajou em pensamentos até perceber para onde estavam indo, quando passaram por uma janela no primeiro andar que dava para ver as balizas do campo de quadribol no horizonte.


 - Sirius. – chamou, sentindo uma euforia crescer dentro de si rapidamente, e a sua voz quase não saiu de tão fina e rouca – alguém vai nos ver.


 Sirius lançou-lhe um de seus imensos sorrisos de todos os dentes quando notou que ela entendera. Ele abriu uma passagem secreta com a ponta do pé, olhando para os dois lados, e um corredor estreito e escuro se abriu na frente deles.


- Ninguém vai nos ver, não se preocupe – ele respondeu depois de algum tempo.


- Você só pode estar doido. – Sasha riu baixinho.


Apesar da preocupação de que alguém pudesse vê-los fora dos castelos à noite em uma semana de exames era quase completamente deletada pela euforia e animação que estava sentindo. Voar. Ela se lembrava que da última vez que o fizera, descobrira que podia ser a melhor coisa do mundo se você soubesse como fazer.


 Sirius segurou a mão de Sasha e guiou-a pelo corredor escuro.


 - Como ninguém vai nos ver? – Sasha sussurrou – você tem duas capas agora?


 - E quem disse que vão ser duas vassouras? – ele respondeu no mesmo tom.


 - Ok... e quem disse que eu quero voar? – ela perguntou apenas para provocá-lo, e o seu tom de voz animado foi o suficiente para arrancar um riso dele.


 - É claro que você quer. – ele falou, ainda entre os risos.


 Sasha ergueu as sobrancelhas e mordeu os lábios quando o corredor curto acabou antes do previsto. Na frente deles, ergueu-se uma escadinha de terra batida e os dois subiram por ela. Quando saíram, apenas o luar iluminava algumas frestas entre troncos grossos de árvores. Deviam estar em algum ponto um pouco além da orla da Floresta Negra, pois as árvores pareciam rarear no ponto em que a saída da passagem estava camuflada.


 Ainda segurando a mão de Sasha entre os seus dedos, o maroto continuou a guiá-la para fora dali. A brisa noturna de verão dançou entre os seus cabelos soltos e pareceu entoar que a noite se tornasse mais mágica. A grama se inclinava levemente e ganhava tons prateados por causa da luz do luar, assim como as copas das árvores atrás deles. A floresta e a escola de repente pareceram mais silenciosas do que nunca, como se não houvesse ninguém ali além deles em um raio de quilômetros. Caminharam por uma trilha quase invisível na grama e contornaram algumas árvores, até que chegaram no campo de quadribol.


 À noite, era lindo. As balizas pareciam de ouro de tanto que brilhavam e o chão de areia parecia prata sob o luar. Sentindo a intensidade da atmosfera e da natureza naquela vista, eles entraram pela porta do vestiário masculino, sempre com Sirius como guia. Sasha deixou o livro preto no armário de Sirius, enquanto ele procurava uma vassoura. Ela vasculhou na mochila que ele trouxera enquanto o garoto se demorara.


 Quando Sasha segurou a capa entre os dedos, pensou que não poderia ser inventado tecido mais perfeito no mundo. A textura era suave e macia, e parecia que se esfregasse muito poderia se esfarelar, mas mesmo assim podia ser a mais resistente das linhas. Quis saber como os pais de Thiago haviam arrumado aquela capa para ele, sabendo que ele era daquele jeito.


 - É coisa de geração. – Sirius explicou quando ela perguntou.


 Ele ainda estava longe dela no vestiário e a sua voz ecoou entre os armários e os bancos vazios.


 - Sabe, o tio deu para ele escondido da mãe dele, assim como o avô dele fez com o tio, e assim foi... há muito tempo isso está na família.


 - Não parece ser tão velha. – ela observou, jogando o tecido sobre si e sentindo-se mais confortável do que nunca sob a pluma.


 - E nunca vai parecer velha mesmo, nem depois que o filho de Thiago tiver passado para o filho dele e assim for. – ele falou com a voz risonha – ela é mágica. É para sempre.


 Correndo o dedo indicador no desenho da capa, Sasha se perguntou quantas gerações de Potter’s teriam feito o mesmo que ela, e quantas digitais deles estariam pregadas ali. Sentindo-se intrusa, soltou a capa do corpo e largou-a ao seu lado, resistindo a tentação de voltar a acariciá-la – pois quando o fazia, parecia que era a capa quem a acariciava.


 - Essa parece boa? – Sirius perguntou, voltando de trás de uns armários com uma vassoura na mão.


 - Eu não entendo nada de vassouras – ela sorriu, observando o espanador velho e o cabo sujo da vassoura – mas você pode procurar uma mais limpa se não se incomodar. – resmungou.


 - Pra quem não entende nada você parece bem crítica – ele falou enquanto voltava para procurar outra vassoura.


 Logo ele voltou com uma que tinha um espanador bem cuidado e o cabo polido como nunca. “É a de Troller, não tinha outra melhor nas reservas, vamos tentar não quebrá-la”, ele avisou quando passou a vassoura. Sasha sorriu e mostrou o polegar para ele.


 - Vamos logo! – ela disse, e girou os calcanhares, fazendo seus cabelos negros rodopiarem no rosto de Sirius.


 Ele ficou alguns segundos observando a garota sair pela porta que dava para as passagens para o campo, e quando ela desapareceu pela porta lembrou-se que felizmente tinha que seguí-la e guiá-la pelos céus naquela noite. Alcançou-a facilmente, e ela ainda tinha um sorriso malicioso nos lábios carnudos.


 - O que você está pensando? – ele perguntou, curioso, mexendo nos cabelos.


 - Estou pensando que a gente não vai a lugar nenhum sem a capa.


 - Droga.


 Sirius correu de volta e agarrou a capa entre os dedos. Encontrou Sasha encostada no portão aberto, e a luz da lua fazia um efeito fascinante em seu rosto, e ficava melhor ainda com o sorriso que ela trazia nos lábios. O garoto balançou a cabeça para entrar em realidade por alguns instantes, e aproximou-se dela com o mesmo sorriso maroto que ela trazia.


 - Então, preparada?


 - Eu nunca vou estar. – ela falou fazendo um beicinho.


 - Qual é, você parece uma criancinha prestes a entrar na Disney...


 Sasha riu e apenas acenou. Estava mesmo feliz. Sirius estava ao seu lado.


 - Ok. Vamos logo. – ele disse – suba.


 A garota obedeceu. Ele prendeu as pontas da capa no cabo da vassoura com um feitiço e depois contornou, segurando a cintura de Sasha, subindo também na vassoura. Ele tornou a enfeitiçar a capa para cobri-lo e só parou de se mexer quando teve certeza de que estavam invisíveis e seguros sob a capa. Enfiou a carinha no bolso enquanto Sasha esperava. Ele inclinou-se, segurando com mais firmeza sua cintura, para murmurar as instruções em seu ouvido:


 - Amor, você tem que impulsionar o chão com os pés. É fácil, você já sabe essa.


 Sasha assentiu lentamente com a cabeça e respirou profundamente, ainda sentido o hálito dele em seu pescoço em um efeito fascinante.


 - Agora. – ele autorizou.


 Ela fez o que ele mandou com cuidado, prestando muita atenção na altura que a vassoura adquiria enquanto o chão diminuía lentamente aos seus pés.


 - Isso... – Sirius ia dizendo.


 Com uma lufada de confiança e sem esperar as instruções de Sirius, Sasha inclinou o corpo para a frente e a vassoura deslizou pelo campo devagar, seguindo a direção da arquibancada do lado oposto. Sirius não interviu. A sensação da capa de veludo mais macio do mundo acariciando seus rostos com a brisa noturna do verão, somada ao fato de que estavam juntos ali, e sozinhos, fazia com que o silêncio fosse mais que suficiente. Era incrível. As estrelas estavam salpicando com força no céu escuro e eles estavam invisíveis para aquele mundo negro.


 A vassoura continuou a voar até passar um pouco das balizas, e então Sirius disse com cautela:


 - Para cima.


 Sasha obedeceu sem saber ao certo onde iria parar. Deixou o corpo ereto e, inclinando a cabeça para cima, sentiu que subiam, e com rapidez. Então, ficou com medo. Se subissem muito, quer dizer, até além de onde o corpo permitia, morreriam por causa da falta de ar e por causa da pressão.


 - Sirius...


 - Pode subir, Vic, não vai acontecer nada.


 Não aconteceu mesmo, mas Sasha pensou que fosse muito mais por causa da guinada que Sirius deu quando o campo parecia apenas um quadrinho marron que se destacava na escuridão dos terrenos da escola, sombrios e negros, do que pela sua tentativa. Enquanto desciam lentamente de volta ao campo, os braços de Sirius se estreitaram, apertando a cintura de Sasha e ele murmurou, rouco, em seu pescoço:


 - Você aprende rápido.


 - Só quando o professor é bom... – respondeu sorrindo para si mesma.


 - Não me venha com essa. Pelo drama que você fazia eu achava que não fosse capaz nem de mudar de direção sozinha.


 - Eu voei bem quando estávamos indo para a casa de Thiago se não percebeu! – defendeu-se um pouco irritada.


 - Ele estava levando você, Sasha – ele falou, rindo baixinho.


 - Mas fui eu que arranquei a vassoura.


 Sirius fez um muxoxo.


 - Own, tudo bem, minha garota voadora. Eu tenho que admitir. Estava dizendo aquilo porque você é realmente melhor do que eu pensava.


 - Obrigada. – ela respondeu.


 Sasha não podia deixar que Sirius simplesmente fizesse o que estava fazendo. Tentou dar uma guinada violenta para o lado esquerdo com a vassoura e isso fez com que os dois se desequilibrassem e quase caíram do cabo.


 - Não repita isso. – ele disse calmamente, enquanto Sasha estava apavorada – porque a gente realmente pode cair.


 - Vamos trocar – ela pediu – venha guiar.


 - Não, eu disse que ia te ensinar.


 - Vai querer me ensinar tudo em uma só noite? – Sasha perguntou com uma voz melancólica, arrancando um riso de Sirius que parecia vir do fundo de sua garganta.


 - Muito bem, Vic... vamos trocar então.


 E Sasha guiou a vassoura de volta ao chão com cuidado e sob os avisos cautelosos e preocupados de Sirius até pousar. Quando os seus pés se firmaram no chão, ela sentiu uma sensação estranha, a mesma que se sente quando pula vários minutos em um trampolim e depois volta à firmeza da terra. Mas ainda assim era ótimo. Depois de se ajeitarem novamente, e os feitiços de proteção retornarem, Sirius murmurou:


 - Prepare-se para a verdadeira emoção.


 Ela não respondeu nada, apenas agarrou-se ainda mais ao corpo dele, encolhendo-se. Nem mesmo se lembrou de quando Sirius a levara pela estreita passagem embaixo do Salgueiro Lutador até a Casa dos Gritos e como fora apavorante; pois a situação era exatamente contrária. Estavam em um lugar amplo e aberto, não tinha como bater em nada. Se caísse, o chão ou o céu eram os limites.


 Sirius arrancou a vassoura do chao com uma velocidade incrível, maior ainda do que da última vez em que voara com ele naquele corredor estreito. Era incomparável a maneira como ele voava, e como ela voara há alguns minutos. A habilidade com que ele fazia curvas e malabarismos fazia ela pensar que ele voava a cada segundo de sua vida para ter tal facilidade. E a sua respiração estava sempre calma e havia um sorriso que Sasha inclinou-se para perceber em seus lábios. Ele adorava o que estava fazendo. Ele tinha razão quanto à verdadeira emoção. Aquilo não se comparava nem um décimo de segundo pelo que ela sentira quando ela própria voara.


 O coração de Sasha palpitava rápido em seu peito e seus cabelos voavam em sintonia com a capa da invisibilidade, que tremulava atrás deles querendo fugir. O vento não cortava o rosto como devia fazer; com a proteção da capa, pareciam carícias fofas de um urso.


 Com uma manobra ousada, Sirius desviou-se de uma das balizas, passando por dentro dela, e começou a voar em direção ao lago, pertos demais do castelo. O lago estava tão silencioso e suas águas tão quietas que, quando eles voaram em sua superfície, um pequeno tremor abalou a paz. Sasha percebeu o que ele pretendia fazer quando aproximaram-se da beira do lago.


 - Six...


 - Shhh... apenas aprecie. É ótimo pela primeira vez.


 Então ela entendeu o que ele queria dizer. À sua frente erguia-se Hogwarts com seu emaranhado de paredes e torres de pedra, e milhares de janelinhas amarelas despontando na escuridão do céu de verão. O castelo era imenso e fantástico. As estufas pareciam brilhar sob o luar, refletindo o brilho em suas paredes de vidro. Depois, ele contornou e começou a voltar para o Lago Negro, ou assim ela pensou, porque quando estavam prestes a sair para os jardins novamente ele reduziu a velocidade da vassoura e sussurrou:


 - A Grifinória.


 O mais rápido que pôde, Sasha virou a cabeça para o castelo, que estava muito perto agora. Eles podiam ver através de uma janela imensa, e logo ela descobriu que era a do salão comunal da Grifinória, não porque se lembrou das diversas vezes em que vira o lago através daquele vidro, mas porque uma cabeleira ruiva balançava-se como um borrão lá dentro. Lílian Evans era a única ruiva da Grifinória. Queria gritar e acenar para a amiga, mas conteve-se. Não seria exatamente uma boa idéia, já que estavam se escondendo na capa.


 - Vamos mais perto... – Sirius disse.


 E ele aproximou a vassoura tão perto da janela que era possível contar os transeuntes do salão comunal. Remo estava espalhado no sofá perto da lareira, e Thiago fazia algo à sua volta, pulando. Rabicho dava gargalhadas sentado ao lado de Remo, mas ele estava sério demais em sua depressão pré-transformação lupina. Lílian estava perto da janela, e virou-se para olhá-la no momento em que Sasha a olhou. O que a ruiva estava fazendo? Ela aproximou-se da janela, tocando-a com a mão com um sorriso de escárnio nos lábios.


 - Ela sabe? – perguntou Sirius de repente.


 - Não. Ela é doida.


 Sirius abafou um riso e continuaram a olhar o salão. Aparentemente Lílian deixara uma pilha de livros na mesa e Alice afogada neles, rabiscando freneticamente o pergaminho. Ela virou para chamar pela ruiva que respondeu com um susto, voltando à mesa. Era engraçado ver daquele ângulo. Então, ele inclinou a vassoura para o lado e começaram a voltar para o campo passando pelos jardins escuros.


 Sasha abraçou-o mais firmemente, sentindo a temperatura do corpo dele com precisão, e então fechou os olhos. Só os abriu quando ele a chamava, e aí percebeu que estavam com o pé no chão, no vestiário masculino.


 - O que aconteceu?


 - Bem, você cochilou.


 Sasha fez uma careta, e Sirius ergueu as sobrancelhas, rindo:


 - É claro que é irresistível demais. – ele disse com um tom malicioso.


 - Convencido. – Sasha soltou os braços dele e largou-o com a vassoura.


 Tinha acabado de se lembrar que havia deixado o livro no armário de Sirius. Com a varinha, murmurou a senha que ele lhe contara e de repente sentiu-se nervosamente ansiosa, como se o livro pudesse não estar ali de novo. Mas quando o armário de alumínio fez um clique e a portinha rangeu ao abrir-se, o livro ainda estava lá, descansando sozinho entre o uniforme vermelho e as luvas jogadas no fundo da prateleira.


 Quando o segurou nos dedos, inclinando-o para dar espaço para fechar a portinha do armário, um papelzinho pequeno e fino, quase transparente de tão fino, deslizou da primeira capa para o chão. Sasha só percebeu porque Sirius, distraído, voltando do armário de vassouras, apontou-lhe o papel com o indicador. Confusa, ela pegou-o. Haviam umas grossas letras pretas:


“Tome cuidado com o que você procura porque o que pode achar talvez não te faça sorrir... Conseqüências drásticas serão impostas àqueles que se meterem no caminho.”


 Então ela abriu a capado livro para ver se tinha mais alguma coisa. Nada. Havia apenas uma página em branco, como sempre tinha em livros antigos. Mas de onde ela conhecia aquela caligrafia? E o que significava aquilo.


 - Sirius...


 Ele aproximou-se o mais rápido que pode dela ao perceber sua expressão de espanto. Leu e releu o papelzinho, e depois o amassou, fazendo-o virar uma bolinha branca de tamanho insignificante na palma da sua mão forte.


 - É só uma coisa idiota que alguém esqueceu aí. – ele falou calmamente.


 - Hei! A gente podia guardar isso! – ela reclamou, tentando desamassar sem sucesso. O papel fino começou a se rasgar.


 - Pra quê? Só pra você ficar mais preocupada ainda?


 - Isso é um aviso, Sirius. Pior, é uma ameaça!


 - E eu não acredito que você vá esquecê-lo tão facilmente.


 - Não...


 - Então. Não precisa dele para amontoar. – ele falou, e pegou cuidadosamente os restos do papel na mão dela, e então rasgou-os mais ainda e atirou na lixeira que havia perto dos armários.


 - Mas dava pra gente...


 - Não dava – ele interrompeu.


 - Sirius, você não é meu pai. – Sasha irritou-se.


 - Mas eu sei que isso vai te fazer mais mal. – ele falou seguramente, enfrentado-a – e eu quero te proteger. Sasha, você está ficando neurótica e...


 - Mas esta era uma pista real! E você destruiu!


 - Tudo bem, eu posso consertar. – falou arrogantemente, parecendo ofendido, e ficou olhando-a, esperando que ela dissesse que não precisava.


 - Pois conserte! – ela atirou, nervosa.


 Sirius revirou os olhos e arrastou os pés até a lixeira. Ele recolheu os pedacinhos de papel que haviam se espalhado no fundo do objeto vazio, e segurou a varinha para lançar um feitiço que Sasha mal pôde escutar, mas depois não aconteceu nada. Ele trocou um rápido olhar confuso com ela antes de tentar novamente, mas os papeizinhos ficaram imóveis.


 Franzindo a sobrancelha, Sasha aproximou-se dele com a mão estendida:


 - Vamos organizar.


 Sirius se negou a entregar os papeis na mão que Sasha estendera, e dirigiu-se a uma mesa que devia ser a que Thiago fazia seus planejamentos. Ela estava coberta de nomes e rabiscos e desenhos dos jogadores que eram cravados. Espalhou os pedaços brancos e Sasha acompanhou com um olhar desconfiado. Não entendia porque Sirius estava afastando-a daquele bilhete daquela maneira: tudo bem, ele não queria que ela ficasse mais neurótica. Mas diabos, não achava que estava neurótica. Era a sua vida. O seu futuro. O que estavam decidindo fazer com ele. Ele não conseguia entender que ela tinha que participar de tudo aquilo? Ela tinha que saber.


 A garota inclinou-se para ajudá-lo a arrumar os pedaços em ordem e formar as palavras, mas todos estavam confusos. Com os lábios crispados, Sirius disse:


 - Não vai dar.


 - O quê? Não, achei um pedaço do Conseq...


 - Não vai dar, Sasha. Estava enfeitiçado.


 O tom dele era sério. Talvez ele estivesse começando a acreditar que aquilo podia ser sério.


 - Como você sabe? – ela perguntou sem desacreditar um pingo no que ele dissera


 - Não dá pra formar as palavras de novo. Não dá para colar. Se você o guardasse, ele desapareceria como fumaça.


 Por um instante ela refletiu sobre aquilo. Aquele papel não podia ser tão ameaçador a ponto de ter que ser enfeitiçado. Ou... podia não ser ameaçador, podia ser apenas para impedir que ela desse um jeito de saber quem o escrevera. Mas ela não desistiria de saber isso: conhecia aquela caligrafia e tinha certeza. Tinha mesmo? Na verdade, não tinha mais certeza de nada, só que aquilo podia ter um mal significado.

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