Capítulo XVII



Os Marotos e o Segredo de Sangue





Capítulo XVII – Lua cheia





- Acho que é a tal da festinha particular. – sussurrou a ruiva – não podemos perder de saber o que é... se Potter quer mesmo que eu deixe ele ter uma chance...


Sasha riu e ela a interrompeu:


- Cale a boca, Sasha! Estou falando sério... e se ele está indo com Sirius encontrar garotinhas nos corredores? Temos que saber! Serão dois coelhos em uma cajad...


- Mas e Snape? O que ele tem a ver?


- Sempre achei que ele gostasse de meninos. – a ruiva brincou – ah, sei lá o que Snape tem a ver! Vamos logo!


Tentando se esconder entre as sombras, assim como Severo fazia, as duas seguiram os três na ponta dos pés. Quando perceberam, estavam no saguão de entrada, e Severo ia em direção à porta; que estava estranhamente aberta. Lílian deu um beliscão em Sasha quando notou que o garoto começara a retornar de costas, se escondendo de alguém que vinha dos jardins para dentro da escola. As duas conseguiram se meter em umas sombras enquanto Snape ia atrás de uma armadura, e estremeceram ao notar que era a madame Pomfrey que vinha agitada, quase correndo a passos curtos e apressados para dentro do castelo. Nem ao menos virou a cabeça para procurar a presença de alguém, e conversava rapidamente consigo mesma palavras inteligíveis que lembravam um rosnado.


Então, ouviram um uivo, e Snape pulou de trás da armadura e saiu correndo pela porta, parecendo de repente ter perdido todo o medo de ser encontrado. As garotas o seguiram com cautela. Com a presença de madame Pomfrey e Snape ali, estavam certas de que os meninos não estavam fazendo nada... com outras garotas. Mas a curiosidade ante ao que eles deviam estar fazendo era maior ainda do que se eles realmente estivessem em salas vazias fazendo outras coisas. Uma bela e gigante lua cheia erguia-se atrás do Lago Negro,e ao alcançarem a porta, notaram que deviam ter ficado mais para trás: Snape sobressaltou-se bem no canto de fora da porta, escondido onde elas não podiam ter visto. Ele as olhou apavorado de início, mas depois deu uma risadinha e murmurou:


- Deveria voltar para o salão, Sasha, não sei se agüenta ver isto.


Então ele agachou atrás de um arbusto, ao perceber dois vultos subindo os jardins. O primeiro parecia um veado... não, um enorme cervo castanho. O segundo vulto vinha vem atrás dele, e era negro, um enorme cão negro e peludo, cujo pelo brilhava na escuridão, e quase elas não puderam vê-lo. Apesar do porte grande e defensor, eles não pareciam ameaçadores para Sasha. Ao contrário, Lily agarrou-se em seu braço. As duas silhuetas faziam um cenário quase chocante ao se aproximarem lentamente dos três, na porta do castelo.


O cão foi o primeiro a chegar. Aproximou-se das duas meninas e pareceu encarar Sasha. Foi aí que ela se assustou; o cão tinha olhos cinzas, inconfundíveis, que brilhavam como pérolas sob a luz do luar. Quando a garota recuou um passo, e um graveto quebrou-se sob os seus pés desfazendo o silêncio, Snape gemeu, e o cão ergueu-se sobre as patas traseiras, encostando as dianteiras na barriga de Sasha e empurrando-a para trás, fazendo com que ela caísse no gramado e puxasse a ruiva junto. Ele demorou-se outro momento olhando-as e depois começou a seguir o outro animal, o cervo, que recuava de volta para a escuridão, em direção ao campo de quadribol; suas patas fofas faziam um som muito reconfortante no gramado, como se o seu porte nada importasse diante de sua pomposidade... como um Almofadinhas...


- Sirius! – Sasha gritou com a voz estridente.


Então os dois animais pararam. O cão olhou para trás por um momento, mas depois retornou correndo para a mesma direção anterior. O cervo olhou-as por alguns segundos que pareceram séculos... e puderam ter a certeza de que eram olhos castanho-esverdeados. Dois enormes chifres erguiam-se no topo de sua cabeça, pontudos... Pontas...


- Thiago. – sussurrou um pouco antes de o cervo virar-se e seguir o mesmo caminho do cachorro.


Snape ergueu-se atrás do arbusto:


- Não me engana com esta cara de surpresa. – ele desdenhou – até parece que não sabia que os namoradinhos de vocês faziam esse tipo de... ilegalidade.


- Ilegalidade? – repetiu Sasha, sem acreditar no que ouvia.


- Ser animagos, Sasha... eles são menores e não estão registrados. Conseguiram sozinhos – falou Lily em voz baixa, para que só a morena escutasse.


- E você sabia?


- Você também sabia! Desde o primeiro dia! Não se lembra? Pedro entrando em forma de rato... Remo atrás dele!


Sasha pensou. Na verdade, esquecera completamente daquele primeiro dia.


- Diabos... – sussurrou.


Snape contornou o arbusto e foi atrás do cervo e do cachorro, ou de Thiago e Sirius, que seja. Lílian levantou-se, soltou Sasha e gritou:


- Não, Snape! Fique!


Mas o garoto nem ao menos olhou para trás, e continuou sua corrida desenfreada atrás daqueles dois animais pelos jardins. Então, a ruiva ajudou Sasha a levantar-se e as duas correram atrás deles. Remo era mesmo um lobisomem; e se Snape sabia da animagia de Thiago e Sirius e os outros, certamente sabia de Remo ou estava investigando sobre ele. Como monitora e principalmente amiga, Lily agarrara à idéia de que Snape não podia saber de nada. Afinal, que diabos aquele sonserino queria saber da vida de Remo?


- Severo Snape, isto não tem a menor graça! - Sasha resolveu lembrá-lo; a frase que usavam na infância não pareceu ter efeito nenhum sobre o garoto.


Snape apenas olhou para trás por um momento, enquanto ainda continuava com sua corrida desabalada em direção à uma árvore de tronco grosso que Sasha conhecia. Não conseguiu identificar a expressão nos olhos do garoto, mas lembrou-se muito bem da árvore. Era o Salgueiro Lutador. Mas quando o garoto voltou a olhar para frente, alguma coisa empurrou-o violentamente para o lado oposto ao qual corria, fazendo-o voar alguns metros em direção à elas. Quando as garotas chegaram perto dele, ele riu descontroladamente.


- Me esqueci deste detalhe!


Snape parecia histérico com a situação. Não obstante, ele ergueu-se com um pulo e pegou um graveto cumprido que estava ali perto, e tocou o mesmo nó ao pé da árvore que Sirius havia tocado aquele dia em que levara Sasha, e deveria ter tocado no mesmo dia, alguns minutos antes deles. Quando a árvore imobilizou-se, Severo saiu em uma corrida desenfreada para a passagem. Saltou dentro dela com um pulo.


Sasha e Lílian mal tiveram tempo de ir atrás dele também. Quando passaram pelo enorme escorrega e caíram no saguão escuro, o sonserino já havia aceso a ponta de sua varinha e adiantava-se pelo corredor escuro à sua frente; elas puderam identificar apenas uma sombra de luz desaparecendo em uma curva. Sasha olhou desesperadamente para a ruiva, e as duas correram atrás do garoto.


- Snape, o que você pensa que está fazendo? – Lily perguntou, a voz irritada.


- Não é da sua conta, Evans. – ele murmurou ofegando.


- Se você não sabe, sou monitora, e um aluno perambulando fora do castelo à essa hora da noite, dentro de uma passagem secreta, com certeza é da minha conta!


Snape virou-se para olhá-las de repente, assustando-as.


- Escutem bem – a varinha dele pousou bem em frente ao rosto delas, quase cegando-as – estou aqui por vontade própria e se algo acontecer à vocês será culpa inteiramente de vocês.


- Isto é perigoso, Severo – Sasha ralhou com os olhos estreitos para ele – você sabe muito bem que a sua curiosidade vai te cobrar alguns preços agora.


- Estou muito pronto para pagá-los. – ele alfinetou, tornando a virar-se e seguir o corredor.


Então as duas foram atrás dele. O corredor estava estranhamente agitado, apesar de estarem ainda a quilômetros da Casa dos Gritos, que devia ser o destino. O som dos passos apressados dos três e de suas respirações ofegantes cortava o farfalhar de algo que vinha de algum ponto lá na frente. Caminharam um bom pedaço do trecho em silêncio.


- Sabe – começou Severo com a voz ligeiramente irritada – não sei o que vocês estão querendo aglomerar aqui. Deveriam ter ficado bem quietinhas lá no castelo. Não há nada para vocês cheirarem aqui.


- É melhor você ficar bem na sua, porque não há nada para você cheirar aqui também.


A resposta de Sasha foi o suficiente para que Snape quietasse e continuasse a sua caminhada farfalhante. Às vezes, ele tropeçava nos degraus que surgiam no meio do caminho sem aviso e uma vez teve que segurar-se em uma raiz que saía da parede para não cair de cara no chão. Como Sasha e Lílian iam atrás muito atentas, isso não acontecia com elas – foi em um desses pensamentos que tiveram certeza de que Snape não tinha a mínima idéia do que estava fazendo.


- Posso saber quem lhe contou sobre isso? – Lílian perguntou quando chegavam em um trecho com vários degraus para cima.


- Bem, acho que vão ficar surpresas... – ele murmurou em voz baixa – foi um dos que estão aqui esta noite.


- Não somos adivinhas! – ralhou Sasha – qual dos três?


Por um momento, Snape absorveu a agressividade da garota. Mas depois respondeu:


- O seu namoradinho, o Black.


E então as duas se calaram. Eles estavam pregando uma peça um tanto... mortal... em Snape! Tinha certeza que a intenção deles não era matar o garoto ou coisa parecida, apenas assustá-lo, mas como teriam certeza de que isso daria certo? Como podiam ter tanta certeza que conseguiam segurar os instintos animais do amigo lobisomem? Arrepiaram-se. Sirius teria muito que explicar sobre isto.


Foi mais ou menos na metade da enorme escadaria – da qual Sasha não se lembrava por ter fechado os olhos na vassoura quando fora – que começaram a ouvir os grunhidos, os latidos e os uivos, além de um ruído de patas socando terra no chão. Quase ao fim da escadaria, souberam o que era o barulho. Bem embaixo da porta escancarada do alçapão, estavam três criaturas: as duas primeiras eles já conheciam, eram o cervo e o cachorro negro. A segunda criatura era amedrontadora.


Se antes alguém ainda tinha dúvidas de que Remo realmente era um lobisomem, esta se acalmou e algo mais que certeza se impregnou. O animal era maior que os outros dois, e tinha um porte ameaçador diante deles, seus pelos negros e cinzas fundiam-se em um emaranhado embaraçado misturado com terra e algo branco, como uma espuma, seus dentes afilados e seus olhos muito negros parecendo furiosos. Instintivamente, Lily agarrou o braço de Sasha e as duas recuaram um passo para trás, quando o lobisomem pareceu cheirá-las e virou a cabeça, ameaçador. Os dois animais menores se posicionaram na defensiva entre o trio e o lobisomem.


Então, o lobo começou a atacar os outros animais para afastá-los. A presença das meninas ali tornava as coisas muito mais perigosas. Sasha segurou o braço de Snape para puxá-lo:


- Temos que sair daqui!


- Não! Não quero perder isso... – ele respondeu, observando a briga dos animais.


O lobo olhava furiosamente para o trio humano, cortando o punho no ar e nos outros dois animais. Já havia desferido vários golpes no cervo, e era óbvio que era muito mais forte. Um golpe feriu o cervo de tal intensidade que fez ele voar na parede e cair desmaiado no chão. Sirius era o único que ainda estava protegendo-os, e como era o menor dos animais não agüentaria muito tempo. Então, a forma animal de Thiago se transformou. Ele estava muito ferido e sujo em um canto da parede, e gritou com a voz rouca:


- VÃO EMBORA DAQUI, AGORA!


Sem se importar com o que o sonserino pensava, Sasha agarrou seu braço e puxou-o com força, sendo ajudada por Lílian. Os três iniciaram uma corrida desenfreada escada abaixo. Elas perderam o equilíbrio de Snape e ele derrapou no chão de terra do degrau, escorregando com as nádegas até o ultimo deles. Deu um grito de dor quando caiu no chão com o braço em um ângulo quase impossível.


- Snape! – Lily apressou-se, levantando-o e colocando o braço dele por cima de seu ombro.


Sasha correu para ajudá-la do outro lado. Ouviram gritos vindos de cima da escada:


- CORRAM! RÁPIDO!


Era a voz de Sirius. E antes que pudessem tomar impulso para correr, o lobisomem já estava no fim da escada e tomava uma ameaçadora posição em direção à eles.


- Sasha, você tem que se transformar! – gritou Lílian.


- O quê?!


A garota lembrou-se daquele mesmo primeiro dia em que descobrira que os garotos eram animagos. Para confortar Rabicho, dissera que era animaga também; e ainda que se transformava em águia. Diabos, mas tinha sido apenas para confortá-lo!


- Não posso, Lily! – ela gritou em resposta, enquanto continuavam a correr.


O lobisomem vinha calmamente atrás deles, observando seus passos com um olhar calculista.


- Como assim não pode?


- Eu não sou animaga!


Lílian arregalou os olhos para ela, e as duas tentaram correr mais rápido; mas com Snape como peso era quase impossível que chegassem rápido o bastante. Se houvesse qualquer possibilidade deles três conseguirem fugir do lobisomem.


- Parem! Não vamos conseguir! – Snape pesava mais ainda dizendo isto com a voz estrangulada.


- Não pode desistir! – Sasha ordenou, segurando-o mais firmemente.


- Vamos morrer! Não podemos fugir de um lobisomem!


- Cale a boca, Ranhoso! – Sirius vinha correndo atrás do lobisomem, em forma humana.


Passou pelo animal com uma rapidez incrível, dando-lhe um tapa nos dois ouvidos de uma vez, forte, deixando-o confuso e mais furioso ainda. Os dentes dele se arreganharam para frente, grandes e afiados, e um grunhido gutural saiu do fundo da garganta do bicho.


- Estamos mortos... – murmurou Snape sombriamente.


- O QUE VOCÊS ESTÃO ESPERANDO PARA CORRER? – Sirius gritou para elas, parecendo furioso também.


O lobisomem que estava bem atrás dele ia dar-lhe um golpe fatal, quando o garoto transformou-se em um enorme cachorro negro e esquivou-se do ataque. Ele apressou-se em derrubar os três na frente. Lílian – sem saber como tivera reflexo e razão suficiente para isto – pegou sua varinha e lançou um feitiço (com a voz muito estridente) no resto do caminho para que virasse um enorme escorrega, e os três deslizaram por entre as paredes escuras cheias de curvas. O caminho pareceu durar o dobro do tempo que haviam levado caminhando, mesmo que a velocidade fosse consideravelmente maior. Quando se estatelaram no chão do pequeno saguão, embolados, foi que o cansaço pegou-os de vez. Snape levantou-se de um salto, gemendo por seu braço quebrado, e Sasha acendeu a ponta da varinha.


- Vamos logo para fora desse lugar! – Lílian brandiu.


A morena levantou-se confusa. Seus pensamentos pareciam estranhamente atordoados...


- Pelas barbas de Merlin, Sasha! – a voz de Snape estava aterrorizada – o que aconteceu com a sua cabeça?


Ela levou a mão para trás da cabeça e sentiu uma fisgada de dor e a ponta dos dedos se molhando. Quando voltou a mão notou-a cheia de sangue.


- O lobisomem... ele vai sentir o cheiro... estamos mortos!


- Cale a boca, Snape, ninguém vai morrer esta noite! – brigou a ruiva, indo de encontro à Sasha.


Quando aproximou-se da morena e contornou-a para olhar a parte de trás da sua cabeça, ela caiu em seus braços desmaiada.


- Diabos!


Lílian tentou reanimá-la sem sucesso, e então flutuou Sasha com um feitiço, seu corpo pendendo molemente no ar como se um gigante invisível a segurasse entre os dedos enquanto ela dormisse levemente, seus olhos fechados e os seus cabelos fazendo uma cortina negra. O sangue tingia o negro de um vermelho muito escuro que pingava das pontas da cascata para o chão; Snape pareceu repugnar o sangue, franzindo o nariz como se fosse algo muito fedido.


- Pode me ajudar? – perguntou a ruiva, raivosa.


- Como?


- Temos que subir o escorrega!


- Pode transformá-lo em escada, agora? – ironizou o garoto.


- Não é hora para piadinhas. – ela saiu em direção ao fim do escorrega e olhou para cima – se você não se lembra, há um lobisomem atrás da gente agora e...


- Shhh... Evans, acho que eles estão chegando. – Snape calou-a.


E realmente havia um zumbido que parecia vir de muito longe, um barulho que lembrou algo como uma memória na lembrança, muito distante. Mas a distancia pareceu se encurtar conforme os ganidos puderam ser ouvidos com mais clareza.


- Ilumine! – gritou Lily, indicando o escorrega.


O garoto adiantou-se. Pegou a varinha de Sasha que estava no chão e meteu-a no bolso, segurando a sua própria à frente. Lílian avançou no escorregador com a amiga flutuando em sua frente, e às vezes ela batia a cabeça no teto baixo; quando a ruiva conseguiu subir pelo menos um metro no escorrega com uma dificuldade imensa de subir ali com apenas uma mão na escuridão, além de guiar Sasha, ouviu um barulho de algo como almofadas caindo com um baque no saguão anterior, embolados, e um grito. Era Snape.


- Corra! Mais rápido! – ele gritava – eles estão aqui!


Então, vieram os grunhidos. A ruiva apressou-se o tanto quanto pôde, mas um grito lancinante e agudo de dor a fez parar por alguns segundos. Algo pegara Snape. Lily apressou-se o tanto quando pôde no escorrega, ofegando e sentindo que seus braços começavam a doer. Finalmente avistou a luz da lua que entrava pela fresta de passagem. Passou Sasha para cima e voltou-se, para gritar:


- Snape! – seu berro ecoou nas paredes do escorrega.


Mas um silêncio mortal foi o que respondeu.


- Venha logo! Já subimos! - ela chamou mais uma vez.


Lílian ia começar a ficar histérica, quando ouviu passos que vinham na passagem, e apressou-se em sair da entrada para não bloquear quem quer que fosse. Eram passos pomposos...


- Sirius! – ela gritou ao ver o maroto em sua forma animaga sair da entrada, arrastando Snape com o focinho.


O cachorro arrastou o sonserino até onde Sasha estava e cheirou a sua cabeça. Depois, transformou-se na forma humana novamente, e foi até Lily:


- Tem que levar Sasha para a Enfermaria! – ele alertou, estremecendo – leve Snape também e procure McGonagall e lhe conte o que aconteceu. Ela saberá o que fazer.


Lílian concordou, afobada.


- E onde está Remo? E Thiago? – quis saber com pressa.


Sirius lançou-lhe um olhar sem expressão.


- Thiago cuidou de Remo para que eu trouxesse Snape... acho melhor eu voltar para ajudá-lo.


Então, o garoto correu para a entrada e Lily só viu quando suas patas pretas e peludas voaram em direção ao escorrega, em uma transformação rápida e incrível. Por uns segundos, ela pensou. E se voltasse para ajudá-los? Como estava Thiago realmente? Mas apesar de toda a sua coragem sabia que não havia nada que pudesse fazer por eles. Embora tivesse o que fazer por Sasha. Do topo da cabeça da amiga, o sangue ainda jorrava formando uma poça envolta de sua cabeça.


Lily novamente flutuou Sasha com um feitiço e deu um tapa no rosto de Snape para acordá-lo. Ele gemeu e abriu os olhos, encolhendo-se.


- Não me coma... não...


- Cale a boca! Sou eu. – disse Lílian com rapidez. Não podia se demorar mais.


- Evans?! – ele levantou-se e apalpou o próprio corpo, com uma expressão de assombro – eu não morri, então?


- Não, Snape – ela disse em tom de “infelizmente” – vamos, temos que nos apressar.


Enquanto Snape se levantava, Lílian já corria em direção ao castelo com Sasha acima de sua cabeça, o sangue fazendo um rastro por onde passavam.


- Vai limpando isso! – ordenou a ruiva para o sonserino – não queremos que o lobisomem siga nosso rastro... - e assim ele o fez.


- Eles vão me pagar... um por um... esses idiotas grifinórios... – resmungava o garoto raivosamente.


Lílian não se deu o trabalho de responder. Subia a colina com uma rapidez que ela nem ao menos sabia que era capaz. Sasha flutuava como um fantasma onde a varinha da ruiva indicava, sua cabeça balançando com a corrida e seus cabelos embaraçando-se no vento gélido. Snape vinha logo atrás em seu encalço, lançando o mesmo feitiço a todo instante para limpar o sangue.


Um alívio imenso percorreu o corpo de Lily quando ela começou a subir os primeiros degraus. A porta de entrada ainda estava aberta e escancarada. Estranho. Saltou de uma vez os últimos degraus e correu em direção à Enfermaria. Não prestou atenção de havia algum aluno ou professor à sua volta, Sasha tinha que estar a salvo primeiro. Empurrou a porta vai-e-vem com força e isso causou um estrépito barulho de madeira rachando-se; a porta voltou em Snape, que caiu para trás com um estrondo.


Não foi preciso gritar pela enfermeira. Ela corria em direção à eles com passos curtos e os olhos esbugalhados para a garota que flutuava na varinha de Lily.


- Ela caiu, professora – Lily mentiu, ou apenas omitiu, sem saber se deveria contar a verdade para a enfermeira.


Com uma careta, a mulher pegou Sasha nos braços e a cabeça dela pendeu para trás como se estivesse morta. A ruiva arrepiou-se.


- Deixe para contar essas coisas para Dumbledore! Esta aluna está em estado muito grave e...


- Não! Preciso falar com a professora McGonagall! – interrompeu a garota, procurando Snape às suas costas, e o viu parado próximo à porta observando tudo com cautela.


- Tem razão, interromper Dumbledore dessa maneira em tempos como este... – ela ia dizendo enquanto colocava Sasha em uma cama e cortava um punhado de cabelos negros próximos ao corte - ... aliás, chamará Minerva porque o diretor está apurando uns negócios fora do castelo. Vá, imediatamente! – ordenou.


A ruiva hesitou por um momento, observando a amiga deitada suja e ensangüentada.


- Evans, não vai adiantar você ficar aqui!


Então ela correu para a porta.


- Não deixe Snape sair, Madame Pomfrey! – ela gritou, e desapareceu na porta.


Enquanto corria pelos corredores, a ruiva sentiu o cansaço começar a pesar em suas pernas, mas sabia que não podia parar. A sala da professora já estava em sua frente quando ela menos percebeu. Toc toc toc. Ela repetiu três vezes até que a professora, com um incrível olhar inchado, uma toca na cabeça e um roupão vermelho, encontrou-a assustada:


- Evans... por Merlin, você sabe que horas são? – ela perguntou enquanto acostumava os olhos à vista, e limpava os óculos nas vestes.


Ao colocá-los, sobressaltou-se:


- O que aconteceu com você? - a voz estridente e preocupada da professora feriu-lhe os ouvidos.


Lílian nem havia percebido que também estava suja e coberta de sangue.


- É uma longa história, professora. O sangue não é...


- Temos que te levar para a Enfermaria já! – ela ia puxando o braço da ruiva na direção do corredor.


Lílian não protestou. Queria mesmo voltar para o lugar para ver como Sasha estava e ralhar com Snape.


- O sangue não é meu, professora. – explicou calmamente – é de Sasha.


- Que diabos aconteceu à vocês? Oh, desculpe. Continue a contar.


Sem soltar o braço da ruiva durante o caminho, a professora ouviu o relato sobre o que acontecera naquela noite, desde que as meninas estavam no dormitório e Sasha saiu para a ronda com Lily – a ruiva pulou o fato de que levaria a amiga para a biblioteca e inventou que ela estava com uma leve dor de cabeça e iria procurar Madame Pomfrey – até o fim, quando Sasha flutuava sobre a cabeça de Lílian como um fantasma. A professora pestanejou em silêncio quando a ruiva parou de falar.


Já podiam ver as portas esbranquiçadas da Enfermaria quando a professora tornou a falar:


- Foi muito corajosa esta noite, senhorita Evans. – o seu tom era honesto – mas foi muita falta de responsabilidade correr atrás de um aluno na escuridão da noite.


- Professora! Era Snape. Ele estava indo ver o que os garotos faziam no Salgueiro e...


- Por favor. – ela parou a garota, olhando em seus olhos, antes de entrarem, e falou com a voz baixa – não repita onde quer que seja o que aconteceu hoje, ou o que sabe sobre o Salgueiro.


- Eu já sabia o tempo todo sobre Remo.


A professora estreitou os olhos.


- Alguns alunos... tem a crença de que podem enfrentar criaturas sombrias e apenas atiçá-los, como se de alguma maneira fosse vencê-los. Sabe que Severo Snape é um desses, e a sua curiosidade ultrapassou as portas da sanidade esta noite. – ela ia dizendo sabiamente.


A ruiva concordou, confusa.


- Professora... como Snape sabia deles? Quer dizer... ele estava os seguindo e...


- Bem, acho que isso os seus amigos irão responder quando voltar – ela repreendeu com as sobrancelhas erguidas, duramente, e empurrou a porta para adentrarem a Enfermaria.


A professora ralhou com Snape e descontou trinta pontos da Sonserina por perambular pelos corredores em horário indevido e perseguir colegas de outras Casas, e ainda alertou que quando Dumbledores voltasse para Hogwarts os dois teriam uma conversa muito séria. Ela ainda parabenizou Lílian por sua coragem novamente, na frente de Madame Pomfrey e Snape, e passou a mão pelo rosto de cera de Sasha, que ainda estava desacordado; e ainda assim descontou vinte pontos de cada uma por falta de senso de perigo e cedeu dez a cada uma pelos motivos anteriores. Snape bufou.


- Professora, não acho que a senhora entenda que... – ele começou delicadamente.


- Sei exatamente tudo o que está acontecendo, senhor Snape – ela interrompeu-o com rispidez – e conservo a minha opinião sobre quem estava certo e quem estava errado.


- Mas atiçaram a minha curiosidade, professora. – o garoto ergueu as sobrancelhas com cautela.


- Como assim? – perguntou Lílian.


- Bem... Black me disse o que fazer se eu quisesse saber... – murmurou envergonhado.


- Há tempos venho lhe avisando! – Madame Pomfrey brandiu, mandona - não siga aqueles garotos que não é do seu interesse... não meta os bedelhos onde não é convidado... Sabe, acho que até demorou para que aqueles garotos aprontassem das suas com você, Snape, simplesmente por sua curiosidade absurda.


- Black vai receber a detenção que merece quanto a isto – disse a professora quando notou a revolta nos olhos do sonserino.


Ele meneou a cabeça.


- Pode ir para a cama, senhor Snape. – ela ordenou.


E então ele girou os calcanhares para a porta vai-e-vem e empurrou-a tristemente, com a cabeça baixa.


- E a senhorita também! – falou para Lílian.


A ruiva ergueu a cabeça para ela.


- Oh, professora, deixe que eu fique com Sasha... não sei como ela pode acordar...


- Eu saberei como ela vai acordar. – a Madame Pomfrey intrometeu-se – acho bom que na minha Enfermaria fiquem somente os pacientes esta noite. Antes de amanhecer chegarão os novos...


- Mas...


- Nada de mas! Acho que ouviu bem, senhorita Evans. – ralhou a professora.


Lílian suspirou e, sem olhar para as duas mulheres que iam ficando para trás, foi até Sasha e avaliou-a por um breve momento. A pele de seu rosto estava mais branca do que nunca e haviam leves contornos roxos envolta de seus olhos fechados pesadamente. Segurou sua mão e sentiu-a fria e frágil.


- Não se preocupe – a enfermeira estava ao seu lado sem que ela ao menos percebesse – já dei uma poção que a deixará melhor... amanhã pela manhã poderá visitá-la, mas só você! Não quero uma escolta agitando a minha Enfermaria. Mas por enquanto deixemos que ela descanse... ela perdeu muito sangue.


Lily meneou novamente a cabeça e saiu em silêncio.



*****





O dia seguinte era sábado. Lílian dormiu feito pedra e só acordou cedo porque Alice quase a derrubou da cama.


- Hey, Lily. Sasha não está na cama! – a voz macia da amiga feriu-lhe o ouvido pela primeira vez na manhã.


A ruiva levantou-se preguiçosamente. Seria um longo dia...



*****




- Oh, Merlin, Sasha, você está bem? – Alice brandia novamente, entrando na Enfermaria.


O semblante de Sasha estava totalmente diferente da noite anterior, quando Lily a deixara aos cuidados de Madame Pomfrey. Ela transformara os cabelos antes cumpridos e negros em curtos, e havia um enorme curativo branco na parte de trás de sua cabeça. Pelo menos ela estava levemente corada, devidamente limpa e até sentada na cama, rodeada por garrafinhas de poções que a enfermeira devia ter insistido em deixar.


- Estou bem, Alice – ela riu fracamente ao notar o desespero da amiga.


- Lílian me disse que aquela maldita estátua da biblioteca caiu na sua cabeça quando tentava entrar na seção reservada... – a amiga fez uma careta, espetando os dedos nos novos cabelos de Sasha.


- Sim... foi um barulho infernal. – emendou a morena, piscando para Lílian.


- Trouxemos algumas coisas para você. – a ruiva esticou os braços.


Haviam trazido um prato com vários bolinhos, tortas e pães para a garota, além de uma garrafinha de suco de abóbora. Ela sorriu, agradecida.


- Vão ter que me ajudar. A Madame Pomfrey me empanturrou com uma poção de vitaminas e soro... – ela fez uma careta, pegando um bolinho de abóbora.


- O que pensam que estão fazendo na minha Enfermaria?


Todas se viraram para ver a enfermeira sair apressada de seu escritório com as mãos na cabeça.


- Não podem entrar com comida aqui!


- Oras... e como alimenta os pacientes? – perguntou Alice, confusa.


- E-eu... eu mesma pego as comidas! Agora, tentem não fazer qualquer sujeira. E se fizerem, limpem! Senhorita Evans, ontem eu disse que não queria alvoroço por aqui. – ela repreendeu-a.


- Alice insistiu, Madame... – murmurou a ruiva.


Alice a olhou sem entender.


- O quê?!


- E eu não sou a única amiga de Sasha que se preocupa com ela! – insistiu a ruiva.


A enfermeira ficou vermelha e depois finalizou:


- Pois bem. Não digam que não avisei. Apenas terminem isso tudo e limpem, pois não quero sujeiras por aqui. E depois vão embora! – mandou, e fechou a porta do escritório com força.


- Ela é bem simpática... – sussurrou Alice.


Lílian deu uma risadinha e se jogou em uma cadeira que havia ao lado da cama da amiga. Alice sentou-se aos pés da enferma. As três comeram o café-da-manhã trocando comentários sobre o tempo, que segundo Alice parecia relativamente primaveril, logo que estavam na primavera. Elas riram e a garota enfatizou que o dia estava lindo, o céu estava mais claro do que esteve enquanto estiveram em Hogwarts e os jardins começavam a florescer. Adeus às chuvas.


Quando terminaram de comer e limparam toda a sujeira que haviam feito - as migalhas no chão – foi que o alvoroço realmente entrou na Enfermaria. Sirius vinha conversando entre os murmúrios com Thiago.


- Sasha! – o primeiro cumprimentou-a com um beijo leve nos lábios – belo corte. – ele piscou para ela com um sorriso.


- Não brinque! – ela pediu, enquanto abraçava Thiago.


- Como está? – o garoto perguntou, passando os dedos nos fios curtos de seu cabelo – adorei assim. – ele riu.


- Estou bem, obrigada... já estava na hora de mudar, né!


- Por favor, eu preferia a cabeleira de antes. – Alice falou.


- Assim dá menos trabalho – a garota brincou, e deu de ombros.


Porque era óbvio que também preferia os cabelos negros de antes.


- Estou brincando! – disse, quando a amiga olhou-a desconfiada.


- Ah, bom. – ela suspirou, sorrindo.


- Vai poder sair daqui quando? – quis saber Sirius, que se sentara ao seu lado segurando sua mão pálida entre os dedos.


- Não sei... ela não me diz. Quando pergunto, fica dizendo que somos hiperativos demais e que não conseguimos ficar quietos nem mesmo para nos recuperar... – ela disse, girando os olhos nas órbitas.


- Espere só até ela ver que temos novos visitantes! – falou Lily.


- Não sabia que estava doente também, Lily. – Thiago disse docemente.


- Não estou mesmo, Potter – a ruiva fechou a cara.


- Já é Potter de novo?


- O seu aniversário acabou meia-noite, se não sabe.


- Mas a nossa intimidade pode durar o tempo que for... – ele falou sedutoramente.


- Blaarght. – Sirius fez – você me dá náuseas, Pontas!


Sasha sorriu. Finalmente entendia o apelido dos meninos, e isto a fez sentir-se estranhamente familiar.


- Oras, Sirius, eu tenho que tentar. Não é mesmo? – ele deu um cutucão no ombro de Sasha, que apenas sorriu.


- Comigo não adianta nem tentar. – ralhou a ruiva.


- Ah, tinha me esquecido que o nosso acordo era segredo.


A ruiva ficou escarlate e fez menção de sair, mas Sasha a convenceu de ficar. Thiago deu-lhe um imenso sorriso.


- Se não quer me chamar de Thiago, tenta Pontas. – ele falou simplesmente.


- Não! É Potter e ponto final!


- Mas eu ainda tenho o direito de te chamar de Lílian, certo? – ele perguntou carinhosamente.


Sasha se perguntava como Lílian conseguia ser tão grossa e tão resistente ao charme de Thiago. Ele era realmente carinhoso e romântico quando se tratava da ruiva pelo que ela via, e não era nada como as garotas que ela viu ele agarrando às escuras certas vezes, como aquela loira na noite em que Lily ficou possuída no salão comunal. Mas o coração tem razões que a própria razão desconhece... dizia um amigo.


- Ok. – foi a última coisa que a ruiva falou antes que a enfermeira retornasse furiosa à Enfermaria.


- Vocês não tem jeito mesmo!


- Como eu disse, Sasha tem muitos amigos... – riu a ruiva.



*****




Ao entardecer, Sasha foi dispensada com uma enorme lista de poções que devia tomar cada uma com horários diferentes e com o aviso de que deveria retornar no dia seguinte à Enfermaria para renovar o curativo. Ela sentiu-se estranha ao sair de cabelos curtos da Enfermaria, mas não desanimou-se e pintou-os de azul marinho. Encontrou seus amigos à beira do lago. Ela sorriu quando Sirius se aproximou para abraçá-la, e ele afundou-se nas roupas largas que Madame Pomfrey colocara nela na noite de sexta. Correspondeu o abraço, mas lembrou-se que o assunto não acabara apenas porque ela ficara na Enfermaria. Pelo contrário, tudo acabava de começar...


- Precisamos conversar, Six. – ela murmurou só para ele ouvir, enquanto desciam em direção aos outros amigos.


- Podemos tratar disso outra hora, não é? – ele respondeu brevemente, abraçando-a pela cintura.


Remo parecia terrivelmente abatido, e apenas perguntou como ela estava e depois subiu imediatamente para o castelo sem dar explicações. Sirius e Thiago trocaram um olhar cúmplice, como se fosse algo que eles já haviam previsto. Gloria olhou para Sasha e perguntou, rindo:


- Que diabos você fez ao meu namorado?


A morena riu. Gloria subiu para o castelo, e todos souberam que fora encontrar Remo. Então, Sasha notou que Alice não estava ali também, devia estar em algum lugar escondido do castelo agarrada à Frank como se fosse uma enguia. “Ótimo”. Estavam em um lugar afastado dos outros alunos que aproveitavam o fim da tarde nos jardins. Estratégico.


- Bem... podem começar. – ela falou, sentando-se perto de Lílian.


A ruiva ergueu a cabeça, atenta.


- Começar? – repetiu Thiago, bagunçando os cabeços folgadamente, fazendo-se de desentendido.


- Snape. – murmurou Lílian – ele podia ter morrido.


- Vocês também podiam ter morrido! – ralhou Sirius – deviam ter deixado as coisas como estavam. Tentei avisar que ficassem no castelo...


- Ah, sim, claro, e iriam se divertir vendo o próprio amigo dilacerar um aluno inocente! – alfinetou a ruiva.


- Olha, Lílian, sei que foi arriscado, mas de inocente Snape não tem nada... – Thiago falou, sentando-se de frente para elas.


- Aliás, só queríamos assustá-lo... ele estava seguindo Remo pelos corredores à noite, a curiosidade dele estava irritando! – emendou Sirius.


- Bela brincadeira... Podiam ter mandado um bilhete anônimo com uma ameaça ou sei lá...


- Assim foi muito mais emocionante. – Thiago interrompeu Sasha, com um sorriso maroto.


- E afinal, pra quê este drama! Estamos todos bem e vivos! – Sirius disse.


- Como conseguiram segurar Remo? – a ruiva perguntou.


- Bem... isso a gente sempre consegue. Ontem foi relativamente mais... pesado – Thiago completou depois de pensar – porque tinha sangue para todos os lados e Remo ficou louco.


- Mas, esta é a vantagem da animagia. – piscou Sirius – não importa o quanto você se machuque... sempre que voltar à forma humana será como se fosse um leve arranhão, e ele desaparece em poucas horas.


- Sasha, devia ter se transformado! – falou Thiago.


A garota olhou inquieta para Lílian, que deu de ombros. Por um instante toda a certeza de que estaria ali somente para ter explicações e não dá-las esvaiu-lhe entre os dedos finos. Sirius a olhou curiosamente.


- Bem... eu não sou animaga. – confessou, olhando para as próprias mãos.


Thiago arregalou os olhos e ajeitou os óculos.


- O quê? Você mentiu?


- Por uma boa causa! – ela defendeu-se imediatamente – disse aquilo ou o amigo de vocês explodiria de vergonha na minha frente e ficaria aquela tensão idiota entre a gente.


Sirius franziu o cenho e Thiago continuava perplexo.


- Você acredita... que até pensamos em te contar que Remo era lobisomem só porque pensávamos que você era animaga, para nos ajudar também? – o último perguntou.


- Eu descobri de qualquer maneira, não é? – ela falou em voz baixa.


Eles ficaram em silêncio por alguns instantes. Sasha sentiu-se envergonhada, mas eles também haviam inventado várias coisas para que ela não soubesse que Remo era lobisomem. Imagine que passara metade do ano escolar andando com eles o tempo todo e nem ao menos desconfiou! Mesmo que fosse um segredo justo de ser guardado, eles mentiram. Assim como ela. Não tinham o direito de ficar nervosos por causa de um maldi...


- Foi uma pena que você desmaiou – começou Sirius, com a voz marota – perdeu de ver a cara de Snape quando ele quase foi atacado por Remo e Thiago partiu para cima dele. Gritou como uma mulherzinha... e depois desmaiou.


- Eu tive que me transformar várias vezes para limpar o seu maldito sangue! – Thiago fingiu que brigou, fazendo-os rir.


- Vou tentar espirrar menos sangue quando bater a cabeça! – Sasha disse.


- Minha doentinha... – Sirius a abraçou de lado e a beijou docemente.


Lílian desviou os olhos de Thiago para o Lago, ligeiramente ruborizada. O garoto abriu um largo sorriso, mas não tentou fazer aproximação com ela.


- Pode ir se acostumando – ele começou a falar, e Sasha parou de beijar Sirius para prestar atenção – Remo vai se afastar de você por um bom tempo... até que ele decida que está preparado.


- Ele se lembra de nós? – a morena perguntou.


- Não... nós contamos. Quando ele se transforma, não se lembra de quem é... bem, é o que nós estamos tentando fazer. Com que ele se lembre quem é quando está na forma animal. – Sirius disse.


- Ele fez isso quando me contou... ficou vários dias me evitando, como se eu fosse julgá-lo ou algo assim. Depois veio me dizer que achava que eu era quem estava o evitando. – Lílian falou, abraçando as próprias pernas.


- E ele fala isso até hoje, Lily! – Sirius falou – se não ouvíssemos de você isso, continuaríamos achando que você era preconceituosa e maligna. – terminou aos risos – pobre Remo... gostava tanto da sua amizade.


Thiago virou-se deitado em direção ao Lago, fechando a cara.


- Mas é lógico que o Pontas preza mais, muito mais! - ele emendou rapidamente, e Thiago ergueu o polegar para ele.


Lílian de uma risadinha para Sasha, que foi captada por Sirius. O garoto fingiu estar boquiaberto para elas e Sasha beliscou-o para não fazer nenhum comentário que embaraçasse a ruiva. Mais tarde, contou a ele tudo o que se passava entre os dois e o garoto disse que já sabia das coisas por Thiago, como essa tentativa de mostrar que ele podia ser melhor para ela. O que Sirius não sabia era que Lílian estava tentando admitir que gostava dele. Mas é claro que Sasha pediu – e insistiu, várias vezes – para que Sirius não contasse nada para Thiago, que com o tempo as coisas entre eles fluiriam naturalmente. O garoto concordou, mas ela não se deu por convencida. Quando voltaram para o salão comunal, Remo estava debruçado em livros e quando viu as meninas, apenas sorriu rapidamente para elas e saiu do salão alegando que tinha combinado um encontro com Gloria. Mas ele apenas não queria admitir que estava anoitecendo e era lua cheia, na frente das meninas. Thiago e Sirius despediram-se delas e saíram ao encalço do amigo, e assim foi até o domingo (e este tempo em que Remo ignorava-as pareceu muito mais longo do que apenas dois dias).


Com a expressão totalmente mudada pela presença da lua cheia – uma expressão doentia e cansada, como se ele não comesse e não bebesse há dias, Remo dirigiu-se à Sasha uma vez com aquele assunto que estava pesando entre eles quando encontrou-a sozinha em um corredor vazio, e os dois caminharam juntos.


- Eu tinha medo do que você poderia pensar. – ele falou com a voz embargada.


- Olha, Remo, pode confiar em mim para o que precisar. – a garota respondeu com a voz calorosa. – o fato de você ser um lobisomem não muda nada na nossa amizade.


- Shhh... – ele fez, indicando alguns quadros nas paredes, onde alguns homens fingiam cochilar calmamente – não conte à ninguém, está bem? – e depois de alguns segundos esperando pela resposta dela, ele continuou: - principalmente à Gloria.


- Você não contou à ela?!


- Não.


- E pretende contar quando?


- Não pretendo contar! – afirmou indignado.


- Se ela descobrir... sozinha, como eu fiz... vai ser muito pior, Remo. Porque Gloria gosta muito de você, de verdade.


- Não me sinto pronto, Sasha. – ele murmurou, engolindo seco – não me sinto mesmo. Sei como ela irá reagir quando souber o monstro que sou... e eu tenho muito medo de perdê-la.


Sasha não queria persuadir Remo de nada e nem mudar sua opinião, mesmo achando que Gloria não reagiria como se o namorado fosse um monstro e sairia chorando pelos corredores. Então, a garota sorriu.


- Já disse que pode confiar.


Remo riu, parecendo fraco – ela notou que era a primeira vez em dias que via o garoto rir.


- Eu realmente não esperava que você reagisse assim... quer dizer, Lily ficou semanas me evitando e...


- Ela me disse que você foi quem a evitou! – Sasha defendeu a amiga.


- Bem... – ele continuou, sem dar atenção ao comentário – geralmente as pessoas saem gritando, sabe. Ficam aterrorizadas e tudo.


- Então você tem sorte de ter encontrado as pessoas mais corajosas do mundo como amigos. – Sasha riu.


- Ah, sim, vejo que a humildade de Sirius começa a te afetar devagar... – Remo riu novamente.


Sasha sorriu:


- Estou falando sério, Remo. Entendo que você tenha tentado esconder isto de mim... eu mesma escondi tantas coisas de vocês – ela olhou-o com carinho, seus olhos azuis brilhando – mas sempre é preciso confiar.


- Sasha... o seu segredo não é vergonhoso. O meu... bem, eu sou um monstro. – ele sussurrou sem olhá-la.


- Espere aí... acho que você não entendeu direito aquele dia. Ele está matando muitos bruxos e trouxas, Remo, e eu sinto que indiretamente é por causa de mim! Sinto que se eu não me entregar, ele não vai parar... – era a primeira vez que ela dizia isto em voz alta a alguém – você sabe que... eu sou mestiça. – disse rapidamente – ou como eles preferem dizer, “sangue-ruim”, embora o sangue de Salazar Slytherin corra nas minhas veias... Acho ridículo tudo isto e não me ofendo com o apelido, na verdade... mas eles estão atrás dos sangue-ruins, alegando o preconceito... está entendendo?


Remo meneou a cabeça silenciosamente.


- Pelo menos você não tenta matar seus amigos. – ele continuou a dizer, rindo.


- E depois eu que sou teimosa!


- Sasha, você está errada. Não pode se culpar pelos ataques que estão acontecendo, ou então vai pirar. Ele é só um bruxo preconceituoso tentando chamar atenção, e matando pessoas que não lhe agradam ou vão contra a sua maré de maldade...


- Só pense no que eu falei! Não tem algo haver?


Remo pareceu pensar por um momento, e então olhou para os lados.


- Eu acho que... aquela tática da Caixa de Jihédhi foi a mais ultrapassada. Se eles realmente quisessem, teriam te pegado naquela noite – a voz dele foi misteriosa, embora não respondesse a pergunta que ela fizera.


E no final das contas, Remo tinha razão. A caixa teria sido algo apenas para assustá-la ou deixá-la alerta quanto ao que Ele realmente queria? Diabos, já tinha passado por tanta coisa por causa disso tudo. Tanta coisa, quando era apenas uma criança, que a fez amadurecer tão rapidamente.


- Às vezes... eu pensava em cortar os próprios pulsos. – ela segredou com a voz rouca, e Remo olhou-a com a testa franzida – sabe, só para despejar aquele sangue que eu não queria possuir em uma banheira qualquer e soltá-lo pelo ralo.


O garoto suspirou.


- Você é diabólica. – concluiu, e ela riu disto.



*****




Com a presença de Remo as coisas pareciam estranhamente mais... fáceis. Thiago e Sirius penavam para fazer os deveres, ao mesmo tempo que Lílian começava a alertá-los cada vez mais sobre a proximidade dos exames de junho. A cicatriz – que já se formara graças às incríveis habilidades médicas da Madame Pomfrey - na cabeça de Sasha fizera uma engraçada forma de S. Sirius insistia que era o destino que fizera aquilo para que ele ficasse gravado na cabeça dela para sempre, e Sasha ria, dizendo que para isso acontecer não era preciso que o destino lhe cobrasse tanto sangue – afinal de contas, o garoto já infestara a cabeça dela há tempos e não saía de jeito nenhum. Agora, a garota conservava os cabelos negros e lisos na altura dos ombros, para o qual Lílian fazia uma careta de desgosto e protestava, pedindo de volta os cumpridos. Na noite de segunda-feira, após uma cansativa aula de Astronomia, eles estavam reunidos no salão comunal quando uma coruja começou a bicar insistentemente a janela.


Thiago reconheceu a sua e foi até ela, enquanto Remo murmurava um:


- Coruja fora de hora não significa boa coisa...


O moreno de óculos abriu a janela e uma brisa noturna de primavera encheu todo o salão rapidamente, refrescando-os. Acariciou a cabeça da coruja – e este gesto fez lembrar a vez em que Sasha fora com Lílian no Corujal – e disse:


- Meus pais? O que eles mandaram para mim?


Lílian sorriu levemente. Sasha olhou para ela com as sobrancelhas erguidas.


- São mesmo deles...


Ele jogou-se no sofá em que estava antes de notar a presença da coruja e abriu a carta com rapidez. Muito concentrado, Thiago leu rapidamente a carta, e suspirou aliviado ao fim.


- Eles querem saber se vocês vão para a Páscoa. – sorriu largamente.


- Pontas, você ainda pergunt...


- Não você, Sirius, as meninas. – falou, indicando-as.


Sasha virou-se para Lílian, e ela tinha os olhos muito abertos em sua direção. Nem haviam pensado sobre isso, de tão preocupadas que ficaram toda a semana com a reação de Remo depois daquela noite e o machucado na cabeça de Sasha.


- Não perguntei para os meus pais. – a ruiva disse.


E Sasha logo percebeu que a amiga tentava se esquivar do convite educadamente. Passar uma semana com Thiago, para ela, devia ser realmente sufocante.


- Ah, Lily, qual é! Você ia ficar em Hogwarts mesmo, não ia? – Thiago insistiu, arrumando os óculos.


- Duvido que a sua mãe não vá deixar. – provocou Sasha, mordendo os lábios.


- Vamos... vai ser divertido! – Remo emendou.


- Vai mesmo... tem muita coisa para se fazer na casa dos Potter! – continuou Sirius, dando uma piscadela para Thiago, que respondeu com um sorriso maroto.


Lílian piscou os olhos com rapidez:


- Parem de fazer isto! Vou ver com minha mãe amanhã... depois te respondo!


O garoto deu um sorriso glorioso e gratificante ao mesmo tempo, todos os dentes esmaltados brilhando. Lílian ficou escarlate.
















...

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