Capítulo XI



Os Marotos e o Segredo de Sangue





Capítulo XI – O Segredo



No dia seguinte, Lílian e Sasha acordaram por volta do meio-dia, sobre os gritos de uma garota cuja voz era muito fina e estridente.


- Eu já disse que não vou! – ela brandava.


Sasha coçou os olhos inchados com os punhos fechados. Não estava cansada, pelo contrário, se sentia muito bem descansada. Sentiu suas mãos geladas e cobriu-se com o cobertor.


- Diabo, ela de novo com seu show. – reclamou Lily, a voz rouca – já te disse? Ela sempre faz isso. Sempre!


A morena olhou para cima, onde a ruiva estava na cama, e encontrou a cabeça dela na beirada, espiando-a, então sorriu:


- Bom dia!


- Bom dia, Sasha... e me desculpe por ser acordada desta maneira. Essa magricela está me dando nos nervos! – respondeu.


- Ah, até parece, Lily... depois da festa de ontem, acredito que nada possa estragar ainda mais. – e deu uma piscadela marota, fazendo a outra rir.


- Que drama! – exclamou, levantando-se e se sentando na cama, os cabelos ruivos muito bagunçados e em volta dos olhos um resto de maquiagem mal tirada da noite passada escurecendo-os – quer saber, não estou com a mínima vontade de arrumar as malas!


- Não precisa agora. Ainda temos algumas... – ela contorceu-se para olhar para o relógio de cabeceira da ruiva, atrás dela - ...minutos. – concluiu.


A ruiva começou a andar pelo quarto, e Sasha pensou que nunca havia conhecido alguém tão energético pela manhã como a ruiva. Ela parecia sempre estar ligada e atenta, e somente quando estava rabugenta era que se dizia cansada e sonolenta – mas não vira Lily dar um único bocejo no fim da festa, quando voltavam no carro dos Potter, sendo que Sasha e Remo cochilavam no banco de trás do carro. Com Thiago era o mesmo. Sempre o agitado, o hiperativo, o líder.


- No que está pensando, Sasha? Levante-se! – a ruiva assustou-a jogando-lhe um bolo de roupas.


A morena sentou-se no colchão em que dormira e novamente coçou os olhos e espreguiçou-se. Então, retornou à linha de pensamento, enquanto tentava juntar as suas coisas dentro da mala sem organização alguma. Ontem, depois da briga na festa, ela não tornara a palavra à Sirius, e nem ele à ela. Simplesmente, ela pensou que ambos haviam começado a intriga, então ambos deveriam resolver aquilo tudo, ou então nenhum resolveria. Sasha não sabia o que esperar de Sirius; notara também que ele ficara muito alterado depois da discussão, e bebera muita bebida alcoólica trouxa. Várias vezes pegara-o encarando-a com os olhos vagos e lentos, mas depois ele parecia acordar e voltar a pular ao som de Rolling Stones.


- Por que deixou que eu espalhasse todas as minhas roupas pelo chão, Lily? – ela quis saber tristemente.


Então um pio muito alto chamou a atenção das duas, e, na janela, notaram a coruja do Profeta Diário com o jornal amarrado nas patas, parecendo furiosa. Deveria estar à espera das duas há um bom tempo. A ruiva tomou distancia ao abrir a janela, para a ave entrar e pousar em cima da escrivaninha. Após pagá-la e desculpar-se, recebendo um triste pio em resposta, Lílian sentou-se na cama e abriu o Profeta, cruzando as pernas, atenta.


- Hum... aniversário de uma bruxa muito velha... – falou mais para si mesma, quando Sasha inclinava-se atrás dela para ler junto - ... ganharam o prêmio melhor Auror do ano... e... ah meu Merlin! – ela arregalou os olhos, apertando a página em seus dedos para ler: - No dia trinta de dezembro (ontem), aproximadamente às três horas da madrugada, um grupo de Comensais aterrorizaram as ruas do Beco Diagonal. Moradores e lojistas que acordaram com o barulho disseram que preferiam não ter acordado, e relataram uma série de desacatos e maldições que lhes foram atingidas com propósito e indiferença a quem eram dirigidas. De acordo com as mesmas testemunhas, os Comensais pareciam embriagados e arruaceiros, e destruíram várias barracas, vitrines e até mesmo algumas lojas pelas quais passavam; depois, entraram na Biboca Diagonal e sumiram de vista. A pergunta é: quem são eles? Quem são estes tipos de bruxos que se volta contra o próprio povo com um propósito sem nexo e com artimanhas imperdoáveis? Quem se uniria a Você-Sabe-Quem tão fielmente? São perguntas que não querem calar, e há várias especulações; mas não há nenhuma certeza. E até que a certeza venha, nós bruxos esperaremos temerosos, cautelosos e cuidadosos a justiça que nos será feita. - e a ruiva engoliu seco.


Sasha suspirou. Poderia ter sido algo mais grave, como estava acontecendo nos últimos dias, como a morte de aurores e de familiares, e até mesmo de alguns bruxos sem nenhuma ligação com o Ministério, simplesmente por serem trouxas; mas da mesma maneira, todos aqueles acontecimentos em Londres começavam a assustá-la. E se eles quisessem o mesmo que queria há alguns anos? E se, diabos, eles viessem atrás dela novamente? Não agüentava mais esconder. Quando morava com os avós, confidenciava-lhes todos os detalhes e todos os seus medos, mas agora começava a se sentir insegura por não ter a quem desabafar quando lhe recorriam pensamentos como aquele. Confiava extremamente em todos os seus amigos, especialmente em Lílian, mas confiar-lhe aquele segredo... era uma causa nobre, mas nunca havia contado à ninguém que não fosse seus parentes. E agora eles não estavam com ela para compartilhar. “Preciso de alguém...”, pensou, e concluiu que aquelas eram as pessoas certas. Saberiam ver com olhos humanos e amigos a sua condição.


- Diabos... – foi a única palavra de Sasha quanto ao assunto.


Arrumaram as malas comentando sobre o ataque ao Beco e depois desceram arrastando-as pelas escadas que rangiam, para perceber que a irmã de Lílian ainda continuava a gritar e parecia muito nervosa, sentada no sofá em frente à televisão, tentando ignorar qualquer presença fora a dela. As meninas foram para a cozinha e encontraram a Srta. Evans, que arrumou algo que elas pudessem comer.


- Petúnia não quer ir à estação, Lily. – a mãe da ruiva falou, temendo que a outra se sentisse mal com aquilo.


- Mãe, eu realmente não me importo. – respondeu, sorrindo docemente, e acalmou os nervos da mãe.


Partiram aproximadamente às duas. Despediram-se dos pais de Lily e passaram pela parede das plataformas nove e dez, sentindo aquele habitual frio na barriga. Sasha aspirou o ar bruxo e sorriu, abrindo os braços:


- Ah... de volta ao lar. – falou, suspirando falsamente, fazendo a ruiva empurrá-la de brincadeira, e seguir em sua frente.


A morena seguiu-a. Entraram rápidas no trem, em busca de uma cabine que estivesse vaga, e não foi difícil encontrá-la, logo que ainda era cedo e a maioria dos estudantes ou se despedia dos pais, ou ainda nem havia chegado à estação. Guardaram suas malas e voltaram para a estação, a fim de saborear um pouco mais o ar bruxo mais puro de Londres; mas Sasha não estava realmente interessada nessa atmosfera. Queria encontrar Sirius, nem que fosse somente para vê-lo. Não sabia como ficariam depois de tudo aquilo que acontecera na noite passada; mas ficou mais tranqüila quando pensou que ainda tinham o resto do sábado e o domingo todo pela frente para resolverem-se. Também não se esqueceu que havia decidido confiar naqueles amigos. Era apenas uma questão de oportunidade... e a agarraria, e contaria tudo! Ela apenas tinha que organizar tudo em sua mente...


- Ainda faltam quinze minutos para o expresso partir. – falou Lílian, mirando o grande e velho relógio dourado que havia perto do mural que indicava os horários de saída e chegada. – vamos ver aquelas vitrines. – indicou, onde umas poucas lojinhas de livretos de bolso, penas e capas de chuva ralhavam para existir na estação.


As duas andaram em direção ao comércio, desviando dos vários grupos de famílias que se despediam alegre ou tristemente, com aquele brilho inconfundível nos olhos. Caminharam até a primeira vitrine, uma loja de capas de chuva, mas não se demoraram nesta, pois dentro da loja havia vários bruxos que as encaravam como se fossem de outro mundo. Na próxima loja, uma de livros, Sasha teve que esperar Lílian ter o título de cada um dos que estavam na vitrine e ouvi-la comentar sobre o autor, sobre o que ouvira sobre tal livro, e muitos detalhes mais. A ruiva até mesmo entrou e comprou um exemplar de “Magic June”, um romance que envolvia um homem trouxa e uma mulher bruxa, segundo ela. Na outra loja, a de penas, se demoraram.


- Nunca vi tanta pena diferente na minha vida! – exclamou a ruiva, passando a mão pelos cabelos vermelhos.


E foi exatamente a mesma coisa que Sasha havia pensado ao concordar com ela. Na vitrine havia uma imensa variação de tamanho e técnicas e modos de uso para as penas. Haviam umas muito exóticas, como elas nomearam. Uma pena muito grande, cuja ponta crepitava um belo fogo azul que Sasha duvidava que alguém alguma vez houvesse comprado uma daquelas. Havia também um grupo de penas que formavam um bico só, fazendo um risco extremamente grosso. E também umas com cores muito bonitas, e outras com cores muito chamativas e berrantes. No interior da loja era possível ser vistas ainda mais tipos de penas, e Lílian não resistiu:


- Temos que entrar!


Sasha ergueu as sobrancelhas enquanto a ruiva rapidamente a arrastava. Deu uma ultima olhada para o relógio e notou que faltavam aproximadamente sete minutos para que o trem partisse, então tinham que ser rápidas. Avisou a ruiva disso e ela respondeu:


- Não se preocupe, eu já sei o que eu quero.


E ela parecia realmente saber, pois foi diretamente falar com a vendedora. Trocou umas palavras rápidas e detalhistas as quais a morena não deu atenção, e a mulher entrou dentro do depósito atrás de uma cortina de bolinhas coloridas. Após alguns minutos que se arrastaram, a atendente voltou com um pacote muito embrulhado e cuidadoso, trocando mais algumas palavras com Lílian, que apenas acenava e fazia perguntas pequenas. Ela parecia estar ensinando-lhe algo. Então, a ruiva saiu rapidamente da loja, arrastando Sasha novamente.


- O que comprou? – a morena quis saber.


- Lá dentro da cabine eu abro pra você ver. – ela estava ruborizada e tinha nos olhos um brilho imenso, como uma criança que acaba de ganhar um presente.


Logo que saíram do recinto, puderam notar que o tempo escurecera muito rapidamente. Antes, o calor sufocava e agora nuvens negras vinham do oeste trazendo formas incompreensíveis. Logo, grossos pingos de chuva começaram a cair e elas correram para dentro do trem, ao mesmo tempo que os alunos o faziam, e isso causou enorme aglomeração no corredor e nas entradas das cabines. Quase foram levadas pela onda de alunos quando pararam para abrir a cabine delas, e quando entraram tiveram uma surpresa... um tanto previsível:


- Olá garotas! – era Sirius, sentado com as pernas esticadas no banco – obrigada por guardarem a cabine para a gente, ficaríamos sem!


- Muita bondade a de vocês! – seguiu-o Remo, rindo marotamente.


Thiago foi o primeiro a começar a cumprimentá-las, e então todos se cumprimentaram. Sasha notou o receio de Sirius ao beijá-la no rosto, ao mesmo tempo que colocava a mão em seu pescoço e a abraçava em seguida. Por um momento, a garota pensou que ele havia decidido que a briga havia sido apenas um fato longe de chateações, mas notou que ele nem ao menos olhou em seus olhos ao separar-se de seu abraço. Ele parecia, sim, chateado; e devia ter percebido que esta também estava muito.


- Então, como passaram as férias? – quis saber Thiago, sorrindo alegremente, enquanto uma Lílian muito raivosa tentava se espremer entre ele e Remo.


- Ah, Potter, nos vimos sexta-feira! – a ruiva falou.


- Eu sei, amorzinho, mas estou dizendo das férias inteiras!


- Nada de amorzinho! – exclamou – e foram ótimas, obrigada. – foi tudo o que disse.


Sasha limitou-se a dar um curto sorriso à Remo, que procurou seu olhar quando os dois começaram a discutir novamente.


- Ouvi dizer que estão quebrando o pau em Hogwarts. – Sirius falou.


- Como assim? – a ruiva perguntou, distraindo-se da briga.


- Meus pais disseram que muitas regras passarão a entrar em vigor. – falou Thiago, engolindo seco – digo, eles agora realmente vão pegar no nosso pé, quanto à horários e tudo. Eles não sabem direito, mas parece que não vamos mais ter festa alguma na escola, e teremos horários mais curtos para voltar ao salão comunal.


Por um momento, eles refletiram sobre isso.


- É o que estão comentando no Ministério. – ele continuou, pensativo.


- Deve ter sido um caos no Ministério. – imaginou Sasha.


- Sim, pessoas gritando, sangue, feitiços, comensais... – brincou Thiago, forçando suspense na voz. – não, mas, eles disseram que foi mesmo. – falou quase seriamente.


- Espero que em Hogwarts também não esteja um caos. – comentou Remo.


Seguiram a viagem conversando sobre o show, o que fizeram nas férias e muitas outras coisas. Segundo Thiago, eles tinham ido ao mesmo shopping que as meninas no mesmo dia que elas, porém algumas horas depois; segundo ele também haviam deixado a Sra. Potter quase de cabelo em pé, não fosse pelo seu gênio calmo e acostumado com as marotices dos garotos. Trocaram as roupas trouxas quando os monitores passaram avisando, e enfim chegaram ao castelo.


Logo na entrada, ao descerem das carruagens, foram informados de que haveria uma breve reunião com os alunos do sexto e sétimo ano em uma imensa sala de aula que havia no primeiro andar bem perto do Salão Principal. Ao chegarem, houve um silencio arrebatador enquanto esperavam a presença de Dumbledore. Podiam ouvir, a poucos metros, o barulho dos alunos em seu banquete animado e fervoroso. Ninguém imaginava o que o diretor tinha para falar, então a tensão era grande.


Ouviu-se um estalido, e o silencio pareceu se intensificar enquanto o diretor saía de uma porta camuflada na parede, seguido da professora McGonnagal. Encarou os alunos por um momento e então começou o seu discurso:


- Olá – ele deu um sorriso - imagino que mil idéias passam pela mente fértil de vocês neste momento... mas esta reunião, é exatamente sobre o que estão pensando. É sobre o ataque que houve antes das férias e de a escola ser interditada. – suspirou, e ajeitou levemente seus oclinhos meia-lua; todos ouviam com muita atenção e respeito – de fato também devem estar imaginando o porque de somente vocês, sexto e sétimo ano, serem convocados. Presumo – ele fez uma pequena pausa, grifando os alunos com os olhos – que na idade de vocês, possa haver algum bom senso. Creio em vocês, porque são quem cuidarão futuramente do nosso mundo, e devo prepará-los que não vão agarrá-lo em um bom momento.


“Devo informá-los que o que presenciamos no baile de Natal foi apenas uma pequena demonstração do poder que eles têm. E sim, garotos, vocês sabem de quem estou falando. O conhecido Lorde das Trevas marcou presença em Hogwarts agora, e sabe Merlin onde ele possa estar planejando seu próximo ataque. Um aluno desapareceu das camas do dormitório da Grifinória no mês passado, acho que todos sabem desse fato – Thiago, Sirius e Remo trocaram um olhar cúmplice, e Sasha abraçou Lílian de lado – sinto dizer isso... mas achávamos que não era possível. Pessoas estão desaparecendo o tempo todo lá fora, sem contar os duelos fatais, os arrastões, os assaltos! O mundo bruxo está de cabeça para o ar... e isso tudo, é por causa de apenas um bruxo! Podem imaginar quanta ganância, quanta sede e maldade há dentro do coração deste bruxo? Se ele tiver algum coração.”


Sirius fechou os punhos, sentindo os músculos se enrijecerem. Não imaginava a grandeza de sua ganância e nem mesmo o que ele planejava, como o diretor havia citado, mas também não pensava que ele poderia ir muito longe. Não acreditava que os bruxos poderiam abaixar a cabeça tão facilmente para um bruxo que dizia e tentava provar ser o mais poderoso – mas o que fez ele estremecer foi que o tal bruxo estava conseguindo provar.


- E na missão de conscientizá-los mais, a equipe de professores e eu decidimos que era justo contar-lhes que o propósito dos Comensais da Morte invadirem o castelo. Eles estavam atrás de algo... – e novamente fez uma pausa, e isso dava um ar tão misterioso ao seu discurso experiente que era como se ele estivesse conversando consigo mesmo em frente ao espelho, fazendo suas dramatizações reais - ... ou alguém.


Alguns alunos se entreolharam horrorizados, outros preocupados, mas nenhum aluno olhou para outro como Remo olhou para Sasha. Seus olhos pareciam extrair-lhe a essência, pareciam sugar de alguma forma o fato que presenciaram ao extremo até em seus pensamentos, para saber o que se passava em sua mente. E na verdade, ela mesma tentava organizar tudo aquilo em sua mente. Não conseguia pensar direito, e temia que mal fosse conseguir fazê-lo pelo resto do fim de semana ou mesmo da semana. As palavras de Dumbledore agora não se faziam mais em sua mente, enquanto ele movia seus lábios serenamente para os alunos. Mas só conseguia ouvir a voz do próprio pensamento acordando-a para a realidade novamente: tudo de novo!


Quando deu por si estavam no salão principal, já vazio dos alunos novos. Não conseguiu comer e ficou quieta o tempo todo, enquanto os amigos conversavam sobre o discurso. Lílian e Remo pareciam muito interessados no tal bruxo, e os outros pareciam interessados no motivo de sua visita a Hogwarts, então Sasha preferiu não entrar em nenhuma das duas conversas.


Naquela noite, todas as memórias voltaram para dentro de sua mente, fazendo-a girar com torpor. Na ponta dos pés, desceu de sua cama de dossel, arrastou lentamente a cortina sem fazer barulho e procurou uma garrafinha dentro de sua mala, onde ela aprendera a aliviar suas dores e “encaixotar” suas lembranças. Ao tirar várias vezes uma fina linha prateada com a ponta da varinha na cabeça, fechou a garrafinha com uma rolha muito forte e sentiu-se finalmente exausta. Deitou-se e dormiu quase imediatamente.


*****




O dia seguinte era domingo e eles o teriam livre. A neve começava a demonstrar sinais de que iria embora, porém o vento ainda era cortante e o frio era terrível, fazendo os alunos se aglomerarem em torno da lareira no salão comunal. As meninas e os marotos já haviam almoçado. As duas foram andar pelo colégio, enquanto os garotos foram atrás do seu lugar na lareira, achando um realmente muito próximo.


A visão da neve se desfazendo dos campos e das árvores que circulavam Hogwarts era um sinal de que o ápice do inverno acabava mais cedo. Fora do castelo, poucas criaturas humanas se faziam presentes, incluindo Hagrid e a professora McGonagal, que conversavam rapidamente e com cautela. Através da janela no segundo andar próxima à sala de aula de Feitiços, tinham uma ampla visão dos terrenos da escola. Era uma pena que a Torre de Astronomia fosse proibida fora dos horários de aula, pois seria realmente interessante poder ver toda aquela paisagem de lá de cima.


Sasha e Lílian voltaram para o salão comunal da Grifinória, certas de que achariam boa companhia para uma conversa. Enquanto andavam pelos corredores, trombaram com Frank e Alice muito juntos em um dos corredores, matando a saudade, e sorriram para eles. Ao passarem pelo quadro da Mulher-Gorda, que pareceu muito gentil e calma com as garotas - o que não era realmente comum; viram que pelo menos todos os alunos pareciam estar no salão comunal, que estava em imensa festa com vários grupos de alunos conversando animadamente. Encontraram os meninos bem perto da lareira, e algumas meninas do sétimo ano os rodeava, parecendo muito entretidas na conversa. Lílian e Sasha preferiram sentar-se à janela, de onde podiam conversar sem que alguém as interrompesse. Por um momento, Sasha procurou os olhos de Sirius, mas os deste brilhavam para uma loira que estava ao seu lado e sorria ardentemente para ele.


- Atiradas. – foi o que a ruiva falou, quando percebeu o olhar da amiga.


- Eu nem sei mais o que falar, Lily. – Sasha amuou-se, chateada – se lembra de todas as coisas que Sirius me disse? Aquelas que te contei nas férias, do baile. – lembrou-a – estas coisas agora estão girando na minha cabeça. Ele parecia estar sendo tão sincero... e agora! O que parece pra você?


- Sasha... na verdade, eu nunca confiei em qualquer coisa que envolvesse Thiago Potter e Sirius Black, mas posso dizer que quanto ao primeiro venho mudando a minha opinião. Thiago parece mais amadurecido este ano, menos fogoso por todas as garotas do universo. E também digo que quanto ao número dois – ela disfarçou quando um garoto passou ao lado delas – eu havia começado a gostar da presença dele, sabe, ele é animado e gentil, mas também é um cafageste. – brincou, fazendo a morena rir. – brincadeira! Estou dizendo que ele também estava se mostrando menos infantil e metido a garanhão, e até gostei da idéia de ele estar realmente apaixonado por alguém, ainda mais sendo você. Seria demais se você pudesse dar um jeito naquele safado do Sirius. – ela terminou, rindo.


Sasha pensou por um instante. O que garantia que ela tinha mesmo a possibilidade de agarrar o coração do garoto e tomá-lo somente para si, enfeitiçando-o? Não havia pensado em Sirius como um conquistador aventureiro quando estivera com ele – tinha pensado nele como ele mesmo, e havia sido sempre fiel à si mesma quando estava com ele. Sabia que algumas garotas gostavam de inventar-se quando estavam com garotos, e achava isso ridículo. Mas com ele sempre soara tão natural... tão espontâneo. Apesar de todos os momentos desagradáveis que estavam ocorrendo nos últimos dias, Sasha não conseguia enfiar na cabeça que Sirius não sentia absolutamente nada por ela, a ponto de ser tão frio. Precisava saber o que estava acontecendo, mesmo que tivesse que perguntar à um de seus amigos, pois seu orgulho não lhe permitia fazê-lo diretamente.


- E pára de pensar que pode acontecer a Terceira Guerra Mundial. – brincou a ruiva.


Sasha riu e depois disse:


- Não consigo pensar que Sirius mentiu para mim, Lily. Acha que ele teria coragem?


- Não sei, Sasha. Não sei o que esperar de Sirius. – ela respondeu seriamente.


E aquela frase foi o suficiente para Sasha perceber que queria terrivelmente que o assunto da conversa se desviasse de Sirius.


- Então... aliás, o que comprou mesmo na estação?


- Ah... verdade, não te mostrei! – ela lembrou – foi uma daquelas canetas de fogo azul. – disse naturalmente.


- Está louca? Eu achava que ninguém comprava uma coisa daquelas... – disse, sorrindo – pra que ela serve?


- É bem simples... é uma caneta de memória. – contou, gesticulando – tudo o que você escreve uma vez, se souber o feitiço certo e souber programar para a hora e o segundo em que o fez, ela o reescreverá com uma perfeição incrível.


- Lílian Evans... – Sasha brincou, semi-cerrando os olhos – está com intenção de usar isso nas provas?


- Claro que não, Sasha! Achei muito interessante... pode ser muito útil! – e o que ela quis dizer com isso ficou realmente dúbio.



*****




Na segunda-feira, o primeiro tempo foi de Defesa Contra as Artes das Trevas. E realmente foi uma aula diferente. De fato, o professor Charlen cumpriu o que dissera na ultima semana de aula antes do Natal: não lecionara mais. Apesar de chato e estressante, ele faria falta com todas aquelas broncas e todos aqueles castigos sem lógica. O novo professor da matéria era um oriental, e apresentou-se como Youn Takashigui.


Sasha mal conseguiu olhar em seus olhos, quando ele perguntou o nome de cada aluno do ‘seu sexto ano’. Era um homem estranho e muito singular, e parecia nunca na vida ter lidado com alunos, e parecia sempre estar procurando alguém no meio deles. Seu olhar era arrepiante e era uma imensidão negra inconsolável.


- Creio que vocês saibam muito bem as regras desta escola, então não devo repeti-las. Quero somente pedir respeito, determinação e coragem nas minhas aulas. – disse, e os alunos trocaram muitos olhares significativos ante a sua fala – como sabem, o mundo bruxo está de cabeça para baixo – ele disse isso com um sorriso muito esquisito – e é meu dever ensina-los e orienta-los a sobreviver lá fora... onde o perigo está em cada esquina, em cada casa, em cada pessoa, em cada conversa.


O resto de sua aula foi normal, mas eles não deixaram de comentar sobre o nosso professor:


- O cara é estranho. – Thiago disse em voz baixa, temendo que alguém escutasse.


- Parecia muito sabedor dos ‘perigos de lá de fora’! – exclamou Lílian.


- Ele me perguntou sobre Rabicho! – falou Remo, espantado – tudo bem, ele é um professor, estava preocupado... mas ele nem ao menos o conheceu! Me perguntou se tínhamos notícias.


- Estranho. – falou Sasha.


- Não vi problemas com ele – contradisse Sirius – parece um bom professor. Na verdade, eu nunca dei aulas para julgar outro professor. – alfinetou.


- Ninguém está o julgando, retardado. – brigou Thiago – estamos somente comentando... nossos pontos de vista! Se você não sabe defender o seu, então fique quieto mesmo.



*****




A semana que se passou foi tão rápida quanto drástica. No Profeta Diário minavam notícias de assassinatos dentro do próprio Ministério e transpareciam o medo das pessoas, que fechavam seus estabelecimentos comerciais e iam para o interior; também relatavam desaparecimentos muito incomuns, de personalidades sinistras do alto escalão do mundo bruxo. Os pais de Lúcio Malfoy haviam desaparecido, e ele parecia estar muito à vontade na escola. Também foram aplicadas várias regras de horários no castelo, como voltar ao salão comunal exatamente às oito e meia, sendo monitorado pelos professores-chefes das Casas ou até mesmo pelos monitores.


É claro que foi uma semana terrivelmente desgastante para Sasha. Além que não estar muito aproximada dos garotos, por causa de Sirius, ainda perdia a companhia de Lílian muitas vezes por causa de seu cargo de monitora. A ruiva parecia estar sendo convocada para toda tarefa que houvesse na escola, e Sasha concluiu isso pelo fato de a amiga ser muito responsável. Cada dia que passava, tinha mais certeza de que não agüentaria mais alguns dias guardando tudo aquilo para si. Cada notícia no jornal (agora diárias) tornavam sua noite de sono tão atordoante, que olheiras fundas fizeram-se em seu novo olhar cansado. Na quinta-feira, estava começando a achar que podia confiar em Rita Skiter, mas o seu bom senso não lhe permitiu contar-lhe alguns fatos cobre a sua vida amorosa, e ainda mais confirmar-lhe os boatos de Sirius Black. Estava uma pilha de nervos, e segurou-se para não voar nos cabelos de Franciny Turner quando esta passou rebolando querendo parecer “a estonteante” em sua frente. Alice estava praticamente casada com Frank, então a sua presença era rara.


Suas companhias nessa semana não foram as mais agradáveis, mas no mesmo dia em que Davies passou horas ao lado dela no pátio fazendo dever – o que conseguiu diverti-la muito -, Sasha viu Sirius e Bertha conversando um tanto íntimos. Sabia que na verdade, eles eram íntimos, mas não conseguia suportar a idéia de que eles poderiam estar querendo reviver o passado. Algumas atitudes de Sirius começaram a enojá-la. Thiago tentara uma aproximação dos dois várias vezes no salão comunal, nas madrugadas que passavam conversando sobre as noticias, mas era sem sucesso. Nunca os dois ficavam no mesmo grupo por muito tempo, mesmo que estivessem tentando ao máximo ser simpáticos um com o outro.


Sexta-feira Lílian teve uma folga à noite, e as duas ficaram nos jardins até as oito e quinze, até que a razão monitora da ruiva falou mais alto e elas seguiram rumo ao salão comunal; os corredores estavam muito vazios, o que significava que a pressão estava realmente fazendo efeito e aumentando a tensão entre os alunos. Haviam apenas alguns casais perdidos pelos corredores, e vez ou outra alguns alunos do primeiro ano perdidos que pediam informação à Lílian. Chegaram ao salão comunal e puderam sentir o calor humano: todos os alunos que pudessem se encontrar no aposento faziam questão de estar lá. Isso parecia estar acontecendo todas as noites. Então, elas foram para um lugar vazio perto da lareira.


- Seria ótimo se tivéssemos guardado alguma coisa do jantar. – falou Lílian, passando a mão na barriga. – estou faminta!


- Não jantei direito... e pra falar a verdade, não estou com fome. – respondeu a morena.


- Também, você parece estar dez quilos mais magra do que na semana passada! Está pálida, Sasha. – comentou a outra – tem que comer alguma coisa!


- Não estou com fome, Lílian, de verdade. Meu corpo me dirá quando eu preciso comer. – dramatizou, rindo em seguida.


- Cuidado para não parecer um compasso que anda, daqui uns dias! Você acha Arabella Figg atraente? – ela perguntou, aproximando-se da amiga para que somente ela ouvisse, com um ar travesso; a outra fez que não com a cabeça, rindo, e ela continuou – então, cuidado ou ficará igual a ela, senhorita Greve de Fome.


- Não faça drama, Lílian! – Sasha respondeu novamente.


- Não faça drama em quê, Victorinha? – Thiago chegou deitando-se no colo da morena, assustando-a de início.


Sirius e Remo vinham logo atrás, e sentaram-se com elas. Sasha lembrou-se que Sirius chamava-a de Vic às vezes, e era o único. Arrepiou-se.


- Em nada, Thiaguinho. – ela disse, com a voz forçadamente infantil, o fazendo rir enquanto sentava-se no sofá ao lado dela.


- Estava dizendo a ela que está magra demais. – a ruiva colocou-o a par do assunto – não acha, Potter?


- Concordo totalmente, Sasha. – ele respondeu seriamente – até comentamos algo sobre isso hoje. Parece que você enxugou ou algo assim.


- Eu acho que Lílian deixou-a passar fome nas férias. – disse Sirius, mexendo nos cabelos.


- Até parece! – a ruiva riu – essa magreza é coisa psicológica!


A frase de Lílian fora cheia de indiretas, e o garoto a entendeu, dando uma súbita olhada para Lílian e para Sasha, como se elas pudessem dizer-lhe o que significava em detalhes.


- É coisa do coração – Lílian completou, dando xeque-mate – mas logo vai passar.


Sasha abaixou os olhos e tentou imaginar o que os olhos atentos de Sirius sobre ela queriam dizer, mas não conseguiu pensar sobre o efeito atordoante que aqueles olhos azuis-acinzentados causavam nela. Os outros recomeçaram a conversar, e ela continuou totalmente alheia, pensando... diabos, estava cansada de pensar tanto sobre isso. Tinha que por um fim! – ou seria um começo?


- Gente... – ela interrompeu uma narrativa animada de Thiago – tenho que contar algo à vocês. – sua voz saiu séria e embargada.


Agora, percebia que seria mais difícil do que imaginara. Muitas emoções a ressaltaram quando os outros ficaram atentos à ela, notando sua seriedade.


- Diga, Sasha. – disse Remo.


- Não pode ser aqui. – falou em voz baixa, somente para eles ouvirem.


- O que quer contar? – quis saber Lílian, muito curiosa, se dando conta de que não sabia o que a amiga teria a falar.


- Alguma fofoca forte? Desembucha! – pediu Thiago.


- Não é fofoca! – ela interpôs, com a voz mais elevada; percebeu que Sirius manteve uma seriedade impecável, mas no fundo de seus olhos a garota notou o temor que ele sentia diante do que ela iria contar – só tenho que confidenciar algo a vocês. Algo muito sério.


Lílian olhou para os lados. Remo franziu a testa e pareceu confuso:


- O que seria tão sério, Sasha?


- Já disse que não posso contar aqui!


- Então, onde poderá contar? – quis saber Sirius, muito controlado.


- Eu acho... que sei um lugar. – e lançou um olhar cúmplice a Remo, que entendeu de imediato.


- Não! – exclamou – a Sala Precisa está a muitos corredores daqui! Seremos pegos se formos até lá uma hora desta.


- Não será legal para mim e para Remo. – falou Lílian, referindo-se ao cargo de monitor.


- Não sei outro lugar melhor. – ela consolou-se.


- Escuta, garotas – começou Thiago – queria lhes contar uma breve história. Certa vez, quatro garotos idiotas marotavam pelo castelo quando descobriram algo que nenhum dos alunos poderia descobrir. Descobriram uma lenda – rapidamente, todos perceberam que ele estava se referindo a eles mesmos e à Sala Precisa – então, apavorados, foram pegos de surpresa por ninguém menos que o diretor barbudo da escola. Gritos, pancadaria... sim, foi horrível – ele teve que brincar, mas continuou sério – o diretor nos orientou muito, meninas. Disse-nos que não retornássemos ao lugar com muita freqüência, pois isso chamaria a atenção do inspetor. – ele revirou os olhos – e também falou que não contássemos para ninguém, pois isso era privilégio nosso! O próprio aluno tem que descobrir por si mesmo seu caminho. – filosofou, mas continuou – então, vocês sabem, a Sala Precisa não pode ser usada para qualquer bobagem! – finalizou.


- Mas o que eu tenho a dizer não é nenhuma bobagem, Potter! – exclamou Sasha, ofendida com a falta de sensibilidade de Thiago.


Thiago franziu a sobrancelha.


- Acha que eu sou uma retardada que não entende a seriedade das coisas? – ela continuou. – eu sei muito bem o que se pode fazer lá e o que não se pode, Thiago – ela acalmou-se, falando-lhe diretamente – e pode ter certeza de que o que eu tenho a contar-lhes... é algo que tem que ser ouvido e tem que ser calado. – sua voz deu uma leve tremida no fim da frase.


Sasha não era de balbuciar. Sua convicção podia transparecer em qualquer meio; mas agora parecia estar realmente com as emoções à flor da pele, e não foi somente Sirius que percebeu isto, pois notou que Lílian segurou fortemente a mão da amiga. Um arrepio percorreu o seu corpo, e o salão comunal pareceu de repente mais gelado do que os jardins àquela hora da noite.


- Vamos. – chamou Thiago, levantando-se.


Sasha estava trêmula, e detestou perceber isto. Diabos, agora estava totalmente confusa! Confiaria o maior de seu segredo àquelas pessoas? Confiaria realmente nelas? ‘’Sim’’, ela pensou, exausta. Não agüentava mais, tinha que soltar aquilo de si. E afinal, uma semana atrás decidira com firmeza de que aquelas eram as pessoas confiantes e amigas o bastante para saber guardar um segredo como aquele. Agora, estava feito e decidido.


Acompanhou Lílian até o Quadro da Mulher-Gorda, ambas sozinhas, enquanto Thiago fora buscar algo no dormitório.


- O que querem saindo uma hora dessas, mocinhas? – a mulher do quadro quis saber, desconfiada – sabem muito bem que o perigo está à solta, eu mesma vi com meus próprios olhos! Os corredores não são confiáveis esta hora da noite... se desaparecerem, não reclamem para mim... – ela disse, notando que as garotas avançavam.


Pararam em um corredor para esperar os meninos, conforme o combinado, pois não sabiam realmente como chegar a tal Sala. Elas estavam tensas, e Sasha notou a delicadeza de Lílian ao não tentar saber o que ela falaria antes dos outros. Não é preciso dizer que a escuridão dos corredores somada ao mistério do momento amedrontou-as, mas nenhuma quis deixar transparecer, trocando palavras a esmo enquanto esperavam.


- Fiquei sabendo que Franciny Turner e Amos Diggory estão saindo. – disse Lílian – achei realmente ridículo, ele deve estar muito necessitado.


- Ah, Lily, ela não é tão feia assim. – Sasha falou.


- Mas é biscate! – exclamou a ruiva – e todos os alunos desse colégio sabem disso. Não é muito bom para a imagem de alguém requisitado como Amos querer sair com Franciny Turner!


- Amos pode ser bonito mas... acho que tem garotos muito mais bonitos que ele nesta escola. Davies, por exemplo. – Sasha disse – e nossos amigos também não ficam atrás! – ela riu.


- Seus amigos. – corrigiu a ruiva – e eu sei que está se referindo à Sirius, Sasha, ninguém acharia aquele Potter tosco bonito, realmente...


- Não é só Sirius. Thiago também é muito bonito. – falou, fazendo a ruiva corar e ficar nervosa sem motivo – e Remo! Ele é realmente charmoso, você sabe.


- Sim... mas não sei porque você não saiu com Davies. Aqueles olhos verdes fitando os meus, e dizendo aquelas coisas... eu piro! – disse a ruiva.


- Ah, eu sei que você gosta de olhos verdes, dona Lílian... Thiago também sabe... – a morena riu, fazendo a outra corar – mas de verdade, eu estava conversando com Davies esses dias... e até gostei, sabe, de ficar um tempão com ele. – ela diminuiu o tom da voz, como se alguém pudesse ouvir naquele corredor muito vazio – eu até repensei se não teria sido melhor dar uma chance para ele do que à Sirius. Mas... já foi! – Sasha disse sem pensar.


Realmente, havia pensado em Davies não só como amigo aquele dia, mas era irreversível a idéia de que estava apaixonada pelo maroto de olhos acinzentados. Seus beijos a levavam para outro mundo e tinha certeza de que nenhum garoto seria capaz de proporcionar o que Sirius lhe dedicava. Mas não deu tempo de Sasha confidenciar isso à Lílian.



*****




- Droga, Thiago, meu pé! – ralhou Sirius, enquanto lutava contra mais dois pares de pernas embaixo de uma capa.


- Essa coisa não pode ser aumentada com feitiço não? – quis saber Remo.


- Não pode! – falou Thiago, com a voz alerta – e é melhor vocês calarem a boca, idiotas, ou vão nos achar em dois segundos!


- Você está de boa né garanhão. – brincou Sirius – ta aí no meio coberto inteiro pela capa... quero ver o caos que vai ser se Filch nos achar uma hora dessas, e ainda mais escondido!


- Não vai ser caos nenhum! – Thiago previu – agora calados!


Os outros dois seguiram o resto do caminho resmungando muito e brigando um com o outro, enquanto passavam por inúmeros corredores até onde tinham combinado de encontrar-se com Sasha e Lílian. Ao se aproximarem do local combinado, puderam ouvir suas vozes:


- Mas é biscate! – dizia Lílian, e continuava a falar algo que eles não conseguiram decifrar.


- O quê... – começou Remo, mas os outros dois o calaram com as mãos para ouvir a conversa.


- Amos pode ser bonito mas... – era a voz de Sasha, e Sirius imediatamente tirou a capa dos outros dois, deixando-os descobertos, e cobriu-se completamente, aproximando-se das duas para poder ouvir a conversa, sem olhar para a face estupefata dos amigos que ficaram no outro corredor.



Ouviu tudo o que Sasha dissera com clareza, observando a sua expressão. ‘’Merlin... ela é linda.’’, ele pensou, mas as palavras que saíam dos lábios carnudos da garota não lhe agradavam nem um pouco. Nem um pouco mesmo. Quando ela disse nas entrelinhas que se arrependera de ter saído com ele aqueles dias, ele arrancou abruptamente a capa, assustando-as.


- Já estamos aqui, garotas. – sua voz foi fria e cortante. – acho melhor irmos, não é mesmo? Afinal, o retorno será mais perigoso que a ida.


Sasha arregalou os olhos:


- O que estava fazendo aí? – perguntou, mas não obteve resposta, e temeu a interpretação que Sirius faria de tudo o que ela dissera.


Os outros dois saíram de trás do corredor muito chateados e irritados, mesmo sem ter ouvido quase nada da conversa, apenas por Sirius tê-los deixado desprotegidos por causa de uma garota!


- Vamos logo. – chamou Thiago, guiando o grupo.


Andaram em silêncio entre muitos corredores ainda, escondendo-se do Poltergeist velho que somente levitava pelos corredores durante a noite, entre as armaduras e as passagens secretas que as garotas nem imaginavam que poderiam existir. Sasha notou que Sirius tentou ao máximo, durante todo o trajeto, manter-se o mais longe possível dela. Notou também que sua expressão estava dura e seu punho estava fechado; e foi por essa demonstração de nervosismo que a garota não foi falar com ele para explicar-lhe algo. Simplesmente, deixou-se seguir o grupo até a Sala Precisa. Além de tudo, precisava manter a mente aberta para não esquecer nada, e não podia se preocupar com outra coisa. Mesmo que não conseguisse esquecer o tom de voz de Sirius...


Ao chegarem, Thiago se candidatou para pensar no lugar perfeito. E ele realmente o fez: assim que passaram pelas portas da Sala, havia ali uma saleta com uma lareira crepitante, com sofás realmente confortáveis e muitas almofadas espalhadas pelo chão do recinto. Sasha sentou-se no sofá grande, deixando a poltrona livre, pois não queria aumentar a tensão sobre si mesma. Mesmo assim, os outros se sentaram no sofá da frente e Sirius na poltrona, ficando completamente virados para ela. Pegou uma das almofadas, pensando em como começar, enquanto os outros respeitavam o seu silêncio.


- Bem... – ela começou, e então desencadeou a falar: - primeiro queria deixar bem claro que tudo o que irei lhes contar é algo que guardarão para sempre somente para si! Ninguém fora a gente poderá saber disso... – ela olhou nos olhos de cada um, e vacilou ao olhar os olhos quentes de Sirius, mas continuou olhando diretamente para ele - ...e se estou confidenciando isso a vocês, é porque realmente acredito e confio em vocês. Sei que são capazes de manter uma amizade verdadeira, então escolhi vocês para contar... o que nunca contei a ninguém. – suspirou – por isso estou embolando as palavras, mas por favor, se não entenderem peçam que eu explique de novo. Juram não repetir o que ouvirão em qualquer outro lugar?


- Claro. – todos disseram quase em uníssono.


Thiago sorriu, dando-lhe confiança. Remo levantou-se e se sentou ao lado da garota, abraçando-a de lado. Sasha fechou os olhos por um instante... “é agora”.



*****




"Não há nada em que paire tanta sedução e maldição como num segredo."
(Soren Kierkgaard)




- É uma longa história... meu nome verdadeiro é Sasha Victoria Riddle Mills. – contou, e isso não abalou-os, então ela continuou – é claro... que vocês não entenderam, então... o nome dAquele-que-não-deve-ser-nomeado é Tom Marvolo Riddle. – contou.


Lílian arregalou os olhos, e os garotos continuaram muito atentos, franzindo a testa levemente agora.


- Ele é meu primo de terceiro grau, sendo primo da prima da minha mãe. É confuso... somos os únicos bruxos sobreviventes de toda a família, e ela é muito desunida. Meus pais mal falavam com seus irmãos depois de casados, mas algo sempre continuou mesmo com a nossa mudança para o norte da Escócia. Esse primo... sempre nos visitou. – ela engoliu seco para continuar – Ele sempre me mimava e me enchia de um carinho familiar que me faltava, e isso me fazia amá-lo tanto! – seus olhos marejaram levemente e ela mordeu os lábios inferiores, sentindo o abraço de Remo apertar. Então, continuou com mais segurança...


“Mas ninguém na família - a não ser seus pais escrotos, nem mesmo meus pais, sabiam que ele era bruxo, ainda mais daquele nível. Ele me presenteava sempre com o que eu mais desejava, como uma vez em que me deu um cachorro, quando eu era muito nova. É claro que eu lhe dava toda a confiança possível. Mas quando eu fiz seis anos, ele chamou meus pais para conversarem. Nunca havia visto minha mãe mais triste ou desesperada em toda a minha vida; mas eu era pequena demais para entender o porque de sua tristeza. Meu pai também mudou. Ele trancava a porta várias vezes durante o dia, e certas vezes nem me deixava sair de casa para brincar nos campos de flores, com Severo.” – Sasha pareceu não notar o olhar arregalado dos presentes diante essa afirmativa, então continuou - “Meus pais estavam esquisitos e eu nem ao menos sabia o porque. Dentro de alguns meses, ele voltou à nossa casa, e mamãe começou a chorar imediatamente. Não resisti em ouvir por trás da porta...


“Ele dizia que queira me levar para o mundo ao qual eu realmente pertencia e me mostrar que os meus poderes poderiam ser realmente úteis. Ele dizia aos meus pais que eu tinha muito poder, muito mais do que qualquer bruxo poderia cobiçar ter, e até mesmo poderes que ele próprio não tinha, e ele sentia isto. Dizia que queria me levar para uma conquista, para me ensinar os passos da glória e cuidar de mim como uma verdadeira rainha. Ele dizia que podiam confiar nele e que nada de mal ou errado me aconteceria. É óbvio que eu tinha apenas seis anos, não entendia qualquer maldade. E no começo ele foi calmo e atencioso com meus pais... parecia tentar ganhar tempo, mas viu que eu estava crescendo rápido e eles não estavam cedendo, então começou a apelar. Foi aí que ele gritou seus planos de verdade, tentando forçá-los. A cada dois meses mais ou menos, visitava-nos para causar terror, e realmente em casa as conversas e o convívio se tornaram insuportáveis.


Ela suspirou tomando ar para continuar: “Gritava que comigo, sua ascensão sobre o mundo bruxo estaria completa, exclamava que eu era a única peça que faltava para o desenlace de todos os seus planos. E mesmo assim eles resistiram. Então, começou a ameaçá-los. E eu acho... que foi aí que tudo começou...”


- Espera aí. – a voz de Sirius atrapalhou a sua linha de raciocínio – e se eu não quiser acreditar em tudo isso?


Sasha olhou-o tristemente. Sabia que ele acreditava nela, mas ele parecia lutar contra si mesmo, tentando não acreditar naquela história em particular. Entendeu que era muita informação de uma vez só sobre si mesma, então decidiu contar-lhes de uma maneira diferente.


- Seria melhor se tivéssemos uma penseira.


Neste momento, Lílian apontou-lhe para algum ponto atrás dela, e Sasha viu que o objeto aparecera. Buscou-o e depositou-o em uma mesinha que também aparecera, bem entre os sofás. Primeiro, organizou os pensamentos em sua mente; depois os recolheu com a ponta da varinha que guardara no meio das vestes. Antes de inclinar-se para frente, deu uma última olhada para cada um dos amigos e murmurou um ‘espero vocês lá’. Sasha sabia que não seria fácil relembrar com tantos detalhes estes momentos... mas era preciso. Depois que começara a contar, notara que isso não só aliviaria o seu íntimo, como também poderia ser útil para protegê-la.


Então, eles mergulharam nos pensamentos de Sasha.


O primeiro lugar foi a entrada de um vilarejo, cuja placa que indicava Wester Galcantray tremulava com um forte vento que soprava na direção contrária à que uma menina de cabelos muito negros corria. Ela subia um campo de flores logo ao lado da placa, e parecia estar correndo desesperadamente para dentro de uma grande casa que ficava no topo do morro. Logo reconheceram Sasha, quando ela virou-se e seus olhos azuis muito claros e brilhantes reluziram com a luz do sol e a intensidade do vento. Eles a seguiram até a casa. Quando a menina chegou no quintal dos fundos da casa, abriu devagar o portão de madeira e, na ponta dos pés, atravessou as únicas árvores grandes do campo que ficavam no fundo de sua casa, e chegou à porta da cozinha, primeiro escutando atrás da porta.


A Sasha mais velha mordeu os lábios inferiores e enxugou seus olhos com a ponta dos dedos; a preciosidade da lembrança ardeu-lhe do peito e ela quase sentiu o que sentia naquele dia. Olhou para seus amigos, que esperavam atentos o que a menininha na porta da cozinha faria. Ouviu-se um baque que vinha de dentro da casa e a Sasha pequena assustou-se quando a porta abriu-se com muita violência para dentro, para um homem de cabelos negros e pele muito clara aparecer com seus olhos muito vivos em cima dela. Abraçou-a, mas ela não segurou o abraço e correu para dentro da cozinha, fazendo com que os visitantes da lembrança a acompanhasse.


- Aí está a minha garotinha... – o homem disse.


Ele devia ter uns quarenta e poucos anos. A cozinha era um cômodo bem arrumado e muito cheiroso da casa, e nada combinava com a tensão que havia naquele momento. A pequena Sasha correu para o colo da mãe, que acolheu-a com um abraço protetor e segurou-a firmemente.


- Minha garotinha, Tom. – ela corrigiu o primo com uma voz raivosa.


Ele deu um sorriso de loslaio. Parecia tão calmo quando calculável, era um homem realmente perigoso. Sasha notou que seus amigos pareciam perplexos com a beleza de Voldemort, no passado, ou pareciam perplexos por ver quem ele era, ou pela profundeza de seu olhar. Na verdade, haviam vários motivos para se ficar perplexo perto daquele homem, mas Sasha já armara suas defesas sobre ele.


- Querida Peyton. – começou o homem – nós conversamos muitas vezes sobre isto... será preciso que eu volte a te explicar o porque de eu querê-la? – ele ergueu seus olhos para a prima.


E a expressão da mãe de Sasha denunciou que aquele olhar a fez pegar fogo. Suas emoções pareciam descompassadas.


- Eu já lhe disse, Tom, que era melhor não voltar à nossa casa! – o pai de Sasha descia as escadas da sala que era o cômodo ao lado, gritando.


- Isso são modos de receber um parente, prim... – ele ia dizendo calmamente, quando viu o pai de Sasha chegar pela porta.


Ele trazia uma arma trouxa, uma espingarda muito polida e bem cuidada, que parecia nunca ter sido usada. Tom Riddle simplesmente deixou seu olhar deitar-se no objeto, e nenhum dos que estavam na lembrança, tanto assistindo quanto participando, foi capaz de identificar qualquer sentimento em seu olhar.


- Terei que avisar duas vezes? – tornou a gritar o pai de Sasha, parecendo muito assustado.


- Você realmente acha que pode me parar? – o outro perguntou, agora com um sorriso fino nos lábios, mas pareceu alterou o seu humor em seguida – Isto está passando dos limites! Vocês não entendem? Somos ancestrais de Salazar Slytherin! – ele começava a gritar também.


Sasha notou que Lílian levou a mão à boca para segurar um grito abafado, e disse-lhe:


- Eles não nos escutam, Lily... são lembranças imutáveis.


- Como...? – a ruiva começou, mas parou ao notar que o homem continuava a falar.


- Não podemos deixar que isso se acabe! Nossa linhagem bruxa está se esvaindo... e somos bruxos muito poderosos! Nunca um bruxo poderia contar as qualidades de Sasha... vocês não entendem? Ela é rara! Nós somos raros! Podemos dizer que somos os últimos...! – disse – e é o que vocês querem, não é mesmo? – sua voz ficou misteriosa e mais fria que o normal; Sasha temia o quão frios eles poderiam ficar – querem que sejamos os últimos. Mas eu posso fazer com que sejamos os primeiros!


- Você é nojento! – gritou Peyton. – nunca deixaria que Sasha se casasse com você, seu ordinário! Ela é apenas uma criança!


- Juntos, seríamos invencíveis! – bradou em resposta, ainda controlando-se. – A nossa força dominaria o mundo bruxo... – sonhou, os olhos brilhando.


- Tom, confiávamos tanto em você. – disse o pai de Sasha tristemente, enquanto destravava a arma – se não tivesse nos exposto a sua condição de bruxo e dissesse que levaria Sasha para férias, até deixaríamos você levá-la... – ele continuou falando, enquanto conferia a arma – mas você não foi esperto o bastante. – ele mirou em Tom.


O alvo pareceu muito calmo diante a ameaça, e sorriu:


- Priminho... você não tem noção de quais são as minhas verdadeiras intenções com sua filha.


- Diga mais uma palavra... que partirá dessa para a pior!


Tom Riddle gargalhou estridentemente.


- Cale essa boca, seu trouxa filho-da-mãe. – com um gesto rápido e experiente, ele sacou a varinha e enfeitiçou o pai de Sasha com o feitiço do corpo-preso. Em seguida, encarou Peyton, cujas lágrimas já escorriam pelo rosto – vocês tem muita sorte de termos o mesmo sangue... não sabem como eu valorizo isto. Pena que você é fraca, Peyton querida... – ele aproximou-se, e mexeu em uma mecha do cabelo escuro da prima, enquanto ela agarrava Sasha ainda mais a si – mas Sasha não é. Eu sinto... a sua energia. – seus olhos brilharam maquiavelicamente – Eu posso sentir a sua força. É claro que vocês não entendem... são só trouxas. Mas esta garota... vai ser minha. Pode guardar estas palavras prima... mas você sabe que desde sempre, eu consegui o que eu queria sem maiores esforços. Vocês estão apenas atrapalhando o meu caminho, e isto está me deixando furioso. – sua voz soou calma – eu não vou fazer mais rodeios para consegui-la. Na próxima vez em que eu chegar aqui... espero encontrar a minha garotinha de malas prontas e com um sorriso ansioso.


Ele mexeu agora nos cabelos de Sasha, e fez ela virar a cabeça para ele. Tinha uma expressão de extremo nojo, e não se importava em demonstrar isso àquele homem.


- Não quer ir passear comigo, querida?


Em resposta, a pequena Sasha cuspiu em seu rosto com força, e a mãe de Sasha saiu de perto dele no mesmo momento.


- Sua pirralha... – ele murmurou muito baixo, com raiva – eu voltarei... podem me esperar. – ele desfez o feitiço do corpo preso no pai de Sasha e finalizou: - e não tentem fugir. – aconselhou, desaparecendo em seguida.


A mãe de Sasha começou a chorar no mesmo momento, e tudo ficou escuro...



- Acabou? – a voz de Remo se fez no escuro, mas ninguém podia ver ninguém ali.


- Não, ainda tem mais. – a voz de Sasha – muito mais, para dizer a verdade... vocês querem continuar?


- É claro! – Lílian e Thiago disseram quase juntos.


- Vamos acabar com isso logo. – Sasha estremeceu ao ouvir a voz de Sirius.


- Então... a próxima lembrança é meio trágica, mas tenho que mostrá-las a vocês, pois explica muita coisa e dá muita essência. – disse, e mergulharam em outra lembrança...


Sasha Mills acordou em uma manhã muito clara com os gritos da mãe. Todos se concentraram para saber qual era o problema com Peyton agora, e ficaram chocados quando chegaram ao quarto do casal junto com a menininha. As grandes janelas venezianas estavam escancaradas e do lado de fora, onde haviam campos imensos de flores cultivadas pelo pai de Sasha, Roger Mills, agora haviam tapetes cinza de flores queimadas e murchas.


- É o fim do meu negócio. – o pai se lamentava, com o cotovelo nos joelhos, as mãos segurando o rosto. – é o fim... – murmurava.


- Nenhum simples barulho para denunciar... – lamentava-se Peyton, e foi até onde o marido estava, abraçando-o.


- Foi o seu parente, Peyton. – ele disse, sem tom acusativo, apenas lamentando – se ele pensa que seremos fracos o bastante para deixá-lo levar Sasha...


A garotinha escutava tudo da porta, sem que eles a vissem. Uma lágrima escorreu pelo seu rosto, e enfim deixou-se descobrir pelos pais, aproximando-se deles para abraçá-los e dizer:


- A gente tem que fugir. – falou com um tom inocente, olhando-os nos olhos.


A Sasha crescida sentiu-se estranha e em sua testa formou-se um vinco de preocupação. Em sua mente, aquela era uma das lembranças mais emocionantes que tinha, e uma das últimas com os pais, e rodara tantas vezes em suas noites. Para sua surpresa, sentiu aquele abraço forte de lado, e era Sirius. A intensidade do momento parecia tê-lo feito esquecer da briga, e ela não esperou nem mais um segundo para encostar o rosto em seu ombro, sentindo-se mais segura para continuar a assistir.


- Querida, você gosta muito de Tom e nós sabemos. – era a mãe dela que dizia – mas tem que entender... estamos fazendo tudo isso para o seu bem, para o bem de muita gente! Você sabe, não é mesmo? – ela acariciou seu rosto muito docemente.


- Mamãe, eu não quero ir com ele. – ela respondeu de imediato, quase ofendida – quero passar o resto da vida com vocês!


Roger e Peyton trocaram um olhar cúmplice. No fundo, a janela realçava firmemente um cenário de terror com poeira negra esvoaçando em uma bela manhã. Era difícil não sentir uma tristeza no coração ao ver aquilo, mas a garotinha de olhos azuis entre os pais parecia bem decidida.


- O que você acha melhor fazermos, meu amor? – perguntou Roger à filha.


- Já disse... a gente tem que ir para um lugar bem longe, onde ninguém possa nos achar. – seus olhos brilharam enquanto ela falava.


- A gente devia ir para Nairn. – disse a mãe.


- Lá eles nos acharão. – respondeu o pai. – é muito próximo, e é muito óbvio irmos para a casa de seus pais, Pey.


- Não temos tanto dinheiro, Roger. E, além disso, você sabe que meus pais irão nos ajudar o tanto que precisarmos. Pelo menos vamos até lá... e conversamos, inventamos alguma coisa e vamos para outro país, mudamos de nome...


- Sasha pode se virar sozinha, com essa magia que ela faz de mudar de forma. – riu o pai.


Sasha sentiu o peito de Sirius tremer, e pensou que ele rira também. Um bolo começou a se fazer em sua garganta e ela tentou engolir, mal notou quando as lágrimas começaram a escorrer suavemente contornando seu rosto muito branco, as bochechas avermelhando-se. Passou seu braço por trás do garoto e segurou-o com firmeza.


- Posso ficar loira de novo? – ela perguntou, muito entusiasmada.


- Do jeito que você quiser, meu amor! – disse a mãe.


A pequena Sasha pareceu ficar triste de repente. Abraçou a mãe e disse, a voz muito embriagada de emoções:


- Me desculpem fazer vocês irem para longe de todo mundo... eu gostava daqui, mamãe... se quiserem ficar, não precisam mudar-se, eu vou com o primo Tom e vocês fiquem aqui muito bem!


- Sasha... – a mãe ninou-a – nós realmente adoramos este lugar... e pensamos que não pode haver lugar mais lindo no mundo. – e puxou a menina para falar-lhe olhando nos olhos – mas nós amamos você, e amamos o fato de ser nossa, a garota mais linda e mais meiga do mundo.


- Pode ter certeza que não trocaríamos nada e nenhum lugar ou dinheiro no mundo por você, Sasha. – apoiou Roger.


Então, tudo começou a rodar e ficou escuro novamente...



Sasha não desgrudou de Sirius, e abraçou-o para chorar aos soluços, e nenhum dos outros falaram nada por alguns minutos, e puderam ouvir somente as fungadas da garota e as palavras sussurradas com sinceridade e preocupação por Sirius, para que se acalmasse. Após isso, ela disse:


- Vamos... continuar. Podemos pular o caminho para Nairn? – perguntou – acho que eu não vou agüentar.


- Claro que sim. – disse Lílian.


- Vou apenas dizer o que aconteceu. Estávamos indo para a cidade que é mais ao norte de Wester Galcantray, onde encontraríamos os pais de minha mãe. Eles eram totalmente alheios ao mundo bruxo, então contaríamos algumas mentiras para que pudéssemos ter dinheiro o suficiente para esconder-se pelo mundo. Era o que tínhamos em mente... até a metade da viagem, quando pegamos outro ônibus em uma estação ferroviária em uma cidadezinha desconhecida. Haviam poucos camponeses no veículo... e minha mãe cheia de roupas esquisitas, meu pai de boina e bigode falso, e uma pequena garotinha loira. Seria engraçado no começo, se vocês vissem essa lembrança. – ela parou mais uma vez para fungar – mas não ficou nada engraçado depois de quinze minutos naquele ônibus balançante. Era madrugada, e as luzes do ônibus se apagaram. Podem imaginar o que aconteceu em seguida?


Houve um silencio por um momento, e Thiago arriscou:


- Comensais?!


- Dezenas deles. Lançavam feitiços para todos os lados, e imediatamente o ônibus começou a derrapar na pista. Então, o veículo capotou. Para qualquer escocês, foi apenas um acidente muito violento de ônibus, mas meus pais e eu soubemos desde o começo quem estava causando tudo aquilo. Houve muito pânico, e muitas pessoas morreram com o capote. Mas meus pais conseguiram ficar por cima, e abriram a saída de emergência para que pudéssemos passar. Lá fora, tive a idéia de me tornar muito grande e inteira preta, não negra, mas preto da cor da noite, dos pés à cabeça, e funcionou. Protegi-os por um bom tempo em uma floresta próxima ao acidente, e quando pensávamos que o lugar estava livre para seguirmos a viagem à pé, muitos comensais surgiram do nada. Eu só pude... mamãe me disse que eu subisse em uma árvore e esperasse eles irem embora para ir procurar meus avós, me camuflando sempre. Eu obedeci. Foi a última vez que eu vi meus pais. – e o bolo novamente voltou à sua garganta, mas ela continuou mesmo assim. – fiquei várias horas em cima da árvore, e depois me camuflei da cor dos troncos, e cheguei até Nairn pedindo orientações aos camponeses pelos quais passava. Contei aos meus avós a verdade sobre a magia e sobre o meu primo Tom, e eles ficavam aterrorizados. Fizeram-me usar outra aparência durante todo o tempo e viajamos quase imediatamente para outro país.


“A primeira parada foi a Rússia. Devem achar que viajar pelo mundo foi fascinante, mas não quando haviam vários ataques e tínhamos que ficar sempre escondidos do mundo. Passamos pela Geórgia, fomos para a Índia, e depois voltamos para a China e depois para o Japão. Era uma linha de caminho sem lógica para despistá-los. Ficamos assim até os meus onze anos, quando fomos para a Austrália, e eles conseguiram me pegar. Meus avós estavam dormindo na sala e eu estava no quarto do apartamento, quando ouvi uns ruídos na sacada. É claro que eu estava distraída demais para pensar que poderiam ser eles. No momento em que abri as portas de vidro e avistei a imensidão e o luxo de Sidney de cima, fiquei hipnotizada. As luzes brilhavam com intensidade e em várias cores, e fui me aproximando do fim da sacada cada vez mais. Me lembro... de ter pensado em Severo naquele momento, e em como ele estaria em Wester Galcantray pensando que eu havia morrido ou algo assim. Então, eles me raptaram. Acho que podemos voltar à penseira agora.”


- É uma grande história – comentou Remo.


- Se quiserem, continuamos depois...


- Nada disso! – exclamou Lílian.


E eles foram à outro lugar, bem diferente das paisagens que estavam presenciando... era um quarto escuro e frio, sabe-se lá de que país. Parecia um porão muito fundo, pois faltava oxigênio, e o teto era realmente impossível de se ver; era iluminado somente por uma luz fraca de um candelabro. Em um canto muito sujo, uma garotinha chorava com muitos lamentos, seu rosto marrom de sujeira e sua pele também; estava descalça e usava apenas um tecido bege escroto que parecia coçar a sua pele. Mas ela não podia coçar-se, pois suas mãos estavam presas pelos pulsos com correntes que iam a um ponto muito baixo na parede atrás dela, fazendo-a ficar sentada. Em seu rosto, as lágrimas faziam uma encruzilhada de caminhos mais claros e mais lamacentos. Parecia estar há dias no lugar. E eles puderam reconhecer a pequena Sasha pelos imensos olhos azuis, que não deixavam de encantar nem mesmo em um lugar como aquele.


“Eu não vou deixá-lo fazer o que quiser comigo.” – o pensamento da garotinha soou alto, de modo que todos puderam ouvir.


- É uma lembrança forte. – explicou a Sasha maior – é incrível, mas me lembro de cada detalhe daqueles dias, de cada pensamento de fúria. Isso vai explicar algo mais para frente.


Sasha notou que os amigos pareciam chocados com a cena de tortura de uma menina tão pequena.


“Onde estão meus pais?” ela pensou novamente, antes de um fungo alto. Novamente caiu em lágrimas e não conteve um grito de dor.


Seu grito ecoou vários metros acima de sua cabeça, até que não puderam mais alcançá-lo com o ouvido. “O que eu fiz para merecer isso?”


Então, uma sombra veio descendo de lá do alto lentamente. Ela só pode vê-la quando estava quase tocando o chão, por causa da escassez de luz. Era Tom. Ele usava uma capa preta que deixava somente seu rosto à mostra, e seus olhos estavam vermelhos. Ela esperou que ele falasse.


- Você nasceu com os poderes certos, minha prima, simplesmente. – ele respondeu a pergunta que ela fizera para si mesma – mas o ruim da história toda... é que não quer mostrá-los ao mundo. Tem medo?


A Sasha maior agora e os seus amigos que assistiam à cena sabiam que ele fazia aquilo para fazê-la se sentir fraca e tentar provar que não o era. Mas a pequena Sasha não poderia imaginar a hipocrisia do primo...


- Não tenho medo de nada! – gritou.


- Então porque não me mostra isso, Sá?


Ela semi-cerrou seus olhos para encará-lo.


- Nunca!


- Não quer se casar comigo mesmo? Você terá uma casinha para cuidar! E será tudo de verdade... juro que eu serei o melhor marido. O nosso filho... será um sangue-puro herdeiro de Slytherin e terá tantos poderes que você nem pode imaginar! – mas ante a essa fala, somente os olhos de Tom brilharam por se encherem de planos e futuros, Sasha simplesmente ergueu a cabeça para ele.


- Eu não quero ter filhos!


- Mas você vai ter... e serão nossos filhos... (A Sasha maior pensou ter ouvido um grunhido de repulsa por parte de um dos meninos, mas voltou à lembrança.)


- Me deixa ir embora! Onde estão meus pais?


A indiferença da garota pareceu afetá-lo, e irritou-se, indo em direção à ela com uma rapidez inigualável e segurando-a pelo pescoço contra a parede, sufocando-a.


- Garotinha, pára de testar os meus nervos. Ouça uma coisa e grave para sempre: você nasceu para ser minha, e no mundo não há outro lugar para você que não seja do meu lado. Onde você acha que aceitarão uma menininha estranha que muda de forma? Eles rirão de você... se sentirá suja entre os outros.


Quando puderam notar que a pele do rosto dela mudava de cor, ele soltou-a.


- Desgraçado. – Thiago xingou com raiva para si mesmo, em voz baixa.


- Eu vou passar por cima de todos! – a garotinha respondeu.


- É uma pena que não tenha essa determinação quando o assunto é mudar o mundo bruxo para melhor... – Tom lamentou-se, enquanto dava as costas para a garotinha e desaparecia de sua visão.


Lágrimas de raiva rolaram no rosto da pequena. Seu rosto vermelho ardia e seus olhos brilhavam de fúria. Todos sentiram a intensa onda de calor que a garotinha emanava, e seu rosto cobriu-se de suor para completar a sujeira.


“Se ele pensa que vai conseguir fazer isso comigo...”


Ela levantou-se de súbito, tentando puxar com força as correntes. Poderia parecer muito infantil o que ela tentava fazer, mas eles se espantaram quando notaram alguma mudança nos objetos atrás dela.


“Eu não vou permitir...”


Os pensamentos dela ecoavam muito altos e um vento começou a mover-lhe os cabelos, e sabe-se lá de onde ele surgiu. Na parede atrás da menina, algumas pedras em volta das correntes se soltaram e caíram no chão, ecoando em seguida. Ela olhou para trás, curiosa. “Mas, o quê...” ela e todos os que assistiam a cena puderam notar que as correntes estavam se soltando da parede suja. “Tente não pensar...” ela repetia para si mesma, enquanto uma agitação inigualável tomava conta de seu ser: podia fugir desse destino. Tentou continuar pensando em seus pais, com a mesma intensidade de raiva de antes, enquanto desenrolava as correntes do próprio braço, sem acreditar no que acontecia, e ao mesmo tempo sem querer duvidar da própria sorte.


- Garotinha esperta. – piscou-lhe Lily.


- Como fez isso? – quis saber Remo, estupefato, atento aos movimentos da menininha.


- Foi quando eu descobri um dos meus poderes... posso fazer magia sem varinha em momentos intensos. – explicou, com um suspiro. – ou até mesmo não intensos, que seja.


- Por isso... sua varinha simplesmente sumia e você não dava falta! – deduziu Thiago.


Lílian fez um gesto de silêncio para continuarem a prestar atenção à cena. Sasha deu uma rápida olhada para Sirius, somente para conferir sua presença, e senti-lo bem ao seu lado agradou-a, ainda mais sob a forte lembrança que estavam assistindo. Os olhos acinzentados dele estavam grudados na cena da lembrança, mas ela pôde perceber que ele sentira o olhar dela sobre si.


Então, voltou sua atenção para a própria lembrança. Sua miniatura agora conseguia pensar firmemente coisas como arrependimento, se matar, a própria incapacidade... exagerando em sua depressão particular. Mas era apenas uma criança, e estava conseguindo extremamente bem bloquear o verdadeiro sentimento em seu coração, pois sentira que Tom podia sabê-lo, ou ouvir seus pensamentos.


A criança tateou as paredes, seu corpo denunciando a sua agitação mais do que qualquer coisa. Olhava constantemente para cima para verificar se Tom não descia gloriosamente para apanhá-la e maltratá-la e encher sua cabeça de impurezas, mas agora ela sabia que era forte. Continuou tateando as paredes até achar uma das pedras mais limpa e meio elevada da textura, diferenciando-se. Aproximou-se e apertou-a. Nada aconteceu. “Diabos!”. Ergueu-a para cima, e novamente a pedra simplesmente mexeu-se, sem abrir nenhuma passagem ou coisa assim. Pisou forte o pé, fazendo pirraça para a parede. Jogou a pedra para todos os lados possíveis, empurrando-a e puxando-a sem parar, até que uma maçaneta surgiu magicamente alguns centímetros ao lado da pedra. Com alívio, correu para ela, e, puxando-a com muito esforço, conseguiu abrir uma passagem. E eles a seguiram.


Havia uma imensa escada muito empoeirada e cheia de teias de aranha, e até mesmo alguns escorpiões serpenteando por ela, o que denunciava sua falta se uso: talvez nem mesmo Tom soubesse dessa escada. Isso tudo ela pensou, e só então deu por si de que havia parado de pensar negativamente. Souberam que eles estavam atrás dela quando ouviram ruídos no saguão ao lado, onde estiveram momentos antes. Então, habilmente, a pequena Sasha subiu a escadas de dois lances por vez, desviando-se dos aracnídeos com rapidez. Quando o grupo conseguiu chegar ao topo, ela era só um ponto no horizonte escuro e cheio de tumbas, e atrás de uma delas ela sumiu para a liberdade, e a lembrança acabou.



Quando se encontravam todos novamente na Sala Precisa, ela tornou a falar rapidamente, sem esperar perguntas:


- Depois disso corri para os meus avós, que estavam apavorados com as semanas em que sumi. Já haviam voltado para Nairn, e eu nem mesmo sei como cheguei até eles, mas o fiz. – respirou profundamente, para continuar. – acho que... o resto, posso contar para vocês. Eles não voltaram a me procurar, e isso assustou tanto a meus avós quanto a mim, pois quando voltassem seria fatal. Eu sabia que mesmo com os poderes que estava descobrindo, eles eram muitos e mais esclarecidos de seus poderes. Em Nairn, freqüentei uma escola bruxa para a qual fui convidada, uma das maiores e únicas da Escócia. Não era interna... e ao ver dos meus avós era muito mais segura. Estudei e morei em Nairn normalmente até o começo do ano passado, quando meus avós pareciam cansados demais para cuidar de uma adolescente, e a paranóia de minha avó aumentava a cada noite que eu saía. Então, recebi uma carta de Dumbledore, me convidando para estudar o sexto e o sétimo ano em Hogwarts. Mesmo desconhecendo o mundo bruxo completamente, meus avós confiaram totalmente naquele velho de barbas brancas, quando ele apareceu na porta de casa para explicar-lhes e fazê-los apaixonar-se pelo nosso mundo. Acho que foi uma ótima decisão mandar-me para cá. – ela confidenciou, olhando para cada um deles – não queria passar o resto da vida morando com os meus avós, que além de tudo nem ao menos eram bruxos, e estavam gastando o que tinham de suas vidas para cuidar de mim. – seus olhos se encheram de lágrimas, e ela olhou para o chão – e é por isso, mais que tudo, que eu os amo. Eles não hesitaram em cuidar de uma pré-adolescente perseguida por loucos com varinhas. Estiveram sempre ao meu lado... cuidaram de mim. Mas estão velhos demais para continuar com essa tarefa desgastante. – ela deu uma piscadela com um sorriso meio torto nos lábios, tornando a erguer os olhos.


Por um momento, os amigos de Sasha pareceram registrar tudo o que haviam presenciado. Diabos, era muita coisa. Nem Lílian nem Remo tinham a visão focada, quanto mais Thiago e Sirius, que se mantiveram na mesma posição por vários minutos, pensando. Após um tempo, que Sasha concluiu como ótimo para que estivesse tudo registrado, Sirius voltou a falar, a voz um pouco áspera e rouca:


- Espere aí. – e todos saíram do transe e prestaram atenção no garoto – o que você disse sobre Snape? Sobre pensar nele, serem amigos, ou algo assim.


Sasha suspirou, lembrando-se de que não havia contado a eles quais eram seus laços com Severo.


- Severo e eu éramos amigos em Wester, inseparáveis. Eu o conhecia porque meu pai tinha uma floricultura grande ao lado do mercado do pai dele. Era seu trabalho trouxa. Na verdade, eu não tinha idéia de que ele era bruxo, até Severo me contar em segredo uma vez. Agora entendo... porque ele me culpa de sua condição agora. – seus olhos tornaram-se brilhantes e distantes – porque na sacada, pensei em Snape.


- Snape está envolvido com... ele? – disse Lílian com repugnância.


- Foi isso que deu a entender aquele dia, lembra-se? – falou Sasha, agarrando-se à linha de pensamento que lhe viera – É claro, eles devem ter pegado Snape para me provocar, e quando eles foram mandá-lo embora, ele sabia demais...


- Sempre o achei esquisito. – falou Thiago, jogando-se no sofá atrás de si – desde o primeiro dia, ele pareceu inquieto e perseguido. Era angustiante olhá-lo. – lembrou.


- Juro que ele não era assim. Snape era tão sentimental ou durão como qualquer garoto de sua idade... e o modo como ele está agindo este ano me deixa muito espantada. – Sasha lembrou-se com um lampejo das vezes em que encontrara o garoto pelos corredores da escola e ele simplesmente a ignorava ou lançava-lhe um olhar faiscante – éramos tão ligados antigamente... ele mudou muito. – sussurrou.


Lançou seus olhos agora para seus amigos, na saleta. De repente, percebeu o que estava acontecendo. Acabara. Finalmente, alguém que não ela mesma sabia de tudo o que a fazia ter pesadelos à noite, e tinha clara consciência de que eles poderiam fazer o que quisessem com o seu segredo. Então, seus olhos arregalaram-se e novamente, ela olhou nos olhos de todos da sala, tentando imaginar em que eles pensavam. Remo encarava-o pensativo, assim como Thiago e Lílian. Não pôde entender a expressão de Sirius, e isso a deixou estranhamente nervosa.


- Acho que agora... não espero que vocês me aceitem ainda. – disse, com a voz baixa. – sei que é um risco muito grande para vocês, e entenderei perfeitamente...


Sentiu-se extremamente cansada, como se tivesse dado várias voltas no campo de quadribol sem parar de correr. Deixou-se cair no sofá atrás dela, e quase que no mesmo tempo Sirius caiu ao seu lado, e Lílian sentou-se do outro. O primeiro afagou as suas costas:


- Não vamos deixá-la nunca, Vic. – sua voz era reconfortante e rouca, e Sasha perguntou-se se ele se esqueceria da briga algum dia, pois ainda havia uma ponta de amargura em sua voz.


- Isso mesmo. Foi ótimo que tenha nos contado – disse a ruiva, fazendo-a desviar seus olhos dos de Sirius.


- É perigoso... – ela começou, mas Thiago a interrompeu.


- E sabe o que mais gostamos neste mundo? – ele falou isso com o sorriso mais maroto que poderia esbanjar, os olhos brilhando, e ninguém precisou responder enquanto ela suspirava.


- Temos que ser cautelosos. – disse Remo com a voz profunda – sabemos que Snape está do lado dele, então pode haver muitos mais...


- Eu... tinha que dizer isso à vocês também. – a voz de Sasha tremulou – acho que seu amigo Pedro é um deles.


Houve um momento em que eles trocaram olhares aflitos, somente entre os meninos. Lílian olhava para Sasha sem acreditar.


- O que você está dizendo? – Thiago expressou o que todos queriam dizer.


- Sei que estou julgando-o mas... é que tudo o que eu penso sobre ele, me leva a essa conclusão. Nunca achou estranho o fato de que ele sempre sai sem dizer nada à vocês? Mas isso não é o mais importante... só comecei pensar nisso quando ele me disse aquelas coisas, naquele café da manhã há algum tempo. “Você sabe que sabe demais...” ele sabia que nenhum de vocês iria entender, então disse sem medo... mas agora acho que faz sentido para vocês.


Sasha ouviu Sirius engolir seco ao seu lado, e isso chamou sua atenção. Foi então que ele contou à ela e à Lílian sobre a conversa que presenciara de Pedro e Lucio Malfoy nos corredores de Hogwarts, pouco antes do primeiro desaparecer.


- Ele está convocando-os. – Sasha murmurou, a voz sombria.


- É como se ele fosse um espião... – raciocinou Remo lentamente. – não entendo como pôde entrar para a Grifinória.


- É obvio que ele sabe que está aqui, Sasha. Agora que estou pensando, o baile também foi por você. Era você que eles procuravam – falou a ruiva, pensando muito rápido, e novamente a morena fechou os olhos para suspirar.


A voz de Sirius foi rápida e fria: - Sabem que há muita gente envolvida, e a maioria são sonserinos fedidos. Vocês sabem muito bem que meu irmão e meus primos estão nessa também. Mas Pedro... – um sorriso torto apareceu em seu rosto, mas uma raiva lampejava furiosamente em seus olhos azuis-acinzentados – acho que fomos inocentes demais quanto à isso, não é?


- Quando ele voltar, essa história não vai ficar assim... – Thiago disse com desprezo.


- Não acho que ele vá voltar. – falou Sasha, temendo apenas parecer estar sendo negativa quanto à tudo aquilo – sinceramente, depois do relato de Sirius... se ele voltar, agora, não serão boas notícias.


Outro momento de silêncio fez-se entre eles. Agora, para Sasha, compartilhar aquele segredo não significou somente segurança e alívio. Significou conhecimento e verdade. Era óbvio que ela sabia muito mais, como os planos do primo e tudo o que ele mesmo lhe contava quando era apenas uma criança, achando que ela não se lembraria. Mas era quase inevitável: mesmo que se esforçasse para esquecer, Sasha lembrava-se de cada detalhe de suas conversas e encontros com ele. Não obstante, isso tudo ficaria para depois. Já havia contado muitos segredos em um dia só.




*****







"Existem momentos em nossas vidas que nos vemos em uma encruzilhada.
Com medo, confusos, sem um mapa.
As escolhas que fazemos nesses momentos podem definir o resto da nossa vida.
Claro que quando se está de frente com o desconhecido, a maioria de nós prefere dar meia-volta e retornar.
Mas às vezes as pessoas pressionam por algo melhor.
Algo além da dor de continuar sozinho.
E além da bravura e coragem que leva para se aproximar de alguém.
Ou de dar uma segunda chance para alguém.
Algo além da quieta persistência de um sonho.
Por que você só descobre quem realmente é, quando é testado.
E você descobre quem pode ser, quando é testado.
A pessoa que você quer ser, existe.
No lado oposto de fé, crença e trabalho pesado.
E ter uma dor no coração, que o medo está pela frente."
(Citação One Tree Hill, 4.02)












N.a: Continua no próximo capítulo.. ;) Comentem, por favor!

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