Capítulo 4



4


Não era para estar ali. Desde que saiu do castelo naquela manhã de sábado em direção ao movimentadíssimo ‘Três Vassouras’ em Hogsmeade, Severus se perguntava por onde andava seu juízo ao responder aquele pergaminho. Depois de tê-lo queimado saiu pelos corredores de Hogwarts fazendo uma patrulha, quando voltou para seu quarto ainda viu as cinzas do pergaminho entres as brasas da lareira. Foi ao seu escritório e sem ter muita noção do que estava fazendo, escreveu apenas algumas linhas.



“O firewhisky de Madame Rosmerta continua sendo sua bebida preferida aos sábados?”

Uma pergunta idiota para o que deveria ser uma resposta ou um convite, mas lá estava ele de frente para o pub se sentindo como um garoto inexperiente tendo seu primeiro encontro com a garota que ele sempre admirava da sala. Sentiu-se ridículo com esse pensamento e deu meia volta dando de cara com uma mulher a poucos passos. Deteve-se com o olhar dela. Era ameaçador, frio, sem o brilho que tinham e de longe lhe lembraria os tempos de Hogwarts. Estava mais corada e mais bela que lembrava ser, as mexas grisalhas delatavam uma idade que não condizia com suas lembranças. Uma morena que não passaria despercebida tão facilmente, vestida como não poderia se lembrar numa capa negra cobrindo o corpo da cabeça aos pés, sem o verde esmeralda de suas casas, ou a prata que tanto admirava... Nada de ouro, nada de vermelho, nada de azul, apenas o negro do luto e uma meia lua de ônix negro com adornos prata no colar que trazia no pescoço a mostra que destoavam com o tempo em que as cores a acompanhavam sempre.

-Black Moon. -Sussurrou Snape sentindo ser invadido por sentimentos que nem imaginava que estavam lá.





“O firewhisky de Madame Rosmerta continua sendo sua bebida preferida aos sábados?

NOX.”

Não pôde deixar de abrir um sorriso. Ora como poderia deixar de ser?! Todo sábado de visita em Hogsmeade Wyrnie acordava cedo e se aprontava. Por volta das dez horas tomava seu café da manhã no pub. Não que firewhisky com peru defumado fosse realmente um café da manhã, mas se tornou um hábito difícil de largar. E ‘NOX’... Quando se correspondiam e não esperavam resposta escreviam NOX no final do pergaminho.

Não conseguiu dormir direito e na manhã de sábado tentou escolher a melhor roupa, mas nada conseguia lhe cair bem. Ao final escolheu um longo vestido negro e sóbrio, a capa de viagem e, o mais importante, o colar prateado com uma meia lua de ônix negra que ganhara na noite de formatura.

Às dez da manhã Wyrnie estava aparatando em frente o Três Vassouras com mil e uma idéias do que poderia acontecer naquele dia, já que fazia algum tempo que não via Severus. Depois de doze anos sem terem contato esperava que o aspecto de seu amigo estivesse um pouco melhor do que durante os julgamentos dos Comensais de Voldemort no Ministério da Magia.

Foi quando aparatou e levantou o rosto que percebeu ele ali, mais adiante, com seus trajes negros e olhos opacos. Sentiu um nó na garganta ao vê-lo e parecia muito bem e melhor desde o Ministério.

-Black Moon. -Leu nos lábios do homem e então deu um sorriso suave reunindo coragem para caminhar até ele.




-Um filho? -Começou Severus mantendo um tom de conversa apenas para quem deveria ouvir.

O casal ocupava uma mesa mais afastada do tumulto, num canto do pub onde não chamariam a atenção dos freqüentadores. Haviam esperado alguém servi-los antes de começar qualquer assunto, com isso só agora, depois de tempos juntos e calados, Snape puxava um assunto que o intrigava tanto.

-Sim... Lembra-se do dia em que meus pais estiveram aqui, Severus? -Perguntou Wyrnie antes de tomar seu primeiro gole de firewhisky. -Eles queriam te conhecer e saber se você realmente era um partido para mim.

-Mas não havia nada realmente sério entre nós. Foram boatos...

-Eu sei. -Cortou. -Mas eles não sabiam. -Respirou fundo. -Nesse mesmo dia minha avó viu o que me esperava.


Vovó, estou ficando nervosa. O que a senhora tanto vê nessa xícara?” Uma Wyrnie bem mais jovem, de longos cabelos negros e olhos de um verde vivo, se ajeitava na cadeira ao lado de sua avó, uma senhora que conservava um rosto estreito e nobre, com os cabelos brancos presos em coque e o nariz bem característico da família árabe. Estavam numa mesa daquele mesmo pub sem muitas diferenças, exceto pela festa que agitava o lugar.

Deveria saber esperar Wyrnie. Já não é nenhuma criança.” Ralhou pondo a xícara sobre o pires na mesa. Numa das mãos, uma bengala de cedro polido com o emblema da família entalhado no punho. “Deve saber que será muito feliz, mas essa felicidade terá um preço alto que pode ir desde perdas materiais até uma vida.

É sobre Snape?” Perguntou com o coração na mão. Aquela idéia dele ser um seguidor do tal Voldemort não havia agradado.

Wyrnie, a borra não me dá nomes, apenas sinais.” Respondeu depois de olhar bem para a neta. “Pode ser também de algum valor que você considera muito importante. O que deve saber é que existem dois caminhos e ambos te levam a essa perda.


No pub Wyrnie olhava para o firewhisky pensativa. Tomou mais um gole da bebida e olhou para Severus que tentava se lembrar de algo daquela época sem tocar em sua bebida. Se soubesse sobre o que sua avó falava será que poderia ter tomado um caminho diferente? E será que esse caminho também levaria ao mesmo resultado, como ela previa?

-Se não ia beber, porque pediu? -Indicou o copo do bruxo intocado.

-Tariq Samhain não é o tipo de aluno que me chama muita atenção. -Comentou tomando o 1º gole da bebida. -É um aluno como qualquer outro, sem qualquer qualidade extraordinária. -Dessa vez olhou para a mulher escondendo o sorriso debochado por trás de mais um gole de firewhisky. Via como Wyrnie ficava vermelha diante do comentário, sempre ficava mais bonita assim e agora não estava diferente. -Talvez até Potter seja mais chamativo. Não pelo brilhantismo, mas pela negação que é em poções.

-Continua linguarudo...

-Sendo filho seu, eu esperava muito mais.

-Você sabe que nunca fui boa o suficiente com poções.

-E ainda teve a capacidade de se tornar um auror.

-O que não quer dizer que eu seja um primor. Severus, -levantou a mão interrompendo a próxima provocação do professor. -Desculpe se não dei a devida atenção para o que ele deveria saber sobre sua matéria. -Disse com um tom de raiva na voz, sem ter a real intenção de se desculpar. -Só quero saber se você vai ou não ficar de olho nele e ajudá-lo no que for preciso.

Snape levantou a sobrancelha recolhendo o sorrisinho debochado. De repente o firewhisky passou a ter mais importância que aquela conversa e Severus dedicou longos minutos saboreando a bebida.

-Não vou pegar leve com ele.

-Não quero. -Respondeu fria repousando o copo sobre a mesa. -Severus, quem me ensinou poções foi você, e hoje eu quero que você ensine meu filho.

O professor permaneceu em silêncio tomando o último gole de seu copo ponderando o pedido.

-É o meu ofício. -Foi o que respondeu.




Continua...

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