O Exame de Aparatação
Harry acordou muito cedo na manhã seguinte à seu aniversário, mesmo tendo ficado comemorando até tarde com Rony e Hermione, esperando dar meia-noite, para que ele fizesse dezessete anos e assim, pudesse fazer as magias que quisesse. Parecia que seu cérebro havia trabalhado enquanto ele dormia, e seu primeiro pensamento quando acordou foi “como vamos para o Beco Diagonal?”. Eles não haviam parado para imaginar um jeito de ir até o local sem dinheiro, por isso Harry percebeu que precisava agir rápido. Olhou para o calendário em cima de sua escrivaninha e viu que era sábado. Soltou um suspiro de alívio e não conseguiu acreditar na própria sorte. Com certeza tio Valter não iria trabalhar, então, ia pedir uma carona. Se fosse preciso, mandaria o tio levá-lo ameaçando-o com a varinha.
-A varinha! – Harry falou sozinho. Acabara de se dar conta que agora poderia usá-la quando quisesse. Mas também se lembrou que a magia que o protegia tinha cessado por completo, mas isso, por incrível que pareça, não o preocupou nem um pouco. O garoto olhou para o lado e viu Rony e Hermione dormindo. A sua excitação era grande, então ele convocou um pacote de Feijõezinhos de Todos os Sabores que estava no chão, o qual tinha vindo junto com a carta de Hagrid.
As possibilidades pareciam infinitas, mas ainda não podia fazer tudo que queria, pois o ronco de Rony o trouxe de volta a realidade, e Harry levantou-se da cama na hora. Caminhou até o corredor e colocou o ouvido na porta do quarto de tio Valter. Não ouviu som algum, nem mesmo o ronco costumeiro do tio. Achando aquilo muito estranho, abriu a porta bem devagar. A cama estava vazia. “Não é possível!”, pensou Harry. Àquela hora da manhã, tio Valter estaria dormindo com certeza. Harry desceu as escadas para se certificar da hora no relógio da cozinha, mas parou quando olhou para a sala. Tio Valter estava dormindo no sofá, com roupa de trabalho e com o telefone no colo.
-Tio Valter? – chamou Harry, hesitante, da entrada da sala.
Valter acordou assustado, olhando à sua volta e tateando o sofá.
-Petúnia, Duda... – murmurava ele, procurando desesperadamente por algo em seus lados.
Por mais incrível que parecesse, Harry sentiu pena do tio por vê-lo daquele jeito. Mas relutou em tornar isso oficial, e perguntou, com a voz mais fria que conseguiu proferir:
-O que você tem?
Tio Valter tinha acabado de perceber que o sobrinho estava ali. Mas em vez de ralhar, gritar, ou ofender o garoto de qualquer maneira, como fazia sempre, ele apenas falou, baixinho.
-Ah, oi, Harry...
Harry sentiu como se tivesse caído de cabeça no chão. Ficou completamente atordoado, não conseguia coordenar as idéias para dar ao menos alguma resposta, por isso, produziu um som impossível de se traduzir.
-Acabei adormecendo aqui, ligando para a Petúnia e o Dudoca... – continuou ele, falando de uma maneira tão calma e amigável que Harry se assustou.
-O que você tem??? – o garoto repetiu a pergunta, mas dessa vez mais exasperado.
Tio Valter olhou Harry de cima a baixo, e disse, sorrindo:
-Nunca fui muito amigável com você, não é?
Harry achou que aquilo era a gota d’água. Andou até o outro sofá da sala, e desabou nele, sem tirar os olhos do tio.
-Porque está me tratando desse jeito? – perguntou ele, com a voz clara, mas hesitante.
Mas a resposta do tio Valter veio com uma voz trêmula:
-Ela devia ter chegado ontem, Harry. Ontem! – dizia ele, totalmente nervoso. Harry não sabia o que dizer, muito menos o que fazer. Seu cérebro se recusava a processar a ordem de consolar o tio. O garoto meramente baixou a cabeça.
-Ela disse que poderia se atrasar! – continuou ele, desesperado. – Mas um dia já é demais!
-Ela não ligou, nem nada? – perguntou Harry, de repente, atropelando as palavras.
-Ligou! Mas ela estava estranha, se confundia ao dizer as coisas. Não deixou nem eu falar com Duda. Disse que ele estava ocupado, ajudando a avó a limpar os móveis. – respondeu tio Valter, agora com os olhos marejados pelas lágrimas.
Estava sendo muito estranho ficar sentado ali, no sofá da sala dos Dursley, conversando com um tio Valter fraco, indefeso e particularmente bondoso com Harry. O garoto até chegou a pensar numa possível interferência mágica no caso, mas quando ia comentar sobre isso com o tio, o telefone tocou, fazendo um estardalhaço de furar os tímpanos, devido ao silêncio da manhã ensolarada. Tio Valter atendeu o telefone rapidamente.
-Valter Dursley. – anunciou, com a voz fraca.
Harry nem precisou se dar ao trabalho de imaginar quem seria. Tio Valter levantou-se do sofá de um salto, quase berrando ao telefone.
-Petúnia? Graças a Deus! Como é que... – mas ele nem terminou a frase. Foi interrompido, e emendou em outra. – Que bom então! To esperando vocês! – e desligou o telefone. Olhou para Harry, e disse, sorrindo. – Eles estão voltando hoje!
Harry sorriu, confuso. Nunca tinha visto o tio tão feliz daquele jeito. Aproveitou para pedir.
-Hum... Tio Valter? Será que você pode nos levar até o centro de Londres hoje? Tenho uns... Ahn... Compromissos. – finalizou ele, esperançoso.
-Claro! – respondeu o tio, com um largo sorriso. – Ei, estou com fome, vocês estão? Acho que um café da manhã é o que precisamos. Vou na rua comprar umas coisas e depois estou de volta! Até mais, Harry! – e foi, fechando a porta de casa com um estrondo.
Harry estava completamente abobado. Demorou pelo menos uns cinco minutos para voltar a si. Nem ergueu os olhos quando um Rony desgrenhado apareceu na sala, com o rosto amassado e cheio de sono.
-O que houve, Harry? – perguntou ele, em meio à um bocejo. – Quem bateu a porta?
-Tio Valter... – respondeu Harry, com a voz vacilante. – Ele foi comprar café da manhã para a gente!
Rony olhou para o amigo com uma expressão de “você só pode estar brincando!”. Andou até sofá e se sentou também. Por algumas vezes ele abriu e fechou a boca, mas não falou nada. Harry também estava mudo. Depois de alguns minutos de total silêncio, Hermione apareceu cautelosamente na sala. Olhou em volta para verificar se tio Valter estava por perto e, aliviada, juntou-se aos amigos.
-Porque estão sentados aqui com essas caras? – perguntou ela, desconfiada. – E cadê seu tio, Harry? – complementou.
Por um momento Harry não respondeu, mas resolveu deixar os amigos a par daquela estranha situação. Contou tudo para eles, que iam ficando horrorizados cada vez mais. Quando terminou, Hermione voltou a ficar tranqüila, e disse, rindo:
-Bom, Harry, acho que era de se esperar que ele mudasse diante da situação que estava. Com mulher e o filho desaparecidos por um momento, ele deve ter se esquecido que te odeia.
-Sim! Mas eles vão voltar hoje! Mesmo assim ele continuou amigável! – retrucou Harry.
-Mesmo assim, acho que você não deve reclamar! – disse Hermione. – Aproveita que ele está amigável, depois de tanto tempo. Sem contar que hoje você vai embora daqui pra sempre.
-É verdade... – falou Harry, acordando de seu estupor. – Vamos esperar ele chegar então, a gente toma café e pede pra ele levar a gente até lá. O exame vai ser às três horas da tarde, pelo que estava escrito na carta.
Rony, que até então tinha permanecido calado, perguntou:
-E porque será que sua tia se atrasou?
Harry deu de ombros. Não ia se dar ao trabalho de se preocupar com a tia. Não até que algo de muito estranho acontecesse.
A manhã percorreu normal até a chegada de tio Valter, com grandes sacas de mercado e com um sorriso no rosto. Parecia ter se esquecido quem era Harry e o que ele e seus amigos faziam. Preparou sanduíches de presunto para todos e foi lavar o carro, porque como dissera ele, não queria ir até o centro de Londres com o carro sujo.
Depois que terminaram de comer, foram se arrumar, sem falar muito. Quando estavam todos prontos, tio Valter os ajudou a colocar os malões no carro e deu a partida. Foi um passeio estranho. Valter não parava de falar sobre a mulher e a imaginar como Duda teria se divertido. Chegaram na rua em que ficava o Caldeirão Furado, e desceram do carro. Antes de descer, Harry falou para o tio Valter:
-Essa, eu espero, é a última vez que nos veremos. A magia pela qual eu era protegido cessou hoje, à meia-noite, então não tem mais necessidade de eu ficar em sua casa. Já posso usar minha varinha quando eu bem entender. Portanto, adeus.
Tio Valter olhou para Harry e inesperadamente, sorriu:
-Tudo bem, Harry. Espero que não tenha ódio por mim sempre. E acho que deve saber porque mudei tanto.
Harry se endireitou no banco do carro, prestando mais atenção.
-Numa noite enquanto você estava na escola, Petúnia e Duda foram chamados por uns homens que se identificaram como representantes do tal Ministério da Magia. Entre eles, tinha um homem ruivo que eu já tinha visto antes...
-Sr. Weasley... – falou Harry, interrompendo o tio.
-Esse mesmo. – continuou tio Valter. – Ele teve uma conversa comigo. Demorada. Coisa de umas três horas. Depois me disse que precisava levar Petúnia e Duda, e disse que ele tinha bons motivos.
Harry franziu a testa. Porque o Sr. Weasley não tinha comentado nada com ele sobre a visita à seu tio? Mas antes de tentar descobrir o porque, tio Valter respirou, e prosseguiu.
-Então quando você chegou naquela noite, antes do término do seu ano letivo, eu achava que Petúnia iria chegar logo, então continuei tratando você como sempre. Eu disse que ela se atrasou um dia? Eu estava mentindo. Ela estava atrasada fazia mais de uma semana. Eu não parava em casa porquê estava procurando ela. Não fui bem sucedido, porque com certeza ela estava num lugar que eu não tinha acesso.
-Mas porque ela foi levada? E porque você agora me trata bem? E porque o Sr. Weasley... – Harry bombardeou o tio com as perguntas, que meramente sorriu.
-Você saberá, mas o homem disse que não era pra contá-lo ainda. Portanto, espero que você seja bem sucedido na sua missão.
Se Harry achou que não conseguiria ficar mais atordoado quanto tinha ficado até ali, estava totalmente enganado. Queria fazer muitas perguntas, mas viu que não adiantaria. Sem dizer mais nada, saiu do carro. Despediu-se do tio, e se juntou aos amigos, que o esperavam, impacientes.
-O que vocês tanto conversaram lá? – perguntou Rony, surpreso.
Harry sorriu, como se tivesse acabado de ouvir uma piada, e passou para Rony e Hermione tudo que tinha ouvido do tio Valter.
-Meu pai? – exclamou Rony. – Ele falou com seu tio? Mas porque?
Harry não respondeu. Também não sabia. Os três entraram n’O Caldeirão Furado e colocaram todas suas bagagens num quarto que Tom disponibilizou para eles. Perguntaram a hora para o barman, e viram que estava quase na hora do exame. Foram para os fundos do e bateram, na parede de tijolos, no terceiro tijolo a contar da esquerda para a direita, acima da lixeira. A parede de pedra se abriu, revelando a rua para o Beco Diagonal, que no momento estava relativamente vazia, exceto por alguns bruxos que iam e viam, varrendo a frente de suas lojas, esperançosos por clientes. Viram um homem de aparência macilenta, baixo e corcunda. Ele acenou para os garotos, que se dirigiram até ele.
-Os senhores são... – começou ele, e forçou a vista para ler os nomes na lista dos inscritos para o exame. – Senhores Potter e Weasely?
-Weasley... – corrigiu Rony, se esforçando para não rir da aparência acabada do bruxo.
-Weasley, desculpe. Meu nome é Hugo Dross. Como os senhores devem saber, o exame de aparatação consiste na... – mas parou, porque Hermione tinha levantado a mão, como se tivesse numa aula. Rony achou que aquilo foi demais. Olhou para o lado e soltou uma risada disfarçada como tosse. Harry acompanhou o amigo e riu também.
-Sim, Srta... Ah...
-Granger, senhor. Desculpa a interrupção, mas os testes de aparatação não são feitos em Hogsmeade? – perguntou ela, um pouco envergonhada.
-Sim, srta. Granger. Mas só para aqueles que o executam durante o período letivo. Para aqueles que não conseguem passar, ou então ainda não tem idade, os testes são executados aqui, no Beco Diagonal.
Hermione agradeceu e se afastou do grupo, para observá-los um pouco mais de longe.
-Bom, prosseguindo. – continuou o instrutor. – O exame de aparatação consiste na análise das habilidades de vocês. Como distância, precisão e rapidez. Eu irei aparatar até um certo ponto, e então vocês irão me imitar, e irão aparatar até aquele mesmo ponto. E assim segue o teste. Lembrem-se, os três D’s. Uma dica útil, é que se não souberem ao certo o endereço do local que quiser aparatar, concentre-se na imagem do local. Lembrem com exatidão de como é o local de destino, e funcionará da mesma maneira. Começando, agora! – e aparatou até a frente da Florean Forstescue, que estava fechada. Harry pesquisou em sua mente e se lembrou dos três D’s. Distância, determinação e deliberação. Seguindo os passos que tinha aprendido em Hogwarts, e sentindo a famosa sensação de pressão na cabeça e o gancho o puxando pela barriga, conseguiu aparatar com sucesso até o primeiro ponto. Rony também. Depois foi até a frente de Gringotes. Os dois conseguiram. E assim foi prosseguindo o teste. Harry e Rony ficaram surpresos consigo mesmos quando terminaram o teste com a nota máxima. O bruxo que estava aplicando o exame ficou feliz com o resultado. Deu os parabéns para eles e anotou algo em sua prancheta. E com um aceno de cabeça, aparatou.
-Ah Harry! Rony! Que bom que passaram! – exclamou Hermione, se aproximando deles. – Isso é realmente ótimo! E com nota máxima!
-Obrigado, Hermione. – agradeceu Harry, sorrindo, mas um pouco nauseado pela sensação de aparatar diversas vezes seguidas.
-Nossa. – disse Rony, meio tonto. – Nunca mais vou aparatar tantas vezes assim.
Depois que se recuperaram do exame, seguiram até o Caldeirão Furado. Subiram até o quarto e resolveram o que fariam em seguida. Aparentemente iriam visitar o orfanato de Riddle, e depois, aparatar para A Toca, onde teria o casamento de Gui e Fleur. Mandaram Edwiges e Pichi com uma carta dizendo que tinham passado e pedindo para cuidarem da coruja até eles chegarem.
-Pronto. – disse Harry, soltando as corujas pela janela aberta. – E então, vamos agora?
-Por mim tudo bem. – respondeu Rony. – Fred e Jorge não estão na loja deles. Provavelmente já estão em casa.
Hermione concordou com Rony, e assim, Harry forçou sua mente para se lembrar de onde ficava o orfanato. Lembrou-se, por acaso, do que tinha acabado de ouvir do instrutor do teste. Lembrar-se com exatidão do local de destino.
-Ok, se segurem em mim. – disse Harry, lembrando-se com perfeição da rua em que Dumbledore chegava numa carroça. – Vamos fazer uma aparatação acompanhada, porque só eu tenho idéia de onde é o lugar.
-Você acha que consegue, Harry? – disse Hermione, preocupada.
-Não custa nada tentar. - respondeu Harry.
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