Resgate Um: Nárnia
Lily encarou Edmund surpresa e os dois correram para a tenda onde Peter estava sendo atendido.
Susan molhava panos em uma bacia improvisada com água quente e colocava sobre a testa de Peter, que parecia estar delirando com a febre alta, enquanto Lucy Pevensie tentava estancar o sangue que escorria ininterruptamente do braço dele.
A ruiva se aproximou das irmãs Pevensie e colocou a mão sobre o pescoço de Peter para sentir a temperatura. Tirou a mão rapidamente e encarou alarmada as amigas ao seu lado.
- Eu... Eu posso ver o ferimento?
Lucy acenou que sim e tirou o pano que tinha acabado de enrolar no braço do irmão e que já estava encharcado de sangue.
- Tentamos fazer alguns pontos, mas onde passamos a linha, a pele cede e a ferida aumenta. – Explicou Edmund já que a ruiva estava observando atentamente uma dessas tentativas de curativo.
- Nem amarrando o braço dele a pele se junta! O que está acontecendo?
Lily cortou um pequeno pedaço da pele e parecia observar cada partícula daquela insignificante amostra antes de aproximá-la do rosto e cheirar.
Confirmando a sua suspeita ela abriu um sorriso fraco antes de falar, tentando não assustar os amigos.
- A espada de Littar foi mergulhada antes da luta em um veneno muito raro e muito perigoso. Esse veneno é extraído de uma planta bastante incomum e que jamais imaginei que nasceria em outro lugar que não Hogwarts.
- Veneno? – Susan perguntou num fio de voz.
- Veneno. Não é um veneno letal por si só. Você pode até manuseá-lo sem perigo algum, o problema é quando ele entra em contato com alguma ferida, aí sim começa o perigo porque ele impede a cicatrização e a pessoa morre pela perda de sangue.
Lucy levou as mãos à boca e Susan sufocou um grito assustado. Edmund ainda conseguiu perguntar:
- E não há nada que a gente possa fazer?
- Há, claro que há. – Lily falou animada tentando fazer com que a cor voltasse ao rosto das irmãs Pevensie. – Eu, modéstia à parte, sou a melhor aluna de poções da minha escola e sei exatamente as plantas que precisamos pra fazer a infusão que vai salvar o Peter. O único problema é que são várias ervas e o preparo é um pouco demorado e nós só temos essa noite pra resgatar a Lucy daquele crápula.
- Precisamos salvar o Peter primeiro. – Falou Lucy. – Ele é um ótimo estrategista, só ele pode montar um bom plano pra tirarmos a Lucy dos calormanos.
- Não temos tempo pra isso. Depois que a poção ficar pronta ele vai precisar de tempo pra se restabelecer. A poção vai fazer a ferida fechar, mas não vai repor todo o sangue que ele perdeu.
- Mas então... O que você sugere?
Lily se afastou um pouco, andou até a saída da tenda, uma pequena fenda no tecido, e ficou por lá algum tempo pensando se seria mesmo sensato sugerir o que estava pensando. Ela nem ao menos conhecia Nárnia direito...
Pense menos e aja mais. Falava uma voz no seu subconsciente. Naquele momento as palavras de Aslam ficaram tão nítidas em suas lembranças que ela decidiu que iria até o fim. Se daria certo ou não, só experimentando pra saber.
Virou novamente para os irmãos Pevensie que aguardavam uma manifestação sua.
- Eu vou arranjar até a noite o máximo de ervas que puder. Quando passar da meia noite vou até o acampamento dos calormanos e resgato a Lucy. Então voltamos e eu preparo a poção.
- Você ficou louca? Ir sozinha ao acampamento dos calormanos? O que você pode conseguir de melhor é ser presa junto com a Lucy. Aí teremos um pouquinho mais de trabalho porque no momento ninguém além de você pode salvar o Peter dessa coisa horrorosa.
Lily molhou os lábios e passou as mãos no cabelo prendendo-os num rabo de cavalo.
- Edmund, eu fiz aulas de esgrima desde pequena na minha escola trouxa, vocês viram como eu luto bem. Só preciso de uma espada e de alguém pra indicar o caminho. De resto eu me viro.
- Lily eu também acho loucura. E de qualquer forma meu irmão não vai agüentar perder tanto sangue até amanhã... – Falou Susan.
- Sangue de unicórnio pode mantê-lo vivo por algum tempo. Por tempo suficiente. Mas precisamos encontrar um unicórnio já morto ou algum que se ofereça por livre vontade em sacrifício pelo Rei de Nárnia. Pode arranjar alguma coisa, Edmund?
- Creio que sim.
- Mas não o mate! Se fizer isso, quando receber o sangue do unicórnio Peter passará a ter uma vida amaldiçoada. Oh, seria tão bom se Aslam estivesse aqui!
Edmund não perdeu tempo. Saiu apressado da barraca, montou em um cavalo falante e saiu em disparada em direção à floresta.
Lily passou a coordenar as atividades por ali. Pediu uma guarda reforçada em torno do acampamento, pois suspeitava que Littar podia querer romper o trato e pegar os Narnianos desprevenidos. Ensinou as irmãs Pevensie como alimentar Peter mesmo com ele semi-consciente e as ajudou também a arranjar uma maneira para que ele perdesse menos sangue.
Quando o sol começava a desaparecer, Edmund voltou sorrindo vitorioso.
- Nem acredito na nossa sorte! Encontrei um unicórnio bastante velho, já à beira da morte que quando soube o que acontecera com Peter, ofereceu seu sangue para salvar o Grande Rei.
Lily bateu palmas alegre e pegou o frasco cheio de um líquido prateado das mãos de Edmund.
- Parece que o vento está começando a soprar a nosso favor! Susan, você fica responsável em fazer com que ele beba alguns goles disso em intervalos regulares de, aproximadamente, duas ou três horas. Faça do mesmo jeito que fizemos ele tomar a sopa.
Lily entregou a garrafa para Susan, soltou o cabelo e vestiu uma capa longa por cima do vestido.
- Você já vai? – Perguntou Lucy sentindo um estranho temor pela amiga.
- Quanto antes, melhor. Ripchip prometeu me acompanhar e nós voltaremos com a Lucy antes do amanhecer. Caso isso não aconteça é porque alguma coisa deu errada.
- Mas...
- Aqui estão as indicações de como preparar a infusão. Caso eu não volte a tempo, algum de vocês vai ter que tentar fazer isso. É só seguir corretamente as instruções, não tem mistério.
Susan engoliu em seco e recebeu o papel das mãos de Lily.
- Espero não precisar fazer isso.
- Eu também Susan, eu também...
Falando isso, a ruiva se despediu dos irmãos Pevensie e saiu com Ripchip na direção indicada por Lucy. Em pouco mais de dez minutos, avistaram o acampamento e Lily parou de chofre. Havia ali muito mais calormanos do que compareceram na batalha daquela manhã.
Ripchip desembainhou a espada e cochichou com a voz firme:
- Eu cuido dos da direita, acha que da conta do resto?
- Dos outros duzentos soldados? – Lily perguntou irônica, mas Ripchip não entendeu e sinalizou, sorridente, que sim. Você é completamente pirado Rip. Não temos a menor chance de lutar contra todos eles, devem ser uns quinhentos homens!
- E de uns cem você dá conta?
- Nós não vamos lutar! – Lily falou calmamente tentando fazê-lo perceber o quão insensata era a idéia.
- Fugir de uma luta é a pior mancha na honra de um homem! – Falou ele ainda empunhando a espada.
Lily não pôde se impedir de sorrir.
- Acho que concordo... – Falou amavelmente. – E é uma sorte eu ser uma garota e você ser um rato falante...
Ripchip pareceu ofendido.
- A senhorita entendeu o que eu quis dizer... – Ele guardou a espada. – Mas se é assim que deseja, estou aqui pra lhe servir e obedecer.
- Que isso! É meu amigo, não é? Amigos entram em acordo... E se ajudam... Olha só, se sairmos como loucos pra lutar contra esses calormanos – Os olhos de Ripchip brilharam – Estou certa de que acabamos com mais da metade deles, mas em poucos minutos Littar perceberia que estávamos aqui pra resgatar a Lucy e sumiria com ela. Ou até mesmo... A mataria se percebesse que não tinha chance alguma contra nossas incríveis habilidades.
- A senhorita tem razão. Não é certo lutarmos agora. Mas o que sugere?
Lily respirou aliviada e se sentiu feliz por ser tão sensata e pensar direito no assunto. Um sorriso se formou em seus lábios quando ‘adivinhou’ qual seria a atitude de Lucy numa situação dessas.
Provavelmente concordaria com Ripchip, lutaria com o maior número de calormanos que conseguisse e se tivesse oportunidade recuava um pouco. Mas não desistiria... Sem contar que teria convencido todos no acampamento a fazerem o mesmo.
- Como aquele dia em Hogwarts que eu quase morri porque ela queria investigar os Sonserinos na floresta proibida...
- O que disse? – Perguntou Ripchip.
Lily piscou os olhos parecendo sair de um transe.
- Oh, nada. Estava apenas pensando alto. Lembranças...
- Então, o que vamos fazer pra resgatar a Lucy?
- Minha idéia é a seguinte: Vamos procurar as ervas para o Peter e daqui a algumas horas, quando a maioria dos calormanos tiver ido dormir, entramos sorrateiramente e resgatamos ela.
- Senhorita Lily não acha que se fosse fácil tirar a Lucy daqui, ela mesma já não teria saído?
- É, eu pensei. Mas não consigo imaginar que tipo de dificuldades podemos ter, nunca passei por nada nem parecido na minha vida!
- O Grande Rei certamente teria um bom plano.
- Eu imagino que sim, ou Aslam não o tornaria Grande Rei de Nárnia, não é? Mas no momento a Lucy só tem a mim pra formular um plano e meu plano é esse!
O simpático ratinho falante parecia não concordar que era o melhor plano, mas já tinha percebido o quão inútil seria continuar discutindo sobre isso. Quando saíram da orla do acampamento pra começar a busca pelas ervas ele murmurou sorridente:
- Se o plano da senhorita não der certo, eu acabo com todos eles. Mesmo sozinho pode ser?
- Pode. Claro que pode. – Lily concordou sorrindo. – Faça o melhor pra não ser capturado também.
Com as bandagens improvisadas por Lily, o ferimento tinha parado significativamente de sangrar. Susan já tinha ministrado o sangue de unicórnio duas vezes em Peter e nas duas vezes teve medo dele engasgar e... Acontecer o pior...
- E se colocássemos um pouco desse líquido precioso direto no ferimento?Será que não cicatriza? – Perguntou Lucy Pevensie.
- Acho que se cicatrizasse Lily saberia e teria nos contado. Duvido que ela iria preferir ficar andando na floresta atrás de plantas quando poderia ter curado o Peter tão facilmente.
- Você tem sazão, Su. – A caçula sentou ao lado do irmão. – Será que ela vai conseguir resgatar a Lucy? Ainda acho que o Edmund deveria ter ido junto.
- Não poderia deixar vocês duas aqui sozinhas cuidando do Peter apenas com animais falantes por perto! Ainda se vocês tivessem ficado no castelo...
- Não existe ‘se’ Ed. – Censurou Susan. – Tudo o que acontece em nossas vidas são resultados de nossas escolhas. Não podemos nos prender no ‘se eu tivesse feito’, ‘se eu tivesse falado’, se eu não tivesse’...
- Tudo bem. Me desculpa. Vou lá pra fora tomar um pouco de ar.
Lucy encarou a irmã e sorriu.
- De qualquer forma, é bom estarmos todos aqui.
- É. É muito bom. – Susan falou vagamente.
- Estou absolutamente entediada! – Falou Lucy E. se jogando em um confortável sofá.
- E o que eu posso fazer pra lhe agradar minha deusa?
A loirinha girou os olhos. Como ele era patético...
- Primeiro preciso de um pouco de ar! Essa minúscula barraca tão cheia de guardas está me sufocando. Não se surpreenda se de repente eu cair no chão e não acordar mais, porque quando o ar se for completamente dos meus pulmões, não haverá nada que você possa fazer.
Littar franziu o cenho, não imaginava que alguém pudesse realmente morrer por ficar dentro de uma barraca com mais dois guardas. Ainda assim a barraca era bastante espaçosa.
Tentou falar isso à ela, mas Lucy levou as duas mãos ao peito e falou com a voz falha:
- Nunca pensei que meu destino fosse morrer tão jovem e ainda sem poder me despedir de meus amigos...
- Tudo bem, tudo bem. Vocês dois, pro lado de fora.
- Quero que fique apenas um na porta, mais do que isso você estará provando o quanto não confia em mim.
- Acho que não será possível, já que...
- Oh Merlin... – Ela se amparou na pequena mesa de jantar, fechou os olhos e começou a respirar pesadamente. – Nunca fui tão ofendida em toda a minha vida. De nada adianta tirá-los daqui se quer me matar de tristeza! Oh, meu próprio noivo não confia em mim!
Littar bateu os pés no chão impacientemente, como ela continuava com a encenação de que estava sentindo uma dor aguda no peito, falou gentilmente:
- Fique apenas um na porta da barraca pra garantir que nenhum calormano curioso venha incomodá-la. Está bem assim?
- Acho que sim. – Ela sentou novamente no sofá controlando a respiração como se tivesse realmente passado mal. – Preciso comer alguma coisa, essa situação toda me fez muito mal.
- Vou providenciar alguma coisa. – Falou Littar saindo rápido.
Lucy o acompanhou até a ‘porta’ e sorriu amavelmente enquanto ele se afastava. Sorriu para o guarda que tinha permanecido ali e aproveitou para olhar o movimento no acampamento.
- Espero que Lily seja paciente e espere esse monte de gente ir dormir. – Murmurou para si mesma quando voltou para seu confortável sofá.
Satisfeita com o que tinha conseguido descobrir até aquele momento, a loirinha começou a rir. Mas logo parou quando lembrou que também tinha descoberto que Littar tinha envenenado a espada que lutara contra Peter.
- Espero que ele esteja bem. – Falou mordendo o canto dos lábios.
Mas, mais do que preocupada, ela se sentia aliviada por ser Legilimente.
Ripchip e Lily estavam sentados no galho de uma imensa árvore perto do acampamento calormano. Tinham conseguido quase todas as ervas necessárias para o preparo da poção. Mas faltava uma. Apenas uma. Uma que, por ironia do destino, só Lucy poderia lhe dizer como colher.
- Eu sabia que devia ter prestado mais atenção nas aulas de Herbologia! – Falou a ruiva jogando longe um caroço de maçã.
- E porque não prestou?
- É meio difícil assistir direito uma aula inteira quando a Lucy é sua dupla... Por sorte ela parou Herbologia e minha dupla agora é a Lice. A Lu também nunca fez Adivinhação comigo, ou eu não teria conseguido aprender nem como se lê uma borra de chá.
Ripchip não entendia nada que Lily queria dizer com ‘herbologia’, ‘adivinhação’ ou ‘borra de chá’, mas gostava de ouvir a ruiva contando sobre Hogwarts, sobre as amigas, sobre os problemas que Lucy lhe causava.
- Mais uma maçã? – Ele ofereceu estendendo a fruta na direção de Lily.
- É mesmo uma janta ótima comer maçãs. – Lily respirou fundo e pegou a fruta das pequeninas mãos de Ripchip. – Mas já é melhor do que nada.
Passaram muito tempo conversando até sentirem-se seguros para descer do esconderijo. A agitação no vilarejo (era assim que Lily passara a definir o lugar) já tinha passado e parecia que todo mundo decidira ir dormir ao mesmo tempo.
- Ripchip jure pra mim que você não vai tentar resgatar a Lucy sozinho!
- Prometo. Só vou procurar a barraca do jeito que Lucy falou e volto pra buscar Lily.
- Ta – Lily umedeceu os lábios nervosa. – volta logo.
Ripchip concordou e entrou no acampamento se escondendo nas sombras. Lily olhou instintivamente pra cima, pra lua. Uma imensa lua cheia. Ficou algum tempo ali apenas observando o céu e pensando em Hogwarts.
- Como será que ta o Remus? – Perguntou para a árvore à sua frente.
Mas antes que a árvore pudesse responder, se é que iria, sentiu alguém puxar a barra do seu vestido. Virou pra trás lentamente e deu de cara com um Ripchip bastante sorridente.
- Achei a Lucy. Tem só um guarda na porta e ela está sozinha lá dentro.
- Então vamos logo. – Lily falou não cabendo em si de felicidade.
Lucy começava a sentir o sono pesar em suas pálpebras. ‘Malditas ervas pra dormir’. Lutou o máximo que conseguiu pra se manter acordada. Fechou os olhos de leve mas de repente teve a sensação de estar sendo observada.
Olhando direto pra fora da barraca viu Ripchip atrás de algumas caixas mal empilhadas. Sentiu o coração acelerar e ia acenar entusiasticamente quando percebeu Littar vindo pelo outro lado com seu jantar. Quando virou novamente para Ripchip ele tinha desaparecido.
- Aqui está. Um jantar com tudo que minha deusa tem direito.
- Obrigada Littar. Mas... O que eu vou beber?
- Você só falou que estava com fome! – Falou ele começando a perder a paciência.
- E você não pode imaginar que comer esse monte de coisas vai me deixar com sede também? Francamente!
- Vou buscar alguma coisa. Tem preferência?
- Vinho ou um suco de abóbora.
Littar franziu o cenho nas Lucy lhe deu as costas deixando claro que não iria explicar nada sobre sucos de abóboras.
Quando se preparava pra deitar novamente no sofá, viu uma pintura no que parecia ser uma espécie de porta-retratos jogada dentro de uma caixa. Parou de chofre ao reconhecer a pintura e arregalou os olhos.
- Quem é ela?
- O que disse? – Perguntou Littar já saindo da barraca.
- Quem é essa mulher na pintura.
Littar se aproximou.
- Ah, é Jadis. Ou a Feiticeira Branca como gostava de ser chamada por aqui.
- Ja-Jadis?
Flashback
A professora Minerva parou em frente a uma tapeçaria, tocou em algum ponto que as duas amigas não conseguiram ver e na mesma hora uma maçaneta apareceu no canto direito. Elas entraram e seguiram por um corredor estreito e comprido até parar novamente, agora em frente a um quadro que tinha a pintura linda. Uma feiticeira toda envolta em peles brancas sentada num lugar de destaque em um belo trenó puxado por duas renas tão brancas quanto a neve que tomava conta daquele lugar tão mágico. Mas alguma coisa naquele retrato causava calafrios...
Fim do Flashback
- É exatamente a mesma...
- A mesma o quê?
Lucy piscou os olhos.
- Porque você tem uma foto da Feiticeira Branca aqui nessa barraca?
- Estava dentro daquela caixa de entulhos, nem me lembrava mais. Fomos grande amigos... – Ele abriu um sorriso cínico e balançou a cabeça. – Amigos não, ela não tinha amigos. Na verdade, tivemos grandes negócios em comum. Mas isso foi há muito tempo. Antes daqueles pirralhos assumirem o reinado de Nárnia.
- Que tipo de negócios vocês tinham? – Lucy estava tão curiosa que esquecia de tirá-lo logo dali antes que Ripchip voltasse.
Littar a encarou por um tempo. Analisava se era seguro conversar esse tipo de assunto com Lucy.
- Terras. Em troca de alguns favores meus (dei fim à vida de alguns animais falantes realmente estúpidos), e ela me deu terras bastante férteis. Mas quando ela foi destituída do poder, esse Rei Peter ordenou que todas as terras de Nárnia fossem devolvidas ao povo Narniano. Ou seja, um monte de bastas falantes.
- Não fale assim deles! – Falou Lucy encarando-o séria. – São criaturinhas adoráveis!
Lucy quase se arrependeu de ter dito isso. Littar a olhou de uma forma que seus olhos negros pareciam arder em chamas.
- Nunca defenda aquelas criaturas horrorosas na minha frente!
Lucy deu um passo pra trás amedrontada. Quase podia sentir o ódio que emanava daquelas palavras. Decidida à tirá-lo logo dali, resolveu acatar.
- Me perdoe amável vizir. Creio que me excedi...
Essas palavras pareceram acalmá-lo um pouco.
- Volto logo com sua bebida.
Lucy prendeu a respiração enquanto ele saía da tenda e passou a mão direita na testa de forma aliviada quando o viu se afastar.
Correu até a porta da barraca, esperava que ‘seu resgate’ ainda estivesse por ali.
Lily e Ripchip se aproximaram cautelosamente da barraca de Lucy. Precisavam pegar o guarda desprevenido. Lily prendeu a respiração o máximo que pôde pra não fazer barulho e ergueu a espada o mais silenciosamente possível.
Quando preparava-se pra dar o golpe ouviu uma voz rouca falando alto.
- Nunca defenda aquelas criaturas horrorosas na minha frente!
Abaixou a espada quando ouviu a voz baixa de Lucy se desculpando.
- O que será que aconteceu? – Ela perguntou à Ripchip em mímicas.
O ratinho deu de ombros e fez sinal para Lily apontando Littar sair da barraca a passos rápidos.
A ruiva não pensou duas vezes. Antes que pensasse em se arrepender, se aproximou novamente por trás do guarda, encostou a espada na garganta dele e puxou com força.
Quando abriu os olhos novamente viu Lucy à porta da barraca com as mãos na boca.
- Lis...
- Não temos tempo! – A ruiva balançou a cabeça, puxou a amiga pela mão e saíram correndo.
Ripchip ia à frente, indicando o caminho. Quando estavam quase na saída da ‘vila calormana’ ouviram um grito.
- Ele já percebeu. – Falou Lily mordendo os lábios e correndo ainda mais.
- Lis eu não agüento mais correr.
- Deixa de ser mole. – A ruiva puxou Lucy pela mão mais uma vez.
Só quando Ripchip parou, quinze minutos depois, afirmando que certamente já teriam despistado quem quer que estivesse atrás deles, foi que Lucy conseguiu respirar.
A loirinha abaixou a cabeça apoiando as mãos no joelho. Quando conseguiu recuperar o fôlego levantou os olhos para encarar Lily.
- Ruiva você é barra pesada, hein? Matou o calormano com um único golpe de espada! – Lucy começou a rir.
- Não o matei. Se socorrerem ele em vinte minutos, ainda conseguem salvá-lo. Se eles tiverem o mínimo conhecimento médico vão saber disso... Foi o único jeito que eu pensei pra ganhar tempo. Littar teria que escolher o que chamar antes: guardas pra correrem atrás de nós ou socorro.
- É por isso que eu sou sua amiga, sabia Monitora-Chefe de Hogwarts?
Lily riu.
- Você está bem?
- Sim, quem não deve estar é o Peter, não é? A espada que o Littar usou...
- Estava encharcada de veneno. – Falou a ruiva fazendo Lucy sorrir.
- Só soube agora a noite, mas tinha certeza que você ia reconhecer a ferida. Professor Slug vai ficar orgulhoso quando souber... Já tem o antídoto?
- Falta apenas uma plantinha... E acho que você a conhece muito bem.
- Lis eu não entendo nada de Herbologia. Você sabe disso!
- É, eu sei. Mas a planta que eu preciso é uma antiga amiga sua... Chavindyuns Japoendines...
- A chuvinha japonesa? – Lucy perguntou levando as mãos à altura do peito fingindo-se de emocionada. – Por Merlin! Que saudades daquela plantinha travessa..
Lily riu da amiga.
- Como eu faço pra colher aquilo?
- Foi jogada longe quantas vezes?
- Cinco.
- Uau! Você é muito mais persistente que eu...
- Sim, mas como eu faço pra colher aquela planta doida? O Peter precisa da infusão e...
- Vai ter que esperar de qualquer forma. – Lucy interrompeu sorrindo – Você só consegue colher a Chavindyuns Japoendines quando amanhecer...
- Ai, não acredito nisso!
- Acredite Lis, a Lice e eu passamos uma madrugada toda na floresta negra só pra colher a Chuvinha... Mas me diz uma coisa, aqui em Nárnia existem todas as plantas de Hogwarts?
- Por mais incrível que possa ser, parece que sim. Não só as plantas, mas as criaturas também. Aqui existem unicórnios, dragões, gigantes, centauros...
- O mundo bruxo não tem animais falantes, nem faunos.
- Mas parece que todo o restante foi trazido de lá!
- Ou levados daqui... – Murmurou Lucy.
Ripchip assistia a conversa com um sorriso no rostinho.
- As senhoritas não acham melhor irmos até a plantinha chuvosa?
- Ótima idéia Rip. Até porque não acho seguro ficarmos parados por aqui.
Lucy se encostou em uma árvore enquanto bocejava.
- Eles me davam umas ervas muito fortes pra dormir... Passava o dia todo sonolenta. Mas você tem razão, é melhor irmos logo. Ripchip e eu vamos colher a Chuvinha, Alice ficaria doida se ouvisse essa nossa conversa sobre a nobre Chavindyuns Japoendines. E você volta pro acampamento Lis.
- Nem nos seus sonhos. Nós vamos os três juntos.
- Lis você acha que o Littar não vai comandar um exército até o acampamento Narniano? Tecnicamente, você descumpriu o acordo de trégua ao me resgatar... E eles pretendiam tacar fogo em todo o acampamento se isso acontecesse...
- Ai meu Merlin! Você não me avisou sobre isso quando me pediu pra te resgatar!
- Se eu avisasse, ninguém iria me salvar... – Lucy deu de ombros. – Ripchip e eu voltamos logo com a Chuvinha. E você avise Edmund e quem mais puder lutar pra se prepararem. E enquanto isso você faz a poção para o Peter.
Lily soltou um gritinho.
- Lucy eu devia enforcar você! Ou te devolver para os calormanos.
- Lily...
- Você devia ter me avisado criatura! A uma hora dessas todo o acampamento pode estar em chamas, sabia? Se você tivesse me falado que eles voltariam eu tinha providenciado pra tirar todo mundo de lá ou...
- Acho que você está perdendo tempo me dando sermão, Lis. De qualquer forma, já está feito mesmo e você que sempre pensa em tudo devia imaginar que eles não aceitariam numa boa que alguém resgatasse a prisioneira deles.
Lily fechou os olhos e contou até dez pra se acalmar.
- Ripchip tem que te levar até a Chavindyuns e eu nem ao menos sei voltar sozinha pro acampamento.
- Eu vou te ajudar. – Falou uma voz atrás dela.
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