Capítulo 5



Quando a manhã de sábado chegou, o movimento na sede da Ordem já havia começado a algumas horas. Harry, sonolento, estava sentado à mesa da cozinha, e segurava sem firmeza uma xícara de café que ameaçava cair sobre suas vestes de festa. Na outra mão, um pedaço de papel amassado, que ele lia e relia, mas sem nenhuma concentração.

Hermione observava a cena da porta. Estava reluzente em um vestido verde claro, que contrastava com seus cabelos castanhos, alisados por mágica e soltos sobre os ombros. Sentando-se ao lado de Harry, ela pediu ajuda para abotoar uma fina pulseira prateada com pequenas pedras brilhantes.

- Pára com isso, Harry! Está tudo certo! A gente já repassou essa lista ontem...

- E anteontem, e no dia anterior... – completou Ron, que chegava da sala, muito bem vestido com seu traje de gala e um chapéu pontiagudo azul, que combinava com seus olhos – Fica tranqüilo, vai dar tudo certo.

- É, eu sei... só queria checar mais uma vez...

Nos últimos dois dias os três haviam passado todo o tempo livre cuidando dos detalhes para a viagem a Godric Hollow. Listram tudo o que tinham que fazer, as coisas que precisavam comprar, as justificativas que iam usar para explicar seu sumiço nas férias, as maneiras de se comunicarem se estivessem em perigo, enfim, tudo.

Com a desculpa de visitar a loja dos gêmeos, Hermione havia ido a Londres, de onde usou um telefone público pra falar com seus pais e pedir algum dinheiro de trouxa, e aproveitou para fazer reserva em um hotel em Godric Hollow. Ron convenceu o Sr. e a Sra Wealsey de que iriam passar algum tempo na casa de Hermione, e Ginny concordou em ficar na Toca e fingir para os pais que estava em contato com eles todos os dias, para dar mais veracidade à história. Tonks e Lupin, a contragosto, também concordaram em mentir para o resto da Ordem e agir por conta própria dessa vez, mas tomaram todas as providências para que, caso alguma coisa de ruim acontecesse, os outros membros fossem avisados.

Agora eles haviam combinado que o sábado e o domingo deveriam ser apenas de descanso e diversão, para recuperarem as energias e partirem na segunda-feira. Mas Harry definitivamente não conseguia relaxar. Ele tinha passado a noite quase toda em claro, e nos poucos momentos em que dormiu, sonhou rodava por Godric Hollow a dias sem conseguir encontrar a casa de seus pais, e acordou assustado para reler a lista e se certificar, pela milésima vez, de que não estava esquecendo nada.

Tonks e Lupin chamaram da sala, onde Ginny acabava de prender os cabelos em um rabo-de-cavalo que deixava a mostra o decote das costas de seu vestido laranja. Todos prontos, entraram na lareira em direção à Toca.
Na casa da família Weasley o caos reinava. Logo ao sair da lareira, eles viram Fred e George que, na sala, em elegantes trajes de veludo cor-de-vinho, faziam piada sobre o fraque do pai da noiva, que mais parecia a roupa do Nick Quase-sem-Cabeça, de tantas rendas e babados. Sebastien, tentando manter a pose, justificava que este era o traje típico na França, mas tentava, disfarçadamente, esconder um pedaço da gola de tule pra dentro da camisa.

Do andar de cima vinham gritos histéricos de Fleur, que parecia irritadíssima porque uma prima distante também estava vestida de branco, enquanto Gabrielle subia as escadas apressadamente, levando um copo de água para a irmã (Harry desejou que tivesse alguma poção calmante diluída naquela água). Ao perceber a chegada dos seis, Sra. Weasley se apressou em recebê-los e encaminhá-los ao lado de fora da casa, onde Ron e Ginny deviam fazer sala para os parentes da noiva, que aparatavam por todos os cantos.

O jardim estava maravilhosamente decorado. Mesmo Ginny, de má vontade, teve que admitir que sua futura cunhada havia feito um trabalho impecável. A tenda lilás continuava estendida sobre o gramado, mas abaixo dela toda a bagunça tinha desaparecido. No centro havia um altar imaculadamente branco, decorado com violetas. Ao seu redor, fileiras de cadeiras de madeira escura circulavam toda a tenda, a não ser por um pequeno vão no meio, por onde entrariam os noivos e seus convidados. As colunas que sustentavam a tenda eram feitas de esculturas de gelo, que, Harry reparou, retratavam pessoas queridas dos noivos que não puderam estar ali. Entre elas, Harry reconheceu Dumbledore e Charlie, além de uma linda mulher que certamente havia sido a avó veela de Fleur.

O Sr. Weasley conversava com um homem grisalho, vestido de preto, que devia ser o juiz. Lupin e Tonks foram sentar-se ao lado de Dedalus Diggle, Kim Shacklebolt, Olho-Tonto Moody e Hestia Jones, os membros da Ordem que já haviam chegado. Harry notou que nenhum dos professores de Hogwarts tinha ido, e sentiu um aperto no coração. Ele tinha esperado que ao menos Hagrid fosse ao casamento, afinal ele era amigo da família Weasley. Queria revê-lo antes de partir em busca das horcruxes, mas parece que isso ia ter que ficar pra depois.

Aos poucos a tenda foi se enchendo e Harry, Hermione e Ginny decidiram sentar-se também, para que a cerimônia pudesse começar logo. O juiz subiu no altar ao centro, e, de cada lado, os pais do noivo e da noiva tomaram seus lugares. Ron e Gabrielle, os padrinhos do casal, entraram primeiro pelo vão do centro, e se posicionaram a frente do altar. Em seguida, com um aceno de varinha, Sra. Weasley fez um quarteto de violinos começar a tocar uma marcha nupcial, enquanto os noivos atravessavam a tenda até o juiz.

Harry pensou que a cerimônia teria sido realmente agradável, se não fosse por Hermione resmungando o tempo todo sobre o vestido verde de Gabrielle (segundo ela, evidentemente copiado do seu) ou sobre como Gabrielle estava se esfregando desnecessariamente em Ron. Pra se distrair destas reclamações, ele brincava de remodelar as estátuas de gelo, o que resultou em um tio de Fleur com focinho de gato e na avó veela com um chifre de unicórnio bem no meio da testa. Do outro lado da tenda, os gêmeos, que observavam a cena, se contorciam para segurar o riso diante da cara de Valentine, que, no altar, tentava concertar tudo com um feitiço não-verbal.

Assim que a cerimônia acabou, uma música alta e animada começou a tocar no fundo do quintal, pra onde todos se dirigiram. Lá, uma mesa imensa, com comida suficiente para um batalhão, estava cuidadosamente montada para a comemoração, um almoço que prometia atravessar toda a tarde e durar até altas horas da madrugada.

Harry e Hermione se serviram de cerveja amanteigada e foram encontrar Ron e Ginny, que estavam tirando fotos com o resto da família. Minutos depois todos estavam dançando na pista improvisada no gramado, fazendo roda em torno dos noivos nas músicas mais animadas, ou separando-se em pares nas mais lentas. Em uma dessas, Gabrielle, que fazia par com Ron, acabou escorregando e caindo em uma poça de lama que ninguém sabe bem de onde surgiu. Hermione, que dançava com Fred, jurou de pé junto que não tinha nada a ver com isso, mas era difícil acreditar vendo a cara de satisfação dela com o vestido sujo e manchado da menina.

A noite chegou e a festa ainda corria animada, ninguém parecia pensar em ir embora tão cedo. Com os ânimos já alterados pelo vinho e pela cerveja amanteigada, Arthur e Sebastien se derramavam em elogios mútuos, falando sobre como era bom que suas famílias tivessem se juntado, como seus filhos formavam um lindo casal, como seria ótimo quando lhes dessem netos.

Valentine, recostada em uma cadeira, com os pés descalços em cima da mesa, parecia dormir de olhos abertos. Meio abobalhada e com a voz mole de sono, ela apontou para o horizonte e disse:

- Olha, que lindo, uma queima de fogos!

Mas Lupin foi o primeiro a perceber, a pesar da distância, que não se tratava de uma explosão de fogos de artifício. Alguém havia conjurado a marca negra e, se ele não estivesse enganado, ela estava sobre Hogsmeade. Puxando de lado Tonks e os outros membros da Ordem, eles entraram na casa e se trancaram na cozinha para uma reunião de emergência.

Percebendo a movimentação, Harry, Ron e Hermione os seguiram, mas foram impedidos por Lupin de participar da reunião. Hermione e Ron ainda tentaram argumentar que já tinham completado dezessete anos e, portanto, já podiam ser oficialmente membros da Ordem. No entanto, vendo a cara de desespero de Harry, que seria o único a ficar de fora, eles desistiram e resolveram fazer companhia ao amigo no andar de cima.

Eles passaram o resto da noite no quarto dos gêmeos, tentando achar, nas caixas que eles haviam deixado lá, alguma das “orelhas extensíveis” com as quais tentariam ouvir a conversa na cozinha. Sem sucesso, jogaram-se desanimados nas camas e esperaram por mais algumas horas, até que Tonks apareceu na porta.

- Vocês vão dormir aqui hoje, ok? Eu e Lupin vamos com os outros até
Hogsmeade checar o que aconteceu, e não seria seguro deixar vocês sozinhos na sede da Ordem. Já conversei com Molly, ela disse que coloca uns colchões na sala e acomoda vocês por lá. Amanhã, de qualquer forma, estaremos de volta para o almoço de despedida de Bill e Fleur, então buscamos vocês. Nem pensem em fazer alguma loucura, viu! Arthur e Molly vão ficar de olho em vocês o tempo todo. De qualquer forma, a essa hora quem conjurou a marca já deve estar longe da vila, acredito que não haja muito o que fazer lá... - e girando sobre os calcanhares, ela se foi para o andar de baixo, onde desaparatou.

Sem nenhuma alternativa, os três se conformaram em ficar na casa e desceram para arrumar suas camas na sala. Embora não conseguissem dormir, nenhum dos três falou muito naquela noite. Ron e Hermione certamente estavam pensando no que poderia ter acontecido em Hogsmeade, mas Harry tentava mais do que nunca não pensar em nada. Não queria sonhar com Voldemort, não queria deixar que ele entrasse em sua mente. Se tinha alguém que não podia saber de seus planos era ele, e a visão da marca o fez lembrar da importância de praticar Oclumência. Com a mente totalmente vazia, ele foi o primeiro a adormecer, um sono pesado, tranqüilo e sem sonhos, como há anos ele não tinha.









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