A carta que ascende a ira
11-A carta que ascende a ira
Três dias depois, Cristopher já havia saído da ala hospitalar completamente novo e contente, porém sem ter recebido mais nenhuma visita da irmã. A única coisa que recebeu foi uma carta amargurada de sua mãe, que ainda não havia aceitado o fato de ele não ter entrado em Sonserina. Em cada andar, em cada corredor, em cada beco escuro da escola de magia e bruxaria de Hogwarts, podia-se notar a face imparcial de um auror em campo. Altos, baixos, largos ou finos, eles estavam sempre andando de um lado para o outro, conversando misteriosamente entre si, entrando em salas ou espreitando pela floresta proibida. Alguns professores sentiam-se confiantes com os novos companheiros, outros mostravam-se completamente hostis, no entanto, os alunos, na grande maioria das vezes sentiam-se assustados e invadidos, como se o ambiente fosse completamente perturbado.
Eva, agora estava inteiramente de volta ao clima das aulas, pois tinha dezenas de deveres das mais variadas matérias. Dificilmente via sua amiga Cellin, principalmente por se esforçar ao máximo para sempre estar ao lado de Régulo. Após uma semana desde seu encontro casual com Medaline, ela se achava agora em uma extremamente monótona aula de defesa contra as artes das trevas:
— Não quero que se esqueçam de que este tipo de elemental pode muitas vezes não se importar com as conseqüências de seus atos — dizia o professor Otto Candle, originalmente mestre de runas, mas substituindo o falecido Garner na ocasião.
Uma mão, de Kail Nesbit, ergueu-se ao ar, atraindo a atenção do erudito mestre.
— Sim, Nesbit?
— Mas professor... Senhor, se bruxos nem sempre conseguem capturar magos elementais, e os conselhos responsáveis por estes não dão conta do recado, então... Eles são invulneráveis?
— Ah-am ! — Otto encarava Kail com seus olhos grandes e esbugalhados — Preste atenção, senhor Nesbit, eu não disse que os conselhos não dessem... “conta do recado”, mas sim, que alguns elementais não se importam muito com punições. — Otto encarava friamente Ulisses e Régulo, que pareciam travar uma batalha discutindo a respeito de golpes elementais — Acho... que o senhor Apalache é um grande expert no assunto, não concorda... senhor Black?
— Bem... — Régulo concertava sua postura — Professor, já que o senhor citou a especialidade do Ulisses — Régulo fitava o amigo em busca de incentivo — Por que não entramos em um assunto mais interessante?... Como poderes elementais, ou... Fusões elementais... Algo mais contagiante?
—Sinto muito que o tema não seja de seu interesse, senhor Black, mas infelizmente o que eu devo passar a vocês é a matéria sobre os conselhos elementais, suas funções e como cobra-los através do Ministério. Agora... se o senhor não estiver satisfeito, sugiro que na próxima semana converse com o senhor Goldsmith, o novo professor, que chegará em breve. — dizia Candle, em seu tom repetitivo e fanho.
A sala, então, se encheu do brilho que emanava dos olhos dos alunos excitados. Finalmente uma notícia boa! Um novo professor de defesa contra as artes das trevas. Apesar de Otto Candle ser uma pessoa magnífica, sua aula era fria e objetiva, sem nada de prática ou informações que não se pudessem encontrar em livros. Como se o professor lecionasse a um bando de velhas!
— Quer dizer que o diretor já contratou um novo professor? — Jamile perguntava em alto tom, para tentar vencer o burburinho que ecoava pela sala.
— Graças a Merlin ! — sussurrava Irvine a Kail.
— Espero que ele goste de aulas dinâmicas. Lembra no terceiro ano quando o professor deixou que trouxéssemos livros velhos para atirar nos diabretes? — Emily virava para trás e chamava a atenção de Estephanie.
— Bem que podia ser um elemental de verdade! Um cristalomago! Seria incrível! — Os olhos de Philip brilhavam, enquanto suas mãos se mexiam freneticamente.
— Silêncio!!! — gritava Otto — Eu ainda não terminei a minha aula!!!
Imediatamente todas as cabeças se voltaram para frente e as bocas se fecharam.
— Como eu dizia, antes de interromper o assunto, os piromagos costumam dar mais trabalho ao Ministério do que os aquamagos, pois naturalmente estes últimos possuem um comportamento mais pacífico. Conseqüentemente o conselho dos aquamagos é mais reservado que os demais. Pois não, srta. Law?
— É possível que dois bruxos comuns tenham um filho elemental? — a pergunta de Judith despertou a atenção da sala, que agora encarava o professor, com uma expressão de descrença.
— Não. — Cortou Otto, balançando a cabeça negativamente, e andando até a garota — Não existem elementais “sangues-ruins”, srta. Law — falava com um certo sarcasmo — Ao menos...
— Ao menos? — se intrometia Ulisses.
— Ao menos que os avós sejam elementais, e os genes não tenham se manifestado nos pais, mas isto é extremamente raro.
Judith ergueu as sobrancelhas e balançou a cabeça afirmativamente, sentindo-se satisfeita.
—Não passarei dever, pois não serei mais seu professor de defesa — consultou o relógio — Para os alunos de runas, até segunda-feira. Estão dispensados.
Sonserina e Lufa-Lufa saíam da sala em meio a especulações sobre o curioso mundo elemental. Eva, alheia a tudo isto, segurava agora em sua mão uma pedrinha rosada, em forma de asa, que brilhava intensamente e parecia estar aquecido.
— Que bonito! Nunca tinha reparado que você usava um amuleto assim. — Comentou Jamile, que saía da sala com Kail.
— Hum, o amuleto que a Cellin deu a Eva... — falava Irvine, colocando a mão no ombro de Jamile.
— Vicker? Ah... é verdade, vocês costumavam andar juntas... — Jamile tocava o amuleto — Está quente!
— É verdade... — Eva parecia preocupada — Isto não é normal... Este é um amuleto da verdade, detecta mentiras, mas eu não estive conversando com ninguém...
— Hum... Mas mesmo assim... Está quente demais... Deve estar detectando muito mais do que uma mentira... — Jamile se retirou, ao lado de Irvine, que acenava e mandava um beijo para Eva.
Eva levou o amuleto até o banheiro mais próximo e deixou-o por alguns segundos em baixo da torneira, mas quando tornou a pega-lo estava tão quente quanto antes.
— Que droga! Acho melhor eu ir perguntar para a Cellin, de repente o dela também está assim.
— Oi, Rookwood — Cumprimentava uma garota da Grifinória, amiga de Cellin.
— Oi, Susan — Eva se retirou, colocando o amuleto no bolso.
Virou o corredor, se dirigiu às escadas. Procurava por Cellin, mas sabia que ela poderia estar em centenas de lugares. O tempo fora do castelo parecia não estar dos melhores, uma tempestade se aproximava, trazendo nuvens escuras e fazendo os archotes se acenderem automaticamente. O ambiente começava a escurecer, como se a noite já tivesse chegado. Eva procurou na biblioteca, no corujal, já estava ofegante. Um raio distante iluminou o corredor em que ela se encontrava.
— Nick! — gritou ela — Nick-quase-sem-cabeça!!!
O fantasma, que aparentava estar ainda mais lúgubre, encarou a menina com um olhar distante:
— Srta. Rookwood?
— Você por acaso viu a Cellin? A monitora do sétimo...
— Pobre Vicker, eu sinto muito, sinto muito — E entrava por uma parede, deixando Eva falando sozinha.
— Pelas barbas de Sonserina!!! Deve ter acontecido alguma coisa! — O amuleto agora rasgara o bolso e caíra no chão, ao mesmo tempo em que outro raio iluminava o corredor. Eva saía correndo, rumo ao salão principal.
— Como podem ver, meus caros amigos, nem todas as famílias bruxas têm sorte, ou pelo menos nem todas as famílias trouxas — a voz de Ulisses ecoava pela torre.
— Dá um tempo! Você não para de falar nisto. O que temos a ver com a morte de uns trouxas inúteis — Se queixava Emily.
Eva passava correndo por Ulisses, Emily e Jack deixando os três olhando para suas costas. Ulisses parecia feliz e agitado. Emily parecia estar completamente irritada. Ao entrar no salão principal, ela havia olhado diretamente para a mesa da Grifinória, mas Cellin não estava almoçando. Com certeza, devia ter acontecido alguma coisa! Régulo estava cercado por calouros, olhava para Philip, enquanto este parecia contar uma fofoca muito interessante. Eles estavam sendo assistidos pela professora Minerva, que aparentava estar extremamente descontente.
Ela pensou em ir ouvir seja lá o que fosse que Philip estava contando, mas tomou coragem e se dirigiu à Minerva, na mesa dos professores. Timidamente, consultou o diretor com o olhar, e ao ver seu sorriso de aprovação, direcionou-se à diretora da Grifinória, com cautela.
— Professora Minerva, aconteceu alguma coisa que eu devesse sabe? — gaguejava desconcertada.
— Infelizmente, srta. Rookwood. Os pais de Cellin Vicker foram... — Minerva engoliu em seco — Assassinados.
— Então era isso! Mas é claro! O amuleto revelava também os sentimentos desesperados do outro portador. Pobre Cellin — pensava ela, agradeceu Minerva com um aceno de cabeça e deu meia volta. Alunos curiosos a fitavam, sem entender o que levava uma aluna a consultar uma professora em pleno horário de almoço.
Eva não quis comer, não quis falar com seus amigos. Preferiu caminhar sozinha. Iria para os jardins, próximo ao lago, onde poderia colocar seus pensamentos em ordem, e acalmar seu amuleto em chamas.
Desceu as escadas, tirou a varinha da capa, sibilou um feitiço caseiro, que fez com que um guarda-chuva se armasse na ponta de sua varinha. Atravessou correndo o pátio e foi diretamente ao lago, quando avistou um ponto azulado no céu, vindo em sua direção.
Sua coruja pousou em um banco próximo e bateu as assas ameaçadoramente, demonstrava não estar contente com a tempestade. Ergueu a patinha, de onde Eva tirou um pergaminho, já molhado. Assim que se viu livre de sua carga, Max rumou até o corujal, sem se quer esperar um carinho de sua dona.
— Nossa! Obrigada... — Eva secou o chão com seu “guarda-chuva”, e o ampliou, fazendo-o parecer um guarda sol, com sua cor rosada e viva. — Respostas da Saris!
“ Irmãzinha doce e meiga,
Não vou ficar frizando minha opinião sobre Medaline Emburgo, pois tenho uma novidade incompleta sobre o futuro para relatar. Bem, se anda estudando muito poções, eu vi, em minha bola de cristal, que você dava alguma coisa à esta garota, não tenho idéia do que seja, mas creio que seja algum tipo de veneno, remédio para dormir, pois o ambiente era a própria ala hospitalar. Mas, como citei, foi uma visão incompleta, pois quando estava no auge da visão, a secretária do César veio me perguntar sobre a cor dos tapetes que ficarão na mansão no dia do casamento...
O que você acha... Será que verde? Ou roxo...?
Sempre sua,
Saris J. Rookwood
Ao terminar de ler, ela amassou a carta, já molhada, e colocou-a no bolso que ainda estava intacto. Pegou o amuleto, e, segurando-o pelo cordão, mergulhou-o nas águas gélidas do lago escuro. Viu pequenas ondulações se formarem e rumarem para longe, onde também havia pequenos furos feitos pelas gotas de chuva que se encontravam com o lago. Hipnotizada pela paisagem pitoresca, que mais parecia um quadro extremamente melancólico, seus pensamentos lembravam o momento em que ela pensara que o assassino famoso de quem todos falavam e temiam não poderia fazer mau a ela, pois ela não tinha relações com nascidos trouxas . Estava enganada. Sentia-se mentalmente ferida, pensava que nada seria igual... A amiga viva, esperta e sempre presente não seria a mesma pessoa, não tinha mais uma família, agora Cellin era órfã. Ficou pensando sobre o assunto por alguns minutos, quando se deparou com o reflexo de Cellin no lago. Virou-se para trás e encarou a amiga. Levantou-se, deixando o guarda-chuva no chão e abraçou-a, com tanta força quanto pôde.
A tempestade havia cessado sem que Eva percebesse, ficaram um tempo abraçadas, enquanto Cellin chorava no ombro da amiga. O amuleto, que agora estava na mão de Eva, já esfriara.
— Como soube que eu estava aqui?
— Nem todo bruxo conhece o feitiço do guarda-chuva, e os poucos que conhecem não devem ter uma varinha feita em madeira rosa! — Cellin deu uma piscada.
— Você deve estar certa — Eva sorriu, sem jeito. Procurava palavras realmente consoladoras, mas sabia que estas não existiam. Sem saber como agir, apenas encarou a amiga, esperando que ela se manifestasse.
— Bem, quem sabe agora, com meus pais mortos, sua família não deixe você me visitar. Provavelmente eu vou morar com meu tio James, ele é bruxo...
— Não quero falar sobre isso!
— Mas é um fato, não é?
— Nem todos os fatos devem ser comentados! Existem outros assuntos que duas amigas podem conversar...
— Este é o assunto que não sai da minha cabeça! — os olhos de Cellin voltavam a se encher de lágrimas — eles foram mortos, ninguém sabe por quem... E muito menos o porquê! Foram bruxos!! O que bruxos poderiam ter contra meus pais? — o tom de voz dela ficava cada vez mais alto, como se questionasse um ser superior.
— Cellin... — Eva tentava acalma-la — Por favor, o Ministério provavelmente está trabalhando no caso. Você... precisa comer alguma coisa!
— Estou sem apetite. O que você está fazendo com o amuleto nas mãos?
— Estava pensando... — Eva colocou seu amuleto de volta no pescoço — Vamos, temos que ir comer!
— Não quero comer! Não quero fazer nada! Quero ir para casa, ver o corpo dos meus pais!!
— Ora! Se não se alimentar não agüentará nem chegar até a torre da Grifinória, quanto mais a Londres! Sua mula!
— Pode ter certeza de que chego! Não quero ficar aqui nem mais um minuto... Gostaria que você fosse comigo, mas sei que é impossível... Acho que vou chamar Eleanora.
— Por que não chama sua amiga Medaline? — Eva virava o rosto.
— Medaline... — o olhar de Cellin era distante — Ela tem os seus próprios problemas... A propósito, andei conversando com ela sobre o Régulo.
— Sério? — Eva deixou escapar um tom empolgado — Bem... Quer falar sobre isso?
Cellin deu de ombros.
— Ela diz gostar do Régulo... Me parece que eles se encontraram nas férias. Mas quando voltou o ano, ele tentou se livrar dela aos poucos. Disse que não podia ficar com ela porque um amigo dele era louco por ela... Besteira, é claro. Mas ela acredita, é muito ingênua.
Eva voltava a olhar para Cellin, esperando que ela dissesse mais coisas a respeito de sua inimiga. Mas Cellin ficou muda, colocou as mãos nos olhos e começou a soluçar.
— Cellin... Ok, vamos entrar, está ficando friu.
— Não... Estou bem aqui... Por que, Eva? Eles eram tão bonzinhos, nunca, jamais, fizeram mal a uma mosca! Mamãe era tão preocupada com as coisas, jamais passava por uma porta sem trancá-la...
Um auror passava ao longe, ao lado de Dumbledore. O homem apontava para a floresta e falava alto sobre uma possível passagem que ninguém havia encontrado.
Quando Eva voltou a olhar para Cellin, esta havia sentado no chão, estava com os olhos fechados.
— Cellin?! Você está bem?
Cellin segurou o seu próprio amuleto com força, e caiu de costas no chão, em baixo do guarda-chuva aberto. Eva levantou a cabeça da amiga, cuidadosamente. Olhava desesperadamente para o auror e para o diretor, que já vinham correndo na direção das duas meninas. Dumbledore imediatamente tomou a dianteira e dominou a situação.
— Mobilicorpus — sibilou — srta. Rookwood, retire o seu guarda-chuva, por favor.
O corpo de Cellin flutuava. O auror ao lado de Dumbledore parecia não entender o que se passava, mas permanecia em seu lugar, aguardando ordens. Eva pegou a varinha, fazendo-a voltar ao normal.
— Ela está bem. Apenas inconsciente. Vou leva-la até a ala. Sr. Lee, encontro o senhor na floresta. Srta. Rookwood, acompanhe-me.
Dumbledore guiou Cellin até a ala, recusando ajudas de aurores que passavam. Seu comportamento paternal fazia com que Eva se sentisse confiante e à vontade . Ele deixou a menina aos cuidados de Mm. Pomfrey e dirigiu-se a Eva:
— Você vai ficar bem? — seu olhar era inquisitivo.
— Sim, senhor. — Eva deu um sorriso amarelo.
— Como está seu pai, Eva?
— Ele está bem. Na verdade, não sofreu absolutamente nada. — respondeu ela, aliviada por não ser questionada a respeito de Cellin.
— Hum... — Dumbledore parecia pensativo — Então... Ele já voltou a trabalhar no departamento de Mistérios? — ele a fitava através de seus oclinhos meia-lua.
— Sim, provavelmente, senhor.
— Muito bem. — finalizava ele — espero que a senhorita cuide de sua amiga, ela precisará de você agora — e se retirou, com um sorriso de incentivo.
No dia seguinte, uma singela sexta-feira, o tempo não estava tão ruim. O céu estava nublado, mas a temperatura era agradável. A tempestade já estava distante. As primeiras aulas de Eva seriam nos jardins, mais precisamente nas estufas, seria aula de herbologia. Para a felicidade de Rookwood, a matéria foi totalmente prática, ajudando-a a manter sua cabeça distraída e longe de pensamento indesejados. Mas mesmo concentrada em sua atividade, sua falta de disposição era notória, e logo chamou a atenção de seus colegas:
—É impressão minha, ou você está realmente com sono ? — perguntou Philip, seu cabelo loiro já mesclado de verde, pois a erva em que ele mexia espirrava pus para todos os lados.
— Sono...? Ah! — Eva tentava conter o vulcão em que havia se tornado a erva da dupla — Tem razão... Eu fiquei acordada, esperando para ver se Aline ou Allana apareciam com comida no salão comunal, mas infelizmente dormi com a barriga vazia...
— Elas estavam fora. — disse Régulo, que trabalhava com Ulisses logo em frente.
— Como assim, fora? — Eva se espantara — Não dormiram no dormitório?
— Dormiram, mas bem tarde. Elas gostam de passear pelo castelo à noite.
— Mesmo com os aurores? — questionou ela.
— Elas não usam os corredores principais para sair. Costumam usar as escadas das paredes ou as passagens verticais.
— Ou seja... Elas freqüentam lugares vazios onde não se encontra nada de interessante... — concluía Eva.
— Eis o que é curioso. Aparentemente, elas freqüentam lugares vazios onde não existe nada de interessante... — ironizava Philip — Ulisses, por favor... Use um “enervate” na Evinha, antes que ela mergulhe no pus sem perceber.
— Não vi você ontem a noite. — comentou Ulisses, com frieza.
— Como assim?
— Você disse que ficou no salão comunal, mas eu não a vi! Fiquei jogando xadrez com a Judith!!
— Ora, é que eu... Eu...
Eva não teve que se esforçar para continuar a disfarçar sua falta de ânimo, pois a professora passava por entre os alunos exigindo silêncio e concentração, além de criticar e menosprezar o trabalho dela e de Philip, alegando que em vez de secar a erva eles haviam tirando mais pus do que ela imaginava que poderia sair.
Saindo da aula de herbologia, Eva quis, imediatamente, escapar de seus amigos para poder saber como estava Cellin. Fingindo entrar no banheiro, ela desviou e resolveu pegar outro caminho para chegar até a ala hospitalar. Ao chegar até a porta, pôde ouvir a voz afobada da jovem Mm. Pomfrey:
— Medaline, querida. Volto logo, preciso pedir ao professor Cardiff um ingrediente que falta para a sua poção.
Eva adentrou e deparou-se com o rosto meigo de Medaline, sorrindo e balançando a cabeça afirmativamente, enquanto a enfermeira cruzava a porta e gesticulava algumas palavras, que pareciam destinar-se a ela própria:
— O que foi que a sra. disse? — perguntou Eva.
— Ora, criança! Eu disse que se veio visitar Cellin Vicker, não perca seu tempo. Ela ainda está repousando. Sugiro que volte mais tarde. — e saiu, rebolando em seu uniforme rechonchudo.
Eva avistou de longe a única cama coberta por cortinas na ala, uma pequena abertura deixava a mostra uma cabeça repleta de cabelos castanhos e um cálice com um líquido transparente. Sabia que seria perda de tempo ficar ao lado de Cellin enquanto esta dormia. Mas não perderia seu tempo à toa. O ódio que sentia por Medaline já havia dominado seus pensamentos. Lembrava-se da imagem escondida de Régulo e sua inimiga, entre jogadores que passavam montados em vassouras velozes, lembrava como havia se sentido. Tanto tempo gostando do mesmo garoto, tanto tempo escrevendo em seu diário cada palavra, gesto de carinho ou manifestação positiva que partia dele, e sem mais nem menos, uma garota estranha (e ainda nascida trouxa) roubava ele assim! Inadmissível! Foi então que ela se lembrou...
“O ambiente era a própria ala hospitalar”. Onde foi que ela havia ouvido estas palavras? Sim, claro! A carta de Saris! Ela daria à Medaline alguma poção, veneno ou remédio... Mais onde encontraria?
Olhou para os lados, encostou-se na cama onde uma menininha sonolenta lia uma revista, tirou a varinha da capa e apontou para a cama coberta de Cellin. Fez o cálice que ali estava flutuar até alcançar o recipiente com a poção incompleta de Medaline. Aproximou-se, com a desculpa de que havia deixado cair um brinco e despejou sobre o recipiente seja lá o que tivesse no cálice destinado a Cellin.
— Encontrou? — perguntou Medaline, solenemente.
— Hum... Não... Deixa para lá, eu peço para Mm. Pomfrey procurar mais tarde — respondeu ela, com um exagerado sorriso.
— Ali está ela! — Medaline apontou.
A enfermeira chegou, com uma pequena moeda branca e acrescentou-a à mistura que Medaline tomaria. A poção apresentou uma coloração perolada que despertou uma estranha careta em Mm. Pomfrey. Um garotinho entrava na ala, acompanhado pelo zelador, seu rosto parecia ter murchado e ele gemia de dor.
— Minha nossa! — exclamou a enfermeira — O que temos aqui? — ela se aproximava do recém chegado — Medaline, tente beber seu remédio sozinha, eu tenho muito trabalho a fazer.
— Não se preocupe! — Eva se manifestou, prestativa — eu posso dar a poção a ela — tinha no rosto uma estranha expressão de prazer.
A enfermeira apenas virou-se e conduziu o menino até uma cama vaga, dispensando o zelador e correndo para um armário velho não muito distante.
Eva, sorrindo, inclinou-se delicadamente sobre a cama de Medaline, com o remédio nas mãos. Num gesto materno, deu à menina todo o líquido na boca, esperando que ela bebesse até o último gole. Mas antes que Medaline terminasse de beber, algo inusitado fez com que o corpo inteiro de Eva estremecesse. Ela se deparava com o reflexo bruxuleante da rosa negra no líquido do recipiente. Boquiaberta, ela repousou sobre o suporte o resto do remédio e ficou paralisada por alguns instantes.
Ao retornar à consciência, reparou que Medaline já estava dormindo, Mm. Pomfrey continuava distraída com seu novo paciente, e o relógio revelava que estava dez minutos atrasada para sua aula de história.
Rumou para a saída e decidiu que faltaria à aula para descançar no dormitório, pois começava a crer que estava tendo alucinações. Sua pressa foi tanta que nem reparara que a todo o momento estava sendo observada por um rosto desconhecido...
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