Conto XXVI – O que é amor, afi
Nota Inicial: O vigésimo sexto conto da trajetória dos Marotos em Hogwarts será narrado por mim, em primeira pessoa, e permeado de romance. Após um período de grandes tribulações, nós podemos nos voltar um pouco mais para a nossa vida amorosa (que não é nada fácil) e tentar resolver os nossos conflitos mais íntimos. Falta-nos, infelizmente, maturidade.
Remo Lupin
- Atchiiiiiim! – era o décimo quinto espirro seguido que eu dava na mórbida manhã que se estendia no Salão Comunal da Grifinória. A noite passada devia ter sido muito fria.
- Com tantos pêlos e você ainda pega um resfriado – sorria Tiago, me encarando – Vejo um ponto fraco naquela ferocidade de lobisomem!
- Shhh! – censurei-o, olhando em volta para ver se tinha alguém por perto – Fale um pouco mais baixo da próxima vez.
- OK! E da próxima vez que sairmos por aí, levarei um casaquinho de lã para você, está bem? – zombou, dando pouca atenção ao meu aviso.
- Onde estão Sirius e Pedro?
- Não tenho certeza, mas penso que o Sirius estava procurando pela Francy e o Pedro... ah, deve ter se perdido por aí – respondeu Tiago, observando um grupo de calouros que passavam pelo retrato da Mulher Gorda.
- A Lílian não fala comigo há séculos – deixei escapar, atraindo no mesmo instante o até então distraído olhar de Tiago Potter – Quero dizer, éramos parceiros de atividades escolares.
- Vejo que a relação de vocês vai além do fatídico beijo, anh? Rolou mais alguma coisa? – Tiago perguntou, os olhos brilhando ao encarar-me, agora vermelho de vergonha.
- Ah, Tiago, não vem. Foi só um beijo. Só um! Nada mais. Um beijo e algumas horas estudando juntos. Que há de espantoso nisso? – respondi, ao mesmo tempo enraivecido e envergonhado.
Mas Tiago não respondeu. Lílian surgia na escada em caracol que dava no dormitório das meninas. Descia cantarolando, pulando de dois em dois degraus. Seu olhar demorou-se um pouco na minha poltrona (ou assim pareceu) e ela sorriu, parando no último degrau para cumprimentar uma colega. Logo após, moveu-se em minha direção.
- Olá, Remo – meu coração acelerou ao ouvir sua voz e um crescente formigamento formou-se em meu nariz – O que há? Está doente?
- ATCHIIIIM! – não pude controlar o espirro. Senti-me como uma lagarta diante de uma bela orquídea naquele momento.
- Bastante doente – ela falou, retirando magicamente com sua varinha as gotículas de saliva que saltaram sobre suas vestes – Pegue isto e isto. Melhoras! – despediu-se, entregando-me uma barra de chocolate Gripin e um lenço salmão de seda.
- Chocolates Gripin! Está aí o motivo de eu querer pegar resfriado toda semana, quando menor – Tiago exclamou, pegando a barra sobre meu colo e abrindo-a. Um aroma de laranja tomou conta do Salão.
Mas a única fragrância que eu, de fato, sentia naquele instante... o único cheiro que invadia as minhas obstruídas narinas... que fazia meu coração pulsar mais ligeiro... e suar as minhas pálidas mãos... era o dos cabelos de Lílian, o aroma de sua pele, impregnado naquele pequeníssimo pedaço de tecido salmão.
O que é o amor, afinal? Não pode ser essa sensação embaraçosa que sinto ao ver a Lílian. Dizem que o amor é algo bom, belo e eterno... mas um sentimento assim pode ser descrito em palavras? Eu não conseguiria definir. Nem sei se o que sinto é amor. Só sei que quero vê-la outra vez e espero não espirrar na próxima ocasião.
Estávamos eu, Tiago e Pedro almoçando no Salão Principal, um céu claro e limpo de domingo sobre nossas cabeças, quando Sirius interrompeu a sinfonia de tilintares de garfos, facas, colheres e copos que se fazia em nossa parte da mesa.
- Desisto!
- O que há? – Tiago perguntou, antes de abocanhar um grande filé à molho madeira.
- A Francy não quer mais saber de mim. Só me ignora! Já tentei falar com ela umas oito vezes hoje pela manhã, mas ela tira o corpo fora e finge que nem me viu – Sirius falava rápido, nervoso, abatido.
- Desiste dela, então – Tiago aconselhou, encarando-o nos olhos – Você nunca foi de parar numa só garota, mesmo. Além disso, lembrem-se, somos populares. Qual garota não quer dar um passeio conosco?
- Mas com a Francy é diferente! – Sirius exclamou.
- Desiste de falar com ela, então. Parte logo pro beijo – falei, sem me dar conta que eu mesmo não teria tanta coragem de seguir esse conselho. Sirius, porém, olhou-me esperançoso e levantou-se da mesa com um salto, correndo para o Saguão de Entrada.
Fui o último garoto a retirar-se da mesa de almoço no Salão Principal naquele dia, esperando ficar a sós com alguém que eu realmente torcia ser a última garota a também sair. Sentado sozinho no canto esquerdo da mesa, olhava para Lílian e duas amigas, na outra ponta, enquanto tomava o quinto sundae de morango.
Esperava não ser só imaginação minha, mas acreditava ter visto Evans me encarando por duas vezes, antes de voltar seus olhos e atenção para a animada conversa que tinha com suas companheiras de quarto. Por que elas não iam embora?
Mas então, quando a comida sumiu e as travessas tornaram-se limpas outra vez, as três garotas levantaram-se da mesa, mas somente duas ausentaram-se do Salão Principal. Lílian veio em minha direção.
- Está aqui para me agradecer pelo Gripin e pelo lenço? – perguntou, sorridente, sentando-se próximo.
- Anh... também – respondi.
- Você tomava sorvetes! Está louco, Remo? – indagou a garota, repentinamente.
- Por Merlin! Juro que nem havia percebido! Gripado e tomando sundaes! – e caí numa gargalhada nervosa.
- Então, qual o outro motivo? – perguntou-me, serena, seus olhos verdes encantando-me.
- Outro motivo?
- Sim, você respondeu “também” quando lhe perguntei o porquê de estar aqui. Qual o outro motivo?
- Ah, Lílian! É tudo questão de semântica! Eu realmente não... – mas parei ao ver aqueles belos olhos verdes na face alva de Lílian Evans traçarem uma expressão de aflição, desapontamento – Esquece.
E aproximei o meu rosto do dela, sentindo cada vez mais forte aquele cheiro de flores e lavanda que impregnava o lenço de seda, o cheiro de Lílian Evans. Mal me dei conta e os meus lábios já tocavam os dela num segundo beijo muito esperado... e doce.
Encontrava-me sentado no Salão Comunal da Grifinória. A poltrona que eu escolhera era a mais escondida possível da visão de quem entrasse ou saísse do aposento; não queria conversar com ninguém naquele instante de reflexão.
Eu realmente não conseguia compreender o que ocorrera. Nós havíamos nos beijado. Para mim, foi um beijo doce e apaixonado... mas por que ela derramou-se em lágrimas logo depois? E por que diabos saiu correndo sem ao menos se despedir? Por que não parou ao ouvir-me chamando o seu nome?
Definitivamente, se o amor é um sentimento bom, belo e eterno como contam por aí, ou essa definição está errada ou que sentimos um pelo outro...
- Estava te procurando – interrompeu-me a voz de Tiago – Por que escolheu logo esta poltrona? Quase não te encontro, sabia?
- Estou meio sonolento. Sentei aqui para tirar um cochilo – menti, fingindo um bocejo.
- Você podia ter escolhido o dormitório. Lá está muito mais silencioso do que aqui. Enfim, tem algo que preciso te contar – Tiago anunciou, encarando-me sério nos olhos – Algo que tem me preocupado bastante.
- Desembucha.
- OK, não fala nada até eu terminar de contar – pediu o garoto e vendo meu aceno de cabeça, continuou – Sempre que chega o período de tua transformação, sabe, nós ficamos bastante chateados por não podermos fazer nada para evitá-la. Sempre nos dá aquela vontade de sair pelos jardins e ficar te observando de longe para checar se tudo vai bem. Mas então o Pedro nos fala de nichos... e ele estava completamente certo! Enquanto pertencermos à cadeia alimentar de um lobisomem, jamais poderemos nos aproximar quando estiveres transformado. Sabemos que uma fera daquelas não ataca animais da mesma forma que ataca humanos. Portanto, está decidido, passados os exames da próxima semana, nós três nos empenharemos na prática da animagia.
Essas palavras atingiram-me de modo engraçado: fortaleceram-me, mas também me preocuparam.
- Mas vocês podem ser presos... tem toda uma papelada de registro no Ministério... e só é legalmente permitido para maiores de idade – alertei, o lado racional voltando a funcionar.
- Quem se importa com as leis do ministério? Algo muito mais importante está em jogo – Tiago respondeu e eu agradeci-o por aquelas palavras.
- Não sabe como estou melhor agora. Obrigado, amigo – falei-lhe, com um grande sorriso.
- Então, vamos andar por aí? Quem sabe a gente encontra o Pedro e o Sirius para nos distrairmos um pouco pelos jardins – convidou-me o rapaz, erguendo-se de um pufe amarelo no qual havia se acomodado.
- Não, espera. Queria te falar uma coisa antes de irmos – disse, antes que o receio retornasse e as palavras me fugissem outra vez – Sobre a Lílian.
- Que há?
- Hoje nós dois, por acaso, nos beijamos... mas não se anime! Foi estranho – confessei, os olhos voltados para o chão.
- Ah, Remo, é pura questão de prática.
- Não me refiro a isso, Tiago! Quero dizer, ela saiu correndo após o beijo. E parecia estar chorando.
- Isso é realmente bizarro. Talvez ela não estivesse preparada.
- Não sei, talvez – falei, embora uma voz que só eu conseguia escutar dissesse “Não é isso que você acha, realmente”.
- Então, o passeio ainda está de pé? – Tiago convidou-me outra vez e eu, desejando esquecer os pesados pensamentos e preocupações, aceitei, erguendo-me preguiçosamente da poltrona.
Tiago não fora o único a ter a idéia de passear pelos jardins. Na altura em que nós chegamos ao exterior da escola, algumas dezenas de estudantes divertiam-se no tapete verde que a grama bem aparada formava.
- Difícil vai ser achá-los aqui – disse, referindo-me a Pedro e Sirius.
- Talvez não – ouvi a voz de Tiago responder num tom animado – Veja só!
Segui a direção apontada por meu amigo e avistei, a uns 50 metros de onde estávamos, Sirius beijando uma garota, encostados no tronco de uma árvore. Não por acaso, era a Francy.
- Ele conseguiu! – vibrei, desejando melhor sorte que a minha ao amigo – Resta-nos achar o Pedro – concluí, achando que não cairia muito bem observamos os amassos de Sirius e Francy ao longe.
- Sabe, Tiago – falei, enquanto caminhávamos à beira do lago, buscando por Pedro Pettigrew – Acho que sei porque a Lílian saiu chorando, após nos beijarmos.
- Pode falar – ele disse, num tom de quem se mostra pronto a ouvir e a aconselhar.
- Suponho que ela esteja dividida. Talvez não goste apenas de mim – confessei, minha imagem apreensiva refletida na superfície da água.
- O que você quer dizer com... – Tiago começou, mas o grito de socorro de um garoto interrompeu-o; o urro parecia ter vindo de um aglomerado de arbustos mais à frente.
Aproximamo-nos ligeiramente e avistamos, detrás do monte de folhas verdes, Pedro Pettigrew caído no chão e Severo Snape à sua frente, a varinha em punho.
- O que diabos você pensa que está fazendo, Snape? – bradei, puxando a varinha do bolso das vestes – Solte-o, já!
- Ou? – desdenhou o sonserino, uma faísca brilhando ameaçadora na ponta de sua arma.
- Ou quebraremos todos os seus dentes – Tiago completou, os punhos cerrados e erguidos.
- Vocês não se atreveriam, principalmente agora que tenho suas reputações em minhas mãos – ele riu, girando a varinha entre os dentes.
- Desculpem... eu não pude... eu realmente tive que... – Pedro soluçava no chão, um ferimento recém-aberto em sua cabeça.
- O seu amiguinho aqui me contou uma coisa sobre você, Remo Lupin. Algo muito mais agitador do que sua paixonite pela suja da Evans – e vendo que eu avançara contra ele após a menção daquelas palavras, mirou a varinha, de súbito, para a testa de Pettigrew – Não se atreva.
- Não se atreva você a pronunciar o nome da Lílian! – gritei em resposta, suado e com esforço para controlar-me.
- Mas, como eu dizia, não foi só isso que o pequeno Pedro me contou – seus olhos brilharam, malévolos – E eu já desconfiava.
- O que você quer dizer? – Tiago pronunciou-se, agora também de varinha em punho.
- O que eu quero dizer, Potter, é que este que se encontra ao seu lado é um maldito de um lobisomem! – e vendo o olhar de espanto que tomara conta do rosto do meu amigo, indagou – Impressionado?
- Pedro! Como diabos você foi...?
- Não adianta lamentar o que já está feito, Tiago. Resta-nos calar a boca desse aí – falei, em tom de nojo, apontando para Snape com a cabeça.
- TARANTALLEGRA! – bradou Tiago, e um raio azulado disparou na direção do sonserino. Entretanto, para a nossa surpresa, o feitiço refletiu no ar e atingiu o meu amigo em cheio. Suas pernas logo se puseram a dançar em um ritmo frenético, fazendo com que o dono dessas caísse no chão, a sua varinha caindo a três metros dali.
- SERVENT... – comecei, mas um lampejo voou da direção de Snape, ligeiramente, atingindo-me no peito. Pelo efeito imediato a que fui submetido, deduzi: era o Feitiço do Corpo Preso.
A gargalhada debochadora de Severo Snape sinalizava-nos uma única coisa: havíamos perdido o duelo.
- Só para constar, Lupin, e para ajudá-lo em futuros combates: essa foi uma belíssima aplicação do Feitiço Senha, Livro Padrão de Feitiços 4ª Série – e afastou-se dos arbustos que agora escondiam o corpo de Pedro, dizendo as seguintes palavras – Agora tudo vai mudar.
E como mudaria. Enquanto esperava o efeito da azaração desfazer-se sobre o meu corpo, avistava um sorridente Snape aproximar-se de um grupo de alunos ao longe, dizendo: Vocês não sabem da mais nova sobre o Remo Lupin, sabem?
Notas Finais: (além de conter notas do autor, há também os pensamentos, detalhes e opiniões pessoais de cada maroto sobre os diversos acontecimentos do conto).
# Gente, em primeiro lugar quero apontar as diferenças entre o romance Harry/Cho e Lupin/Lílian. A Cho Chang, ao meu ver, gostava do Cedrico Diggory e sentia a sua falta, achando-se, dessa forma, culpada ao também ter algum interesse por Harry e ficar com ele. O que é diferente da suposição de Remo Lupin. Segundo a hipótese de Lupin, por Lílian gostar de mais de um garoto, ela sente-se dividida e, até mesmo, num conflito interno, sem entender se está fazendo certo ao gostar de um e ficar com outro ou de beijar um pensando no outro ou, até mesmo, se não estaria traindo aquele que estivesse ficando ao ter o seu amor dividido por dois. Bem, mas é claro, isso tudo, até então, não passa de suposições; eu apenas quis esclarecer as diferenças antes que pudessem surgir acusações de plágio, ou algo do tipo.
# Enfim, como prometido, um conto com romance incluso! Sirius, seguindo o conselho de Lupin, consegue reconquistar a sua garota, Francy. Remo, porém, mergulha-se num conflito interno e vê-se sem entender o que é o amor, chegando a questionar se o que há entre ele e Lílian pode mesmo ser esse tal sentimento. Bem, só o tempo irá dizer.
# Snape armou uma cilada para Pedro Pettigrew. O maroto procurava por Remo, Sirius e Tiago quando foi alertado por um aluno da Sonserina de que os seus amigos estariam próximos daquele grupo de arbustos. Claro que o aluno mentiu a pedidos de Snape, que já esperava a sua vítima, escondido entre aquele mar de folhas verdes. Estuporando o garoto, Snape utilizou um Feitiço Espada, abrindo um ferimento em sua cabeça e ameaçando cortar-lhe o pescoço se Pedro não contasse tudo que ele pedisse.
# Mais uma nota sobre Snape. Ele só armou a tal cilada por um simples motivo: ficou sabendo, através do fantasma do Barão Sangrento (que encontrara o zelador Argo Filch caído nos jardins), que os Marotos haviam se aventurado pelos territórios do colégio na noite anterior. Como já possuía um acúmulo de desconfianças, resultante da observação da aparência de Remo Lupin todo mês logo após o período de lua cheia, Severo Snape soube somar as informações e deduzir o caráter lupino do nosso maroto. Ameaçar Pedro Pettigrew foi a forma de confirmar o seu achado.
Bem, as notas aqui encerram! Espero que tenham curtido mais este Conto Maroto e até a próxima aventura!
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