Meu pai
Falando nele, procuro me lebrar dele e juro por Deus que não consigo. As vezes, nem sei se usava bigode ou não. Ou melhor, parece que usava e tirou depois que se juntou com a vagaba do escritorio e se mandou de casa.
O engraçado é que da vagaba eu me lembro direitinho: Uma loira peituda de cabelos ondulados, que podia ser filha dele.
Conheci ela num dia em que não sei porque, fui procurar por ele no banco. Ah, me lembro, estava a fim de descolar uma grana, isso ele tinha de bom: pelo menos naquela época nunca me negou dinheiro. Pois então, liguei pra ele e fui ao escritorio. Quem me atendeu foi a tal da loira, quando perguntei por ele ela me encarou sorrindo e disse: _ Ah, então você é o filho do Dr. Arthur...
Ela se levantou e foi rebolando em direção á sala dele. Lembro que usava uma minissaia preta bem curta e justa. Eu devia ter uns dezesseis anos, só havia saído com algumas garotas e ficado só no amasso, e então pensei como seria legal transar com uma garota daquelas.
Depois descobri que eles eram amantes. Foi por acaso. Um dia estava dando umas bandas pela Faria Lima, quando num semáforo vi o Toyota dele. Passei pelo carro e o flagrei dando um beijo nela. Na hora não deu pra ver direito, pensei até que podia ser outra pessoa, mas o Toyota vermelho era mesmo o do meu pai, e a vagaba, bem eu reconheceria aquela vagaba em qualquer lugar.
Pra não dar bandeira eu, que ia atravessar a rua, recuei pra calçada. O sinal abriu, ele se mandou, e eu fiquei parado um tempão na esquina da Faria Lima. Depois deixei pra lá e continuei a andar, mas confesso que fiquei chateado com aquilo. Não contei pra ninguém o que tinha visto e acho que fiz bem, afinal pra quem eu contaria? Pra Gina? Pra minha mãe?
O engraçado é que hoje não lembro quase mais nada dele. Depois que foi embora de casa nunca mais o vi,ou melhor, vi uma vez. No inicio ainda fazia umas ligações apressadas, dizendo que andava ocupado e que nas férias viria pra ver a gente. Mas eu sabia muito bem porque ele não viria tão cedo: o coroa tinha dado um desfalque no banco e estava sendo procurado pela policia. O nome dele, pra nossa vergonha tinha até aparecido nos jornais, o dele e de mais uns cinco ou seis pilantras.
_ Por causa daquela vagabunda! -mamãe costumava dizer cheia de ódio, botando a culpa de tudo na loira.
Quem sentiu de verdade a falta dele foi a Gina. Quantas e quantas vezes não a peguei chorando no quarto. Como ela é meio durona, quando me via disfarçava e fingia que não estava chorando. Acho que até hoje não aceita que o velho abandonou a gente. Isso porque ele parecia muito ligado á ela, nas poucas vezes em que estava em casa, pegava ela no colo e fazia umas brincadeiras meio bobas tipo, ele a beijava e perguntava:"cadê a piquinininha do dédi?" Quando viajava fazia questão de trazer o melhor presente pra ela, pelo menos eu achava que era assim.
Nunca fui muito chegado á ele. Acho que sempre desconfiei que ele era um pilantra. Sei que é duro falar assim do pai da gente, mas se acho que sou um idiota porque não achar que ele, que fez coisas piores do que eu, é um pilantra?
Mas como dizia: Gina foi quem mais sentiu de verdade, porque gostava mesmo dele. Mamãe, não, acho que sentiu porque ele largou dela e se mandou com uma garota quinze anos mais nova. Falando a verdade, nunca me lembro de ter visto meu pai fazer um agrado pra minha mãe. Por isso, sempre desconfiei que o casamento deles não ia nada bem. Acredito mesmo que há muito tempo desconfiava que a mamata ia acabar: o chofer, as empregadas, as ferias em Angra, a minha mesada e a casa com piscina.
E deu no que deu: o coroa se mandou com a vagaba, e mamãe, que nunca havia feito nada na vida, a não ser uma faculdade vagabunda, teve que começar a trabalhar. E acho que é aí que minha historia começa de verdade.
Começa de verdade, porque foi depois que a gente vendeu a casa e foi morar num apê no Jabaquara...Espera aí, antes do apê do Jabaquara teve o de Pinheiros, que era bem maior. Pelo menos, a Gina e eu tínhamos um quarto pra cada um. Naquele tempo, continuamos a estudar nmo Pio XI, e mamãe que achava que o dinheiro da venda da casa ia durar pra sempre, nem pensava em trabalhar... O negocio dela ainda era combinar programa com as peruas, ir ao shopping comprar roupas, sapatos, como se nada tivesse acontecido e meu pai ainda bancasse a gente.
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