Esfriando...



Quando Hermione chegou de volta em seu país no outro dia, esperou em vão pelo noivo. Em casa ela olhava para a porta de cinco em cinco minutos, ansiosa e com o coração apertado de saudade. Várias pessoas vieram vê-la, mas nunca era ele. “Deve ter ocorrido algum problema que o impediu”, pensou Hermione, decidindo esperá-lo amanhã. Foi dormir meio chateada, mesmo assim.


Mas tampouco no outro dia Ron deu sinal de vida. Hermione esperava-o para o almoço. Perguntou a Ammy sobre ele e esta disse que não sabia. Nem de Harry obteve informação. Desta vez ficou aborrecida mesmo. Decidiu ir à casa dele a noite, para vê-lo.


— Ele não está, Hermione – disse-lhe a Sra Weasley. – Disse que ia à casa de um amigo, não falou qual. Até pensei que era a sua. Quem sabe ele não aparece lá mais tarde? – a sogra animou Hermione.


Hermione foi pra casa com essa esperança. Mas em vão. Nem a sombra de Ronald Weasley passara por lá. Decidiu-se a procurá-lo no trabalho, mas não houve oportunidade porque a rotina no PD estava muito cheia. Então ela ia de noite à Toca, mas ele nunca estava. Depois de uma semana nisso, a Sra Weasley falou:


— Olhe, Hermione, vou lhe dizer a verdade: ele está aí, mas pede para eu dizer que não está porque não quer vê-la – contou a mulher, vermelha. – Só que eu acho que o que ele está fazendo com você não é direito. Vá lá em cima tirar satisfações com ele – estimulou a mãe de Ron, chegando para o lado para que Hermione entrasse. Esta deu alguns passos determinados, mas desanimou antes de chegar à escada.


— Deixe pra lá. Amanhã eu falo com ele, agora estou muito cansada, não quero me estressar – disse, abalada. A Sra Weasley olhou-a com pena.


— Isso, querida. Vá descansar, então. Durma bem – murmurou gentilmente. Quando Hermione foi embora, ela subiu para falar com o filho. Abriu a porta do quarto dele e postou-se em sua frente de braços cruzados. Ele estava lendo, e olhou para a mãe interrogativamente. – Hermione esteve aqui novamente – ela disse.


Ron baixou de volta os olhos para o livro, resmungando um “Hum”.


— Você está tratando muito mal essa moça. Se não quer continuar com ela, vá e termine decentemente, pare de fugir. Seja o homem que eu te criei pra ser – repreendeu a mulher. – Mas eu já vou avisando – ela tinha ido até a porta e voltou-se para acrescentar isso – que se arranjar outra, é bom que ela seja melhor que a Hermione. Qualquer coisa abaixo disso e eu vou fazer ela desejar nunca ter te conhecido – Molly saiu, batendo a porta com tanta força que os pôsteres do Chudley Cannons estremeceram. Ron jogou o livro longe e suspirou, tapando o rosto com as mãos. Relanceou o olhar para a foto de Hermione, que tinha junto com algumas outras sobre seu criado mudo. Virou-a sobre a mesa. Nem isso poderia ficar ali. Ele não sabia o quanto se estendia a vigilância, a impressão era de que aqueles olhos castanhos e finos o perseguiam por toda parte.


Ron levantou-se e puxou uma mala de sob a sua cama. Abriu o armário e começou a tirar de lá uma quantidade de cartas, álbuns, cartões – qualquer coisa que tivesse um vestígio da letra ou do rosto de Hermione. Colocou tudo na mala, e saiu pelo quarto e pela casa à caça de coisas do tipo. Por último pegou as três fotos que tinha sobre o criado mudo. Sem ligar para a pieguice do ato, beijou a última e fechou a mala, colocando-a de volta sob a cama. Sentia-se febril e tinha medo de falar dormindo. Isso não aconteceu. Ele não se animou a descer para jantar. Foi dormir com dor de cabeça.


— Harry, você fica com isso aqui pra mim? – pediu Ron, que chegara no QG carregando uma maleta. – Guarda lá na sua casa?


— Claro – murmurou Harry, pegando a mala e colocando-a sobre sua mesa. Começou a puxar o zíper, mas Ron deteve sua mão.


— São coisas da Hermione – disse Ron, em tom contrariado. Tinha as orelhas vermelhas. – Não posso ficar com isso, mas não queria jogar fora – justificou-se.


— Ah, sim – e Harry não comentou mais nada, em respeito.


— Tem mais uma coisa – falou Ron, depois de uma pausa. – Preciso que dê um recado meu a ela. Diga-lhe que... eu não quero mais saber dela. Foi bom enquanto durou mas não dá mais. Que ela se considere livre pra seguir sua vida e que eu espero que sejamos bons amigos mesmo assim – Ron repetiu todo o discurso que tinha preparado. Harry estava bastante contrariado.


— Ah, Ron, fala sério... Não quero fazer isso. É sacanagem, mandar recado. Ela vai ficar muito mal – protestou Harry.


— Mas é necessário, Harry. Ela precisa ficar sem querer saber de mim de uma vez; essa é a forma mais segura. Ela tem que parar de ir lá em casa.


Harry suspirou. Odiara a tarefa, mas a cumpriria. No almoço. Encontrou Hermione e Ammya. Eles conversaram coisas básicas por algum tempo. Harry notou o abatimento de Hermione e teve vontade de contar tudo. Mas conhecia a garota, ele e Ron já haviam considerado essa possibilidade. Não era prudente. Não demorou muito e ela perguntou o de praxe:


— Como está o Ron? Onde ele está?


— Lá no escritório, eu acho. Está bem – Harry respondeu, de má vontade. Corou e olhou para a mesa, reunindo coragem para continuar. – E... ele te mandou um recado... disse que... – e Harry repetiu o que Ron falara.


Hermione e Ammy ficaram olhando para ele, em choque.


— Como? – murmurou Hermione, num fio de voz.


— Por favor, não me obrigue a repetir – pediu Harry, incomodado.


— Mas ele não pode fazer isso com a Hermione! – exasperou-se Ammy. Hermione olhava para frente, com ar parado.


— Eu não acredito... mandar recado!... – estava indignada. – Não pode ser... – não fazia o menor sentido para ela.


— É ridículo! O que você vai fazer, Hermione? – perguntou Ammya.


— Não quero vê-lo nunca mais – esta respondeu, levantando-se. – Pra mim Ronald Weasley morreu.


— Espera, você não pode deixar por isso mesmo, Hermione – Ammya levantou e pôs-se no caminho da prima. – Ele precisa ouvir umas verdades pra ver se vira homem. Se você não for eu vou, mas não vai ter o mesmo efeito.


Hermione olhou para ela com os olhos fora de foco. Finalmente voltou a si, ficando vermelha.


— Tem razão – disse. – Vou lá tirar satisfações.


— É melhor não, Hermione... Pra quê? Você vai se chatear ainda mais... – desencorajou Harry, tentando evitar que ela chegasse perto de Ron por causa do maluco. Não sabia se Ron conseguiria mostrar-se firme na presença dela.


— Qual é a tua, Harry? – indignou-se Ammy. – Vai dizer que está do lado dele mesmo agora?


— Não, é que... – enquanto ele falava, Hermione sumira. Estava no corredor do QG, quase vazio na hora do almoço, caminhando determinada. Abriu a porta do cubículo de Ron com estrondo. Só não o pegou desprevenido porque, como um cachorro, ele sentiu o cheiro dela, e teve tempo para preparar uma cara de indiferença. O rapaz ergueu os olhos para ela, inquisitivo. Ela demorou um pouco para associar o que dizer.


— Recebi seu recado – falou, secamente, um momento depois.


— Bom. Esse era o plano – aprovou o rapaz. – E o que quer agora?


— Entender – ela respondeu, irritando-se mais. – A estupidez e os motivos.


— Ora, você me conhece. Pensei que já soubesse de uma tanto quanto dos outros – ele retrucou, fiando-se no tom porque não tinha o que dizer.


— Não há motivos. Você é maluco – desdenhou Hermione.


— Ah, não? – questionou ele, com ar irônico.


— É a sua ciumeira irracional novamente? – ela perguntou, seca.


— Depois se finge de inocente... – Ron resmungou, olhando para o lado.


— Ah, quer saber: vá se danar! – exclamou Hermione. – Não vim aqui para ouvir, mas para falar que você é um idiota, um covarde que nem tem a coragem de dizer suas tolices na cara das pessoas, tem que se valer de mensageiros e insinuações. Eu esperava mais do grande auror Ronald Weasley! – ela alterou-se, ironizando e gesticulando. – Só quero te avisar que não venha rastejar atrás de mim como você costuma fazer, porque agora eu é que não quero mais saber de você, não quero te ver nem pintado de ouro. Nunca mais apareça na minha frente! – Hermione terminou o discurso aos gritos, contendo as lágrimas com muito custo. As orelhas de Ron estavam vermelhas (ele não conseguia controlar isso), mas sua expressão permanecia dura e fria ao olhar pra ela.



— Mais alguma coisa? – perguntou, em tom seco e cerimonioso.


Hermione, explodindo de raiva, não conseguiu falar nada. Tirou o anel de noivado de jogou-o no chão, saindo aos tropeços, apressadamente. Agora olhares a seguiam, porque muita gente já voltara do almoço. Ron botou o anel no bolso e afundou a cabeça nos braços. Hermione só parou em sua sala, no PD. Passou chispando pelos colegas e desabou na cadeira, escondendo o rosto nos braços e chorando. Wilfred entrou na sala dela.


— Está atrasada, Hermione! – disse, de bom humor. Então notou o estado dela. – O que houve? – perguntou, ternamente, abaixando-se para falar mais de perto.


— Eu e Ron terminamos – contou, após breve hesitação, com a voz abafada porque mantinha a cabeça nos braços. A primeira reação de Wilfred foi pensar “Oba!Finalmente!” e seu rosto se iluminou; mas então ele ficou com vergonha de ser tão egoísta. Ela estava muito triste, e realmente doía vê-la assim.


— Pobrezinha... – murmurou o rapaz, acariciando de leve uma mecha do cabelo dela. – Você quer is pra casa? Eu te levo lá, dou um jeito de cobrir sua falta depois – ofereceu o rapaz. Hermione ergueu os olhos vermelhos para ele. Odiava incomodar, mas estava muito tentada a aceitar o oferecimento dele.


— Ai, acho que eu vou, Will – ela murmurou. – Não vou conseguir trabalhar assim... Desculpe, eu te cubro outro dia, mas é que era tanto tempo... entende?


— Que é isso, Hermione, sem problemas – Will sorriu de leve pra ela. – Vem, eu te levo em casa – ela estendeu a mão para ela.


Hermione acompanhou-o docilmente. Apesar de estar com pena dela, Wilfred não ia perder a oportunidade. Pediu pra sair com ela no dia seguinte.


— Hermione... Bem... Será que você não gostaria de sair comigo amanha? Sei que não é o momento, mas... Seria bom pra você se distrair um pouco... Desanuviar a cabeça... – começou Wilfred.


Primeiramente ela pensou em recusar. Não estava com cabeça. Mas depois a raiva de Ron foi mais forte.


— Eu adoraria. Mesmo. Me pegue aqui às dezenove horas.


— Okay. Agora vou deixar você descansar... – Wilfred beijou o rosto dela. – Até amanhã, Hermione.


Hermione sorriu pra ele e entrou. A moça foi direto para o quarto e jogou-se na cama, chorando, como qualquer uma faria. Estava tremendamente magoada e isso alternava com uma raiva muito, muito profunda de Ron.


Lá pelas quatro da tarde ela cansou de tanto chorar e virou-se de costas na cama. Abriu o armário e convocou um livro com acenos de varinha. Quando reconheceu o exemplar, lançou-o com raiva do outro lado do quarto. Era o que Ron lhe dera em seu último aniversário. Era um livro raro, mas Hermione nem se deu conta disso na hora. Pegou outro e não conseguiu ler. Levantou-se e desceu.


Hermione não almoçara, mas não estava com fome, a não ser de vingança. Mas abriu a geladeira mesmo assim, tirou sorvete, bolo, esquentou uma lasanha, fritou bifes, hambúrgueres, e levou tudo para a sala, junto com bebida energética. Ligou o som e deixou o CD que estava nele (Sonata Arctica) tocando enquanto comia, planejando seu encontro com Wilfred no dia seguinte, decidida a fazer tudo aquilo que ela sabia que mais irritaria Ron se ele visse. Nada disso a consolava, porém, e ela foi ficando mais amarga a cada minuto que passava.


Quando a mãe de Hermione chegou as 18:30, encontrou a filha deitada de qualquer jeito no sofá, rindo como uma maluca, e brincando com a varinha. A sala estava cheia de pássaros se esborrachando nas paredes e batendo uns nos outros, uma música repetia no último volume e o chão estava uma nojeira com os restos de tudo que Hermione comera (e passara mal). A pele da garota estava verde.


A Sra Granger teve uma considerável dificuldade em ajudar a filha, pois quando tentou controlá-la, esta deu uma crise de histeria. Tinha acabado de conseguir tirar a varinha de Hermione quando o Sr Granger chegou. Eles levaram a filha para o pronto socorro, onde não puderam fazer muito por ela além de dar um remédio para passar o mal estar. Na volta para casa, Hermione estava acabrunhada e não queria falar. Proibiram-na de sair até que contasse o que acontecera e de ir trabalhar no dia seguinte. Ela ligou para Ammy e pediu que esta avisasse Wilfred que não poderia sair com ele.


Hermione passou o dia todo em casa, de pijama, o que não foi exatamente bom pra ela, embora ela não tivesse cometido mais nenhuma besteira. Ficou deprimida e melancólica, e apesar da mãe ter feito companhia a ela, não conseguiu animá-la ou arrancar dela o que a deixara assim (embora a ausência prolongada de Ron, que antes sempre os visitava, a fizesse desconfiar).


A moça foi dormir às dezenove horas. Acordou com um barulho no jardim, levantou-se e, de varinha em punho, abriu a janela. Entre uma harpa e um alaúde encantados, tocando melodias suaves, estava Wilfred Reed, que acenou pra ela e sorriu, antes de começar a cantar a música preferida de Hermione: .
Ela sorriu e deixou-se ficar ouvindo, apesar da música lembrar-lhe Ron, e o lugar onde Will estava, também. Escutava com uma mistura de prazer suave e aperto no coração. Logo seus pais apareceram no quarto para ver o que estava acontecendo (e Hermione acenou para Will fingir que estava tocando os instrumentos).


— Nossa, o que o Ronald vai achar... – ia começando o Sr Granger ao ver o poeta cantando, mas a mulher lançou-lhe um olhar fulminante.


— Não estou nem aí para o que o Ron vai achar – disse Hermione, friamente.


— É meia-noite, não podemos deixar esse rapaz na rua, vamos chamá-lo para tomar um café – disse a Sra Granger. Hermione disse para que Will desse a volta na casa e ela e a mãe foram recebê-lo na porta.


No dia seguinte, todos os que conheciam Hermione e Will já sabiam da visita noturna dele. As mulheres comentavam (“Tão fofo!”). Ammy, vendo Ron passar ali perto, alteou a voz com que contava sobre Will para uma colega.


— E se quer saber, ele é muito melhor que os antigos namorados de Hermione, porque é sensível e gosta dela. Não faz o meu tipo, mas é um cara legal. Hermione não sofreria com ele.


Ron entrou em seu escritório sem cumprimentar as meninas. Mas que raiva, o poeta já tinha avançado! Que vontade de estrangulá-lo! “Também, nem posso reclamar, depois de tudo que eu disse. Tem que ser assim mesmo, já que comigo ela não pode ficar. Pelo menos está perto. Eu posso vigiar, e se ele pisar na bola com ela, quebrá-lo todinho”. Com esse pensamento Ron acalmou-se o suficiente para manter o autocontrole, apesar do ciúme continuar consumindo-o.


Ele almoçou quieto, no Caldeirão Furado. Hermione chegou um pouco depois e sentou-se sozinha no balcão. Ron a observava de vez em quando. Ele pagou a conta e saiu e logo ouviu passos atrás de si. Virou-se pensando que finalmente ia poder pegar aquele baixinho folgado com tendências assassinas, mas era Hermione.


— O que você quer? – perguntou Ron, rudemente.


— É só que... – Hermione disse, tímida. – Bem, você talvez tenha ouvido falar que o Will foi lá em casa e, bem, talvez tenha pensado... Eu não estou com ele, nós apenas... – Ron interrompeu-a.


— Eu não quero saber do que você faz ou deixa de fazer, eu não me importo, isso não me diz mais respeito. Nem me interessa. Eu só fazia questão antes porque se você me traísse mancharia minha honra. Entende? Sempre fui eu, nunca você. Agora vai trabalhar, vai, me deixa em paz – ele deu as costas a Hermione e aparatou. Ela chegou ao Profeta abatida, novamente, mas não deu nenhuma crise.


Pouco depois Harry foi levar uns relatórios para Ron e encontrou o amigo quieto, com o olhar parado em frente e cara de mártir.


— O que houve? – perguntou.


— Estava pensando naquele caso... – Ron respondeu, escrevendo algo no papel à sua frente sem olhar. – Isso te diz alguma coisa? – questionou, batendo no papel com a pena. Harry se aproximou. Estava escrito “Fui um nojento de novo”. Harry bateu no ombro do amigo.


— É bem claro. Mas se acalma, cara, nos vamos resolver.


— Tem que ser logo. Daqui a pouco as coisas vão ficar irreversíveis – queixou-se Ronald, comprimindo o rosto com as mãos.


— Tenho boas notícias pra você – Harry tirou um dos papéis do meio da pilha que trazia e entregou-o a Ron. – A lista de ex-alunos – cochichou.


Como quase a única pista que eles tinham sobre a identidade do “ameaçador” era sua pouca idade (não tinham conseguido permissão para interrogar Vitória), resolveram investigar os rapazes que tinham terminado Hogwarts no ano anterior.


— Droga, não tem fotos! – exclamou Ron.


— Essa é a parte ruim. Vamos ter que investigar um por um.


— Grifinória não é, se não eu lembraria dele do Salão Comunal. Vamos começar por Sonserina – Ron determinou, por pura antipatia, afinal o rapaz não demonstrara sinais de orgulho puro-sangue, mas de maluquice. Depois pensou melhor. – Ou Corvinal – disse. – Temos que admitir que ele é bem inteligente.


— Sim, o trabalho é duro. Mas já é um começo – disse Harry. – Anime-se.


Ron sorriu fracamente. Os dias foram passando, e as coisas estavam na mesma. As investigações progrediam com lentidão, porque tinham que ser feitas no intervalo do trabalho, que não era pouco, e além disso eles não se aventuraram a contar pra ninguém sobre isso, porque era ridículo demais para acreditarem. As únicas pessoas que acreditariam (Ammy, Gina, Hermione) eram mulheres e estariam em perigo se se metessem no caso.


Wilfred Reed não se aventurara a pedir Hermione em namoro, pois sabia que ela não aceitaria. Mas eles circulavam juntos para todo lado, e ele tinha liberdade de ser mais carinhoso com ela, abraçando-a, pegando sua mão ou beijando seu rosto a toda hora, porque ela não esboçava reação. Ela estava do mesmo jeito que ficara no sexto ano de Hogwarts, oscilando entre raiva e tristeza. Quando se encontravam algumas vezes, por causa do trabalho, Ron era extremamente profissional e fingia não ter conhecimento da presença dos jornalistas, mesmo quando Wilfred enlaçava sua Hermione pela cintura com o pretexto de mostrar-lhe o melhor ângulo de alguma foto. No almoço no CF, Ron observava Will e Hermione de esguelha, fingindo desinteresse. E por vezes, na outra mesa, Hermione esquecia de responder alguma pergunta de Wilfred, ocupada em observar as costas de Ron. Algumas vezes seus olhares se cruzaram, e foi isso mais a angústia que a torturava que fez Hermione decidir esquecer todas as ofensas, perdoar e ainda humilhar-se voltando a correr atrás dele.


Tentou puxar conversa na rua, mas ele nunca ultrapassava um aceno polido de cabeça. Foi à casa dele mas ele sempre estava no Harry. Se ela ia no Harry, não dava um minuto e Ron arranjava uma desculpa e ia embora. E quanto mais sofria, mais Hermione sentia que precisava dele. Não tinha intenção de procurá-lo no trabalho, por causa do que ocorrera da primeira vez, mas não teve escolha. Foi ao QG uma manhã bem cedo, antes de ir para o Profeta.


— Ah, não – exclamou Ron, ao vê-la entrar, contrariado mas não pelos motivos que ela imaginava. Não pudera pressenti-la desta vez porque ela parara de se cuidar desde sua última briga, inclusive de usar perfume.


— Você disse que seríamos bons amigos – ela disse, após hesitar um instante. Ele levantou-se e deu as costas à moça, mexendo em uns papéis. – Eu queria pelo menos isso – Ron demorou um pouco para responder.


— Era pra ser assim; mas não dá se você fica o tempo todo andando atrás de mim, como um agouro – ele rosnou. – Nós terminamos, Hermione. Será que isso não entra na sua cabeça?


— Sinceramente, não – ele falou, adiantando-se um passo. – Porque não entendo. Passei esse tempo todo remoendo cada defeito meu, cada falha minha, e não fui capaz de encontrar uma que pudesse te dar motivo para me tratar do modo como me tratou.


Ronald voltou-se para ela. Aquela atuação lhe exigia um esforço descomunal, especialmente porque ele sempre fora franco e mais transparente até do que gostaria. Retrucou, com desprezo:


— Porque não havia um motivo para encontrar, Hermione. Você é tão inteligente, me admiro que não tenha percebido – ele deu um risinho nojento e abriu os braços. – Eu enjoei – ele disse. – Será que um cara não tem o direito de enjoar? Nunca foi “pra sempre”, Hermione; você acreditava mesmo nisso? Eu dizia o que você queria ouvir! – o rapaz zombou. – Você ficou bonitinha, gostava de mim, eu resolvi aproveitar pra curtir um pouco. Mas agora cansei. De você, da sua conversa, da sua cara, dos seus beijos... – enumerava Ron, sentindo todo o corpo formigar com a proximidade da garota. – não queria dizer, mas você não me deixa em paz.


Hermione aproximara-se mais dele. Juntando toda a coragem e o pouco de amor próprio que lhe restava, ela chegou o rosto bem perto do dele e murmurou, no tom mais doce de que era capaz:


— Tem certeza? – foi o momento mais difícil para Ron. Por mais que desviasse os olhos só via o rosto dela diante de si. Todas as células pareciam ter recebido a ordem “Beije-a”, e ele sentia-se lutando contra um touro enquanto tentava conter-se. Um segundo e ele recuou.


— É claro que eu tenho – disse, rude. – Vá para o seu trabalho e me deixe fazer o meu. Vá embora – ele pegou-a pelo ombro e empurrou-a para fora, trancando sua saleta em seguida.


Quando Hermione tinha desaparecido no corredor, totalmente derrubada, Ron saiu de seu cubículo, pálido, e atravessou o corredor cambaleando para o cubículo de Harry.


— Por favor, me ajuda – ele pediu, jogando-se em uma cadeira, com os olhos fechados, e puxando os próprios cabelos. Estava branco como cal. Harry assustou-se. – Ou eu vou descer, agarrar aquela garota, beijá-la e não soltá-la, e dane-se se a matarem porque eu morro junto. Por favor, me tranca aqui – Ron murmurou.


— Calma, cara, calma – Harry trancou a porta com um aceno de varinha e pegou um chá da garrafa térmica sobre a mesa, dando para o amigo, que derramou metade no colo.


— Meu Deus, como isso é difícil! – exclamou Ron. – E eu lembro ter ainda te importunado quando você teve que terminar com a Gina por causa do Voldemort... Desculpa, Harry, agora eu sei como fui um idiota...


— Também já fui um idiota com você, então não se preocupe.


— Quando eu penso que poderá ser pra sempre assim... – Ronald suspirou, desesperançoso. As investigações não estavam rendendo muito. Todos os rapazes procurados eram só frangotes recém-passados nos NIEMs, nada de especial, nada de especial. Havia ainda alguns garotos a procurar, mas eles não pareciam ser promissores; a maioria era da Lufa-Lufa, inclusive. Ron completou: – Eu acho que vou me mudar pra Argentina, Austrália ou Alasca pra não ficar sempre nessa...


— Anime-se – disse Harry. – Se for vai levá-la como esposa.


— Ah, já nem acredito mais que seja possível.


— Pois vai ser logo. Ontem de noite trabalhamos até tarde, eu fiquei aqui também; estávamos desfazendo os feitiços para abrir o diário de registros da Vitória. Finalmente conseguimos. Ela administrava, mas a rede que fazia o transporte dos produtos era enorme. Na lista de nomes, e em boa quantidade de registros das obtenções de ovos de dragão, aparecia um tal Poldek Zatz, que trazia a mercadoria da Polônia. Os vendedores deviam ser romenos, que cruzavam a Eslováquia para levar os ovos na casa dele. Esse tal Poldek é o mesmo cara... – e Harry apontou um nome na lista de ex-Lufa-lufas: “Leopold Zatz” – que esse aqui. Poldek é apelido de Leopold. Aposto como ele foi transferido de Durmstrang depois que nós saímos de Hogwarts. Por isso você não lembra dele. Não tenho certeza mas é uma questão de meia hora para conseguirmos essa informação. Sendo o mesmo, o Ministério com certeza apoiaria a captura, já que estão atrás dele.


— Então vamos pegá-lo – gritou Ron, pondo-se de pé. Olhou em volta, então, receoso de ter chamado atenção não desejada.


— Não se preocupe, os feitiços de proteção aqui estão ok, ninguém escutou. Mas não podemos nos precipitar, Ron. Lembra que ele é esperto. Vamos fazer as coisas devagar, planejadamente – Harry falou.


— Precipitar, Harry? Depois do que eu disse hoje para a Hermione vai ser uma sorte se eu conseguir que ela olhe na minha cara de novo. Demorar só vai piorar as coisas.


— Você conta pra ela o que aconteceu. Ela vai entender, vai te perdoar.


— Não vou fazer assim – disse Ron. – Não posso simplesmente humilhar uma garota e desprezá-la por cerca de um mês, depois dar uma justificativa e voltar tudo ao normal, quaisquer que tenham sido meus motivos para tratá-la assim. Você devia ter ouvido o que eu disse... Na verdade, ainda bem que não ouviu, pois como é amigo dela me daria uma surra merecida. Quero conquistá-la novamente, pouco a pouco. Eu magoei tanto ela que tenho vergonha de encará-la. Mas isso fica pra depois. Agora vamos sair e pegar o miserável.


— E como vamos fazer isso? Você tem um plano?


— Não... – Ron desanimou, mas não desistiu. Pensou um pouco. – O único jeito de fazer ele aparecer é eu sair com uma garota.


— Não vou me vestir de mulher de novo! – protestou Harry.


— Nem adiantaria, ele não se engana com isso. Precisamos de uma mulher de verdade, que seja corajosa. Mas quem?


Os dois trocaram um olhar, e pensaram a mesma coisa ao mesmo tempo. Saíram correndo em busca de Ammy. Ela conversava com Petter. Eles a puxaram sem mais para a sala de Ron, atropelando-se nas explicações.


— Chega! – exclamou Ammy, colocando as mãos nos ouvidos. – Fale um de cada vez. Harry, o que vocês querem? – ela evitava olhar para Ron por causa do que ele fizera à prima. Estava com raiva.


Harry contou a história, primeiro por cima, depois acrescentou detalhes. Ammy boquiabriu-se. No fim olhava Ron penalizada.


— Pobrezinhos... Por que você não contou tudo pra ela? Ele iria entender.


— Podia até entender. Mas eu conheço Hermione. Ela ia querer dar uma de corajosa e ficar comigo sem ligar para os riscos. Não ia aceitar terminar. Se já estava com dificuldade para isso apesar das minhas grosserias... – ele falou.


— Tem razão. Eu provavelmente também agiria assim – Ammy considerou. – Com o George, quero dizer, claro – completou.


— Então, vai nos ajudar? – Ron questionou, pressuroso.


— Com certeza – falou Ammy. Então corou. – Só que... eu e o George estamos indo tão bem que... eu gostaria de pelo menos deixá-lo de sobreaviso, para evitar as confusões que essas coisas costumam provocar.


— Então vamos logo falar com ele – apressou Ron. – Acho que podemos fazer isso agora em horário de trabalho. É uma espécie de missão, não é?


— Espera – pediu Harry. – Precisamos de mais gente. Você e Ammy vão estar ocupados atuando. Eu posso cobrir uma saída, ou até duas próximas, mas e o resto? – ele levantou a questão. Ammy, sem hesitar, abriu a porta e, com um aceno de mão, chamou o primo, que ainda estava pelo corredor. Ele se aproximou.


— Está a fim de uma hora extra, Pit? – ela questionou.


— Opa, sempre – disse o garoto. – Gosto do trabalho. O que tenho que fazer?


Eles contaram a situação para ele também, com menos detalhes.


— Tô dentro – disse Petter. – Inclusive conheço o lugar perfeito para isso. Há um restaurante trouxa de comida francesa, bem aberto e com mesas na calçada, agora no verão. Em frente há um pub em que sempre vou com meus amigos, bem cheio, perfeito para se esconder. Eu posso ficar lá.


— Ótimo – concordaram os outros. Ammy acrescentou: – Vou fazer a reserva já por telefone e depois vamos na Gemialidades – e ela saiu com Petter. Meia hora depois estavam todos os quatro na loja de George.


— Oi, amor, que surpresa agradável – o garoto recebeu-os, abrindo os braços para a namorada. – A comitiva pode ir embora – acrescentou, zombador.


— Para, George – Ammy riu e bateu no braço dele. – Vamos lá pros fundos, precisamos falar sério com você – ela pediu.


— Por quê? Eu não tenho segredos para as minhas prateleiras – ele protestou, afetando um ar ofendido.


— George... não complica... – Ammy olhou-o de lado, com um pequeno sorriso. O rapaz tocou o rosto dela.


— O que você me pede sorrindo que eu não faça chorando? – brincou, e abriu a porta para os fundos da loja, dispondo-se a ouvir os aurores.


Dali a alguns minutos, seus funcionários ouviram um expressivo e sonoro:


— Ah, não! – dizia George. – Nem pensar. Sem chance. Não vou emprestar minha namorada para o Roniquinho Monitor, nem de brincadeira. Não, não – negou George, repetidamente. – Problema teu se a Hermione te deixou. Tu é que não soube cuidar; agora se vira.


— Não seja tão insensível! – repreendeu Ammya, exasperada. – É um trabalho, George. Puro fingimento, eu não vou te trair.


— Sei que não. Mas tinha graça, esse panaca do Ronald não quer arriscar a garota de que ele gosta, vai e bota a minha em risco de morte. Engraçadinho! – ironizou o rapaz, irritado. – Nada feito.


— Olha, eu não vim aqui pedir autorização, apenas te avisar – irritou-se Ammy, – porque fazer isso eu vou de qualquer jeito. Agora já avisei. Passar bem – e Ammy adiantou-se para a porta. George segurou o braço dela.


— Aaaah, droga! – exclamou. – Tá – consentiu. – Mas eu vou estar lá perto. Quero o endereço do lugar para já ficar por ali.


— Por quê? Como você vai fazer isso? – Harry questionou.


— Não interessa. Eu dou um jeito – o rapaz puxou Ammy para perto de si, e encostou o nariz no dela. – Não fica muito perto do Ron, ok? – pediu, em tom suplicante. – Pra não se contaminar... com a imbecilidade e todo o resto...


— George... – Ammy repreendeu, rindo. Ron olhou feio para o irmão, mas esse beijava Ammya e nem notou.


 

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