O Acidente - PoV Rose
Ouvi Scorpius gritar alguma coisa antes que pudesse bater a porta na cara dele. Não entendi muito bem, mas também nem me importav; só queria sair dali o mais rápido possível... Abri a bolsa e encontrei a chave do carro. Ótimo, precisava mesmo dar uma volta e esfriar a cabeça para depois conseguir olhar para a fuça do meu marido loiro aguado e mentiroso. Aliás, esse era um lado dele que esperava não ver mais depois do nosso casamento.
Peguei a chave, destranquei a porta do carro e ouvi Scorpius quebrar alguma coisa dentro de casa. Era sempre assim; ele se estressava e sobrava para a mobília, sorte que as crianças não estavam e não viram o fiasco do pai. Era pior quando nós brigávamos e eles viam tudo.
Entrei e fechei a porta, coloquei o cinto, liguei o rádio - utensílio trouxa que realmente mais distraía as pessoas, e o adorava muito por isso - e no instante seguinte dirigia por aí em alta velocidade (mania que adquiri com Scorp). Começou a chuviscar e mesmo assim continuei correndo pelas ruas pois estavam desertas hoje - como sempre, em datas de feriados importantes, as pessoas preferiam passar em casa com a família do que na rua - e meu celular tocou.
Peguei a bolsa, enquanto prestava atenção no movimento, e achei o celular. Era Scorpius. Não atendi a primeira ligação, a segunda ignorei completamente e a terceira resolvi atender para, de propósito, desligar na cara dele. Estava jogando o aparelho eletrônico trouxa pela janela quando ouvi alguém buzinar. Não entendi muito bem o motivo disso. Em seguida veio um clarão e tudo escureceu.
Abri os olhos e notei que estava em algum lugar desconhecido. Paredes brancas (que aliás me causavam dor de cabeça), um sofá claro, um vaso de flores em cima do criado mudo ao meu lado com uma cadeira encostada do lado, janelas cobertas com cortinas cor de creme e alguns aparelhos estranhos de hospitais do lado da minha cama me fizeram perceber onde me encontrava. Sim, era um hospital, e não tinha ideia do que estava fazendo nele. A porta se abriu e meus pais apareceram acompanhados de um médico alto, de cabelos negros, sorriso bonito e olhos azuis acinzentados que me lembravam alguma coisa...
– Querida, que bom que você finalmente acordou. – Mamãe estava nervosa, podia ver isso enquanto sentava-se na beirada da minha cama.
Encarei-a sem saber o que se passava, e ela percebeu que eu precisava de explicações. Papai se aproximou e acariciou meus cabelos ruivos, mas nenhum dos dois falou nada. Na verdade, o único a falar foi o médico.
– Rose, como está se sentindo? – Ele parecia simpático.
Mesmo sendo simpático, eu sentia que ele escondia algo importante de mim. O mesmo poderia ser dito sobre os meus pais. Encarei o médico com mais firmeza.
– Me sinto bem, mas me sentiria melhor ainda se soubesse o porquê de estar aqui; deitada em uma cama de hospital. – Resmunguei irritada e ele se aproximou, passivo.
– Não sei como te dizer tudo o que está acontecendo, mas vamos do início: você sofreu um acidente há dois dias enquanto dirigia seu carro, e só acordou agora. Ficamos com medo de que pudesse simplesmente não acordar, ou seja, entrar em coma, mas parece que está tudo bem agora. Sua situação era delicada, entende. De qualquer maneira precisamos fazer mais exames e ver como se sai daqui pra frente... – Ele sorriu em um sorriso nervoso e sem dentes, apenas mostrando suas covinhas.
O jeito como falava - lenta e pausadamente - dava a entender que ele não sabia o quanto minha capacidade de compreender as coisas estava bem. Isso me irritava. Detestava e detesto a cima de tudo a mania irritante que as pessoas têm de subestimar umas as outras. De qualquer forma, compreendi muito bem palavra por palavra.
Minha cabeça girou. Um acidente?? Desde quando sou tão imprudente assim??
– O que aconteceu pra eu bater o carro?? – Perguntei confusa.
Minha mãe se remexeu desconfortável em cima da cama enquanto pudia ouvir meu pai chocar um dos pés irritantemente contra o chão repetidas vezes. O médico me encarou e no instante seguinte me encheu de perguntas estranhas.
– Rose, não lembra do que aconteceu?? Do carro que um motorista irresponsável, que por sinal estava embriagado, começou a dirigir na contramão e atingiu você? – Seu olhar era de preocupação.
Não, eu não me lembrava disso. Alguma coisa dentro de mim se agitou como um alarme vermelho. Tinha alguma coisa muito errada acontecendo comigo, então.
Sacudi a cabeça negativamente e o respondi talvez com mais pressa do que deveria.
– Não... Aliás, desde quando tenho um carro?? – Perguntei confusa, pois me lembro claramente de ter prometido a mim mesma, depois de quase atropelar um cachorro enquanto mandava uma mensagem por celular para o Hugo, que nunca mais dirigiria novamente.
– Como assim, Rose? – Meu pai perguntou, assustado. Agora mesmo é que não entendia mais nada.
– O que??
O médico olhou para minha mãe e ela entendeu a situação, embora eu tenha ficado mais nervosa e agitada ainda.
– O que tem de errado comigo?? – Perguntei, quase desesperada, ao perceber que eles estavam quietos demais.
– Você está com amnésia, Rose. – Mamãe finalmente falou.
– Consegue se lembrar de quem você é??
- É claro que ela consegue, ainda mais por que consegue se lembrar de mim e da Mione. – Papai resmungou irritado, após revirar os olhos para o médico e sua pergunta aparentemente boba.
- Rose Weasley, por que? – Perguntei mais confusa ainda.
- Ahn... Sim, mas você não lembra de mais nada?? – Minha mãe se manifestou, depois de olhar torto para o meu pai e o fazer ficar quieto. Agora ela me encarava como se quisesse que me lembrasse de algo importante.
Sim, parecia que estavam escondendo alguma coisa de mim... Não estava entendendo todo aquele mistério, afinal, sei muito bem quem eu sou.
– Depende. Me lembro de você, do papai, do Hugo, do Alvo Severo... – Minha voz falhou no final, demonstrando que eu sabia que algo estava errado.
– Você se lembra como era a sua vida antes do acidente?? – Doutor Jeremy – segundo seu crachá – perguntou.
– Não... – Falei ao sentir minha cabeça girar.
Me lembrava de coisas que pareciam muito antigas e não me lembrava de mais nada. Nada recente, pelo menos.
Antes que Jeremy pudesse me perguntar mais algumas coisas, a porta se abriu e Scorpius Malfoy apareceu. O que cargas d’água aquele loiro enxerido estava fazendo aqui??
– Ahn? O que ele está fazendo aqui? – Perguntei sem entender absolutamente mais nada.
– Ele? – Foi a vez de Malfoy perguntar, com uma cara de quem havia recebido um balde de água fria em cima dos cabelos loiros lambidos.
Meus pais o encararam e no instante seguinte eu me encontrava sozinha, olhando para as paredes. Dr. Jeremy havia levado-os para fora, provavelmente para uma conversa particular... Só não entendia o motivo de Malfoy estar no meio disso tudo.
Meia hora depois eles estavam de volta, inclusive Scorpius.
– Oi Rose, você se lembra mesmo de mim? – Ele perguntou, com uma cara de cachorro que havia caído da mudança. Seus olhos azuis acinzentados brilhavam de expectativa.
– Sim, fomos colegas na escola... Eu acho.
– Você acha? – Ele perguntou, irônico.
– Se for começar com as suas ironias, é melhor ir embora. Não é minha culpa se, segundo o Dr. Jeremy, estou com amnésia. Ao menos eu me lembro que nunca fui com a sua cara de doninha albina...
– Céus... – Meu pai finalmente se manifestou. Sua expressão era de preocupação ao mesmo tempo em que ele encarava Malfoy como quem pede desculpas.
– O que o Malfoy está fazendo aqui afinal?? – Perguntei começando a ficar extremamente irritada. Todo aquele mistério me irritava...
– Eu soube do acidente e vim te visitar, Daisy.
– É Rose. – Revirei os olhos e ele riu.
– Eu sei que é Rose, mas gosto de te irritar. E é tudo nome de flor, de qualquer maneira... – Sua pose metida sumiu e por alguns instantes deu lugar a um Malfoy que eu nunca tinha visto na vida: um que era mais humano e se preocupava.
– Você tem senso de humor... – Tentei aliviar as coisas e ele sorriu sem me mostrar os dentes.
Ele se aproximou e sentou na cadeira que estava ao meu lado. Seus olhos azuis acinzentados me encaravam profundamente, Scorpius queria respostas.
– O que você se lembra em relação a mim? - Sua voz pareceu falhar no final, ou pode ter sido apenas impressão minha.
– Muito pouca coisa... – Admiti sem graça ao perceber a expectativa dele se esvair como água se esvai em uma torneira levemente aberta, e seus olhos agora estavam mais cinzas do que azuis.
– Tipo o que exatamente?? – Ele insistiu.
– Por que faz tanta questão de que eu me lembre de você, Malfoy?? Me lembro só de que devo manter distância e nunca olhar pra sua cara arrogante. Aliás, creio que não nos vemos há algum tempo, não?? – Perguntei, agora sendo eu a arrogante na conversa.
– É. Faz algum tempinho mesmo... – Havia um duplo sentido tanto na sua voz quanto na sua frase, ele parecia desanimado com isso tudo.
– Senhor Malfoy, creio que seja melhor deixar Rose descansar. Pode voltar outra hora se quiser... – Dr. Jeremy observou, olhando com uma cara de pena para ele.
–Por que vocês fazem questão de deixa-lo me ver?? O que isso importa pra ele?? – Perguntei furiosa, afinal, eu era insignificante para ele.
Malfoy desde os tempos de escola sentia algo por mim, embora eu nunca acreditasse, e não seria agora que ele teria algo comigo. Scorpius podia ter a mulher que quisesse desde que ela se encaixasse no perfil dele, então não entendo o porquê dele vir me visitar.
– Ok, eu volto outra hora. Posso deixar isso aqui?? – Ele levantou uma das mãos e só então reparei que trazia um buquê de rosas vermelhas – minhas preferidas aliás – junto consigo.
Não tinha a mínima ideia se ele sabia ou não sobre rosas vermelhas serem minhas preferidas, mas que fora gentil da parte dele, isso fora. E gentileza nunca foi o nome do meio do Malfoy, não quando ele só sabia ser arrogante, mandão, briguento, metido...
Eu nunca sentiria nada pelo Malfoy.
Comentários (1)
Leitora nova! Adorei o capítulo e estou amando a fic! Incrível essa ideia de Rose ter amnésia quando já era casada com Scorpius... falando nele, morri de dó dele nesse capítulo... Até trazer flores ele trouxe. Beijos! Dani.
2013-11-12