Único



                  


And the raven, never flitting, still is sitting, still is sitting (...)


And his eyes have all the seeming of a demon's that is dreaming,


And the lamp-light over him streaming throws his shadow on the floor;


And my soul from out that shadow that lies floating on the floor


Shall be lifted – nevermore!


The Raven, Edgar Allan Poe






    Lord Voldemort estava sentado em seu escritório em meio a uma madrugada fria de dezembro, debruçado sobre pergaminhos e livros antigos. A guerra havia terminado, ele havia matado Potter e dominava agora o mundo bruxo. Havia sobrado alguma resistência, mas eram mais um pequeno incômodo do que uma ameaça real. Agora ele tinha tudo o que sempre buscara: poder. Mas por que então sentia que sua vitória não estava completa? Ele sabia a resposta, mas incomodava de mais pensar naquilo. Afinal, em uma guerra, o lado vencedor nunca sai sem perder nada. Ele perdera sua Bella.


    Ela morrera por ele, se jogando em frente a um feitiço que pretendera o atingir pelas costas enquanto ele duelava com Potter. Snape lançara o maldito feitiço, e Voldemort havia depois matado o desgraçado traidor e o dado de jantar para Nagini. Mas a vingança não foi suficiente para trazer Bellatrix de volta, nem ao menos para suprir a falta que ela fazia. Em alguns momentos, ele desejava que ela tivesse voltado como um fantasma, que ela não tivesse sido capaz de atravessar o véu para o mundo dos mortos sem ele. Mas Voldemort vira o olhar no rosto da bruxa quando ela morreu, e lera os últimos pensamentos que se passaram em sua mente antes que ela se tornasse apenas escuridão. Ele está vivo. Foi o que a mulher pensou, e ele pôde presenciar o alívio e completude que ela sentira antes de morrer. Bellatrix havia morrido em paz, sentindo que seu destino estava completo.


Ela dera sua vida por ele, literalmente, e em todos os sentidos possíveis. Havia sido sua serva mais leal desde antes de receber sua Marca Negra, sempre falhando muito pouco em relação aos outros Comensais. A fé que tinha nele superava a confiança de um soldado por seu líder, era comparável à adoração que um religioso possuía por seu deus. Foi a única mulher que ele permitiu que vivesse depois de compartilhar sua cama, e depois que a provou nunca mais foi capaz de desejar outra. Bellatrix dedicara totalmente sua vida a servi-lo, de corpo, mente e alma, até seu último segundo, sua última ação, seu último pensamento, foram dedicados a ele.


É claro, Lord Voldemort não era capaz de amar, não era capaz de cultivar nenhum sentimento a não ser os piores e mais vis. Acima de tudo, era um homem prático, e sua racionalidade dizia que ele devia ser grato que ela tivesse morrido por ele. Por que então o transtornava tanto pensar nela? Embolou mais um pergaminho quando notou que as palavras que sua pena rabiscava nele não mais faziam sentido, pois sua mente tornara a devanear e se voltara novamente para ela. Diabos! Jogou o papel na lareira e pousou a pena, sabendo que não faria nenhum progresso com aquilo. Bella… Por que aquela maldita mulher continuava a atormentá-lo, mesmo depois de morta? Por que ele estava sempre pensando nela, mesmo quando sua memória fazia algo desconhecido doer dentro de seu peito?


O Lorde das Trevas sabia a resposta, sim, ele sabia, mas não queria admitir para si mesmo. Logo quando conseguiu aquilo que passou a vida por almejar, ela morre e lhe estraga seu final perfeito. Ele queria poder esquecê-la, virar as costas e nunca mais gastar um pensamento sequer na mulher. Mas toda a casa parecia ainda impregnada com o cheiro dela, com sua presença, cada cômodo trazia uma lembrança, ou várias, do corpo perfeito de Bellatrix sucumbindo ao seu. Levantou-se e foi até uma mesa no canto do escritório, preparando para si uma dose generosa da absinto. Por vezes a fada verde o ajudava a esquecer a fada vermelha de chamas e sangue que atormentava seus pensamentos. Assim que tornou a se sentar e tomou um longo gole da bebida ardente, ouviu uma leve batida na porta do escritório. Rolou os olhos, aborrecido.


- Eu disse que não queria ser incomodado. - falou com a voz grave e ameaçadora. Será que aqueles incompetentes não conseguiam resolver nada sozinhos? Bebeu mais alguns goles de seu drink, sentindo a mente começar a desacelerar. As batidas na porta soaram outra vez, mais altas e urgentes que antes. - Se tornar a bater, terei o prazer de abrir para lhe lançar uma Cruciatus! - a ameaça faria qualquer dos idiotas que trabalhavam para ele saírem correndo como crianças assustadas. O barulho, porém, tornou a quebrar o silêncio, agora batidas rápidas e repetidas com urgência, e não cessaram como as anteriores.


De cenho franzido, se perguntando o que diabos poderia ter acontecido para uma ordem e uma ameaça sua não ter diminuído a urgência do assunto, Voldemort se levantou e foi até a porta. As batidas persistiam, e ele abriu a porta de uma vez, interrompendo um "toc" no meio. Olhou em volta, mas não havia ninguém ali. Absolutamente ninguém, apenas a escuridão do corredor à sua frente.


- Bella… - sussurrou, sem saber porque, e a palavra ecoou em seus ouvidos. Sacudiu a cabeça, livrando-se do momentâneo devaneio, e fechou a porta atrás de si. Sentou-se então numa poltrona em frente à lareira, desistindo dos livros e pergaminhos. O copo em sua mão se esvaziava rapidamente enquanto sua memória lhe mostrava, dolorosamente, a ocasião em que ele e Bella estiveram sobre aquela poltrona, como ela o cavalgara com voracidade, como o rosto dele estivera enterrado em seus seios…


Então mais um barulho o despertou de suas fantasias, e por um segundo ele pensou ser a mesma batida na porta. Percebeu então que o som era diferente, e vinha de sua janela. O Lorde se levantou e abriu o vidro, receoso. Apenas mais escuridão. Quando ele estava prestes a fechá-la novamente, passa pela janela um enorme corvo, as penas negas de suas asas esbarrando em Voldemort ao passar por ele.


O animal se empoleirou no busto de Salazar Slytherin que havia sobre a porta e ali ficou, encarando o homem pálido que habitava o cômodo. O Lorde deixou a janela aberta, para que a ave pudesse sair, serviu-se de mais uma dose de absinto e voltou para sua poltrona, observando o pássaro à sua frente. Talvez estivesse ficando obsecado, mas as penas tão profundamente pretas do corvo o lembravam de certa forma o cabelos de ébano que Bella possuíra. Cabelos que ele não veria nunca mais.


Desviou os olhos, irritado na forma como uma coisa insignificante como aquela podia levar sua mente à memória dela. Pôs-se então a observar o resto do cômodo, a forma como a lareira e as velas bruxuleantes lançavam sombras oblíquas por toda a parte, até que a sombra curva do pássaro acabou por atrair o olhar do Lorde de volta para ele. A criatura o olhava diretamente nos olhos, olhos que pareciam profundos de mais para uma mera ave, olhos escuros e observativos como foram os de sua Bella. Olhos que ele não veria nunca mais.


Virou o rosto, decidido a tentar esquecê-la ao menos durante aquela noite. Deu mais um gole em seu absinto, observando a forma como a sombra das cortinas, que eram sacudidas pelo vento, se moviam na parede como dançarinos. Lembrou-se do tango que dançara com Bellatrix, naquela festa na casa dos Malfoy, que deixara ambos sem fôlego e todos os Comensais boquiabertos. Jogou então, repentinamente, o copo que bebia na lareira, alimentando as chamas. A fada verde não estava do seu lado aquela noite, estava apenas piorando sua situação. Assim como aquele maldito corvo, aquele animal que representava a morte e que tanto o lembrava Bella. Ela costumava usar um colar com a forma do crânio de um corvo, que se ajustava perfeitamente ao seu farto decote, assim como à sua personalidade. Mas ele não a veria nunca mais.


Então, na penumbra tremeluzente pelo fogo que se debatia com o vento, ele a viu. No começo parecia apenas uma ilusão, escondida entre as sombras dançantes das cortinas, sua imagem parecendo oscilar também. Mas ela sorriu e andou até ele, sua beleza negra, a um só tempo carnal e etérea, igual à que ele se lembrava, talvez apenas um pouco mais pálida. O que seria aquilo? Um delírio, um sonho? Mas então ela tocou seu rosto e ele sentiu sua pele gelada de morte, mas macia e real, como ele se lembrava. Não era um inferi, ele estava certo, mas não sabia afirmar o que ela era. Não gastou, porém, preocupações desnecessárias com definir sua natureza. No momento que sentiu o toque dela, nada daquilo importava, o único fato é que ela estava ali com ele.


Voldemort se levantou e puxou a cintura da mulher para si, colando seus corpos e tomando os lábios dela. Doce, suave, ardente, era sua Bella, ela estava de volta. Seus lábios eram frios, as mãos que o envolveram pela nuca eram frias, mas seus toques possuíam o mesmo calor. Levantou-a pela cintura, fazendo com que ela envolvesse seu quadril com as pernas, e andou com ela até a parede na qual ela surgira, pressionando o corpo dela com o seu. Suas bocas ainda estavam penduradas uma na outra, ele percorria cada canto da dela, matando saudades de cada detalhe.


As mãos de Bellatrix, famintas como sempre, começaram a percorrer o corpo do Lorde quando os lábios dele passaram para o seu pescoço. A pele ali também era fria, e ele não conseguia sentir a pulsação de suas veias, mas tinha o mesmo cheiro, o mesmo gosto, e ela soltava os mesmos gemidos quando ele mordia ou chupava algum ponto no qual sabia que ela era mais sensível. Desceu os lábios pelo pescoço dela, lentamente, aproveitando cada sensação, e ao mesmo tempo faminto, querendo tudo o que pudesse de uma só vez. Notou que ela usava o pingente de corvo quando seus lábios chegaram ao decote, e puxou de uma vez as amarras frontais do vestido negro como a noite, fazendo que se arrebentassem. Enterrou-se nos seios macios e gélidos, cujos mamilos se enrijeceram sob seu toque.


- Bella… - sussurrou, de forma quase inaudível, contra sua pele fria - minha Bellla, você voltou para mim.


- Sim, meu lorde, meu amor. - ela disse, sua voz suave e levemente rouca, seus dedos se emaranhando nos cabelos dele. Voldemort levantou o rosto para olhá-la nos olhos, aqueles olhos escuros e observativos que ele tanto adorava. - Estou aqui, e não vou deixá-lo. Nunca mais.


E, contradizendo suas palavras reconfortantes, ela desapareceu, fundiu-se novamente com a sombra bailante da cortina. Ele gritou, desesperado, amaldiçoando o mundo e a si mesmo, e então o corvo empoleirado no busto crocitou, lembrando-o de sua presença ali. A presença da morte, para ele não um agouro, mas uma lembrança, de que tudo que ele havia conquistado não tinha o mesmo valor sem ela ao seu lado, de que todo aquele poder parecia não fazer sentido. A imortalidade que ele tanto almejara, havia agora se tornado sua prisão, condenado a viver a eternidade sem sua Bella.


Ele sabia que Bellatrix nunca iria deixá-lo, não em seus pensamentos, nunca o deixaria descansar. Nunca mais. Será que um dia essa agonia cessaria, ou ao menos se atenuaria? A sombra do corvo se espalhava por quase todo o cômodo, mergulhando o Lorde e sua alma fragmentada na escuridão. Sem entender como, ele sabia que aquela ave nunca mais sairia dali. Olhou para os olhos do majestoso pássaro, olhos que o encaravam de volta com uma intensidade fora do comum, e soube a resposta para sua pergunta. A dor de perdê-la não passaria, não se abrandaria. Sua alma havia se deitado sobre as sombras da morte, e não tornaria a se erguer. Nunca mais.


-----x-----


N/A: Mais uma vez, aqui estou eu com uma fic que não era para existir. Laris me perguntou, em pleno dia 30, se eu não postaria nenhuma fic no halloween, e em vez de dizer que não tinha nada escrito nem planejado, simplesmente comecei a escrever isso aqui. A verdade é que eu queria ter guardado Réquiem para o halloween, mas não me segurei, e aí como eu queria algo sombrio pro halloween, fiquei o tempo todo comparando o sombrio dessa com o sombrio de réquiem, oq não foi uma boa ideia hahaha Mas vendo a fic separadamente acabei gostando dela, apesar de estaar convicta de ter estragado a obra prima do mestre Poe u.u Um grande beijo e obrigada para a Renatha linda, que corrigiu meus errinhos, deu pitaco e me elogiou, valeu sua linda! <3


Bom, espero que gostem, e feliz Halloween!!!!
Beijos!


(31.10.2013)

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Comentários (6)

  • MaryLestrange

    *------* obrigada kamilla!!! Realmente, todas esperamos que Herdeiras não termine assim kkkkkk

    2013-11-06
  • Kamilla Bacchi

    Eu realmente espero que Herdeiras do Mal não termine assim, mas ficou otima, sombria e triste. Sacanagem fazer ela aparecer e quando as coisas estavam esquentado desaparecer.

    2013-11-04
  • MaryLestrange

    Lari!!!! A culpa é sua! kkkkkkkkkkkkkk Lordão tb ficou na mão, n foi só vc ;) Muito obrigada sua linda!!! ;*

    2013-10-31
  • Laris Black

    Mimimimimimimimi não teve putaria, você me acostumou mal pq quando a Bella apareceu eu dei uma risada do tipo, agora as coisas ficam boas e qdo tava ficando bom , puff , tu me deixou na mão, e eu fiquei c do do Voldy. Bom , nao faz isso de comparar fic... Cada fic tem sua vipe...eu duvido q conseguiria escrever Castigo atualmente, então fique tranquila. Quero dizer q eu n li o livro e nem o filme, n me odeie, mas eu achei muito lindo e tão bem escrito. Tbm n gosto do lorde apaixonado tão explicitamente , mas eu acho q seria tipo isso se o fim tivesse sido a Bella morta e ele vivo. Então, ficou muito bom. Ps: Me ame mais e a culpa disso tudo é minha , hahahaha . 

    2013-10-31
  • MaryLestrange

    Muito obrigada Tarí!!! Eu geralmente sou muito chatinha com fic VB pq não gosto muito dessas fics que tem o Voldy apaixonado e tal, (exceto HdM, mas tem toda uma história por trás que faz ficar convincente) mas comecei a pensar na cena em que ela morre, e ele fica todo desesperado grita e sai correndo pra vingar ela e etc, então comecei a pensar nesse conceito dele tipo só valorizar depois que perdeu... Enfim, fico muuuuuuito feliz que tenha gostado, muitissomo obrigada!!!! =D

    2013-10-31
  • Tarí Tinuviel

    Muito diferente essa idéia de um lord Voldemort apaixonado, já que ele é um personagem tão sem sentimentos. Mas ficou muito bom, é legal ter uma perspectiva diverente de vez em quando. :)

    2013-10-31
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