Os olhos de Dumbledore



69. Os olhos de Dumbledore

Como não haviam conseguido nada melhor que ele, Regulus e seus amigos seguiram com o plano de roubar pó de flu do professor Kettleburn, no dia seguinte ao jogo contra a Corvinal, ao amanhecer. Tudo o que precisavam era encontrar uma escada, ou então fazer uma. Amifidel, Jack e John conseguiram pensar em várias alternativas para a escada, cordas com ganchos na ponta, para que pudessem escalar a parede de dois metros e meio, ventosas para os pés e as mãos, brigar com o Salgueiro Lutador até que ele jogasse um deles para dentro da janela. Nada disso parecia funcionar na prática, então Regulus se enfiou na biblioteca à procura de um encantamento que transfigurasse algum objeto em escada.


O sol mal havia raiado quando Regulus entrou na biblioteca bocejando. A bibliotecária, ao contrário do que ele esperava, sorriu ao vê-lo entrar assim que ela abriu as grandes portas da biblioteca.


- Bom dia! – ela disse, animada. – sempre me pergunto por que começo o expediente na biblioteca tão cedo e hoje, finalmente, tenho a minha resposta. – ela sorriu – o que vai ser hoje, senhor Black? Feitiços, Poções, história da Magia...


- Transfiguração, quero terminar a pesquisa que comecei esta semana... – ele sorriu.


- Os mesmos livros?


- Sim, obrigado.


- Estarão na mesa próximo à janela em instantes. Pode se sentar e aguardar.


- Obrigado, senhorita.


Regulus sentou-se na mesa que ela havia indicado e aguardou alguns minutos, bocejando sem parar. Estava quase dormindo quando o som oco dos livros sendo colocados sobre a mesa o despertou. Ele ia agradecer novamente a bibliotecária, mas ela já havia sumido por entre as estantes.


O garoto passou horas folheando os livros, nove ao todo, lendo cuidadosamente toda nota de rodapé ou palavras escritas em negrito. Em algum lugar deveria aparecer escrito como transfigurar um objeto em escada.


Parecia impossível que não houvesse em lugar algum tal encantamento. O garoto já estava bastante desolado, os olhos ardendo de tanto ler e bocejando sem parar quando Emma apareceu em sua frente, o rosto vermelho de raiva:


- Você esqueceu do jogo? Já estão todos no vestiário esperando por você! O jogo começa em quinze minutos e você ainda nem se trocou!!!


Regulus levantou-se, juntou os livros de qualquer maneira sobre a mesa, enquanto ela continuava seu sermão.


- Assim não dá, Reg! Essa não é a primeira vez que eu tenho que procurar por você na hora do jogo! Parece que você não se importa com o time! Fique sabendo, ou você pega aquele pomo ou vou arrumar outro apanhador!


 Aquela era uma ameaça que não podia ser ignorada. Ele abaixou a cabeça e saiu correndo porta a fora em direção às masmorras. Ele precisava vestir seu uniforme de quadribol antes de ir para o vestiário pegar a vassoura.


Quando chegou ao campo, exatos quinze minutos mais tarde, os dois times já estavam posicionados em torno do centro do campo, aguardando o apito para o início do jogo. Regulus não tinha ouvido a escalação dos times, mas não achou que deveria ter nenhuma surpresa comparado ao ano anterior e não ousou levantar os olhos para encarar os outros jogadores. Ouvi-los bufar já era o bastante para saber que não aprovaram seu atraso.


Madame Hooch soprou o apito e todos os jogadores tomaram suas posições, Lucinda Talkalot foi para frente dos aros para defender o gol, os artilheiros de ambos os times permaneceram em círculo em torno do centro do campo, com os batedores logo atrás. Regulus e Rachel Broadmore permaneceram à meia altura entre o chão e os demais jogadores com os olhos fixos na caixa de onde sairia o pomo. Regulus olhou para ela e desviou o olhar imediatamente. Já tinha tido o suficiente do azul daqueles olhos durante o verão.


A professora lançou a goles para o ar. O pomo subiu como junto com a goles, deixando um rastro vermelho e dourado no ar, como um foguete. David, namorado de Emma, lançou-se para frente e agarrou a goles.


- Posse de Ravenclaw ! Davies passa zunindo por um, não! Dois balaços da Sonserina ! Ei, Mulciber e Avery não estão brincando!


Regulus olhou para a cabine do comentarista, Bertha Jorkins estava lá, aparentemente animado. Ele  esperou alguns segundos para que fosse seguro passar pelos balaços de seu time sem ser atingido e se posicionou acima do nível dos outros jogadores para ter uma melhor visão do campo. Ele não tinha conseguido ver que direção o pomo havia tomado após se separar da goles, mas para seu alívio, tudo indicava que Rachel também não vira, pois a garota voava aparentemente sem destino.


O sol da manhã estava forte, mas ainda não era o suficiente para aquecer, uma vez que o vento gelado vindo do norte também parecia determinado a cumprir o seu papel de varrer o outono para longe das terras de Hogwarts. Por conta disso, era difícil para Regulus e Rachel permanecerem parados por mais de alguns segundos num mesmo ponto para escanear o campo, eles eram lançados para os lados constantemente. Mas não eram só folhas e os jogadores que o vento carregava para longe, a voz de Bertha Jorkins chegava entrecortada para Regulus, como se a menina estivesse com soluço.


- ...outro balaço fenomenal de Richard Broadmore! Este é mesmo filho de... Não chegou a tempo... Vanity joga a goles com força... pegou a goles e zuniu em direção... Mulciber sem dó...


O vento zunia forte em seus ouvidos e Regulus lamentou não ter um dos abafadores de ouvido da professora Sprout.


O jogo seguia equilibrado, com uma pequena vantagem para a Sonserina, que mal comemorava um gol quando Corvinal empatava novamente. Isso parecia entediar Bertha Jorkins, que desanimava e narrava o jogo sem entusiasmo.


- ... ponto para Sonserina. Estamos em 40 a 30. Balaço de Richard. Balaço de Mulciber, David Davies desvia e escapa por pouco, ele mira e lança no gol de Emma Vanity. 40 a 40. Empate de novo. Agora é a vez da Sonserina. Posse de bola para Vanity. Ela se esquiva de dois balaços, Avery devolve o balaço direto no peito de David, que parece ter tido uma parada cardíaca e está caindo da vassoura... brincadeirinha, Emma, fica fria! Como todos viram ele se esquivou do balaço de Avery, embora tenha levado um de Mulciber logo em seguida. Vanity passa a goles para Greengrass que marca para Sonserina. 50 a 40... – ela deixa escapar um longo bocejo.


O fato de ter acordado cedo, somado à narração sem emoção de Bertha, desencadeou uma série de bocejos em Regulus. Bocejos bastante inapropriados, uma vez que Rachel começara a se mexer de forma diferente. Era possível que ela tivesse avistado o pomo. Regulus tentou se aprumar na vassoura e seguiu a apanhadora velozmente. Quando chegou próximo à Rachel notou que a garota não avistara o pomo, estava somente tentando tirar o cabelo loiro da frente dos olhos. Ele riu. Pelo menos aquilo tinha servido para acordá-lo.


O jogo seguia empatado em 90/90, o pomo havia sumido. Então Regulus resolveu brincar um pouco. Olhou para Rachel e fez uma pirueta. Depois um grande looping. Voar em altíssima velocidade era bastante excitante. Ele aproveitou para dar um voo rasante e tocar levemente nos cabelos de Rachel, apenas para perturbá-la.


- Aí, hein, Rachel! Recebendo carinho de Black no meio do jogo! – o comentário jocoso de Bertha fez a arquibancada explodir em gargalhadas.


 Rachel passou a persegui-lo e ele achou graça. Regulus tinha certeza de que ela o perseguia porque estava brava, mas na verdade ela estava focada no pomo que voava logo atrás da orelha dele. O vento mudou subitamente de direção e ele escutou o zunido das asas do pomo.


- Minha gente, isso é que é manobra radical! Olha o que o Black fez! Um giro em torno do próprio corpo e... e... Parece que a senhorita Broadmore esqueceu que está na frente de toda a escola! Rachel, aqui não é lugar para agarrar um garoto! – continua Bertha, agora bastante animada, debruçada na mureta da cabine de locução.


Rachel , que vinha logo atrás de Regulus, lhe dá um encontrão, dando a impressão que queria abraça-lo, numa tentativa frustrada de pegar o pomo, que já estava bem preso na mão do garoto.


- Não me queira tanto! – caçoa Regulus, erguendo o pomo no alto para que todos vissem.


- fim de jogo! Black pegou o pomo! Rachel pegou o Black e tudo acaba como uma música melosa de Celestina Warbeck!!! Bem, é isso. Fim de jogo, vitória para Sonserina por 240 a 90. Até a próxima, pessoal! E boa sorte aos pombinhos!


Regulus voou o mais rápido que pode para longe de Rachel e entregou o pomo na mão de Emma.


- Então, Emma, sou ou não sou o melhor apanhador?


Emma sorriu.


- Você é o melhor, Reg. Mas não abuse, se atrasar mais uma vez, coloco outro em seu lugar.


- Não vai ser necessário, capitã. – ele respondeu abrindo um largo sorriso, enquanto observava Rachel deixar o campo bufando com a vitória da Sonserina. Os comentários de Bertha só aumentaram a raiva de Rachel e, para piorar as coisas, por todo o caminho de volta aos vestiários ela teve que aguentar comentários maldosos.


- Apaixonada, hein, Rachel? – arriscou um aluno da Grifinória, que arrependeu-se amargamente pelo comentário quando a garota lhe lançou um feitiço bastante doloroso que colou sua língua na ponta do nariz.


Regulus também não ficou livre dos comentários, mas achou graça de todos. Respondia sem o menor pudor, que ela o havia agarrado por conta de seu charme natural e em nenhum momento desmentiu o mal-entendido, deixando que todos pensassem que ela realmente não tinha visto o pomo. Ele tinha por convicção moral defender toda e qualquer garota indefesa, mas uma peste como Rachel não podia ser considerada “garota” o tempo todo, muito menos indefesa.


No vestiário os garotos não paravam de cumprimentar Regulus, mais pelo encontrão com Rachel do que pelo fato dele ter pego o pomo.


A festa já estava organizada nas masmorras quando professor Slughorn entrou. Os alunos ficaram momentaneamente em silêncio, já que era incomum o diretor da casa participar deste tipo de festa.


- Parabéns, parabéns ao ótimo desempenho do nosso time no jogo de hoje! – ele falou em voz alta, enquanto observava os alunos esconderem os copos com cerveja amanteigada que haviam sido contrabandeadas para dentro da escola por Avery e Mulciber. – em outros tempos os alunos me serviam um pouco de cerveja ao invés de tentar disfarçar o óbvio...


Lucinda Talkalot levou-lhe uma garrafa e desculpou-se. O professor bebeu um gole antes de continuar a falar, em pé, no centro da sala comunal diante de vários alunos espalhados pelos cantos.


- Sinto atrapalhar a comemoração, mas o diretor pediu que me certificasse que nosso apanhador, Regulus Black, não faltaria no jantar de hoje. Teremos uma comemoração lá e todos são benvindos. O jantar será servido às 19h.


- Do que se trata, professor? – perguntou Regulus.


- Vai ver ele vai celebrar seu casamento com Rachel Broadmore! – debochou Gibbon.


Regulus apenas olhou para ele, mas não respondeu. As piadas a respeito de Rachel estavam começando a ficar sem graça.


- Não posso dizer. Temo que para o profundo desapontamento da senhorita Broadmore, o assunto não tem a ver com o jogo de hoje.


Regulus sorriu e levantou os ombros.


- Estarei lá, professor. Porque não se senta e comemora conosco nossa primeira vitória do ano?


Sughorn não precisou de um segundo convite. Sentou-se na poltrona central da sala, que Regulus havia lhe cedido e serviu-se dos doces que Lucinda lhe oferecia. Não demorou muito para que o professor se tornasse o centro das atenções e começasse a narrar as histórias mais inacreditáveis sobre vitórias da Sonserina e assim seguiu a tarde numa comemoração bastante ruidosa e animada. Faltava pouco menos de meia hora quando Slughorn levantou-se e foi se preparar para o jantar.


Regulus estava ansioso para saber o que iria acontecer. Aquele não tinha sido um jogo excepcional e não havia motivo para que o diretor o cumprimentasse diante da escola inteira por ter pego o pomo. Mas ele não conseguia pensar em nada mais. Se o diretor tivesse descoberto a respeito de sua intenção sobre usar a rede de pó de flu, certamente não iria repreende-lo diante de toda escola e tampouco o professor Slughorn chamaria isso de comemoração.


Ele vestiu seu uniforme e penteou os cabelos. Depois checou a aparência no espelho e sorriu, pensando que sua mãe diria que ele estava lindo se o visse. Os colegas de quarto não foram para o dormitório se trocar, isso foi um alívio, pois assim ele não não aguentava mais ouvir comentar sobre o episódio do abraço de Rachel.


A sala comunal da Sonserina estava novamente vazia. E ele novamente atrasado. Então apressou o passo em direção ao Salão Principal.


Entrou no Salão e se dirigiu à mesa da Sonserina apressadamente, pois estavam quase todos sentados e ele não queria ser o último. Tentou olhar seus companheiros de casa com naturalidade, embora todos parecessem ansiosos para saber o que iria acontecer.


- Boa noite a todos e todas. Parabéns Sonserina e Corvinal pelo jogo de hoje. Bastante equilibrado e emocionante. Mostra que as duas casas se prepararam e nos presentearam com um belo espetáculo. Muito obrigado. – o diretor aguardou que cessassem os murmúrios e continuou seu discurso,  - Existem pessoas cujas qualidades vão além do que as palavras podem descrever. Esforço, dedicação, habilidade, inteligência, coragem e bondade são meras palavras diante dos relatos que ouvi esta semana. A Professora Sprout me contou que por infortúnio, uma grande quantidade de cava-charcos invadiu sua estufa número 3 e quase dizimou a plantação de mandrágoras. Não fosse pela ajuda do Professor Kettleburn, do guarda-caça Rubeo Hagrid e do aluno da Sonserina, Regulus Black, hoje ela não teria mais nenhum exemplar deste importante ingrediente no preparo de diversas poções. Ela me contou que Regulus Black não só se ofereceu para ajudar a pegar os animais como conseguiu capturar a maioria deles, mostrando-se também bastante eficiente em reenvasar as plantas para que se recuperassem do ataque. Senhor Black, peço que se aproxime.


Regulus levantou-se, sem graça, e caminhou até a mesa dos professores. Os olhares de inveja, curiosidade e despeito o acompanharam todo o caminho. Assim que se virou, seus olhos procuraram o irmão na mesa da Grifinória. Sirius não acenou para ele, nem sorriu. Apenas o olhava, com ar entediado. Ele então olhou para a mesa da Lufa-lufa e o sorriso luminoso de Alice aqueceu suas bochechas. O diretor contornou a mesa e postou-se ao seu lado, deu-lhe um aperto de mão e voltou-se para a escola.


- Esta é a segunda vez que Regulus Black é merecedor de nossa admiração e gratidão. – a professora Sprout se aproximou deles, trazendo algo dourado em suas mãos, que o diretor pegou – gostaria que aceitasse nossos cumprimentos e esta pequena medalha por serviços prestados à escola.


O diretor sorriu e olhou profundamente em seus olhos. Regulus reconheceu aquele olhar – era igual ao de seu pai. Seu coração disparou. Quando o olhavam desta forma a primeira coisa que vinha em sua cabeça era a sensação de que tinha feito algo errado – e sempre havia algo que ele precisava esconder. A imagem da lareira dos aposentos do professor Kettleburn veio à sua mente, luminosa como se tivesse acesa, imediatamente ele fixou-se nos diversos objetos da sala e lembrou do chá com seus professores, o sabor dos biscoitos. O diretor sorriu e o garoto sorriu aliviado, embora seu peito ainda arfasse. Rapidamente os olhos de Regulus encontraram refúgio em suas próprias mãos, subitamente úmidas.


O diretor continuou falando qualquer coisa que Regulus não prestava mais atenção, mas para a qual ele assentia sem parar, com os olhos fixos em suas mãos, como se estivesse tímido e sem graça por estar ali. Quantos mais seriam capazes de infiltrar mentes como seu pai e Dumbledore? Aquilo era inquietante.


A professora Sprout e o professor Kettleburn o cumprimentaram, depois todos os outros professores, então ele voltou para o seu lugar, sorrindo para todos. A mesa da Sonserina o aguardava com festa.

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Comentários (2)

  • Luhna

    Se eu gostei do capítulo? AMEI! Eu tava quase igual ao Regulus, quase dormindo aqui (é sério - também acordei cedo hoje), mas aí veio aquela história divertidíssima com a Rachel. "Charme natural" foi ótimo! ;) Mas acho que a Alice talvez não tenha curtido muito as piadinhas. Quanto ao Dumbledore, acho que o Regulus não tem com o que se preocupar. Afinal, Dumbledore é daqueles que deixam a pessoa trilhar o caminho dela, mesmo não concordando com as escolhas...

    2014-01-05
  • Ivana R

    Luhna! Olá!Espero que você e todos por aqui tenham tido uma ótima passagem de ano!Bem, quanto à Corvinal, acho que não me expressei muito bem. Segundo a Rowling/Pottermore, o pessoal da Corvinal é um pouco menos solidário que o da Sonserina ;). Mas veja bem, essas coisas não podem ser tomadas ao pé da letra. Regulus Black, por exemplo, apesar de ter suas características sonserinas bastante fortes (como valorizar a amizade, ser escorregadio, não medir esforços para chegar onde quer...), também é muito Lufa-lufa, pois trabalha duro - ou estuda muito; é inteligente como um Corvinal e corajoso como um Grifinório...Espero que tenha gostado do capítulo de hoje... Semana que vem, segue o plano da lareira!!!Bom restinho de ano a todos!!!Beijos,~Ivana 

    2014-01-03
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