XVII



– Que diabos vocês estão fazendo aqui? – Scorpius Malfoy questionou levemente assustado, assim que aparatou em seu quarto na mansão Malfoy.


As duas pessoas que disputavam uma partida de xadrez sequer levantaram os olhos do tabuleiro. Albus Potter tinha o polegar no queixo e a expressão pensativa enquanto Anthony Zabine executava seu movimento no jogo.


– Não faça dramas, Malfoy. Chegamos cedo da manhã pra falar com você e sua mãe disse que podíamos esperá-lo no quarto. – Albus respondeu sem desviar os olhos do jogo. – Xeque. – Ele disse ao Zabine, sorrindo de forma maliciosa.


Anthony Zabine fez uma careta e levou a mão esquerda até a nuca, massageando o local. Potter era um maldito cretino, porém, não tinha mentido quando disse que era um ótimo jogador de xadrez bruxo.


Quanto a Scorpius, apenas restou a ele se aproximar de onde os amigos jogavam e se jogar ao lado deles no chão. Seus olhos estavam cravados na peça que Zabine movimentava, porém, sua mente estava distante. Ele pensava na Weasley e na vida que ambos levavam até firmarem aquele acordo. Antes dos 300 Galeões, as coisas eram mais fáceis.


Porque, durante quase toda a sua vida, seu passatempo preferido foi odiar e implicar com Rose Weasley. E agora, depois de conviver esses poucos dias ao lado dela, todos os xingamentos e promessas de ódio eterno pareciam ter sido feitos em outra vida e por outra pessoa. Porque naquele momento, Scorpius Malfoy tinha certeza de que alguma coisa tinha mudado.


Ele apenas não sabia se gostava do seu novo “eu” ou se lutava para voltar a ser quem era antes do acordo firmado com a Weasley.


– Xeque mate. – A voz de Albus ecoou em seus ouvidos, mas ele não acordou de seus devaneios, pelo contrário, pareceu mergulhar ainda mais neles.


**


Era primeiro de setembro e aquele seria o seu primeiro ano em Hogwarts. Como não tinha primos na escola e nem muitos amigos – devido ao passado duvidoso que ele sabia que seu pai tinha – Scorpius Malfoy estava sozinho em uma cabine. Ele não negava que se sentia solitário, porém, tentava não parecer fraco enquanto encarava a paisagem pela janela.


As pessoas não gostavam dele, Scorpius percebeu assim que colocou os pés na estação com os pais. Todos os adultos lhe lançavam olhares estranhos e as crianças sorriam de forma maldosa para ele, de modo que, quando entrou no trem, foi vitima de brincadeiras de mau gosto e comentários ácidos sempre que se aproximava de alguém.


É, ele realmente tentou se aproximar de alguém.


Isso porque seu pai disse que, independente do que os outros dissessem, ele deveria se portar como um verdadeiro Malfoy e andar de cabeça erguida. Mas, além disso, Draco Malfoy sugeriu a ele que arranjasse amigos. Pessoas que fossem dignas de confiança. Amigos verdadeiros, daqueles que estariam com ele para tudo. Scorpius alegou que Anthony estaria com ele assim que voltasse das férias que estava passando com a mãe na Alemanha, mas Draco Malfoy foi irredutível quando disse a ele que Scorpius deveria se enturmar. E não deixar que ninguém pisasse nele por causa dos erros que, outrora, Draco cometeu.


E Scorpius até tentou seguir o conselho do pai, mas depois de tantos pontapés, terminou sozinho em uma cabine quase no final do trem.


Qual foi sua surpresa ao ver a porta ranger e, por ela, um garoto pequeno e de cabelos pretos desgrenhados entrar.


– Se importa se eu me sentar com você? – O garoto questionou tirando o cabelo dos olhos incrivelmente verdes. – Não estou a fim de aturar meu irmão e minha prima está devorando Hogwarts, Uma História outra vez.


Scorpius riu de leve quando o garoto revirou os olhos e assentiu. Era realmente bom que alguém não o julgasse por não ser da família que ele era. Ou talvez, Malfoy pensou inseguro, ele apenas não o tivesse reconhecido.


– Você sabe... Sabe quem eu sou? – O menino Malfoy murmurou um pouco inseguro.


O garoto de cabelos pretos fingiu um olhar avaliativo que o apavorou.


– Cabelos loiros e penteados para trás, vestes novas e com cheiro de recém compradas e sapatos lustrosos, além desse nariz horrendo. – O menino disse a ele como se tentasse descobrir quem ele era. – Você só pode ser o filho dos Malfoy. – Concluiu com um sorriso de canto. Ao notar o desconforto do Malfoy, ele apenas deu uma cotovelada do menino e riu. – Relaxa, eu realmente não me importo com o seu sobrenome.


E Scorpius suspirou aliviado, feliz por alguém não o julgar por um erro de seu pai que ele ainda nem compreendia.


– Bem, provavelmente você é o único. – Scorpius respondeu oferecendo a mão direita para um cumprimento. – Sou Scorpius Malfoy.


O garoto de cabelos desgrenhados lhe apertou a mão e sorriu.


– Bem, você também foi o único que ainda não me comparou ao meu pai. – Ele respondeu dando de ombros. – Me chamo Albus Potter.


E então, os dois garotos de onze anos passaram a conversar como se fossem conhecidos há anos. Falaram sobre suas famílias e como era chato serem comparados a seus pais e aos feitos realizados por eles o tempo todo, mas também falaram sobre assuntos mais agradáveis, como quadribol e a última vassoura do momento.


Scorpius descobriu que Albus era um completo palhaço, e ele sequer desconfiava que o garoto Potter estava, segundos antes de entrar naquela cabine, apavorado com a idéia de entrar para a casa de Sonserina. Depois de conhecer Scorpius, tudo o que Albus desejava era que eles caíssem na mesma casa e, sinceramente, ele já não tinha mais tanto medo assim da casa das cobras.


Quando o carrinho dos doces passou pelo vagão onde eles estavam, Potter e Malfoy levantaram quase que imediatamente, se jogando para fora da cabine com as bocas salivando por açúcar.


Scorpius pegou um pacote de sapos de chocolate e todas as varinhas de alcaçuz, enquanto Potter preferiu algumas tortinhas de abóboras. Eles estavam entregando o dinheiro à doceira quando uma menina franzina de cabelos ruivos e pele sardenta se aproximou deles.


– Hey Albus, por que você sumiu? – Ela perguntou fazendo Malfoy arquear as sobrancelhas.


– Você estava lendo seu livro chato, e James estava muito ocupado sendo James. – Ele deu de ombros enquanto mordia um doce. – Então eu saí para perambular por aí e encontrei esse outro garoto. É o primeiro ano dele em Hogwarts também.


A garota sorriu para Potter, mas seu olhar ainda era desconfiado para cima de Malfoy.


– E qual o seu nome? – Ela questionou.


– Scorpius. – Ele respondeu de forma simples e colocando as mãos nos bolsos da veste. Se aquela garota era amiga de Albus, pensou ele, ela deveria ser legal.


Mas a reação dela não foi a que ele esperava, definitivamente.


– Scorpius Malfoy? – Ela questionou com os olhos arregalados em surpresa e, ele logo percebeu, um pouco de desprezo.


E Scorpius não gostou daquilo. Nem um pouco.


– Sim, Malfoy. – Ele respondeu a encarando de forma dura. – Algum problema com isso? – A pergunta poderia ter saído mais sutil, porém, ela foi dura e certeira.


E a menina também não gostou daquilo.


– Problemas? Nenhum. – Ela devolveu ácida. – Mas meu pai me disse que eu não deveria me envolver com você. Ele não gosta da sua família, sabe. – Cruel, aquilo tinha sido cruel e doeu em Scorpius.


E ele podia ter simplesmente virado as costas para aquela garota petulante e a ignorado e então, quando caíssem em casas diferentes, nunca mais se falariam. Mas ele não fez isso e, com toda a certeza, foi esse ato que alterou toda a história dos dois.


– E a garotinha do papai faz tudo o que ele manda? – Scorpius perguntou zombeteiro, fazendo a menina avermelhar.


– É claro que não! – Ela respondeu tentando encontrar palavras para rebater. – Eu também não gosto de você, porque você é um garoto repugnante.


E Scorpius Malfoy ficou pensando no significado da palavra repugnante, afinal, que criança de onze anos falaria por aí uma palavra tão estranha? Ele podia não saber seu significado ao pé da letra, mas sabia que repugnante não era algo bom, porque a garota continuava sorrindo desdenhosamente para ele.


– E você é uma menina muito chata e metida. – Ele devolveu prazeroso por rebater. – E ainda por cima é feia.


Depois disso, ele viu os olhos dela se encherem de lágrimas, mas achou legal a forma como ela não as deixou cair. Em seguida, a menina se aproximou dele e apontou o indicador em seu rosto.


– Nunca mais se aproxime de mim, Malfoy. – Ela disse não contendo o nojo em sua voz.


– Se você não se aproximar de mim, perfeito. – Scorpius respondeu, ciente de que poderia se encrencar por fazer aquela afirmação.


E então, sem mais nada a dizer, Scorpius se voltou para dentro da cabine. Albus Potter demorou um pouco mais para se juntar a ele, mas enfim, apareceu. E, por incrível que pareça, ele pediu desculpas pelo comportamento da menina que – Scorpius realmente ficou surpreso com essa parte – era sua prima.


Malfoy disse que não se importava, contanto que ela não o provocasse. E Albus disse que conversaria com Rose Weasley para que ela mantivesse uma distância segura dele.


E aquele foi o pontapé inicial para todas as discussões que surgiram posteriormente. Era obvio que se evitavam, passavam dias sem se ver, mas quando encontros esporádicos aconteciam nos corredores ou em aulas compartilhadas, bastava que alguém acendesse a primeira fagulha para que a explosão acontecesse.


Quando seus olhares se cruzavam, nada além de faíscas eram vistas por todos.


Mas as faíscas que Scorpius Malfoy sempre pensou que eram de ódio, poderiam ser outra coisa. E ele descobriu isso quando já era tarde demais.


**


–SCORPIUS!


Malfoy foi tirado bruscamente de seus devaneios pelo grito potente – e impaciente – de Anthony Zabine, que estava parado a sua frente, assim como Albus. Ambos estavam tentando falar com Scorpius há algum tempo, mas ele parecia estar preso em outra dimensão.


E, de fato, Malfoy estava. Porque aquela pequena lembrança parecia estar muito distante dos dias atuais. Porque, ao menos naquele tempo – e naquela dimensão – conviver com Rose Weasley era muito mais fácil. Se eles não tivessem brigado naquele primeiro de setembro, será que as coisas teriam sido diferentes?


– Por que você está gritando? – Malfoy perguntou irritado enquanto se levantava e encarava os amigos.


– Talvez porque você estava parecendo um zumbi? – Albus retrucou divertido, obrigando Zabine a segurar o riso e Scorpius a revirar os olhos.


– Muito engraçado Potter. – Disse Scorpius completamente insatisfeito. – Agora que as damas terminaram o jogo de xadrez, podem me dizer o que fazem no meu quarto?


Enquanto Scorpius se dirigia para o closet a fim de trocar as roupas da noite passada, Zabine concentrava seu olhar em uma revista de quadribol recém apanhada e Albus se sentava a cama. Potter teria prazer em dizer ao amigo o que fazia ali, naquele horário da manhã.


– Anthony eu não sei, mas eu vim pra cá assim que acordei porque Hugo estava lá em casa quando a mãe de Rose apareceu na lareira ontem a noite. – Disse Albus enquanto arrancava a revista que Anthony lia para obrigá-lo a prestar atenção na conversa. – E tia Hermione contou que você estava dormindo com Rose no quarto dela.


O sorriso de Albus naquele momento poderia ser comparado com o sorriso de uma colunista de fofocas quando descobre algo em primeira mão. E enquanto Scorpius voltava para o quarto com os olhos levemente arregalados, Zabine encarava Potter fingindo nojo.


– Você está parecendo a minha vizinha fofoqueira Potter. – Zabine sussurrou para Albus.


– Como se você não estivesse curioso para saber se Scorpius finalmente caiu na real. – Ironizou Albus que, ao notar que Scorpius permanecia calado e quieto como se estivesse petrificado, aumentou a voz. – Você vai contar o que realmente está acontecendo entre você e Rose ou eu vou ter que perguntar a minha prima?


Malfoy sabia que Albus não estava blefando, embora a voz divertida do moreno pudesse convencer qualquer um do contrário. Anthony era mais contido, mas estava nítido em seus olhos que ele gostaria de saber mais a respeito de Scorpius e Rose. Encarou melhor as duas figuras a sua frente e suspirou enquanto se jogava na poltrona em frente à cama.


Aqueles eram seus melhores amigos. E se eles não puderem ajudá-lo a entender o que está acontecendo, ninguém mais irá conseguir.


**


A manhã tinha passado de forma monótona e calma.


O sol estava à pino, denunciando que o dia seria maravilhoso, e uma suave brisa balançava a folhas das árvores do lado de fora, juntamente com o velho balanço.


Rose Weasley encarou o balanço de madeira branca que ficava embaixo de uma árvore e sentiu uma série de coisas que ela não sabia definir. As lembranças da infância se misturavam com o beijo que Scorpius e ela tinham trocado, a levando se lembrar do outro beijo que recebeu de manhã e das palavras que ele despejou em cima dela.


– Você não gosta de ficar comigo? Não gosta de me beijar?


As palavras dele a torturavam desde que ele tinha partido pela manhã. E ela se amaldiçoava porque se as coisas estavam do jeito que estavam, a culpa era dela que inventou um acordo que agora não parecia mais ser tão inofensivo.


Porque se não fossem os malditos 300 Galeões, as coisas continuariam do jeito que sempre foram entre eles e não aquela relação confusa em que eles tinham se metido.


Ela suspirou pesadamente e, quando percebeu, seus pés lhe guiavam para fora de casa na direção do seu velho balanço, na esperança de que ele, como um bom amigo, pudesse lhe dar alguns conselhos.


Derrotada, Rose sentou-se na madeira enquanto seus pés roçavam o gramado baixo. Ela queria gritar, queria chorar, mas nada daquilo parecia apropriado. Certamente, Lily saberia o que lhe dizer naquele momento, mas sua melhor amiga não queria conversa com ela. Não podia sequer conversar com a mãe, visto que Hermione Weasley nem sonhava com a bagunça que a vida da filha havia se tornado.


As coisas estavam erradas. No começo do acordo, ela pensou que podia levar tudo numa boa. Mas agora, ela se via por uma perspectiva um pouco diferente. Ela mentia para as pessoas que amava, mentia para a sua família e para os seus amigos. E só agora, depois de tanto tempo, ela entendia o que Lily queria dizer quando lhe alertou sobre os riscos que aquele acordo poderia trazer.


No final das contas, as teorias de Lily não lhe pareciam mais tão absurdas. Porque mesmo que ela ainda tivesse dificuldades para acreditar, havia se tornado uma das garotas de Scorpius Malfoy. E aquilo doía. Porque enquanto estivessem de férias, ela tinha certeza de que estaria ao lado dele; mas e quando primeiro de setembro chegasse?


Em Hogwarts, havia garotas muito mais bonitas do que ela. E, com toda a certeza do mundo, a fama de Scorpius Malfoy aumentaria ainda mais quando todos descobrissem que ele saiu com Rose Weasley nas férias – porque agora ela sabia que não poderiam esconder aquele namoro sem que sua família ou a família dele desconfiassem de que aquele relacionamento nunca existiu.


Ela tinha uma vida mais tranqüila antes dos 300 Galeões. Porque odiar Scorpius Malfoy era muito melhor do que sentir o que ela sentia agora.


Isso porque para Rose Weasley estava sendo impossível não se apaixonar por Scorpius Malfoy.


Ela tinha passado a vida toda detestando aquele garoto e acreditava que nada seria capaz de mudar aquilo. Mas bastaram alguns dias ao lado dele, para que ela pudesse descobrir que Malfoy não era feito apenas de defeitos. E ela, por mais errado que aquilo pudesse soar, estava gostando daquele lado novo dele que ela tinha descoberto.


Porque era bom saber que Scorpius Malfoy tinha sentimentos, visto que, por muito tempo, ela imaginou que ele não tivesse nem ao menos um coração.


Rose soltou um longo suspiro e se agarrou ainda mais firme nas cordas do velho balanço. Talvez fosse bom para ela sentir um pouco de vento no rosto enquanto balançasse. Deu impulso uma, duas, três vezes. Até que atingiu uma altura razoável. Não estava tão alta como ficava quando seu pai a empurrava, mas por hora, estava bom.


Distraída com o pequeno vôo que alçava, Rose não ouviu os passos de alguém se aproximando. E quase enfartou quando sentiu mãos grandes e pesadas pressionando suas costas, a fazendo voar mais alto.


Ela conhecia aquele toque, mas virou a cabeça um pouco para comprovar sua teoria. E sorriu quando percebeu que estava certa:


– Pai? – Ela questionou um pouco confusa por ele estar em casa naquele horário. – O que faz aqui?


**


Scorpius Malfoy tinha acabado de desabafar suas dúvidas com os melhores amigos. Mas ao contrário do que ele imaginava, nem Albus e nem Anthony pareciam estar levando tudo o que aconteceu a sério porque Scorpius via os sorrisinhos debochadamente sonserinos nascendo dos lábios de ambos.


– Você está me dizendo que sentiu ciúmes do Lorcan e que passou a noite com Rose sem se aproveitar dela e ainda não sabe o que está acontecendo com você? – Anthony questionou incrédulo.


– Achei que você fosse mais espero do que isso Scorpius. - Albus concordou enquanto dava alguns tapinhas amigáveis nos ombros do Malfoy, que bufou.


E então era assim? Malfoy pensou resignado. Ele tinha confiado seus problemas aos melhores amigos e eles ainda zombavam da sua cara? Com toda a certeza, Merlin não poderia ter sido mais sacana ao colocar Anthony e Albus na sua vida.


– E eu achando que vocês eram meus amigos. – Malfoy resmungou da poltrona onde estava sentado.


– Mas é exatamente porque somos seus amigos que estamos te zoando por você ignorar aquilo que está tão óbvio. – Potter disse fingindo um ar de sabedoria.


Mas foi Anthony, que ao ver a expressão ainda confusa de Malfoy, disse as palavras que assombrariam Malfoy pelas próximas horas.


– Você se apaixonou pela Weasley, cara!


E então Potter e Zabine observaram os olhos de Scorpius Malfoy se arregalarem.


Era óbvio que fazia sentido aquilo que os amigos lhe disseram, mas mesmo assim ele não conseguia pensar com clareza. Sua cabeça zunia e ele sentia o peito se comprimir, talvez pela falta de ar momentânea que tomou conta dele, ou talvez – e mais provavelmente – pelo medo que passou a sentir.


Scorpius Malfoy nunca tinha se apaixonado e alguém lhe dizer, de repente, que o tal cupido tinha enfim o acertado, o deixava tonto.


Por que aquilo não poderia ser real.


– Vocês estão ficando loucos. – Malfoy rosnou enquanto andava de um lado para o outro. – É a Rose, lembram? A garota irritante com quem eu impliquei a minha vida toda! Posso gostar de estar com ela, mas estar apaixonado? Esqueçam.


Potter, que já esperava aquela reação do amigo, sorriu de forma conspiratória para Anthony. Em seguida, andou até o melhor amigo e o segurou pelos ombros, fazendo com ele parasse de fazer círculos caminhando no mesmo lugar.


– Se você não está apaixonado por ela, me responda uma coisa – Albus disse a ele de forma séria. – Por que se preocupou com ela ontem?


Scorpius sentiu a pele do rosto aquecer, mas disfarçou e, logo, falou a primeira coisa que veio a cabeça:


– Porque era meu papel. Se eu não aparecesse, os pais de Rose iriam desconfiar da nossa farsa. – Ele respondeu como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.


E então Anthony Zabine, percebendo a intenção de Albus, se intrometeu no assunto. Scorpius era seu melhor amigo, era sua obrigação o fazer abrir os olhos.


– Mas o seu papel não o obriga a sentir ciúmes. – Ele disparou duro, fazendo Malfoy se virar pra ele impassível. – Qual é Malfoy, você não deixava a Weasley se aproximar de nenhum garoto. E não me refiro nem ao Scamander. Acha que eu esqueci do péssimo humor que você adquiriu depois que a Weasley começou a sair com Jimmy Thomas?


Maldito Corvino, pensou Scorpius. Thomas nunca havia sido bom o suficiente para Rose. Ele era almofadinha demais. E irritante também.


– Qual é? – Extravasou ele. – Thomas é um completo imbecil!


– Mas estava com a sua garota. – Potter retrucou sorrindo ironicamente.


– Ela não é a minha garota. – Malfoy respondeu sentindo-se triste por aquela afirmação. – Por enquanto a única coisa que nos mantém unidos é a droga daquele acordo dela.


Anthony Zabine bufou alto e virou de costas, incapaz de agüentar as frescuras de Scorpius para admitir algo que estava na sua cara. Potter mudou a sua expressão, perdendo a paciência visivelmente.


– E se você continuar agindo dessa maneira, ela continuará a não ser sua garota. – Avaliou Potter, estreitando os olhos na direção de Scorpius. – Qual é o seu problema? Acha que ficar negando o tempo todo aquilo que está na sua cara vai ajudar? Quando me tornei seu amigo, achei que você mais corajoso do que isso. Ou Rose não vale o seu esforço?


E os três mergulharam em um silêncio absoluto.


Scorpius Malfoy fechou os olhos por alguns instantes, tentando colocar a mente – e o coração também – no lugar. No fundo, ele sabia que seus dois melhores amigos estavam certos, mas mesmo assim era difícil assumir para si mesmo que havia se apaixonado. Perguntava-se como deixou as coisas chegarem aquele ponto e como tudo seria dali por diante.


O que fazer? Admitir que amava Rose Weasley e se aprisionar a uma só garota ou renegar aquele sentimento assumindo o risco de perdê-la para sempre?


Scorpius Malfoy pesou as duas coisas na balança invisível da sua consciência. Logo, suas dúvidas desapareceram.


Albus Potter e Anthony Zabine já estavam desistindo de convencê-lo qualquer coisa quando os lábios de Scorpius se entreabriram e por eles não escapou nada além de um suspiro.


– Vocês estão certos.


Zabine foi o primeiro a virar-se para ele, gritando que finalmente ele havia percebido o lógico. Potter era discreto, mas tinha um sorriso triunfante nos lábios, porque apesar de ter sido contra aquele acordo ridículo, ele reconhecia que se não fosse por ele, Malfoy não teria percebido que todo aquele ódio que ele sentia pela sua prima era amor reprimido – misturado a um pouco de tensão sexual também.


– Fico feliz que você tenha resolvido entrar para a família. – Potter disse enquanto fingia que enxugava as lágrimas. – Mas agora me diga uma coisa, Rose, pelo que nos contou ainda não sabe desse o amor avassalador que sente por ela, não é? – Questionou sorrindo sarcasticamente.


Malfoy suspirou.


– Não, mas eu disse que estava me sentindo estranho. Que eu me sentia diferente em relação a ela. – Ele respondeu, lembrando-se da breve discussão que travou com ela pela manhã. – Mas eu disse a ela que provaria que estava mudado. – E então, antes que Malfoy ou Zabine debochassem dele, acabou completando. – Caramba, se eu disse isso, como pude ser tão cego?


– A primeira fase é sempre a negação. – Anthony disse rindo levemente.


– E você entende bem disso não é? – Albus perguntou para ele, que fechou a cara imediatamente. – Você quer esquecer a minha irmã, mas não consegue.


– Pelo que me falou, Hugo esteve na sua casa a consolando ontem a noite. – Devolveu Zabine mal humorado. – Portanto, ela tomou a decisão dela e eu não tenho mais nada a ver com isso.


– Você é pior que Scorpius quando se fala em negação. – Resmungou Potter. – Mas caso mude de idéia, saiba que eu sempre vou preferir você à Hugo.


Zabine franzio a testa discrente.


– Mas vocês são primos, foram criados praticamente juntos. – Observou Anthony.


– Exatamente. – Albus respondeu como se fosse lógico. – Além de ser meio esquisito, eu nunca poderei bater em Hugo, porque minha mãe nunca deixaria. Já você...


Zabine já abria a boca para retrucar que Potter estava sendo preconceituoso ao dizer que não gostava do relacionamento de Lilian por ela estar com o primo. Milhares de famílias bruxas tradicionais só existem por causa dessa união. Mas não conseguiu, visto que Malfoy estava inquieto e – Zabine o agradeceria por isso mais tarde – interrompeu a discussão dos dois.


– Será que vocês podem parar de se atacar e me ajudar? – Ele questionou levemente irritado. – O que eu posso fazer para provar a Rose que eu mudei. E que eu gosto dela pra valer?


Potter prendeu o riso, achando as dúvidas do melhor amigo esquisitas. Scorpius Malfoy estava em dúvidas sobre o que fazer para conquistar uma garota? Era aquilo mesmo?


– Não era você o especialista em conquistar garotas, Scorpius? – Anthony perguntou zombeteiro. Malfoy fechou a cara.


– Conquistar garotas estúpidas. – Avaliou ele. – Rose é diferente de todas as garotas com quem a saí. Ela é... especial. – E então, ao perceber o que tinha admitido, ele sentiu a pele do rosto se aquecer. Tinha certeza que estava corado, porque seus amigos não conseguiram segurar o sorriso.


– Olha só pra ele Zabine. – Zombou Potter. – Já está até fazendo discursos apaixonados.


– Verdade. – Concordou Zabine enquanto imitava Albus e fingia engolir o choro. – Nosso garotinho está crescendo.


Scorpius revirou os olhos pela milionésima vez naquela manhã e esperou os dois pararem de rir. Malfou cruzou os braços abaixo do peito e, quando Potter e Zabine não riam mais como duas hienas, perguntou de forma cansada.


– Vocês vão me ajudar ou não?


Albus e Anthony trocaram olhares e, então se aproximaram de Scorpius. Zabine, então, foi o primeiro a falar.


– Você tem que mostrar a ela que realmente está a fim. E o mais importante, que pra você, ela é diferente de todos os tipos de garotas com quem você já saiu.


– Okay. – Malfoy respondeu quase eufórico, mas sua expressão beirou o desespero quando perguntou. – E como eu faço isso?


Zabine revirou os olhos, mas Potter respondeu da forma mais clara que conseguiu.


– Você conquista garotas desde que tinha treze anos. Não vai ser difícil, você só precisa prestar atenção nos detalhes. – Albus falou e sorriu em seguida. – Rose tem aquela cara de durona sabe-tudo, mas ela é como a maioria das garotas. Ela gosta de flores e gosta de ser levada para jantar fora, só não gosta de ser pressionada.


Scorpius analisou mentalmente todas as suas opções e por fim, acabou decidindo qual seria o seu primeiro passo.


– Se eu a convidasse pra jantar hoje à noite, ela não se sentiria pressionada, certo?


**


Ela já não estava mais no balanço. Naquele momento, Rose e Ronald Weasley estavam sentados na varanda de casa aproveitando um bom chocolate quente. O pai tinha lhe dito que havia pegado a manhã de folga porque tinha alguns problemas para resolver, mas ela ainda não estava entendendo onde, exatamente, ela entrava naquela decisão.


– Esse é o seu último ano em Hogwarts. – Avaliou ele e Rose o encarou, aguardando que completasse seu pensamento. – Acho que a sua decisão de estudar em uma universidade trouxa já foi tomada, não é?


Rose sorriu para ele, porque, ao contrário do que todos poderiam imaginar, Ronald apoiava a carreira que a filha tinha escolhido, mesmo que não fosse exatamente o que ele tinha planejado para ela.


– É vou me inscrever em breve, mas ainda não defini a universidade. – Ela respondeu e ao ver o pai sorrir de maneira triste, completou. – Qual é? Não vai se livrar de mim tão fácil, existe aparatação, lembra? – Ela perguntou piscando um olho e riu.


Ronald também sorriu de leve, embora aquela fosse apenas uma de suas preocupações. Estava sentindo as costas doerem, mas aquela noite mal dormida no sofá – visto que Hermione não voltou atrás na sua decisão depois que ele “invadiu” a privacidade de Rose – serviu para fazê-lo refletir. O garoto Malfoy, provavelmente, não era o seu maior problema.


O seu maior problema era o fato de que ele estava vendo os seus filhos crescendo. E assim como ele não estava pronto para ter a sua filha mais velha, a sua princesinha, longe de casa, ele não estava pronto para vê-la se tornar independente. Porque ele sabia que Rose havia puxado Hermione nesse quesito.


– Você vai ser uma grande jornalista, meu bem. – Ronald disse e os olhos da menina imediatamente se encheram de lágrimas. – É uma mulher bonita, corajosa e inteligente. E Scorpius vai ser um cara de sorte se não deixar você escapar.


E o coração de Rose vacilou quando ela ouviu o nome do, até então namorado. Ela encarou melhor o pai e, ao notar que os olhos deles estavam intensos, ela percebeu que ele estava sendo sincero. E que, apesar de todas as implicâncias, ele passaria a apoiar o namoro dos dois. E então, ela quis chorar.


Porque toda aquela relação com o Malfoy era uma farsa, por mais que ela quisesse que deixasse de ser. Mas ela tinha medo. Medo de ser usada, de ser tratada como um brinquedo, que quando perde o interesse é jogado fora.


– Você acha que Scorpius e eu podemos dar certo? – Ela não conseguiu reprimir o questionamento em voz alta.


Ronald a encarou sem entender, e Rose corou.


– Por que diz isso? – Ele perguntou e ao perceber que a filha não diria mais nada, completou. – Acho que vocês já deram certo, se quer saber. – Ronald respondeu sorrindo para a filha.


– Mas nós sempre fomos rivais na escola, nunca nos demos bem. Você lembra de todas as reclamações que já receberam de Minerva por causa das minhas brigas com ele? – Rose questionou e, ao ver o pai assentir, completou. – Como o senhor acha que duas pessoas que discutem até pelo ar que respiram podem dar certo?


E Ronald Weasley sorriu diante do questionamento da filha. Como ele sabia? Simples, vivenciava aquela mesma situação todos os dias, dentro da própria casa.


– Porque vocês me lembram duas pessoas que eram exatamente como vocês na escola. – Ron respondeu, sentindo um pouco de nostalgia. – Completamente opostos, mas que se completam como as peças de um quebra-cabeça.


– E eles conseguem ser felizes mesmo com todas as diferenças? – Rose perguntou ainda sem saber se acreditava na história do pai.


Ron sorriu de canto.


– Você acha que sua mãe e eu somos felizes?


E então, a boca de Rose Weasley se abriu surpresa. Ela cresceu ouvindo as brigas dos pais, mas sempre sorria quando via que, minutos depois, eles estavam rindo e pedindo desculpas um para o outro. Ela nunca tinha parado para pensar que os pais pudessem ter tido uma adolescência normal – com todas aquelas fases de insegurança e busca de identidade. E problemas amorosos. – mesmo com as constantes batalhas que precisaram travar na época.


– Se eu me casar um dia, quero ter um casamento como o de vocês. – Rose respondeu e riu quando Ronald fez uma careta de desgosto.


– Eu acabei de aceitar seu namorado, fale de casamento apenas daqui a dez anos quando eu tiver absorvido o baque. – Resmungou ele.


Em seguida, Rose o abraçou. Porque aquela era a primeira conversa civilizada que tinham em muito tempo.


– Scorpius parece ser um bom garoto. – Ron disse enquanto sentia o cheiro de cereja que emanava dos cabelos da filha. – E me desculpe por tentar empurrar o Lorcan pra cima de você. Eu sempre quis o seu melhor.


– Está tudo bem pai. – Rose respondeu com a voz embargada enquanto se afastava do pai. – Eu te amo muito, sabia?


– Eu também te amo, minha filha.


E então, se encararam por mais alguns segundos, até que Ronald decidiu que era hora de voltar ao trabalho. Que sua missão por ali tinha acabado. Quando contasse a Hermione sobre a conversa que tivera com a filha, certamente ela ficaria orgulhosa.


– Só mais uma coisa Rose. – Ronald pediu antes de aparatar. – Não conte ao Malfoy sobre a nossa conversa. Gosto da cara de apavorado dele sempre que cruza comigo.


E então, ele sumiu, deixando Rose rindo de suas últimas palavras embora sentisse o peso do mundo em suas costas.


Ela se sentia culpada por estar mentindo daquela maneira, mas simplesmente não tinha coragem de dizer ao pai que o namoro com Scorpius Malfoy era um apenas um acordo que tinha data certa para acabar.


E ela sentiu o estômago revirar. Por que faltavam apenas dois dias para o ano novo.


Mas Rose não conseguiu se lamentar por mais tempo, porque antes de entrar em casa para afogar a culpa em um pote sorvete, uma coruja negra pairou no ar, pousando em seu braço logo em seguida. E Rose Weasley arfou assim que viu o envelope com o brasão imponente da família Malfoy estampado.


Hey Rose, como você está?


Essa é a décima carta que eu tento escrever pra você. Porque eu queria pedir desculpas pela forma como eu saí da sua casa hoje de manhã. E eu queria escrever algo mais bonito e inteligente do que isso, mas simplesmente não consigo. Então, será que você pode me desculpar?


Eu quero que saiba que apesar de não ter sido no melhor momento, as coisas que falei eram verdadeiras. Eu realmente me sinto diferente quanto a nós dois. E acho que nós começamos tudo de forma errada, não apenas esse namoro, mas a forma como nos conhecemos. Então, eu decidi que quero começar de novo.


Bem, meu nome é Scorpius Malfoy e estou em meu último ano em Hogwarts. Sou da casa de Sonserina e, quando me formar, pretendo ser jogador de quadribol profissional. Se não fosse jogador, provavelmente eu gostaria de ser medibruxo. Minhas cores preferidas são o verde e, pro mais absurdo que seja, o vermelho. E você? Quem você é?


Que tal me contar hoje à noite, enquanto jantamos em um restaurante que eu conheço em Hogsmead?


Pego você as 20h00min. E não aceito um ‘não’ como resposta.


Com carinho,


S. Malfoy.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.