Um Black muito suspeito



Pela manhã não quis tomar café, fui direto ao Corujal enviar uma carta a minha família. Amarrei-a na nossa dócil coruja Felix, acariciei suas penas que tinham cor de café, enquanto ela piava feliz, fiquei meio incerta por alguns segundos se enviaria ou não aquela carta. Nela, eu pedia permissão fervorosamente para passar as festas na casa de uma amiga muito querida, Hestia.  Mamãe ficaria de coração partido, mas era por ela que eu faria isso também, tenho certeza que em dado momento entenderia. Fiz um último carinho em Felix e deixei que ela fosse embora. Dirigi-me para fora do Corujal, imaginando que no dia seguinte receberia no café um berrador ou uma carta muito desgostosa de Evangeline reclamando sobre como eu era uma desnaturada, que não se importava com a família, que deixaria John e Dominique sem sua tia ‘memmeli’ e coisas do tipo. Gemi em desprazer, não pela carta que receberia, mas porque me deparara com Nigel Spring assim que passava pelo portal do Corujal.  Fingi não notá-lo e prossegui meu caminho descendo a escada. Ele fez um comentário que não pude entender, mas achei que o tom dele parecia bem ofensivo. Nigel era filho de tia Wanda, irmã de meu falecido pai. Ele era sonserino, assim como a maior parte da família fora. Meu pai fora um corvinal, sua mãe o chamava de ‘sonhador’. Tia Wanda odiava minha mãe pelo simples fato de ser uma trouxa. Meus avô se importaria, porém já era falecido na época e, minha pobre vó – como meu pai sempre se referia a ela – não possui plena faculdade mental. Acho que a situação dela era tão séria que papai não nos levou a ela sequer uma vez. Quanto a tia Wanda e ao resto da família, papai virou as costas a ele. Dizia que ninguém ordenaria quem ele deveria amar. Nigel tinha a minha idade, herdara o ódio de sua mãe. Eu, por outro lado, não dava a mínima a eles. Mamãe poderia ser do jeito dela, mas minha família era tudo o que eu possuía. Eu poderia chamar Evangeline de trasgo do subúrbio ou encher a paciência de Emily até que estourasse, o que era muito difícil acontecer, e reclamar dos princípios de mamãe. Mas elas eram as minhas meninas e, embora eu fosse a mais nova, considerava-me capaz de protegê-las de tudo e alguém que não as considerassem dignas de tanto amor, simplesmente não me valia a pena.


- Desculpe, o que você disse?


Ele riu friamente e deu de ombros - Não venha me questionar como se fosse superior, você não é.


Nigel sempre fora desagradável, mas nunca dirigia a palavra assim para mim, mas se eu pensasse bem na maneira como o derrotei no último encontro do grupo de duelos, chegaria à conclusão de que ele poderia ter motivos para ficar, no mínimo, frustrado comigo.


- Endoidou, primo? Não me dirija a palavra assim, nem ao menos notei sua presença.


- Infelizmente não posso dizer o mesmo não é? O fedor do sangue da sua mãe me suas veias é inconfundível.


Eu sabia que muitos alunos aderiam ao pensamento de Voldemort e seu grupo, assim como vários planejavam segui-lo, se já não o faziam. Não é preciso muito para concluir o que o nojento do Nigel escolhera para a vida dele. Porém ele não passaria por cima de mim tão fácil, não quando eu não tinha feito nada para incomodá-lo. Acho que se olharmos no geral, aquela guerra acontecia justamente assim. Um pensamento equivocadamente superior sendo forçado por nossas gargantas, o que não engoliríamos. Meu sangue não era sujo e minha magia era minha. A varinha de salgueiro, inflexível com pelo de unicórnio em minhas vestes, tinha me escolhido no Sr.Olivaras.  Era revoltante os comentários que seguiam saindo de bocas de pessoas como Nigel.


- O cheiro deve ser de toda essa merda que sai da sua boca. – se mamãe me ouvisse agora, buscaria a barra de sabão.


- Ah sua mestiça...


-Olhe lá o que vai dizer- o interrompi, já sentindo minhas bochechas queimarem - Ou vai acabar novamente aos meus pés choramingando, como na última segunda-feira.


Eu sei que provavelmente não deveria ser tão petulante, normalmente eu não era. Creio que aquilo fez a raiva de anos a fio de Nigel por mim apenas crescer. A coisa ficou um pouquinho pior quando Nigel avançou em minha direção, recuei até me recostar na pedra fia, mas não abaixei a cabeça e por pouco não me desequilibrei no degrau, a queda não seria muito agradável. Quanto a Nigel, não encostou um dedo em mim, mas eu podia sentir sua respiração na minha testa.


- Para trás! Se você encostar em mim eu juro que...


- Que o que, Sangue-ruim? O que você vai fazer?


Respirei fundo e o empurrei para longe e me virei para terminar de descer as escadas.  Ele me segurou pelo braço esquerdo, fechei meu punho direito lembrando-me exatamente como Pierre, meu primo trouxa, me ensinara e virei o corpo com tudo, acertando-o no queixo. Nigel era um magricela, então uma pessoinha com minha força poderia desorientá-lo um pouquinho. O pesadelo ficou completo quando vi Sirius Black subindo a escada correndo, tirando sua varinha das vestes e apontando-a para mim.


- Abaixe essa varinha, Spring.


Parei e olhei para trás, Nigel apontava sua varinha para todos os lados, meio desorientado.


- Faça-me o favor!- Bufei e peguei minha varinha rapidamente - Sério, Nigel? Você sabe muito bem o que pode acontecer se fizer algo... Eu não vou prejudicar minha casa por um idiota, então guarde sua varinha e não me importune mais. – Tentei utilizar meu tom de voz mais ameaçador. Sirius já se colocava a minha frente. – O que você está fazendo? – Indaguei dando a volta e ficando ao lado dele.


- Estou te ajudando, sua má agradecida. Vou ensinar a esse ser escroto como se trata uma dama- Nigel recuperara-se e parecia muito zangado. Eu não saberia dizer o que era pior, ele ou Sirius tentando defender minha honra.


- Seu idiota, não meta seu nariz onde não é chamado! Vá embora antes que eu decida acabar com você também.


- Há! E como você acha que vai fazer isso?


Eu olhava de um para o outro, considerando, por um momento, estuporar ambos.


- Chega, chega e chega! Nigel, não seja idiota, não quero que ‘titia Wanda’ tenha mais um motivo para me odiar, que é o que vai acontecer se não nos deixar em paz, agora! – me virei para Sirius, séria. – Realmente não se meta onde não é chamado. Pronto. Todos guardem as varinhas.


Guardei a minha, mas Sirius continuou sério. Nigel pareceu pensar, pela primeira vez no dia, que estava em desvantagem e começar a recuar. Catei Sirius pelo braço e praticamente comecei a arrastá-lo para longe dali. Dispensei responder ao comentário de Nigel sobre como aquilo não ficaria impune.


- Verme fedorento. Eu não posso ter vindo da mesma família que aquilo.


Meus pés afundavam na neve tamanha era a força com a qual eu caminhava, Sirius me acompanhava frustrado. Minhas mãos permaneciam dentro do casaco, minha cabeça estava quentinha com uma toca da grifinória.


- Não deveria ter feito isso, Emmeline. Eu tinha a obrigação de dar uma lição naquele fedido.


- Dar uma lição? – Parei bruscamente e o fitei cética- Você queria humilhá-lo. Como vocês fazem desde que se denominaram “ Os marotos”, como se tivessem direito de passar por cima de qualquer um. É o que vocês fazem com o Snape... É o motivo pelo qual Lily não saber o que fazer em relação ao Potter. – Sirius mantinha os braços cruzados, olhando para os lados, como se eu nem estivesse falando. – O que você estava fazendo lá, afinal?


Ele me olhou por alguns segundos e encolheu os ombros.


-Vi você saindo e fui atrás, há algum tempo quero propor um acordo, achei que seria a hora certa de lhe falar. – Arqueei a sobrancelha, aquilo já soava estranho- Minha nossa, me deixe explicar! – Sorri levemente e assenti para que ele falasse sua proposta. – Com muito esforço eu quase consegui média em Herbologia, - só se fosse o esforço dele se esticar e tentar enxergar a prova do Remus, mas guardei o comentário maldoso- e creio que vou precisar de uma ajudinha esse ano. E eu sei que você é uma aluna bem aplicada. 


- Bem, mas você falou em acordo...


- Exato. Desde o primeiro ano percebi que a graça e leveza que você exalta ao andar – não tenho certeza se o comentário foi maldoso – não se aplica quando você está voando.


- E o que tem a ver com isso?


- Você é péssima voando, Memeline.


- Não me chame assim.


- Estou tentando te ajudar.


- Eu sei voar e pronto, é suficiente.


- Não se você pretende ir à direita e acaba dando uma volta de 360°.


-Não é bem assim... – mas já não estava certa sobre isso.


- O que eu sei é que você quer seguir como auror – mordi o lábio, eu não partilhava esse desejo com muitos. Mas como eu pensava, todos sabiam. – E bem, esse requisito é muito importante.


- Por que está fazendo isso? Remus poderia muito bem te ajudar em Herbologia.


- Remus já tem muito com o que lidar. – franzi o cenho, sem entender exatamente o que ele queria dizer. A verdade é que Sirius estava certo. 


- Acho que tudo bem, então.


- Isso Memme... Emmeline. Agora, você pode me responder algo? – dei de ombros – Como você toda raquítica conseguiu dar um belo soco no Spring?


Coloquei as mãos dentro dos bolsos, apertei-as contra o corpo, balançando a cabeça. Não valia contrariá-lo. Comecei a caminhar em direção ao castelo e ele me acompanhou.


- Tenho vários primos trouxas. E tem esse, o Pierre. Ele é um tanto estranho. Na última vez que nos visitou, me ensinou a como me defender de algum tarado – ri com a lembrança de dois anos atrás. Pierre é três anos mais velho que eu, filho de tia Lucy, irmã de mamãe – sinto falta dele, foi embora para a França estudar e não o vejo há muito tempo. Minha mãe não gostava muito da nossa aproximação, eu não desgrudava de Pierre desde que eu era pequenininha. Meus outros primos trouxas nunca se aproximavam muito de mim e das minhas irmãs, acho que sentiam que tínhamos algo diferente. Mas não o Pierre, ele nos adorava. Cuidava de mim. – olhei para Sirius, ele estava com uma cara meio feia, não entendi, mas prossegui- Posso ser ruim em uma vassoura, mas eu pilotava a moto de Pierre com muita, ahn, graça e leveza.


- Moto? Tipo uma bicicleta?


Ri  e assenti.


- Deveria conhecer mais o mundo trouxa, Sirius. Tem muita coisa legal. Se minha mãe soubesse que o Pierre me fizera andar naquilo, provavelmente me deixaria de castigo uma eternidade. Mas ele dizia que eu precisava aproveitar as coisas boas da vida.


- Ok, já entendi o Pierre. Fale-me mais sobre a moto. – Segui conversando com Sirius, sobre a moto e todos objetos que ele poderia achar estranho. Eu contava isso como vantagem, fazer parte de dois mundos.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.