Capítulo 8: Cruzando a linha



Hermione estava sentada no saguão do segundo andar, os cotovelos sobre os joelhos e a cabeça repousando nas mãos, tentando determinar em que ponto as coisas saíram tanto do controle. Podia ouvir Jorge andando pela cozinha lá embaixo, fazendo comida que ninguém comeria. Os machucados de Laura a manteriam no hospital ainda por um tempo; Justino a traria pra casa. Lupin, aprisionado dentro do próprio corpo de lobo, estava em uma jaula no Confinamento onde era observado cuidadosamente quanto a outras reações que poderia apresentar devido à poção envenenada. Demoraria pelo menos um dia até que tivessem certeza. Ela acabara de chegar em casa, física e emocionalmente esgotada, encontrando o seguinte bilhete de Harry preso na porta de seu quarto.


-H... Fui pra DI. Lefty Mamakos foi ferido num ataque ao treinamento da DI. Fique aqui!


Sem conseguir pensar em nada que pudesse fazer, ou algum lugar pra ir, obedeceu. Allegra tomara outro peão em seu jogo friamente calculado, e a vítima escolhida era significante. Ela só poderia imaginar a reação de Harry ao ouvir que seu amado tutor fora vítima dos planos dela. Ele representava o melhor ao que Harry se juntara na DI e se ele podia ser atingido, qualquer um podia. Estava acontecendo novamente. Voldemort estava sistematicamente desmantelando o mundo de Harry, atacando tudo e todos ao redor dele. Se continuasse assim, logo não restaria nada... E não deixou de notar que ela própria era um alvo primário, apesar de que Allegra provavelmente a deixaria por último.


Ficou tensa ao ouvir a porta da frente bater, depois passos apressados vindo do corredor. Observou enquanto Harry subia as escadas dois degraus de vez depois correu sob o arco que cobria as escadas que levavam até o quarto dele; pareceu não notá-la. O rosto dele estava cheio de determinação. Ela levantou e o seguiu.


O quarto de Harry era no terceiro andar da ala central da casa. Era o maior e mais interessante de qualquer um dos quartos; Jorge insistiu que Harry ficasse com ele. "Acho que salvar o mundo dá o direito à pessoa de ter um quarto realmente ótimo" ele dissera. Harry ficou constrangido, mas não recusou a oferta, era realmente o melhor quarto, e o único na casa que tinha um nome: O Cloister. Era comprido e largo, cercado por janelas e duas lareiras. Não havia teto de verdade, no lugar onde estaria um, havia vidros emoldurados por ferro. O vidro era enfeitiçado para evitar que quebrasse e pra manter pássaros e fragmentos estranhos longe.


Hermione o seguiu subindo as escadas e empurrou a porta do quarto, e o encontrou jogando roupas em seu malão, e vários itens de seu quarto que pareciam ser pegos aleatoriamente. Ele olhou pra ela, registrando sua presença, mas nada disse, apenas voltou a fazer o que quer que estivesse fazendo. O que quer que tenha visto na DI, fora a gota d'água. A compostura que manteve no hospital não estava presente... Estava apenas reagindo agora, ela podia ver isso em seu rosto.


-Harry, lamento por Lefty. - disse baixinho. - Ele está bem?


Ele balançou a cabeça. -Depende de sua definição para esse termo. Ele vai viver, mas vai ter que fazer isso sem sua perna esquerda e a mão direita. - Hermione fechou os olhos. -Ela atacou cadetes, Hermione. Eles não podiam se defender e Lefty perdeu partes de seu corpo tentando salvá-los, do jeito que ela sabia que ele faria. Isso vai terminar, agora mesmo. - continuou enfiando seus pertences no malão.


-O que é isso tudo? - perguntou, com medo de saber a resposta.


-Estou indo – ele respondeu, seu tom contido e controlado.


-Por quanto tempo? - perguntou, mantendo seu tom o mais casual possível.


Ao ouvir isso, ele parou e olhou pra ela. -Não vou voltar. Estou indo pra sempre.


Ela deu dois largos passos na direção dele. -Do que está falando? Essa é sua casa!


-Não é mais. Ainda vou cobrir minha parte na hipoteca se é o que te preocupa.


Hermione mal podia acreditar no que ouvia. –Que inferno, qual é seu problema? - gritou. -Acha que dou a mínima para dinheiro numa hora como essas? Não pode simplesmente ir!


Ele ficou reto, os olhos brilhando -Posso e vou! - gritou em resposta. -Enquanto ficar aqui e não fazer nada estarei colocando toda casa em perigo! - passou por ela pra pegar alguns livros. Ela fazia círculos no mesmo lugar, seguindo os passos fervorosos dele pelo quarto.


-Já voltou a seus sentidos? É um exercício de futilidade! Enquanto você se importar conosco, ele ainda poderá nos usar contra você, não importa o quanto esteja longe! Pode muito bem ficar aqui e ao menos estar preparado quando chegar a hora!


-Não! Ele está fazendo tudo isso por uma razão, e não tem nada a ver com você. Ele me quer, ele vai me ter. Depois que eu for atrás dele, vai te deixar em paz. - Hermione estava pensando se com "você" ele queria dizer "todos vocês" ou apenas ela.


Ela balançou a cabeça, as lágrimas ameaçando. -Não acredito que vai fazer isso comigo.


Ele virou pra ela, seus olhos brilhando. -Pra uma pessoa inteligente, você às vezes é bem idiota! Não entende? Estou fazendo isso por você! Voldemort já me tirou todos que realmente me importavam na vida... Meus pais, Sirius, Hagrid, Dumbledore... E depois ele levou Rony também, e nós sabemos que nenhum de nós dois realmente superou isso. Pensei que tivesse dado um jeito nele pra sempre, mas deveria ter pensado melhor,e ele vai voltar e vai me fazer pagar! Não posso ficar parado sem fazer nada enquanto ele se prepara pra terminar o trabalho! Se tenho que pagar por desafiá-lo então vou pagar com minha vida e não com as suas! - Hermione encolheu com a fúria dele. Ele levantou a mão direita, a palma estendida na direção dela. No centro estava uma pequena cicatriz em forma de vírgula que ele tinha há anos. -Vê essa cicatriz?


Ela fez que sim com a cabeça meio dormente. -Você... você se cortou num pedaço de uma bola de cristal quebrada...


-Não. Isso foi o que eu te disse. O corte que deixou essa cicatriz foi feito por minha própria mão. Na noite após... - ele pausou e se recompôs. -Na noite após a morte de Rony, saí escondido de Hogwarts e fui até seu túmulo. Peguei uma faca e cortei minha mão, e fiz uma promessa pra ele. Eu jurei, pelo meu sangue sobre o túmulo dele, que nunca deixaria acontecer a você o que aconteceu com ele. Queria deixar uma cicatriz pra que eu nunca esquecesse. Até parece que eu poderia. - ele esticou o braço e colocou a mão sobre a bochecha dela; ela quase podia sentir a cicatriz queimando contra sua pele. -Não entende nada? Você é tudo o que me resta no mundo! Ele não vai te pegar, nunca, não enquanto eu viver. É por isso que tenho ficar o mais longe possível, não importa o quanto isso magoe.


Ela balançou a cabeça, meio comovida e meio furiosa. -Não somos mais crianças, Harry. Não sou uma dama em perigo da idade média. Não preciso que você me proteja, e não quero seu cavalheirismo mal direcionado! Se quer bancar o mártir, é melhor se fingir de planta, porque eu não vou ser a melhor platéia! Quer me proteger? Certo! Vamos proteger um ao outro!


Ele recuou, afastando as palavras dela balançando a cabeça que não. -Não é tão simples.


-Não me importa! - ele virou, aparentemente decidindo que ela era uma causa perdida e fechando o malão. Ele o ergueu da cama com um aceno de sua mão e ficou flutuando atrás dele enquanto ele saía do quarto e descia as escadas. Hermione seguia logo atrás. Quando chegaram ao saguão do segundo andar ela murmurou algumas palavras e o malão caiu de vez no chão. Ele virou, a expressão de raiva.


-Me deixe ir, Hermione!


-Não! Você está maluco se acha que vou ficar na janela e estoicamente dar tchau enquanto você galantemente vai embora! Acha que está me dando a dura verdade? Que tal isso como uma dura verdade: você não pode passar por aquela porta e se retirar de minha vida, porque nunca vai terminar entre nós, está me ouvindo, Harry Tiago Potter? Nunca! - gritou pra ele. Alguma parte longínqua de sua mente estava atenta ao fato dos dois estarem cruzando A Linha, a fronteira entre amizade e algo não falado, que tinham colocado entre os dois há tantos anos atrás. Nunca falavam sobre isso, mas a existência dela sempre foi consciente; o que quer que estivesse além da Linha, Hermione estava cara a cara com isso no momento.


Ele levantou as mãos pra puxar os próprios cabelos. -É a única coisa que posso fazer! - ele gritou. -Não posso lutar contra ele, está em todos os lugares e em lugar nenhum! Como posso lutar contra o que não vejo? Preciso sair e encontrá-lo! - ela viu que estava quase sem conseguir manter suas emoções contidas.


-Vai ter que passar por mim primeiro! - ela gritou. As lágrimas estavam muito próximas agora.


Ele de repente abaixou as mãos e desfez a distância entre eles com dois longos passos. Levantou as mãos e a segurou com força pelos braços. Ela olhou intensamente pra o rosto dele, estranho pela emoção nua e de quase-pânico. Ele estava se apoiando numa linha muito fina. -Você me escute - ele disse, sua voz grave, intensa e quase falhando. -È o único jeito, entendeu? Eu tenho que ir! -Os dedos dele apertavam seus braços como prensas, transmitindo os tremores dele através dos ombros dela e por todo seu corpo. Os olhos verdes brilhavam cheios de lágrimas que começaram a escorrer por suas bochechas enquanto ela olhava; ela estava apenas vagamente consciente que suas próprias lágrimas escorriam. -Eu vou e você não pode me deter! - Sua respiração estava ofegante. Hermione não podia falar, apenas ficou parada, sem o que fazer enquanto ele a balançava pelos braços pra reforçar. -Não pode me deter... Você não... Você... Você... - a voz dele cessou e sua expressão desintegrou; ele olhou nos olhos dela por alguns agonizantes segundos, balançando a cabeça. Seu olhar estava cheio de descrença, como se eles não se conhecessem até aquele momento.


Um muro antigo e decadente no interior do coração de Hermione entrou em colapso numa enorme queda e ela jogou seus braços ao redor do pescoço dele com um grito, que ultrapassou os soluços que subiam por sua garganta. Ele a apertou contra o peito com um pânico apertado, enfiando o rosto nos cabelos dela. Os dedos dela cravaram nas costas dele, mas por mais que tentasse, não conseguia segurá-lo mais forte. -Harry, eu não... - ela começou, e então, de repente, não podia mais continuar porque os lábios dele estavam no caminho, pressionado com urgência contra os dela. Por um segundo de choque, Hermione não tinha certeza do que estava acontecendo, e então abriu os olhos e encontrou Harry apenas a olhando com uma expressão perplexa; sua boca formigava do que não havia sido um beijo imaginário. Isso aconteceu? Ela pensou. Sua mente gritava; estamos cruzando A Linha! - a mente falou - Isso vai mudar tudo! Sua vida nunca vai ser a mesma! Ela ignorou os avisos. O que mais poderia fazer? Escorregou as mãos para trás do pescoço dele e ficou na ponta dos pés para levar os lábios até os dele, hesitante; os braços dele a envolveram apertando de leve para aproximá-la. Depois do contato estabelecido, entretanto, todo controle desapareceu como se um interruptor tivesse sido ligado. Ele enfiou os dedos nos cabelos dela e ela se derreteu contra ele, apertando seus braços contra os ombros dele enquanto se beijavam, perdidos numa onda de paixão tão intensa que Hermione se perguntou de onde tinha vindo... Ou talvez sempre tivesse existido, apenas esperando sua hora.


Harry já a beijara antes. Beijos de amigos na bochechas. Barulhentos e exagerados (mas inocentes) beijos de olá. Selinhos castos, de boca fechada na véspera de ano novo. Ela o abraçava livremente como faria com qualquer amiga próxima ou um irmão. Ele já trocara de roupas na frente dela. Ela cortara o cabelo dele. Ele a vira com nada mais que uma tolha com água escorrendo por seus ombros. Eles conversaram enquanto estavam no mesmo banheiro, ele no chuveiro e ela escovando os dentes na pia. Não havia mais mistério, nenhuma idiossincrasia restante a ser descoberta. Em nenhuma situação, existiu tensão porque tinham A Linha e infeliz daquele que a cruzasse. Certamente nunca tinham se beijado assim. A verdade era que ela nunca beijara ninguém desse jeito, e isso incluía todos namorados ou amantes que teve. A mente dela girava e girava e seus ossos pareciam se liquefazer dentro de sua pele, o calor do corpo dele esquentando-a toda. O pescoço dela arqueou, a cabeça pendendo para trás de modo que olhava distraída para o teto do saguão enquanto a boca dele se movia pela pálida coluna do pescoço dela, suas mãos presas com força nos cabelos descontrolados dele. Ele respirou fundo e parecia que ia falar; ela puxou os lábio dele novamente pros dela, cortando suas palavras. Ela curvou a cabeça na direção dele, os dois ligados por uma estranha urgência que o fez puxá-la mais pra perto, pequenos barulhos escapando de sua garganta e o fez a beijar com mais força de modo que ela mal podia respirar. A posição deles mudou quando Harry se curvou rapidamente, passou o braço por trás dos joelhos dela e a carregou. Ela virou a cabeça sem terminar o beijo, se segurando com um braço ao redor do ombro dele enquanto a carregava de volta pelo arco pelo qual tinham acabado de vir.




Três horas depois, Hermione estava sentada em uma das poltronas perto da janela no Cloister com seus joelhos contra o peito, olhando para o quintal banhado pela luz da lua. Era uma noite de lua cheia e lá fora estava quase claro o bastante para se ler sem uma lanterna. Estava enrolada com o roupão de Harry; era grande demais pra ela, mas era macio e tinha o cheiro dele. Ela virou o rosto pra olhar pra ele, dormindo do lado dele da cama grande, um braço abraçando um travesseiro. Um pequeno sorriso estava em seus lábios, que parecia estranhamente nu, como sempre ficava quando estava sem os óculos. Hermione suspirou, imaginando se iria logo acordar e descobrir que tudo foi um sonho. Eu acabei mesmo de dormir com Harry? Isso é besteira, ele e eu nunca nos envolvemos desse jeito. Não podia ser de verdade, era muito estranho pra ser real. Talvez eu tenha imaginado, pensou. Eu vim sonâmbula até aqui e alucinei tudo... Mas sabia que essa não era a verdade. Havia amplas evidências do contrario. O quarto estava coberto pelas peças de roupas que usavam onde tinham sido jogadas, e todo o corpo dela formigava prazerosamente relembrando uma experiência bem física. O peito dela apertou e sua visão embaçou pelo prisma de lágrimas não derramadas. Hermione pressionou o punho na boca enquanto lágrimas caíam de seus olhos e escorriam por suas bochechas.Três horas depois, Hermione estava sentada em uma das poltronas perto da janela no Cloister com seus joelhos contra o peito, olhando para o quintal banhado pela luz da lua. Era uma noite de lua cheia e lá fora estava quase claro o bastante para se ler sem uma lanterna. Estava enrolada com o roupão de Harry; era grande demais pra ela, mas era macio e tinha o cheiro dele. Ela virou o rosto pra olhar pra ele, dormindo do lado dele da cama grande, um braço abraçando um travesseiro. Um pequeno sorriso estava em seus lábios, que parecia estranhamente nu, como sempre ficava quando estava sem os óculos. Hermione suspirou, imaginando se iria logo acordar e descobrir que tudo foi um sonho. Não podia ser de verdade, era muito estranho pra ser real. , pensou. Eu vim sonâmbula até aqui e alucinei tudo... Mas sabia que essa não era a verdade. Havia amplas evidências do contrario. O quarto estava coberto pelas peças de roupas que usavam onde tinham sido jogadas, e todo o corpo dela formigava prazerosamente relembrando uma experiência bem física. O peito dela apertou e sua visão embaçou pelo prisma de lágrimas não derramadas. Hermione pressionou o punho na boca enquanto lágrimas caíam de seus olhos e escorriam por suas bochechas.


-Hermione? - veio uma voz macia, dormente. Ela olhou pra trás; ele estava virando, ainda mais dormindo que acordado, mas notou a ausência dela. Piscou e se apoiou em seus cotovelos, apertando os olhos pra focalizar. -O que está fazendo? - ele murmurou, esfregando os olhos. Desorientação pelo sono o fazia parecer bem mais jovem que seus 26 anos e por um momento Hermione viu o garoto com quem fez amizade há tanto tempo atrás no lugar do homem que conhecia hoje. Ela tremeu com imagem totalmente discordante e então ele sentou e o sono deixou sua expressão, acabando com essa impressão.


Ela sorriu. -Apenas pensando.


Ele foi até a beira da cama e levantou, amarrando um lençol em torno de sua cintura enquanto ia até ela na beirada da janela e sentou ao seu lado. Ela virou o rosto pra que ele não visse a umidade ali, mas não foi rápida suficiente. Ele olhou pra ela, franzindo a sobrancelha e então esticou o braço e segurou a bochecha dela com uma mão, secando as lágrimas com o polegar. Sorriu gentil pra ela. -No que está pensando que está te fazendo chorar?


Ela suspirou, abaixando os olhos. -Acho... Que preciso lamentar um pouco.


Ele concordou. -Eu sei.


Ela levantou os olhos, surpresa. -Sabe? - esperava ter que explicar isso a ele.


-Também sinto isso. Nossa amizade acabou, Hermione. Não importa o que aconteça a partir daqui, o que tínhamos se foi pra sempre. É perfeitamente natural sentir a perda.


Ela sorriu e cobriu a mão dele com a dela. -E pensar que houve um tempo que achava que você era insensível.


Ele riu. -Eu sou insensível, mas não com isso. - ele puxou a mão e estendeu a perna pra dentro do quarto, olhando pro vazio. Hermione observou o perfil dele, a pálida luz da lua refletindo como mármore na sua pele. Ficaram sentados em silêncio por algum tempo. Harry ficou um pouco impaciente e de repente parecia com medo de olhar pra ela. Hermione podia ver os músculos em seu queixo trabalhando. -Você... - ele começou e depois limpou a garganta, mantendo o rosto virado. -Você se arrepende? – perguntou baixinho. Só depois de falar, ousou levantar os olhos, olhando pra ela por baixo das sobrancelhas abaixadas.


Hermione balançou a cabeça devagar, comovida pela expressão ansiosa no rosto dele. -Não - respondeu. -Não me arrependo. - ele suspirou aliviado e deu um largo sorriso; iluminou todo seu rosto. Ela sorriu de volta e se inclinou para beijá-lo. -Sente aqui comigo, vamos conversar.- ela disse. Ele escorregou pra trás dela, de modo que ela pôde se acomodar contra seu peito, os braços dele a sua volta. Apesar do convite, por um tempo nenhum dos dois disse nada, contentes por apenas estarem juntos, se acostumando com a nova intimidade. Hermione suspirou e deixou seus olhos fecharem, o ritmo da respiração dele a ninando até uma confortável letargia, uma das mãos dele suavemente o cabelo dela.


-Não acredito que isso é verdade - ele disse afinal.


-Eu sei. Alguns minutos atrás, quando você estava dormindo ainda, quase me convenci que foi tudo um sonho. - ela levantou a cabeça do ombro dele e olhou sua expressão. -Harry... O que mudou?


-Como assim?


-Bem... Já temos quinze anos juntos, e agora isso, do nada. O que mudou? Por que agora?


-Não sei - ele disse baixo. -Muitas coisas aconteceram nas últimas semanas. Acho que talvez... Todo esse movimento apenas abaixou nossas defesas. Não posso falar por você, mas pra mim... Nunca soube conscientemente, mas já faz tempo que venho sentindo isso.


-Eu também - ela disse.


-Por causa de...


-Rony... - ela completou.


-Sim. Mas havia mais que isso. Acho que investimos muito na idéia de uma amizade platônica, como se tivéssemos que provar alguma coisa ficando longe um do outro. - ele beijou-lhe a testa. -E também havia A Linha.


Hermione sorriu, divertindo-se com o fato dele pensar na linha do mesmo jeito que ela. -É, aquela linha irritante. Acho que dessa vez realmente a cruzamos, não acha?


Ele riu. -E como.


Ela ficou em silêncio, repousando a cabeça no ombro dele. Parte dela estava apenas esperando, esperando que toda morte e dor das últimas seis horas entrassem de vez para destruir esse oásis de tranqüilidade. -Vamos falar sobre isso? - ela sussurrou.


Ele hesitou tanto antes de responder que ela começou a pensar se ele tinha ouvido-a. -Devíamos.


-Estamos a salvo aqui?


-Mais a salvo que em qualquer outro lugar.


-Então não vamos falar sobre isso... Não por enquanto.


-Não há nada que eu possa fazer que ainda não tenha feito, não agora.


-Pensei agora que para a maioria das pessoas, essa seria a hora que teriam aquela conversa obrigatória na qual discutem os amantes anteriores.


-Meio redundante para nós, não é? Provavelmente eu mesmo posso dizer todos os seus.


Ela levantou a cabeça e sorriu pra ele. -Mesmo? Estava prestando tanta atenção assim?


-Sempre presto atenção em você.


-Ha! Certo, Potter, pode começar. E não esqueça nenhum.


Ele respirou fundo e se ergueu um pouco. Hermione sentou direito e observou, interessada. -Certo, aqui vai, em ordem cronológica. A honra de ser o primeiro foi para Horace, o auxiliar de professor sensível e inteligente da graduação.


-Sensível e inteligente e completamente egocêntrico. Mas ele tinha olhos adoráveis.


-O seguinte foi Rufus, o herbologista... Eu não gostava dele.


-Eu sei. Ele tinha pavor de você. Toda vez que vinha me buscar ele se escondia atrás da porta com medo que você fritasse os cabelos dele com um relâmpago.


-Depois veio o seu grande e tórrido romance - ele disse dramaticamente. -com Dr. Kilroy, o escritor suave e estonteante.


Ela cobriu os olhos com as mãos, gemendo. -Eu realmente fui tão jovem?


-Você tinha 22 anos!


-Sim! E regredia até os 16 quando ele estava por perto!


Ele desviou o olhar. -Sabe, tinha vezes que tinha que segurar a língua quando você estava com ele. Ele não era bom pra você... e era apegado demais a produtos pra cabelo.


-Você está certo, era muito prejudicial. E ele não aprovava nem você nem o fato de eu morar com você. Ficava me pressionando pra que eu fosse embora, morar com ele. Finalmente ficou demais e terminei com ele.


Ele tirou os cabelos do rosto dela. -Lembro da noite que fez isso. Você veio pra casa e estava um pouco fora de si. Fique tão aliviado de ter reunido a coragem pra fazer aquilo.


-Chorei por horas. Eu sabia que era a coisa certa, mas mesmo assim, foi... doloroso. - ela passou o braço ao redor da cintura dele. -Você veio até meu quarto com chá e meu bolinho preferido e você me abraçou e disse que tudo ficaria bem. Fiquei tão feliz por estar lá.


-Posso ter parecido calmo e reconfortante, mas estava secretamente planejando maneiras para fazer aquele canalha sofrer sem acabar na prisão. Ninguém machuca minha Hermione.


-Meu herói.


-E então, depois do garoto pomada, apenas... Geraldo. - ele disse, seu tom obscuro quando disse o nome do amante atual. -e agora eu. Nossa, estou em boa companhia.


Hermione sentou de vez, os olhos arregalados. -Minha nossa... Geraldo! Como vou dizer a ele?


-Bem, se você prefere não dizer, vou gostar muito de dizer a ele que você trocou...


-Aposto que ia gostar mesmo. Não, vou mandar uma coruja pra ele amanhã e dizer que acabou. - A expressão dela suavizou; esticou a mão e acariciou sua bochecha com as costas dos dedos. -Sinceramente, não acho que ele vai ficar tão surpreso. E vai ficar livre pra achar uma namorada mais moderna.


-Isso termina com você, então. Sua vez.


Ela deu os ombros. -Ah, você é fácil.


-fácil, extremamente fácil, pra eu e todo mundo cantar junto – ele brincou.


Ela riu. -Não, quer dizer, você só teve dois casos.Esperou muito tempo, até ter 21... Não que haja algo errado com isso, se quer saber. Primeiro Gina, e depois Ronin aquela bruxa gótica assustadora. Não lamentei por vê-la pelas costas, se posso comentar. Sempre suspeitava que ela queria me azarar quando eu dava as costas.


Ele concordou, contraindo os lábios. -Levei uma vida amorosa sem muitos eventos. Acho que estava muito ocupado. - ele olhou pra ela por um momento, depois suspirou. -Exceto que... faltou uma.


Ela franziu a testa. -Não faltou não.


-Houve uma pessoa que você não sabia, antes de Gina.


-Ah - ela disse, mordendo o lábio inferior. -Bem... Se você quer a verdade, eu também tive alguém que você não soube. - eles apenas se encararam por um momento. -Você primeiro... E se me disse que foi Cho eu vou matar você.


Ele deu uma risada. -Ah, não. Eu nunca dormi com Cho. Acho que ela queria...


-Ela ainda quer.


-... Mas não estava pronto pra isso. Não, foi outra pessoa. - ele olhou pra suas mãos, seus dedos enlaçados com força sobre seu colo. –Eu a conheci quando estava treinando na DI. Ela era uma de minhas instrutoras.


Hermione podia sentir que esse era um assunto doloroso pra ele. Ela esticou a mão e colocou uma mão dele entre as suas. -Me fale sobre ela.


Ele virou pra olhar pela janela enquanto falava. -Ela era mestre em ataque mágico, o tipo de coisa que a gente tem que aprender na minha linha de trabalho. Na hora que nos conhecemos, houve um tipo de... atração animal entre nós, era muito potente. Não conseguíamos ficar longe um do outro. Não demorou muito pra que começássemos a passar cada momento possível juntos.


-Lembro que você estava bem distraído nessa época, e não ficava muito em casa. Pensei que tivesse a ver com seu trabalho, qualquer que fosse.


-Em parte era pelo trabalho, mas era mais por ela. Era o tipo de romance apaixonado, totalmente consumidor que apaga o resto do mundo e que faz tudo mais parecer irrelevante. Era algo como seu relacionamento com Dr. Kilroy... Prejudicial, mas tão irresistível que não dá pra se segurar. - ela acenou com a cabeça, lutando contra os ciúmes. Essa mulher estava em seu passado, lembrou a si mesma. -Ela foi minha primeira e me fez sentir como se não existisse mais nada no mundo.


-Você a amava - ela disse, tentando manter seu tom normal.


-Não, é isso. Não acho que fosse amor. Era um tipo de vício mútuo.


-O que aconteceu? - ela levou a mão à boca, percebendo que ele estava usando o passado o tempo todo. -Ah não... ela morreu?


Ele balançou a cabeça. -Não. Pior. - ele a encarou e apertou as mãos dela com força. -Ela me traiu, Hermione. Traiu todos na DI. Passou para o outro lado e se tornou uma bruxa das trevas. Ela me usou pra armar uma emboscada pra alguns de nossos agentes... Quatro deles morreram. Tive sorte de escapar com vida, e da última vez que a vi, estava correndo com seus novos colegas, rindo de mim.


Uma suspeita obscura crescia no coração de Hermione. -Harry... Você está falando de Allegra?


Ele fez que sim, devagar. -Sim. Allegra foi minha amante, anos atrás. Houve um tempo em que ela foi boa, ou pelo menos me fez acreditar que era. Eu sabia, mesmo na época, que não seria a última vez que a veria. Nunca pensei que ia chegar a isso... Mas não consigo me fazer odiá-la tanto quanto ela parece me odiar.


-Lamento, Harry. Deve ser horrível pra você saber o que ela se tornou.


-Não é muito justo, se quer saber. Levei muito tempo pra superar isso. - ele forçou um sorriso. -Então, você já sabe quem é minha amante secreta... e quanto ao seu?


Ela respirou fundo. -Não consegue adivinhar?


Ele desviou o olhar. -Rony.


Hermione acenou que sim, um nó subindo sua garganta. -Ele foi o primeiro.


-Não sabia disso.


-É difícil pensar sobre isso. Entenda... só ficamos juntos uma vez, no dia que ele morreu. - Harry olhou pra ela, uma expressão séria no rosto dela. -falamos sobre isso... estávamos namorando há mais de um ano e estávamos avançando bem devagar, mas estávamos pronto pra dar esse último passo. Estávamos no quarto do jardim de inverno de Hogwarts e de repente parecia a hora certa. Rony trancou a porta com a varinha e... - ela passou a mão nos olhos. -Nunca falei sobre isso, é difícil.


-Você e eu fomos praticar duelos naquela noite... foi quando Rony recebeu o bilhete. - Harry disse rouco. -Quando voltamos pro castelo... - ele não precisava terminar, os dois lembravam aquela noite terrível muito bem. Hermione o olhou nos olhos e viu a mesma dor que vivia em seu coração, ela se enterrou em seus braços, as lágrimas dela molhando a pele do seu peito nu. -Essa foi a última gota pra mim - ele disse baixo, seu queixo repousando sobre a cabeça dela. -Fiz um voto que destruiria Voldemort... E vou fazê-lo.


-Não vamos falar sobre isso - ela disse, sem muita esperança que pudessem evitar.


-Temos que falar sobre isso - ele disse, apertando os braços ao redor dela. -Estava pronto para ir embora algumas horas atrás, e ainda faz sentindo pra mim, fazer isso.


-Não! - ela disse, saindo dos braços dele e sentando. -Não faz sentido nenhum! Não acredito que ainda quer tentar ir embora depois do que aconteceu entre nós.


-O que aconteceu entre nós deixa ainda mais importante que eu entre em ação! Se ele achava que podia te usar contra mim antes, imagine o quanto vai ser tentador pra ele agora! - ele baixou os olhos e a voz. -Só comecei a viver quando fui pra Hogwarts, você sabe. Minha infância com os Dursley... Mal faz parte de minha existência, pelo menos de partes que importem. Você esteve comigo minha vida toda, Hermione. Cresci com você ao meu lado. - ele a segurou pelos antebraços, seus olhos intensos. -Não saberia como viver se você não estivesse comigo. Não saberia como ser Harry Potter sem você!- Hermione abafou um soluço e se inclinou para frente, pressionando sua testa contra a dele. -Tenho que derrotá-lo antes que ele te tire de mim - Harry disse rouco.


-E se ele tirar você de mim? - ela disse, recuando. -tenho certeza que estaria bem pra você, lá, perseguindo ele e se vingando e deixando o mundo a salvo pra democracia, mas e quanto a mim? Não suportaria, Harry... Apenas ficar aqui dia após dia sem saber por onde você está ou se você está vivo ou morto! - ela balançou a cabeça, encarando-o com seu olhar mais persuasivo. -sempre encaramos os problemas juntos. Por que isso de repente ficou tão errado?


-É impossível, você estaria em perigo...


-Certo, eu estaria em perigo. Talvez essa seja minha escolha, Harry! Se quero enfrentar o perigo por você, como pode me dizer que não posso! - ele levantou da janela e começou a andar pelo quarto, seus braços cruzados sobre o peito. Hermione observou sua agitação aumentando enquanto ela falava. -O que quer que vá acontecer, acontecerá, mas se não podermos ficar juntos contra ele... Bem então... o que temos?


Ele balançava a cabeça rápido pra frente e pra trás, como se tentasse negar algo pra sim mesmo. Ele parou de andar e ficou em frente a ela, de repente ficou de joelhos e colocou a cabeça no colo dela. -Não sei o que fazer? - ele disse, a voz tremendo. -Você tem que me ajudar, Hermione.


Ela suspirou. -Todos tempos problemas, e se você não os compartilha então não dá àqueles que se preocupam a chance de se preocuparem o suficiente.


Ele se ergueu e tomou o rosto dela entre as mãos. -apenas me diga o que você quer. O que quer que queira, eu farei.


Ela sorriu, o coração doendo... Sentia como se fosse puxada para cinco direções diferentes. Por um lado, estava imensamente feliz, por outro estava nervosa pelo que isso significava. Por outro lado se sentia a salvo com ele aqui, e por outro parecia que o mundo todo tentava separar um do outro. Mas nesse instante, estava certa de apenas uma coisa. -Só quero você - sussurrou, passando a unha pela bochecha dele. -Quero que você faça amor comigo... Como se fossemos as únicas pessoas do mundo.


-E não somos? - sussurrou em resposta. Hermione se sentiu caindo nos olhos dele quando ele se aproximou dela e qualquer outra palavra se tornava irrelevante; ela enlaçou seus braços e pernas ao redor dele e ele levantou, a carregando consigo de volta para cama.




-Agora, vá com calma...


-Posso descer as escadas, Jorge, muito obrigada! - Laura deu um tapa na mão dele quando tentou ajudá-la a descer a escada da varanda que dava para o quintal. -Estou bem, eles me consertaram direito!


-O médico disse que deve descansar - Justino ralhou, seguindo ansioso atrás deles.


-Pelos céus, não estou planejando nadar no Canal, só quero ir ao observatório, coisa que fiz todas as noites de minha vida adulta. Em tempos como esse, é ainda mais importante estar em contato com o que os céus estão nos dizendo. - Com seus acompanhantes nervosos bem perto dela, Laura andou rapidamente até o gazebo... mas este não era um gazebo comum. Era maior que muitas casas, um octógono de dois andares espetacularmente esculpido, de vinte metros de diâmetro e aberto para o céu. Eles usavam o segundo andar como observatório; astronomia era um interesse particular de Laura e de Cho também. Laura subiu as escadas até o andar superior, ganhando resmungos preocupados de Jorge.


-Digam, onde está Hermione? - perguntou, saindo até a varanda do observatório. -Ela estava bem chateada quando saiu do hospital.


-Acho que está no quarto dela - Jorge disse. -Ouvi ela subindo pro saguão quando chegou. Saí pra fazer compras um pouco depois disso. Não vi Harry desde que saiu... Não sei porque, não espero que ele venha hoje. Ele me disse que estaríamos a salvo aqui, mas tenho minhas duvidas.


Laura balançou a cabeça. -Ele deve estar fora de si. O ataque em Hogsmeade, depois a seus amigos na DI, depois a bomba... - ela falou, tirando seu diário de astronomia de sua caixa.


-O que estamos olhando hoje, Chant? - Justino perguntou, olhando para o céu quando Laura se curvou sobre o microscópio.


-Bem, a lua está terrivelmente brilhante então não veremos muito nessa parte do céu. Pensei em tentar... - ela parou, levantando e inclinando a cabeça. -Estão ouvindo alguma coisa?


-Ouvindo o que?


-Não sei... só tive a impressão de ter ouvido algo. - ela começou a voltar para o telescópio quando o som veio novamente; dessa vez todos ouviram.


-O que diabos é isso? - Justino murmurou. Todos começaram a ouvir com atenção. -Parece...


-Um tipo de gemido... de novo! É algum animal? De onde está vindo?


-Está vindo da casa - Jorge disse, sinistro. Todos viraram pra olhar as janelas de Balicroft. -Parece que alguém está machucado. - todos se concentraram para ouvir na escuridão. Laura sorriu devagar.


-Hum, não, Jorge. Não acho que estejam machucados no sentido que quis dizer. - Como se para comprovar a suposição, o barulho grave e baixo, de repente foi substituído por um grito rápido que não poderia ser confundido por nada mais do que o que era... Uma mulher no meio de preencher uma necessidade humana básica, e gostando muito. O queixo de Justino caiu.


-Nossa! Está vindo do quarto de Harry! Olhem, as janelas estão abertas!


-Ele está lá?


-Se estiver, não parece estar sozinho. Não acredito que ele levou alguém pra lá numa hora como essa - Justino disse, balançando a cabeça e fazendo "tsk" em desaprovação. -Ele deveria estar armando a vingança e liderando as tropas, e não no quarto transando com alguma vagabunda que achou!


-Ah, Justino, Harry não é do tipo de transar com vagabundas. - Laura disse. -Mas é estranho.


Jorge foi até as escadas. -Vamos lá e entrar de surpresa e dizer que não sabíamos que ele estava em casa!


Laura o segurou pelo braço. -Ah, não vai não, seu hooligan incorrigível. Não é de sua conta.


-Então porque estamos aqui ouvindo? - Justino resmungou.


-Porque somos pessoas terríveis, horríveis que não conseguem segurar a curiosidade. - Laura disse, sem mexer nenhum músculo pra sair da posição. Como por sinal, os gritos da mulher sem nome no quarto de Harry de repente se intensificaram, e enquanto os três ouvintes faziam uma careta, ela gritou o nome dele. Laura, Justino e Jorge congelaram, os queixos caído de choque, pois não havia como confundir a voz da amiga deles.


-Ohhh, meu cérebro está escorrendo por meus ouvidos - Justino gemeu, apertando as mãos no lado da cabeça.


-Se não a conhece tão bem, diria que foi Hermione - Jorge disse.


-Ah, saí dessa de conhecer tão bem, isso foi Hermione. - Laura disse.


Justino virou pra seus dois amigos. -Acho que eles estão transando! - ele exclamou. Jorge apenas riu e Laura balançou a cabeça pra ingenuidade de Justino.


-Deve ser bom viver em seu mundo, Justino - ela disse. -Ouça, claro que estão transando! E pensar que ela tinha acabado de me dizer que eles nunca transaram.


-Acho que não tinham - Jorge, cruzando os braços. -Essa deve ser a primeira vez deles.


-Bem, então isso é grande! - Laura exclamou. -Isso é monumentalmente importante! - Antes que pudesse pará-lo, Jorge virou e desceu as escadas correndo.


-Era inevitável - Justino disse. -Eu sabia que não podiam ficar platônicos pra sempre.


-Ah, você sabia, não é? Nunca pensei que fossem cruzar a linha. Quer dizer, depois desse tempo todo? - de repente, Jorge apareceu do outro lado da grade, flutuando no ar. Laura e Justino deram um pulo quando estendeu duas vassouras.


-Venham, vamos espiar! - ele disse, sorrindo.


-Isso é doente! - Justino gritou.


Laura colocou as mãos nos quadris. -Jorge, estou chocada. Estou realmente perplexa e desapontada - ele arqueou uma sobrancelha. -Que não pensei nisso antes. - ela completou, pegando sua vassoura e pulando a grade. Justino revirou os olhos e puxou sua própria vassoura, com uma expressão resignada.


Voaram devagar subindo o lado da torre norte até onde o teto de vidro do Cloister se encontrava com a parede de pedra, elevando-se um pouco pelo canto. Bem embaixo deles, iluminada por um raio de lua, estava a cama de Harry. Os dois amigos estavam deitados em concha bem juntos, as costas dela contra o peito dele, o lençol verde escuro cobrindo-os até a cintura. Ela sorria com os olhos fechados. Harry beijava os dedos dela. Ele a abraçou pela cintura e acomodou a cabeça atrás da dela no travesseiro e os dois pareciam relaxados e começavam a dormir.


-Não deveríamos estar assistindo a isso - Justino sussurrou.


-Mas é tão fofo... - Laura disse, sorrindo.


-Preciso de um banho.


-Somos pessoas horríveis, apenas horríveis. Estamos espionando nossos amigos num momento que parece de pura intimidade e conforto.


-Vamos sair daqui - Laura sussurrou, virando a vassoura pra longe da janela. -Vamos deixá-los quietos por enquanto... podemos nos divertir de manhã.




Hermione podia sentir a luz do dia brilhando em seu rosto, os raios de sol deixando o interior de suas pálpebras vermelho enquanto estava deitada acorda com os olhos fechados. Ela podia sentir a cama vazia a seu lado, mas também podia ouvir Harry andando pelo quarto então não precisava se preocupar com o que acontecera com ele... Ou se ele tinha decidido ir embora afinal. Ela abriu os olhos só um pouco, mantendo o resto do corpo relaxado como se continuasse a dormir. Harry estava perto da janela, tirando roupas de sua cômoda. Ela apenas observou, aproveitando a vista enquanto ele pegava shorts de ciclistas e uma camisa. Harry não era grande, mas em algum momento depois que se mudaram do pequeno apartamento no Bosque Shepherd, ele deixara de ser pele pura, pra se ser magro e bem definido. Depois da demonstração de habilidade física que foi forçado a dar em Hogsmeade, ela não estava surpresa.


Ele sentou na beira da cama e se curvou sobre os pés, provavelmente amarrando os cadarços. Quando terminou, se virou e se inclinou sobre ela; ela fechou os olhos rapidamente. Ele esticou a mão e passou por seu pescoço. Ela abriu os olhos e sorriu pra ele. -Bon giorno, principessa - ele sussurrou.


-Bom dia - ela disse. -Acordou cedo.


-Vou correr, quer vir?


-Hum, claramente você me confundiu com alguém em boa forma.


Ele sorriu, os olhos brilhando. -Bem, você parecia em muito boa forma ontem.


Ela riu, deitando de lado e apoiando a cabeça no cotovelo. -Vá em frente. Eu vou ficar aqui deitada languidamente na cama como Cleópatra. - ele não disse nada por alguns momentos, apenas olhou pra ela com uma expressão muito estranha. -O que foi?


-Nada, é só que... - ele não continuou.


-Só que o que?


-Você é tão... linda - ele disse, sorrindo. Hermione sentiu um calor e se derreteu... ela tentou sorrir em resposta mas tudo o que conseguiu foi uma expressão que provavelmente parecia sonhadora. Era ótimo, ela pensou. Quem podia adivinhar, vinte e quatro horas antes que quatro palavras dele poderiam me transformar numa pilha derretida.


-Você também não é tão ruim - ela disse. Ele se inclinou para frente e a beijou depois levantou da cama. Ela se esticou e o segurou pelo braço. -Harry, temos muito o que conversar.


-Eu sei.


-Vamos pensar em algum jeito de lidar com Allegra e o qualquer coisa que acontecer... Apenas não faça nada desaconselhável.


-Como ir embora numa cruzada solitária? Não vou - mas ele não a olhou nos olhos quando disse isso. Ela fingiu não notar.


-Bom. Vá correr.


-Te vejo no café. - ele trotou pra fora do quarto.


Hermione sentou, puxando o lençol ao seu redor, e dando um longo suspiro. Se espreguiçou e desceu da cama, aproveitando a sensação do sol da manhã que esquentava sua pele nua. Levantou e deixou o lençol cair, pegando o roupão de Harry novamente e se envolvendo com ele. Foi até a janela e olhou para o quintal; era uma linda manhã de maio, perfeita para uma foto. Brisa fresca, céu azul... Ela abriu a janela e colocou a cabeça pra fora, inalando o aroma das flores de arvores que cresciam ao redor de toda ala norte.


Ela virou e começou a andar pelo quarto, recolhendo suas roupas descartadas, sorrindo ao lembrar como cada peça foi descartada. Parou, apertando a calça jeans e sutiã contra o peito, uma onda de irrealidade caindo sobre ela. A consciência plena do que acabara de acontecer na noite anterior ainda não tinha despertado até agora, e agora estava acordando então ela começou a pensar nas maneiras que isso mudaria sua vida. Ela olhou em volta do quarto como se procurando um exemplo... Seus olhos repousaram em cima da cômoda de Harry. Largou suas roupas e foi até ela, pegando a foto emoldurada que lá estava. Era uma foto dela, Harry e Rony no jardim de Hogwarts durante a festa de 150 anos de Hogwarts, que foi dada na primavera do sexto ano... Apenas semanas antes da morte de Rony. Na foto, Hermione estava no meio, um braço em volta de Rony e o outro em volta de Harry. Os três sorriam e riam, se cutucando e posando pra câmera de Colin. Ela olhou pra imagem do rosto de Rony, um nó subindo a garganta. Fechou os olhos no momento que reviu tudo.


Ela e Harry tinham acabado de voltar para o castelo da prática de duelos no jardim e achavam que Rony estaria esperando por eles no salão comunal, mas ele não estava lá. Não estava no dormitório... Finalmente Harry pegou Mapa do Maroto e eles viram que não estava no castelo. Já iam avisar a McGonagall, quando ela viu. Um pequeno bilhete dobrado sobre a cama de Harry com os nomes "Potter e Granger" escritos na frente. Ele abriu com as mãos tremulas... dentro só havia as palavras "Encontrará o que restou dele na clareira perto da floresta proibida".


Ela lembrava como seu sangue ficara gelado e como Harry ficou pálido enquanto corriam pela torre e iam atrás dele, nenhum pensamento sobre nenhuma regra que estavam quebrando. A viagem na vassouras de Harry era um borrão... Tudo o que ela podia fazer era se segurar com força na cintura dele, seu rosto pressionado contra as costas, rezando silenciosamente que Rony estivesse bem. Pousaram na clareira... A lua estava tão clara que quase parecia dia. Harry mal esperou a vassoura pousar antes de pular, chamando o nome de Rony numa voz engasgada com lágrimas, já consciente do que ocorrera. Ela cambaleou, uma dor horrível rasgando seu estômago, lembrando como tinha sido abraçá-lo mais cedo naquele dia. Ouviu Harry gritar, um som angustiante, de coração partido. Ela correu pra ver por si mesma, mas o encontrou no meio do caminho, segurando e abraçando-a rápido... Como ela lutara contra ele e tentou passar pra ver, ela tinha que ver o que tinha sido feito dele. Harry estava soluçando, apertando-a com uma força que não era sua pra evitar que ela passasse por ele e visse, e ela finalmente desistiu de lutar contra ele. O resto da noite era um borrão. Lembrava ter passado a maior parte sentada na grama enquanto a maioria das pessoas vinha atrás dele, e depois vieram pessoas pra levar o corpo embora. Ela não o viu, e por isso era eternamente grata. Podia lembrar de Gina chorando e a professora McGonagall tentando confortá-la, podia lembrar das pessoas tentando falar com ela e Harry e os dois apenas sentados lá, olhando o vazio. Os irmãos de Rony apareceram... Vagamente lembrava Fred levantando-a facilmente da grama e carregando-a embora.


Colocou a foto no lugar e desviou o olhar, uma mão na boca. E se você ainda estivesse conosco, Rony? Pensou. Ainda estaríamos juntos, eu e você? O pensamento era ao mesmo tempo maravilhoso e terrível. Sabia em seu coração que se Rony ainda estivesse vivo, sentiria a mesma coisa que sentia por Harry agora, e ainda assim Rony significava tanto pra ela. Uma imagem muito clara veio à sua mente, uma imagem dela sentada na mesa da cozinha em Balicroft com Rony de um lado e Harry do outro, amando um mas sem poder evitar de se apaixonar pelo outro. Podia se ver divida, podia ver isso fazendo com que se voltassem um contra o outro e transformando a amizade deles em ódio. Pressionou as mãos contra os olhos pra desfazer essa imagem perturbadora. Talvez seja uma coisa boa que ele se foi, a mente dela sussurrou... Hermione gritou e balançou a cabeça como que pra se livrar desse pensamento terrível, apesar de saber que nunca poderia ser banido realmente.

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