Capítulo XI
Capítulo
onze
Como as férias seriam bem-vindas... era tudo o que Anne sonhava nos momentos em
que entrava para assistir alguma aula; sonhar em sentar-se em uma cadeira de
praia, o sol brilhando sobre si e os pés na areia, a água extremamente azuis
borbulhando à sua frente. Mas, infelizmente, antes de desfrutar daquele sonho,
teria que continuar a batalha... continuar assistindo aulas monótonas,
continuar fazendo testes demasiado difíceis e continuar suportando ver Harry
nos intervalos para almoço e janta.
Desde que terminaram, os dois não se falaram mais. A garota fortificou sua
amizade com Clara e as duas passaram a trocar confidências todo o tempo; porém,
Anne já estava definhando.
Os almoços e jantas eram longos, pois Clara tentava fazer com que a amiga
comesse, inutilmente. Ela já tinha uma aparência acabada; os cabelos caíam
lisos emoldurando o rosto ossudo; os olhos, antes azuis e brilhantes, pendiam
agora, tristemente, sempre olhando para algum ponto sem fim, pensativos.
Em um daqueles dias, a profª McGonagall chamou-a quando a sineta tocou
anunciando o término de sua aula e encarou-a com uma expressão bastante
preocupada.
-
Sente-se, senhorita. - dissera ela, acenando para a cadeira defronte à sua
mesa. - Toma... um biscoito - Ela indicou o pote de biscoitos de gengibre e
Anne, sem vontade, aceitou um. - Bem, senhorita... eu posso... posso chamá-la
de você?
Anne acenou afirmativamente a cabeça.
-
Bem... eu estou muito preocupada com você, Anne - continuou a profª McGonagall,
comprimindo o óculos nos olhos, com uma expressão triste. -, a senhorita está
emagrecendo cada vez mais; não está prestando atenção nas minhas aulas...
sinceramente, está parecendo uma morta-viva!
Anne sentiu as bochechas corarem.
-
Aconteceu algum problema, senhorita...? Você não quer... desabafar? - Por um
momento, o tom de voz da professora pareceu tão humano e não aquela secura de
quando ela explicava sua matéria aos alunos. Seus olhos transpareciam uma
compaixão genuína.
-
Na verdade, aconteceu sim - murmurou Anne, abaixando a cabeça, tristemente. -,
mas não adianta o quanto eu desabafar - continuou, encarando os olhos da
mulher. -, eu já desabafei bastante, até... mas não adianta...
-
O que aconteceu? - interrompeu a profª McGonagall.
-
Sinceramente - sussurrou a garota. -, eu preferia não dizer... eu... já pensei
muito nisso... e cada vez que eu penso, eu me machuco mais e mais...
Silêncio... porque todas as vezes que as pessoas não sabem o que dizer, um silêncio
paira no ar...
-
Bem... qualquer... problema... é só vir a mim - disse a professora, calmamente
e, indicando o pote de biscoitos, disse: - pegue mais um!
A
garota pegou mais um daqueles enormes biscoitos de gengibre e depois, retirou-se
da sala, deixando uma profª McGonagall espantada atrás; assim que dobrou o
primeiro corredor, jogou os biscoitos pela janela e apressou-se para a próxima
aula, precipitando-se andares acima.
*-*
-
Ela te chamou...? - exclamou Clara, na aula seguinte, incrédula.
-
Chamou - confirmou Anne, indiferente. -, bem... e ainda me obrigou a comer um
biscoito nojento... quer dizer, me obrigou não, não é, porque eu joguei fora
quando saí da sala dela...
-
Tá vendo, Anne - disse a garota, tristemente. -, você vai acabar morrendo se
continuar assim...
-
Morte... - suspirou ela. - é o que eu mais busco atualmente.
-
Bem, então antes de você encontrá-la - disse Clara, seca e ironicamente. -,
você tem que estudar para os testes que estão chegando...
-
Testes, testes e mais testes! - exclamou Anne, irritada. -, será que eles não
percebem que os alunos têm uma vida fora do estudo?!
-
Hummmmmmmm... não?! - cochichou Clara, baixinho, já que o professor começara
a caminhar pela sala, verificando se os alunos estavam fazendo o exercício que
ele passara.
Miraculosamente, a sineta tocou por todo o castelo e os estudantes jogaram as
carteiras para o lado, pressurosos para que as aulas terminassem; era evidente
que todo o mundo precisava de férias urgentemente.
Anne saiu da sala junto a Clara e as duas andaram, calmamente pelos corredores
em direção à sala comunal, para deixar as mochilas no dormitório e conversar
antes do almoço; enquanto subia um lance de escadas, Anne pôde ver Johnny,
descendo-as rapidamente.
-
Eu não sei se você quer, mas acho que o momento é esse - sussurrou Clara, ao
seu ouvido.
-
Tudo bem - respondeu a outra, descendo para o próximo patamar e esperando o
garoto. Era agora ou nunca...
-
Oi, Johnny...
-
Hum... oi...
-
Tudo bem?
-
Tudo...
-
Hum... e como têm ido as coisas? - perguntou Anne, séria.
-
Como têm ido? - exclamou ele. - Ah, como poderiam ir, não é, Anne... você me
abandonou e esfregou na minha cara aquele Potter... como você queria que as
coisas fossem, hein?
-
Ah - suspirou ela, esvaziando como um balão.
-
Mas eu superei, claro - continuou Johnny, secamente. -, arranjei outra pessoa e,
sabe...? Essa pessoa que eu arranjei, realmente me ama e não apenas me usa...
-
Mas...
-
Não! Sabe, Anne - ele a interrompeu. -, você tem que, decididamente, rever os
seus conceitos, porque, você não
pode usar as pessoas... manipulá-las por um tempo e, depois que você se cansa
do seu bonequinho, você simplesmente joga-o fora.
-
Mas eu não fiz, isso, Johnny - exclamou Anne, desesperada.
-
Claro que fez - disse ele. - e fez pior... depois me esmagou... eu nem imagino
como pude te amar... isso nunca tinha
que ter acontecido, sabe?! O meu maior erro, foi te convidar para aquele baile
idiot...
-
Não - murmurou Anne, cabisbaixa. -, aquele foi e melhor coisa que você pode
ter feito a alguém... eu ganhei uma enorme vivacidade... eu me senti feliz,
como nunca, ninguém fez comigo...
-
Mas você não me amava, não é? - interpelou Johnny, sua voz transparecia
raiva. - Mas não adianta brigar, sabia? Isso tudo não vai levar a nada! Por
mais que a gente discuta por toda a eternidade... eu preferia... sério... que
você nunca mais falasse comigo...
-
Tudo bem... - murmurou Anne. - mas... por tudo que aconteceu conosco, eu só
quero te agradecer... pelo que você fez por mim, por você ter me mudado e ter
me amado.
-
E eu também quero te agradecer. Por você ter me pisoteado e feito eu ver que
nem todas as pessoas do mundo valem à pena - concluiu Johnny, girando nos
calcanhares e continuando a descer as escadas.
Anne nunca mais o viu e nem sequer falou com ele; porém, o cheiro que ele
exalara enquanto falava com ela, fazendo-a com que se lembrasse dos momentos
felizes que viveram, fizera com que ela revisse seus conceitos.
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