A profecia



 


           Estava chegando lá. Eles haviam subido por aquelas escadas velhas do Cabeça de Javali e poderiam estar acomodados em qualquer quarto daquela espelunca. Severo nunca entendera o motivo pelo qual Alvo Dumbledore, o diretor da Escola de Magia e Bruxaria Hogwarts, adorava ir àquele local cujo dono parece tão sujo e nojento quanto o próprio bar. Mas agora o mestre e uma mulher quem Severo reconheceu ser Sibila Trelawney - parente distante de Cassandra Trelawney, uma renomada vidente de outrora - se encontravam em um quarto no segundo piso, e Severo já podia ouvir-lhes falar. Estavam no ultimo aposento, ao final de um corredor meio escuro e não menos sujo que o resto do bar. Precisava ter cuidado agora. O fato de o corredor estar deserto não era de todo uma vantagem, já que estava muito mais silencioso. Além disso, Alvo Dumbledore não é o homem com quem Severo gostaria de se encontrar agora. Do outro lado da porta, Dumbledore dizia:


- Bom, Srta. Trelawney, se isso é tudo eu já vou me retirando. Em breve selecionarei o professor que ocupará a vaga de Advinhação e...- Dumbledore estava saindo da sala. Se pegasse Severo ali, seria seu fim. Mas algo acontecera, algo que fizera o diretor ficar muito quieto. Uma voz rouca e diferente da voz nervosa da mulher que Severo ouvira antes falava:


- Aquele com o poder de vencer o Lorde das Trevas se aproxima… nascido dos que o desafiaram três vezes, nascido ao terminar o sétimo mês… e o Lorde das Trevas o marcará como seu igual, mas ele terá um poder que o Lorde das Trevas desconhece…


            Isso era o que Severo achava que era? De repente alguns passos foram ouvidos subindo as escadas atrás de Severo. Ele não tivera tempo nem de notar, quando percebeu, o odiável dono do bar já estava às suas costas, ralhando com ele, gritando a plenos pulmões, puxando a varinha...


- Reducto!- bradou Severo, mais veloz que o dono do bar, mas ele conseguiu desviar-se a tempo e o feitiço pegou na parede de madeira e a destruiu.


O copeiro havia se jogado com tudo para a esquerda e, como o corredor em que estavam Severo e ele fosse estreito, seu corpo bateu com estrépito na parede ao lado. No mesmo momento, a porta do quarto se abriu e, para horror de Severo, Alvo Dumbledore estava parado à soleira, com um olhar esmagador, prestes a matá-lo ali mesmo. Severo viu-o mover as mãos por baixo da capa de viagem violeta, mas não estava disposto a esperar para ver o que sairia dali; concentrando-se o máximo que pôde em uma ponta alta de uma rua que dava à uma praça circular, ele girou no mesmo lugar e Dumbledore, o dono do bar e a mulher de óculos muito maiores do que o necessário se tornaram figuras difusas a girarem no ar. O ar comprimiu-se como sempre, uma estranha sensação de estar viajando por um lugar desagradavelmente pequeno e, menos de cinco segundos depois, Severo já estava em pé na ponta da rua dos Pinheiros, olhando ansioso para o final dela, onde se erguia uma Sé e em seu redor várias casinhas com aparência similares, todas rodeando uma praça bem cuidada.


Estava chovendo muito, o que Severo demorou a perceber, e parecia que o céu cairia sobre toda a Grã-Bretanha. Mas isso não tirava da cabeça o que ele, caminhando agora apressado pela rua e farfalhando uma enorme capa negra que sempre usava, ouvira no Cabeça de Javali. Alguém com o poder de vencer o Lorde das Trevas se aproxima? Quem será? O que aquela voz queria dizer com isso? E de quem era aquela voz? Poderia ser daquela mulher estranha com os óculos em toda a cara? Severo tinha que reportar isso ao seu Lorde. Uma informação muito valiosa, com certeza, principalmente porquê Alvo Dumbledore se dispusera a ouvir. O quão grato ficará o Lorde das Trevas quando ouvir isso? O que lhe dará?


            Severo chegara na entrada da Sé totalmente ensopado, com os negros cabelos colados ao semblante ansioso, e parara à grande porta de madeira onde uma cabeça de caveira de cuja boca saia uma cobra olhava inerte para o recém chegado. Ele levantou a manga do braço esquerdo e mostrou a Marca Negra, o mesmo desenho da porta gravado em seu antebraço. O crânio pareceu luzir por um breve segundo, depois a porta se abriu para admitir um apressado Severo, que correu à cruzar a missa e entrar na porta atrás do altar, onde dois homens de preto postavam-se à cada lado.


- Ora, Amico, eu estou com pressa!- exclamou Severo, quando os dois homens ergueram as varinhas, fazendo-o parar.


- Desculpe, Severo, mas é o protocolo. – disse o homem da direita, seu rosto semioculto por um capuz.


            Sem dizer nada, Severo levantou mais uma vez a manga da capa e deixou que Amico tocasse-a com a ponta da varinha. A marca de Severo queimou e, pela satisfação do homem que a tocara, a dele também. Assim que entrou, Severo encontrou uma sala pouco grande, com algumas mesinha dispersas por ela, mas com uma enorme lareira no final e, diante do fogo crepitante, uma poltrona grande e majestosa em que se acomodava um homem. Severo avançou com cautela agora e se curvou diante do mestre, sem ousar olhar-lhe nos olhos. Voltando-se à ele, o Lorde das Trevas falou, sua voz fina e mais parecendo um silvo maligno:


- Severo, o que tem pra mim hoje?


- Milorde, tenho uma informação que pode ser muito valiosa...ela vem de Sibila Trelawney e de Alvo Dumbledore.


- Alvo Dumbledore?- o Lorde deixou o nome pairar no ar com uma nota de silvo demorado. Como não se atrevesse a interrompê-lo, Severo esperou-o continuar:- Que pode ser tão valioso vindo do nosso velho conhecido, Severo?


- Acho que é uma profecia, Milorde. O senhor sabe quem foi Cassandra Trelawney, certamente...


- Sobre mim, Severo?- interrompeu-o o Lorde, impaciente.


- Sim senhor.


- Diga.


            Severo contou tudo o que ouvira para o Lorde, sem omitir um detalhe sequer, se desculpando por não poder apurar mais devido ao flagrante que levara do barman do Cabeça de Javali. Ao terminar, o Lorde parecia muito pensativo, não preocupado, mas interessado, como se estivesse apenas resolvendo um quebra-cabeças de brinquedo.


- Quer dizer, que ao terminar do sétimo mês, que deve ser Julho, nascido dos que me desafiaram três vezes...nascerá aquele com o poder para me vencer?


- É o que parece, Milorde.


            O Lorde das trevas riu gostosamente. Deveria ser realmente engraçado que alguém como ele fosse temer um recém nascido. Além do mais, estavam em agosto, havia quase um ano pela frente, quase um ano para esperar “aquele com o poder de vencer o Lorde das Trevas”. Mas tão logo parou de rir, o Lorde articulou, satisfeito:


- Espere... dos que me desafiaram três vezes... só existem quatro pessoas vivas que fizeram isso. E que são, como você bem sabe, Severo, Frank e Alice Longbottom e...


- Tiago e... Lílian Potter.


- Mas, é claro, eu o marcarei como igual...aquela Lílian é uma sangue-ruim, não é?


- Sim, Milorde, mas...


- Então, é claro!


- Milorde, se me permite, eu gostaria de dizer que os Longbottom são uma conhecida família bruxa e merecem mais atenção do que um casal promíscuo e...


- Mas os Longbottom são sangue-puro, Severo. E nós não matamos sangue-puro.


- Mas, Milorde, são traidores do sangue!


            Severo estava atônito. O Lorde das Trevas estava crente de que seria de Tiago, aquele vagabundo insolente, e de Lílian, logo ela, que nasceria sua perdição. Severo já sabia o que o Lorde pretendia, tinha certeza de que ele os mataria sem piedade nenhuma. Não podia permitir isso.


- Milorde...permita-me então eliminá-los. Eu tenho certeza de que...


- Não!- Severo não olhava, mas tinha certeza de que seu Lorde o fitava com interesse e desconfiança.- Severo, o que é com você?


- Na-nada, Milorde.


- Não minta pra mim Severo. Que eu saiba, você e o Potter sempre foram inimigos declarados. Você estaria por acaso demonstrando piedade...ah!


            O Lorde compreendera algo. Algo que nem mesmo Severo admitira para ninguém. Algo que dormia dentro dele desde o colegial, mas que agora despertava com fervor e medo. Ele não falou, deixou que o Lorde compreendesse por si só.


- É a Lílian Potter não é?


            Severo não respondeu. Manteve-se calado, odiando a si mesmo por ter ouvido o que ouviu. Agora ela morreria. E seria sua culpa, sua inteira culpa. A única mulher que Severo Snape amou, sua amiga de infância, separados em Hogwarts, quando ela seguiu para a Griffinória, a casa dos destemidos e leais, e ele seguiu para a Sonserina, a casa dos espertos e sobreviventes.


- Mi-milorde, por favor...


- Mas é claro, Severo. Você me deu uma informação valiosíssima. Merece uma recompensa. Você quer que eu poupe-a, não quer Severo?


            Ele demorou a responder. Não sabia se faria alguma diferença para o mestre ou para ela. Por fim, respondeu:


- Sim.

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