O chapéu seletor



Capítulo 1 - O chapéu seletor












A paisagem era sempre a mesma, um eterno campado verde que se repetia. Draco observava o horizonte recostado na janela. Tinha que pensar tantas coisas este ano, desejava apenas fugir e fingir que simplesmente não era com ele.



Ouviu as vozes agitadas de alguns estudantes. Virou os olhos para Crabbe. “O que está acontecendo?”



“Ahh... Não sei...” o garoto gigantesco respondeu sem jeito. Ele era um brutamontes mas parecia ao mesmo tempo tão frágil.



“Então vá saber.” Draco falou como se fosse óbvio. Crabbe se levantou e foi para o corredor do trem.



Draco desvirtuou os seus pensamentos na paisagem tediosa novamente. Não estava sinceramente interessado no que estava acontecendo. Uma escola como aquela era cheia de fofocas e intrigas. Não era um momento exatamente atípico ver uma agitação no trem. Isto acontecia todo ano... só mudavam os motivos... todos sempre idiotas.



“É uma garota...” Crabbe chegou na porta da cabine.



“Uma garota?”



“Estão falando que tem uma garota nova na escola e que ela tem uns dezesseis anos.”



“Isso é impossível, idiota...”



“É mas... dizem que ela foi adotada por Dumbledore e que está na escola a meses. Deste que a guerra acabou.”



A guerra. Draco não queria se lembrar da maldita guerra. Seu pai tinha fugido e o seu paradeiro era desconhecido. Foi dado então como morto. Ele não parava de imaginar sua mãe vagando pela mansão Malfoy como um “fantasma viúvo” que não tinha de fato perdido seu marido...



“Draco?” Goyle o chamou.



Draco tremeu os olhos impaciente.



“Você acha que isso é verdade?” Goyle perguntou, incerto se deveria mesmo ter perguntado.



“A coisa da garota? É claro que não...” Draco não tirou os olhos da janela.



“De qualquer forma... nós vamos ficar sabendo... afinal, dizem que ela está na escola.”



“Que seja.” Draco fez um gesto displicente com a mão. Suspirou fundo e fechou os olhos devagar. Sentiu um olhar. Abriu os olhos e viu Potter parado na porta da sua cabine. “O que foi Potter?”



“Nada.” Harry respondeu rispidamente. E saiu do campo de visão de Draco.



O trem chegou em Hogwarts. Draco olhou para o castelo e pensou com tristeza que seria a última vez que veria esta cena. Diversos barquinhos levando menininhos de onze anos assuntados. Sorriu da cena. Nunca pensou que iria sentir falta daquilo. Era seu último ano em Hogwarts mas preferia não pensar nisso. Sabia que aquilo lhe doía, mas nunca admitiria.



Viu o movimento no corredor e saiu do trem. Não falou nada durante todo o percurso até o salão comunal, apesar de todos terem puxado assunto com ele. Sentou-se no seu lugar de costume com toda a compostura. Sua profissionalidade em disfarçar suas emoções era indescritível.



Sentia que alguém tinha lhe arrancado uma parte e o abandonado em seguida, deixando-o sangrar para curar feridas que ele não conseguiria reparar.



“Alunos...” a voz de Dumbledore ecoou pelo hall enquanto ele tilintava em uma taça de cristal. A vozes foram se calando gradativamente. “Primeiramente bem vindos. Antes de começar o processo do chapéu seletor eu tenho algumas declarações.”



Todos olharam para ele compenetrados, menos Draco que olhava distante para a mesa.



“Temos uma nova aluna. Um caso mais...” Dumbledore pensou muito nas suas próximas palavras. “específico. Ela já tem dezesseis anos e vai ingressar em Hogwarts este ano.”



Ouve um grande tumulto. “Silêncio, silêncio por favor.” Todos se acalmaram. “ela não foi descoberta antes pois só demonstrou suas habilidades a pouco tempo e por causa de todo o período de guerra não tivemos como detectá-la. De qualquer forma, ignorar as suas habilidades só por causa de sua idade tardia seria um crime. Por isso...” Ele respirou fundo. “Brena Blair. Você pode entrar querida.”



Draco olhou para o corredor e viu uma menina de longos cabelos pretos andando com passos precisos e fortes pelo hall. Ela estava de cabeça erguida, com um olhar firme e extremamente azul. Sua capa esvoaçava e revelava que ela não estava usando uniforme. Vestia um corpete, uma saia rodada e botas de cano alto trançadas.



Ela subiu até o patamar do hall. Virou-se para os alunos. “É um prazer.” Sua voz era suave e ao mesmo tempo firme. Draco observava cada movimento da menina. Ela aparentava uma segurança invejável. Seu rosto delicado e o olhar firme contrastavam com uma perfeição indescritível. Pelo menos para Draco, indescritível. Ele a olhou abismado até ter seus pensamentos interrompidos.



“Ela até que é bonita...” Ouviu a voz grave de Crabbe.



Draco rolou os olhos impacientemente. Odiava ter seus pensamentos interrompidos. “É, talvez.” Pensou a resposta mais genérica que poderia dar.



“Se importa de iniciarmos o sorteio das casas com a Srta?” Dumbledore lhe dirigiu a palavra calidamente. Ela acenou e sentou-se na cadeira, deixando Minerva colocar lhe o chapéu. Brena deixou transparecer uma tremida de olho, que demonstrava o seu nervosismo, mas quase ninguém viu isso.



“Lufa-lufa!” O chapéu gritou depois de um longo tempo.



“Lufa-lufa?” Draco pensou em voz alta, intrigado.



“Algum problema com isso Malfoy?” Pansy perguntou nervosa.



“É claro que não.” Ele respondeu rispidamente. “Ela só não tinha cara de Lufa-lufa...” ele complementou com desdém.



“Claro que tem!” Pansy respondeu com uma voz altiva. “É uma sangue-ruim perdedora! De que outra casa deveria ser?”



“Sangue-ruim?” Draco perguntou como se não tivesse escutado os outros comentários da garota. “Totalmente trouxa?”



“Você não sabia?” Ela comentou arrogantemente.



“Obviamente não...” ele respondeu sem paciência.



“Sim é... diretamente do mundo trouxa...” ela comentou com nojo na voz. “Inaceitável admitirem uma menina trouxa dessa idade em Hogwarts não acha?”



“É estranho...” Ele falou com a voz longe.



Draco nem observou a escolha das casas dos meninos do primeiro ano como costumava fazer. Olhou para mesa da lufa-lufa. Isso ele nunca fazia. Ele a observou. Delicada e educada, conversando casualmente, sem muita empolgação e com muita classe com os alunos da lufa-lufa que pareciam encantados com a presença dela. Ela ria uma vez ou outra lançando os cabelos para trás. Como se percebesse o olhar dele, ela desviou da conversa para olhar diretamente para Draco.



Ele congelou por segundos, sem desviar o olhar, escutando apenas o som da sua respiração.



Era como se o ambiente tivesse sumido.



Mas o ambiente voltou a aparecer com a voz impetulante de Pansy em seu ouvido: “Está olhando alguma coisa Draco?”



Draco olhou para baixo, respirando fundo e encarou Pansy com um olhar frio. “Por que?”



Ela se arrumou na cadeira sem jeito. “Nada. Eu estava pensando Draco... já estamos no nosso último ano e...” a voz dela estava muito instável e ela cutucava seus dedos.



“Algum problema?” ele respondeu indiferente.



“Não... é que...”



“Ótimo.” Ele a interrompeu sem nenhum pudor e levantou-se da cadeira. “Eu já vou indo...”



“Mas você é monitor! Deveria acompanhar os...”



Interrompeu-a novamente, com a voz mais grave desta vez. “Tenho certeza que não terá problemas em escoltar um bando de crianças Pansy...” Ele a olhou sarcasticamente. “Ou vai precisar de mim para isso?”



“Claro... mas...”



“Então escolte as crianças. Te vejo depois.” Ele falou sem encará-la e saiu da mesa não desejando resposta alguma.



‘Componha-se Malfoy!’ ele pensou rispidamente. ‘Componha-se!’ Imediatamente Draco levantou o rosto, com um olhar austero seguiu pelo corredor com passos calmos e precisos.



Andou pelo corredor escuro e viu uma sombra em sua frente. Pôde sentir quem era.



“Potter...” Ele se inclinou na parede oposta.



“Malfoy...” Harry respondeu com uma voz pesada.



Os dois suspiraram cobertos pelas sombras do passado e do futuro.



“Eu lhe agradeço... nunca lhe disse isso mas... agradeço...” Harry falou com uma voz dura.



“Nenhum agradecimento é necessário.” Draco olhou para baixo. “Eu não o fiz por você.”



“Se você não salvou a minha vida por mim a salvou por quem?” Harry sorriu tristemente.



“Muitos motivos Harry... muitos...”



“Eu não vou te chamar de Draco só porque você me chamou de Harry...”



Draco riu. “Você é tão infantil Potter...” e desencostou da parede. Deu um tapa nos ombros de Harry. “Eu não sei porque te salvei Harry...” virou-se de costas sumindo na escuridão do corredor.



“Até mais tarde...” Draco fez um aceno com a mão sem virar para trás.



Aquela guerra turbulenta lhe arrancou mais pesares do que frutos. Ele viu muito mais sangue do que desejava... sangue de todos os lados atormentando-o em seus pesadelos. Porém o que mais doía era a visão de sua mãe vagando pela mansão como um fantasma negro, que perdeu o sentido da vida.



Tantos anos ao lado de seu pai, seguindo e imitando cada passo dele e agora estava perdido nos escombros que ele havia lhe deixado de herança: uma mãe desolada, uma mansão escura e fria, sua eterna sombra e, sim, uma fortuna imensa...



Uma maldita fortuna que todos almejavam como abutres em cima da carniça: os Parkisons, os Zabinis, tantas famílias, tantos traidores desta guerra sangrenta, como ele, que não passava de mais um traidor. Draco mergulhou suas mãos no rosto, batendo a cabeça contra a parede. Ele tinha que ser firme e austero mas não tinha de onde tirar as forças...



Draco percebeu um olhar sobre ele. “Quem está aí?” ele perguntou sem se importar com a resposta.



“Brena Blair...” a garota tinha uma voz doce e altiva.



“Blair... a garota nova?” Ele virou-se para ela e fitou novamente aqueles olhos azuis que na escuridão do corredor ficavam ainda mais resaltados. Ele olhou para baixo. “Porque raios você não usa uniforme?”, perguntou rispidamente.



“Eu não posso comprá-los...” Ela respondeu com firmeza.



“Pobre... sangue-ruim e da lufa-lufa? Você é o símbolo da escória...” Ele lançou um olhar superior.



“Escória é o que você me considera?” Ela riu superiormente inclinando-se sobre o ouvido dele. “Não foi o que os seus olhos transpareceram no hall a alguns segundos atrás...” a voz suave penetrava-o como um veneno.



Draco engoliu seco. “Não se superestime...” ele deu um sorriso torto, deixando algumas mechas caírem no seu rosto.



“Me superestimo porque posso.” Ela respondeu erguendo a cabeça.



“Coloque-se no seu lugar sangue-ruim.” Ele respondeu rindo nervosamente.



“Nós vamos ver aonde é o meu lugar...” Ela mexeu com as mãos esperando um nome.



“Draco Malfoy.” Ele fez uma postura ainda mais austera. “E você é um fracasso de nascença...”



Ela riu novamente e se curvou no ouvido dele, sussurrou no ouvido dele. “Nós vamos ver...”



Ele viu ela sumir pelo corredor e resmungou “Sangue-ruim convencida...”. Virou-se para o outro lado e viu um grupo de pessoas se organizarem atrás dele. Crabbe e Goyle se posicionaram como guarda-costas. Logo atrás vieram os outros sonserinos, todos andando superiormente, balançando cabelos e capas como se aquilo lhes tornasse melhor do que os outros. A imagem lhes dava o poder que não tinham.



Draco deitou-se em sua cama sem sentir a mínima antecipação pelo dia seguinte, mas o dia seguinte chegou independente de sua vontade. O sol batia contra o seu rosto e ele se cobria completamente com as cobertas resmungando.



Ouviu as pessoas se levantando ao seu redor, tentando ao máximo ignorar o fato que tinha que levantar. Tirou o rosto das cobertas, frisando os olhos e fazendo caretas. Todos já tinham saído do quarto. Ótimo, teria privacidade, podia relaxar os ombros em paz sem parecer fraco por não manter a postura.



Draco saiu do dormitório impecavelmente bem vestido, com um andar preciso e olhar supremo.



“Boa dia Draco.” Pansy olhou para ele de cima em baixo.



Ele olhou-a de canto de olho e seguiu reto apenas acenando a mão com descaso. Foi tomar café da manhã com o seu típico mau humor. Pensou, reflexivo, que era difícil manter esta postura como se tudo fosse sempre perfeito, mas valia a pena pois era respeitado, temido e imitado.



Pansy sentou-se ao seu lado e ele não se virou. “Você ficou sabendo?” Pansy tentou iniciar o assunto.



“Vocês só vivem de fofocas?” Ele falou enquanto levava uma garfada a boca.



Pansy ignorou. “A garota nova, a tal da Blair...”



Draco virou o rosto para Pansy. E ela percebeu o interesse repentino. “Eu pensei que só fossem fofocas Draco...” ela olhou para o prato dela.



“Fale de uma vez.”



“E se eu não quiser...?” Ela encostou o cotovelo na mesa olhando para ele.



Draco riu sarcasticamente e ficou sério repentinamente. “Eu disse: fale.”



Pansy engoliu seco. “Bem... ela é a nova apanhadora da lufa-lufa.”



“Como?” ele perguntou incrédulo.



“Você ouviu...”



“Impossível, ela nem deve saber jogar.”



“É o que eu acho, mas os pobres lufa-lufa a vêem como uma nova esperança.” Ela riu. “Eles acreditam mesmo que ela vai tirá-los do buraco.”



“Eles são mais estúpidos do que pensei. Ela é só uma trouxa que provavelmente nunca montou uma vassoura.” Ele deu um sorriso sarcástico. “Se bem que, pensando bem... eles não podem conseguir coisa muito melhor do que ela.”



Pansy riu freneticamente. Ele a olhou criticamente com nojo. “Chega...” Draco se incomodou com as risadas forçadas de Pansy. Ela parou imediatamente voltando suas atenções para o prato.



Draco sentiu a pontada de um olhar nele. Um olhar que começava a ser muito familiar para ele. Levantou os olhos e viu ela, linda e impecável, sentada na mesa da lufa-lufa, encarando-o com um sorriso de canto de lábio enquanto respondia casualmente um ou outro garoto da lufa-lufa.



Estagnado naquela visão ele não notou Pansy chegando em seu ouvido, mas ouviu as palavras que ela disse: “O primeiro jogo vai ser Lufa-lufa contra Grifinória. Nós vamos ver como a sangue-ruim novata se sai.”



As palavras de Pansy ao mesmo tempo que doeram soaram como um estímulo que não sentia a muito tempo: Esta garota nova estava desafiando ele, descaradamente desafiando ele...

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