Veela Song



 Charlie não tirou os olhos de cima de Fleur por nem um minuto durante sua primeira semana em Éden. Seu instinto dizia sempre quando alguma coisa poderia ameaçar a harmonia entre sua equipe. E não ficara cego ante a hostilidade recíproca entre a visitante e Cho.
 Não era de forma alguma uma hostilidade declarada, antes era uma antipatia mútua, velada, como se duas garotas muito bonitas não pudessem dividir o mesmo espaço ao mesmo tempo. Janine chegou a comentar com ele, enquanto tratava mais uma enorme queimadura que ele tinha no braço:
– Isso é normal. Duas garotas bonitas de personalidades tão diferentes não poderiam mesmo conviver em harmonia, Charles .
– Bem, eu acharia melhor que elas simplesmente se ignorassem. É muito desagradável perceber que um comentário ácido de uma é fatalmente dirigido à outra, o tempo todo.
– Se Fleur fizesse parte das turmas de patrulha, talvez isso diminuísse. Acho que ela se aborrece com o fato de ficar o tempo todo aqui no acampamento, creio que ela achava que poderia fazer parte das equipes de ar. É realmente um tédio passar o dia analisando amostras velhas de sangue e pele.
– Eu não a colocaria numa equipe, para o próprio bem dela! Imagine, ela não tem treinamento para isso, Jan! Seria jogá-la à morte.
– Uma coisa isso tem de bom, para Cho... ela se sente em vantagem por ficar o tempo todo perto de você.
– Não faça esse tipo de insinuação, Jan! – disse Charlie,  sentindo as orelhas ficarem vermelhas.
– Ora, Charles ... que bobagem, você é um homem, ela uma mulher.
– Ela é uma garota! É quase onze anos mais nova que eu, Jan!
– E daí? Eu acho que quando o vê ela faz uma idealização romântica, afinal... bem, ela não teve uma vida amorosa muito normal... tadinha.
– O que houve?
– Você não sabe? Você-sabe-quem matou seu primeiro namorado! Foi a primeira vítima depois que ele ressurgiu.
– Sério?
– Charlie,  em que mundo você vive? Todo mundo no acampamento comentou sobre isso, Olívio nos contou, quando a recomendou para o estágio!
– Você sabe que eu não presto atenção em fofocas!
– Eu sempre me esqueço que você presta sempre mais atenção ao trabalho que às pessoas...
– Isso não é verdade.
– Imagina... porque será que meu querido chefe é sempre o mais queimado daqui? Essa última  bate o record, hein? – disse ela, colocando mais uma atadura mágica com poção contra dor na queimadura.
– Mas – Charlie parecia pensativo – como o namorado dela morreu?
– Na final de um torneio tribruxo. Ninguém conhece muito as circunstâncias, nem mesmo Cho. Ela só sabe o que Harry Potter disse.
– Ah, eu conheço a história. Lembro quando aconteceu, nas férias estive em casa e Harry estava lá, coitado, ainda traumatizado. Não sabia que o rapaz tinha sido namorado dela. Harry nunca tocou no nome de Cho.
– Você o conhece, né? Como ele é?
Charlie deu de ombros
– Claro que é, mas ele não liga para isso. É um ótimo garoto, ele e meu irmão caçula são muito amigos... pensando bem deve ser horrível ser alvo permanente de Você-sabe-quem... acredita que ele diz o nome com todas as letras?
– Não! Ninguém diz esse nome... ele deve ser realmente muito corajoso!
– Já o vi fazer isso muitas vezes, e depois se desculpar pela própria coragem – riu Charlie,  que logo voltou a pensar em Cho – Jan, pobre Cho... eu não imaginava que ela havia passado por isso tudo.
– Passou. Eu creio que ela odeia os comensais da morte mais que tudo na vida. Mas ela não fala quase sobre isso. Eu não falaria se estivesse no lugar dela – disse a enfermeira enquanto finalizava o curativo.
– Nem eu – disse Charlie,  esticando e encolhendo o braço para se adaptar ao novo curativo – nem eu, Jan.
Essa conversa fez Charlie olhar Cho com outros olhos. O olhar sempre carente da menina, com seu jeito meigo, tão diferente do ar aristocrático de Fleur, que mesmo nas tarefas mais simples não perdia o jeito de princesa, tudo isso, o fez aproximar-se de Cho, mesmo achando que não deveria se aproximar muito, muito depressa. Também não queria parecer estar dando a ela regalias, só queria conhecê-la melhor.
A sétima noite depois da chegada de Fleur parecia uma noite tranqüila de verão, e Charlie observava ao longe a montanha, negra, onde eventualmente podia se ver pontos luminosos vermelhos, as cavernas onde os dragões faziam seus ninhos. Dentro de algumas semanas os ovos começariam a abrir, e quando os filhotes estivessem num tamanho razoável, ele poderia selecionar os dragões para a coleta de sangue fresco. Do mirante de pedra onde se encontrava, podia ver quase toda a parte leste da reserva. Atrás dele, o acampamento estava na sua rotina noturna: Janine lia, Celso brincava com o Dragão Norberto, Primakova discutia o último artigo sobre a farmacopéia bruxa com Michel, Olívio polia sua vassoura e cada um se ocupava de alguma forma, quase todos fora de suas cabanas, que àquela altura estavam bastante quentes, mesmo para a região, que era fria. Apenas Fleur não estava à vista. Cho aproximou-se sorrindo, e ele retribuiu.
– Apreciando seus protegidos? – ela falou, referindo-se aos dragões. Ele baixou a cabeça e riu.
– Por que será que todos pensam que eu acho os dragões minha família?
– Porque você vive para eles. Isso é óbvio – Charlie a encarou, examinando-a. Cho o olhava com um ar provocativo e malicioso.
– Bem... não é isso. Não é afeto... é responsabilidade, Cho. Eu tenho que responder pela vida de cada dragão que habita a montanha. Isso ocupa um grande espaço na minha vida. Cada um deles pode viver até mais de cem anos, e nesses cem anos, com seu sangue, pode curar pessoas, ajudar bruxos em poções e encantos... um dragão é muito valioso, em todos os sentidos. Meu dever é que cada dragão da reserva viva o máximo que puder, da melhor forma possível. Para isso eu preciso estar sempre atento. Tem sempre alguém querendo matar um dragão. Alguém que não entende que matar um dragão é como matar uma galinha dos ovos de ouro...
– Charlie... por que você tem que falar o tempo todo do seu trabalho? – ela se aproximou dele e disse mais baixo – por que você não pensa em mais nada?
Ele não pôde responder. Um rugido estrondoso ecoou ao longe e a leste. Ele virou-se atento imediatamente, a tensão aparecendo em cada músculo de seu rosto. Conhecia esse som: alguém estava tentando acuar um dragão. Imediatamente o acampamento tornou-se um formigueiro, com toda equipe correndo para as vassouras. Uma invasão de caçadores não era apenas algo terrível, era um fator que conseguia enfurecer todos.
Menos de dois minutos depois, a equipe inteira de ar voava em formação, Charlie tinha na bússola mágica a sinalização exata do local onde um dragão, provavelmente uma fêmea, era atacado por cerca de quinze caçadores. Só mandavam um número grande assim quando queriam capturar algum deles vivo.
– Charlie – gritou Cho, quando o primeiro feitiço hostil cortou o ar. A menina disparou um feitiço para baixo, a esmo, enquanto Charlie tentava localizar na bússola o animal acuado. Sabia que ele estava ferido. Um grupo de caçadores dificilmente consegue capturar um dragão vivo sem ferí-lo, se não tem pessoas treinadas para tanto. A equipe de Charlie era uma das poucas no mundo que conseguia imobilizar um sem ferí-lo.
Enquanto isso, os caçadores tentavam fugir, agora que sabiam que haviam sido descobertos. Olívio derrubou um, usando um feitiço estuporante, assim que viu o homem aparecer numa clareira. Quando estavam bem próximos ao local onde estava o dragão, Charlie viu um vulto aproximando-se sobre uma vassoura. Seu sangue gelou quando viu a máscara que o homem usava. Era um comensal da morte.
– Imobilus! – ele ouviu Cho gritar. Ela foi mais rápida que ele e paralisou o atacante no ar sobre sua vassoura. Ele virou-se grato e sorriu para a menina, antes de mergulhar na floresta. O rugido, agora baixo, do dragão, o assustava. Sabia que se ele havia perdido a força para urrar, era porque os ferimentos eram sérios. Saltou da vassoura e quando deu o primeiro passo, sentiu uma dor aguda e excruciante. Não conseguia virar-se, não conseguia se mover. Fora apanhado pela maldição cruciatus assim que tocara o solo.
A dor durou uma eternidade. Seus pensamentos foram se apagando, e a única coisa que ele conseguia pensar era que imploraria para que a dor passasse de alguma forma. Ele não podia suportar aquilo, simplesmente não podia. Era como se sua carne estivesse sendo arrancada dos ossos, uma dor que queimava, oprimia, fazia que ele até desejasse a morte, se ela fosse o fim daquela dor imensa.
Foi quando ele ouviu uma canção doce numa língua desconhecida. Uma canção suave, numa voz meiga e angelical, que foi fazendo a dor cessar como que por encanto. Sem saber como, deslizou para um estado de inconsciência onde pelo menos não havia mais dor.
– Charles ? Charles ? – uma voz o chamava. Parecia vinda de muito acima, como se ele estivesse no fundo de um poço. Aos poucos, sua consciência ia voltando, e ele pôde sentir sob seu corpo o chão pedregoso, áspero, o que o fez abrir os olhos e sentar-se bruscamente, para dar de cara com o rosto belo de Fleur, que o olhava, espantada.
– O que houve?
– Ah, que bom que ele acordou – disse a voz animada de Olívio. Ele viu o rapaz, que amarrava dois homens a uma árvore. Fleur permanecia calada. Ele repetiu:
– O que houve?
– Dois caras te cercaram e lançaram a maldição cruciatus em você. Sorte que Fleur os derrubou. E ela nem precisou estuporar ninguém, hehehe.
– O que... – subitamente ele se deu conta de algo que estava fora de lugar – como você veio parar aqui?
– Aparatei – disse ela, de forma desafiadora – eu pude ouvir os urros do dragão da minha cabana, e sabia que você jamais me deixaria vir em uma vassoura.
– Charles  – Cho apareceu detrás de uma árvore – ainda bem que você está bem! Prendemos quase todos os outros. Alguns escaparam!
– Cho imobilizou um! – disse Olívio – prendemos quatro comensais e mais seis caçadores comuns, no final.
– E o dragão? – perguntou Charlie. Um silêncio incômodo pairou entre os três. – falem – ele disse, de forma imperiosa.
– Celso e os outros estão lá adiante, com ele... mas chegamos muito tarde – disse Olívio. Charlie levantou-se de um pulo. Fleur ia seguí-lo quando Cho disse:
– O que você vai fazer lá? Você não entende de dragões mortos, entende?
– Garota, o que eu te fiz? – perguntou Fleur.
– Apareceu no momento errado – respondeu a outra, de forma ácida. E eu realmente não sei como você aparatou bem no lugar certo, na hora certa.
– Ora, vá se catar – disse Fleur, passando entre Olívio e Cho, seguindo atrás de Charlie.
– Cho, você endoideceu? Ela SALVOU o Charlie,  alô? Você entende isso?
– Olívio, ela não me engana. Não gosto dela. Não acho muito difícil que ela esteja tentando facilitar a entrada de caçadores em Éden.
Olívio se calou, ainda duvidando, achando que Cho desgostava de Fleur apenas por puro ciúme.
Adiante, Charlie estava ajoelhado diante do imenso corpo de uma jovem fêmea de Rabo-córneo Húngaro. Ele acariciava as escamas do pescoço do dragão, penalizado. Já havia contado as escamas da muda, no ventre da fêmea. Ela tinha pouco mais de vinte anos.
– Droga... ele disse – ela devia estar na sua primeira cria.
– Charles  – disse Celso – o que nós temíamos – ele mostrou uma faixa no ventre onde as escamas estavam muito macias. Era sinal que ela estivera chocando ovos, que podiam estar em qualquer lugar.
– Vamos ter que procurar os ovos – disse Charlie – e tentar acabar de chocá-los no acampamento. Vamos deslocar o corpo para o laboratório. Precisamos fazer isso antes que o sangue dela comece a se solidificar. Chame Olívio e Cho. Eles vão me ajudar a transportá-lo. E vocês – ele apontou os outros e Fleur – tentem achar os ovos. Precisamos chocá-los antes que comecem a esfriar, ou os filhotes não nascem.

***

 Horas depois, Charlie contava, arrasado, os frascos de sangue coagulado de dragão que a fêmea rendera. Spike agora retalhava o corpo, do qual quase tudo, exceto os ossos, se aproveitava, mas nada era comestível. Em vida, o sangue de dragão assemelhava-se com lava de vulcão, e nesse estado permanecia, mesmo por anos, enquanto  dragão estivesse vivo. O sangue era a substância mais rica em propriedades mágicas que se tinha notícia. Quando o dragão morria, o sangue começava a se solidificar, num processo que levava alguns anos para acabar, resultando na dragonita, a pedra de sangue de dragão, que tinha uma aparência cintilante e vermelha. Carne, sangue e principalmente, o coração, eram usados em preparados e poções, o couro era aproveitado integralmente e havia usos para os chifres inteiros ou mesmo mo[idos. Quando morria um dragão de morte natural eles precisavam imediatamente fazer o beneficiamento dos raros materiais: eram eles que mantinham aquela reserva de pé e intocada. Os ossos eram levados para um lugar na montanha que eles chamavam “O Cemitério”, e onde raramente os outros dragões iam, era uma depressão estranha, no alto de uma montanha que, na verdade, eras antes havia sido a cratera de um vulcão, hoje completamente extinto.
 Aurores haviam sido convocados, e levado os quatro comensais presos e os demais caçadores, quase todos fichados, para interrogatório, dizendo que manteriam contato sobre o que podia ter levado comensais da morte até a reserva. Charlie não precisava de investigação: Dumbledore o avisara que, uma vez que Voldemort estava fraco, com certeza iria querer algum dragão vivo, para retomar a antiga vitalidade com a poção regenerante.
 Ele pensava em Fleur, e, principalmente, na canção que ele escutara. Tinha certeza que fora ela que cantara, e de alguma forma, derrubara seus agressores. Mas ainda assim, sentia-se desconfiado. Não queria acreditar que ela tivesse se arriscado pelo bem da reserva, ou dele. Foi quando o chamaram e disseram que os ovos estavam no acampamento, haviam sido encontrados pela equipe.
– Charlie,  precisamos fazer agora mesmo uma câmara quente – disse Celso – está quase amanhecendo, mas os ovos precisam ser aquecidos.
– Eu sei. Vamos usar um dos chalés de suprimentos. Vou esvaziá-lo e conjurar uma lareira. Vamos precisar deslocar alguém para cuidar da ninhada.
– Isso seria loucura – disse Celso – se comensais estão rondando a reserva, precisamos até de mais gente na equipe.
– Vou pedir reforço. Mas temos que salvar os ovos. Talvez eu me responsabilize por ele.
– Tá louco? Charles , você é o líder – interviu Olívio – precisamos de você no ar o tempo todo!
– Eu posso cuidar dos ovos – disse Fleur – eu não faço nada de interessante mesmo.
– Não acho isso uma boa idéia – disse Charlie,  rumando para o depósito que iria esvaziar. Fleur o seguiu.
– Escute, eu te salvei, lembra? Você podia depois disso confiar em mim.
– Você não deveria estar na floresta. Podia ter se machucado, ou até mesmo morrido.
– Nenhum homem iria me matar – ela disse, entrando atrás dele no depósito. Ele observou em volta e disse, agitando a varinha no ar:
– Apparattus!– apontou para todos os suprimentos, que foram desaparecendo, estava deslocando-os para outro depósito. Em pouco tempo estava tudo desimpedido e ele disse: incendio!
Uma lareira imensa apareceu, acesa, na parede. Ele ficou um instante olhando para as chamas, pensativo. Então olhou para Fleur, que permanecia em pé, na porta do chalé, olhando para ele. A luz do fogo tornava seus cabelos pálidos muito avermelhados, seus olhos azuis tinham um brilho firme e decidido. Não havia outro jeito. Tinha de confiar nela.
– Vá lá– ele disse – traga os ovos. Agora você é responsável por eles. Conjure uma cama, você tem que ficar dia e noite ao lado dos ovos, como uma solícita mãe dragão – ele disse e não conteve o riso. Ela sorriu para ele e correu para pegar os ovos. Os dois juntos os acomodaram entre as brasas. Um deles mexeu-se levemente.
– Vão sobreviver – disse ele, satisfeito, mas ainda com um olhar triste.
– Você foi incrível – disse ela
– Não, não fui. Me deixei pegar.
– Porque estava totalmente concentrado em salvá-la.
– E fracassei. – ele olhou-a – o que você fez lá? Digo... como você os derrubou?
– Um poder de veela me ajudou– ela disse timidamente – Veela song, como o chamam. A canção mágica das veelas nórdicas. Hipnotiza os homens.
– Você me hipnotizou também? – ele perguntou
– Não. Não posso. Você andou tomando pílulas anti-veela. Não me olhe desse jeito espantado. Sei que você as distribuiu a todo acampamento. E fez bem. Não quero ninguém me acusando de manipular os homens daqui. Obrigada por confiar em mim.
Ele sorriu e deixou o chalé, desejando boa sorte a ela. Devia tomar alguma poção animante, não dormira, e não podia dar-se ao luxo de dormir durante o dia, com tanta coisa a ameaçar a reserva.
O que aconteceu desse dia em diante foi que Fleur realmente tornou-se tão solícita com os ovos como seria uma mãe. Mal saía da cabana, apenas para tomar banho e ir ao banheiro, quando gritava por Janine, que ficava em seu lugar. Até as refeições ela fazia junto aos ovos. Toda manhã e toda noite Charlie vinha ver a futura ninhada. Às vezes, pela manhã, tomava conta deles enquanto ela fazia sua toalete matinal.
Mas era à noite que ele se demorava mais, e os dois começaram a conversar, primeiro, sobre os ovos, depois sobre várias coisas. Uma noite ele disse:
– Não se preocupe. Em uma ou duas semanas os ovos vão eclodir, e você estará livre disso. Quando os filhotes estiverem com algumas semanas, poderemos começar a selecionar machos adultos para a coleta de sangue anual. Você logo estará voltando para casa.
– Uma pena – ela disse, olhando para o rosto sardento. – eu estou gostando muito daqui. E estou gostando de ser uma mãe dragão.
– Hum... será que em breve você vai estar cuspindo fogo? – os dois riram.
Charlie custava a acreditar que podia se entender tão bem com ela. Nos dias que haviam conversado, ele passara da desconfiança à simpatia, e, embora não admitisse, a um outro estágio de paixão, diferente daquele que experimentara ao vê-la pela primeira vez. Agora, era uma paixão verdadeira, e livre dos encantos de veela, porque se apaixonara por ela, pela mulher, não pela sua bela imagem, ou seu perfume inebriante.
– O que você pretente fazer, quando sair daqui? – ele perguntou – Quando curar sua mãe e sua irmã? Há algo para o qual voltar, em Paris?
– Não há mais nada em Paris que me prenda. E, francamente, há coisas lá que seria melhor esquecer.
– Coisas? Ou uma coisa, ou melhor, um coisa? – ela riu. Não queria dizer a verdade a ele. Não queria dizer que queria esquecer o irmão dele. Ele sequer desconfiava que estava se apaixonando pela ex-namorada de Bill. E ela achava melhor que continuasse assim.
– Um coisa, você tem razão.
– Céus... como “um coisa” deixa aguém assim ir embora? – ele disse, sabendo o terreno pelo qual, finalmente, avançava.
– Alguém que foi muito especial para mim... fisicamente, ele era parecido com você.
– Nossa, sério? Só falta ser meu irmão. Ele está em Paris há um... – ele viu a sombra aparecer no rosto dela.
– Charles ... eu não queria te dizer isso...
– Então... você e...Bill?
– Me perdoe por não ter dito. É que acabou, e foi doloroso para mim, porque ele não quis confiar em mim... não foi um fim memorável, se você quer saber. Eu sequer esperava ter de contar isso...
– Fleur... – ele disse, tocando seu rosto e fazendo-a olhar para ele – você fez bem. Eu conheço Bill. Eu sei como ele é. E agora, conheço você também.
Aproximou lentamente seu rosto do dela e a beijou, com carinho. Fleur o abraçou, e, ao longe, um dragão soltou um urro diferente do urro de dor. Uma fêmea estava comemorando o nascimento da primeira cria da reserva em algum lugar além das montanhas. Charlie percebeu isso, mas nada o tiraria de perto dela naquele momento.
Na porta de outro chalé, Cho constatava que ele ainda estava dentro da cabana, e nem o ruído da primeira cria do ano o fizera mover-se de lá. Entrou então, contrariada. Se uma cria recém nascida não o tirara lá de dentro, não seria ela, Cho, que conseguiria separá-lo da maldita meio-veela.

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