QUASE UM BRUXO
Porque ela tinha que aparecer na minha vida? Não sei. Só sei que ela desarrumou tudo. E em grande estilo, conforme vocês vão saber. O que eu sei realmente, é que eu era quase feliz. Eu quase me sentia aceito, afinal, era bem tratado pelos meus amigos. Bem, eu tinha a impressão que os meus três melhores amigos eram mais unidos lá entre eles, mas eu quase não me importava com isso. Só um pouquinho, um pouquinho de nada.
Afinal, o que eu queria? Quem pode querer andar com um quase aborto? O fato deles não me tratarem como um já era um bônus. E tinha a Hermione... bom, eu achava que ela nunca ia gostar de mim, mas eu não me importava muito com isso. Afinal, bastava ela quase gostar de mim, ou melhor, gostar sim, mas não do mesmo jeito que eu gostava dela. Isso quase não tinha importância nenhuma...
Eu quase me acreditei muito esperto porque no quarto ano consegui par para o baile antes de todo mundo na minha turma! Tá, eu tinha a impressão que o Harry estava com mais medo que eu de convidar alguém, e o Rony apesar de toda aquela banca, na verdade, era um cara, assim, quase igual a mim. A vantagem dele era que ele apesar de tudo tem mais carisma que eu. Mas, convenhamos, no meu entender até o Trevo, meu sapo, tem mais carisma que eu! Como eu não tinha nada a perder, convidei Hermione. Como eu sou eu, claro, ela já tinha arrumado para para o baile. Acho que comecei a desistir dela quando ela apareceu com o Krum. Acabei indo com a Gina, mas isso não a fez muito feliz. Não é nem o caso de ser a última opção, mas de não estar entre as opções possíveis.
No ano anterior, eu havia me sentido muito corajoso e capaz quando Harry resolveu ensinar a gente a se defender. Eu ainda tinha nítida a memória da noite em que a gente realmente enfrentou bruxos das trevas. Na época, eu, Harry, Rony e Hermione havíamos achado que toda aquela arrogância do Draco Malfoy seria sepultada pela prisão do pai dele. Mas a mãe dele NÃO fora presa, e não era muito melhor que o pai. Malfoy não cansava de dizer que o pai dele cedo ou tarde sairia da prisão.
Mas, apesar disso eu me sentia realmente um cara quase feliz. Quase me contentava com o fato de adorar a Hermione de forma platônica, porque com isso eu tinha a impressão que ela se sentia em dívida comigo, e me dava aquela atenção tão grande, principalmente na aula de poções.
Meu desempenho na aula de poções dava um sentido todo novo à palavra humilhação. A minha relação com o professor Snape era estimulante para os outros alunos. Cada vez que alguém se sentia medíocre e patético olhava para mim e dizia: “é, ainda não sou como o Longbottom. Ainda existe esperança.” Eu já estava quase acostumado com isso. Não que meu pânico diante dele tivesse realmente diminuído, isso é que não. Ele continuava sendo o bicho papão. Toda aquela terapia na aula de defesa contra as artes das trevas havia sido realmente em vão. O que, até então eu NÃO entendia era COMO eu havia passado para o nível intermediário em poções, o que parecia para mim tão possível quanto um trasgo voar.
Mal ou bem, eu sempre passava de ano, mas pra mal que para bem: no primeiro ano, acho que aqueles pontos que o professor Dumbledore me deu salvaram o dia, no segundo ano, quando eu COM CERTEZA seria reprovado, eu fui salvo por aquela história do Harry com o basilisco, que fez os exames serem cancelados (como eu comemorei isso!); no terceiro ano, milagrosamente, eu passei (nem me perguntem como); no quarto ano, acho que os professores foram benevolentes, e eu passei. Mas dessa vez eu não comemorei. Não havia motivo para isso. No quinto ano, a grande surpresa: eu passei em TODOS os N.O.M.s (Níveis Ordinários de Magia), ou seja, aquilo que define se você é minimamente bruxo. Eu, francamente, ainda tinha algumas dúvidas a respeito disso Até hoje eu acho que, hum, bem, alguém deve ter trocado as notas. Eu queria REALMENTE ter ficado reprovado em poções.
O sexto ano era um ano do terror. Não havia NOMs e nem NIEMs, mas logo depois dos feriados de Natal, cada professor passou uma tarefa para o resto do semestre que valia 50% das notas para aquele ano, o ano intermediário de avaliação entre o básico e o avançado, ou seja, um ano tão massacrante quanto o anterior e o posterior. Vocês pensam que que, com toda essa história de Vocês–sabem–quem voltando os professores deram um desconto, e a tarefa foi facinha, né? ERRADO, meus amigos! Os nossos queridos professores positivamente queriam nos fazer ou enlouquecer ou aprender pela dor. No caso do Snape, acho que ambos, não necessariamente nessa mesma ordem:
– Muito bem... vocês acham que são bruxos, não é mesmo? Acham que aqui vão conseguir seus NIEMs apenas agitando varinhas e fazendo gestos teatrais... vocês estão enganados. O nível intermediário é o mais importante, onde vocês podem aprender TUDO que precisam para chegar ao avançado, ou simplesmente chafurdar na lama da mediocridade e chegar aos NIEMs absolutamente despreparados. – por mais que eu achasse que conhecia todas as expressões malvadas que o professor Snape sabia fazer, nesse dia eu estava surpreso. Isso, positivamente, era sinal que ele estava realmente tramando a nossa morte, a minha pelo menos.
– Vocês acham – ele prosseguiu– que eu vou facilitar a vida de vocês? – (eu sabia que ele não iria, claro) – Chegou a hora de realmente mostrarem algum tutano nesta escola... e não pensem que serei generoso na hora de julgá–los – uma coisa eu sempre odiei no professor Snape: ele fala cuspindo. Junto com esse “julgá–los” saiu uma quantidade tão grande de perdigotos que eu soube imadiatamente que ele passara todo Feriado de Natal elaborando algo grande, difícil e mau para nós. Nesse momento, ele me enxergou, e deu início a sessão de humilhação n°1 da aula. Até que nesse dia ele demorou pra começá–la.
– Qual a sua opinião, Senhor Longbotton? O que o senhor acha que eu elaborei para a turma?
– Não tenho opinião – eu disse, tentando me encrencar o menos possível.
– Isso para nós não é novidade – ele disse, com um ar decididamente divertido, e eu creio que encolhi os 10 centímetros que crescera no último ano. – A sua mente é absolutamente obtusa, o senhor tem o cérebro tão... impermeável, eu diria, que não se consegue extrair dele sequer o mínimo. Até hoje eu penso em processar criminalmente o avaliador que deu ao senhor nota suficiente para permanecer nesta turma depois dos NOMs. Imagino que o fato dele ser amigo de sua avó tenha influenciado seu julgamento. Eu queria ter tido a oportunidade de efetuar uma contra–avaliação pessoalmente, mas... misteriosamente as amostras do senhor sumiram. O senhor entende, não?
Brilhante! Agora, além de estar fazendo poções absolutamente contra a minha vontade, eu descobria o dedão da minha avó na minha aprovação suspeita. Boa parte da turma, aquela que correspondia à Sonserina em maior número, estava estourando de rir. Harry, Rony e Hermione olhavam para mim penalizados. Como eu sempre digo, só por causa deles eu era quase feliz, principalmente quando olhava a expressão de Hermione. Eu olhei para o professor, para o seu sorriso sádico, e não disse nada. O que adiantaria reagir? Eu era um zero à esquerda mesmo... e, pior, ele tinha razão para reclamar. O que eu poderia fazer? Nesse momento uma voz cortou o silêncio:
– Porque o senhor não diz logo o que é a tarefa e deixa ele em paz? –
Grande Harry! Me defendeu e fez a Grifinória perder 10 pontos. Claro que depois o culpado seria eu! Logo depois que tirou os pontos, o professor, agora muito mais bem humorado (em cinco produtivos minutos de aula ele já tinha feito duas coisas que adorava: me humilhar e ferrar a Grifinória através do Harry), resolveu finalmente dizer o que era a tarefa:
– Muito bem... está na hora de vocês deixarem para trás toda essa sua pobreza intelectual! Eu farei algo por vocês que me agradecerão pelo resto de suas existências! Chegou a hora de abandonarem a simples cópia, senhores. Ofereço a todos uma oportunidade ÚNICA de saírem da mesmice de copiar poções... a tarefa deste ano, no nível intermediário, será criar uma poção nova. Uma poção com a identidade dos senhores... e não pensem que eu não saberei se alguém pegar uma poção alheia para modificar...
Quase toda turma explodiu em perguntas. Hermione, por exemplo, parecia excitadíssima, enquanto Rony e Harry se olhavam com um ar tão desolado quanto o meu. Mais atrás, Draco fazia firula dizendo que a poção dele seria melhor porque ele era sangue puro. Só Crabbe e Goyle pareciam ainda não ter entendido a tarefa. Quanto a mim, estava no meu estado de pânico habitual, um pouco maior porque sabia que daquele ano eu não passava. Havia sobrevivido por milagre aos NOMs, e aos comensais da morte. Mas daquela tarefa de poções eu achava que não sairia vivo.
Eu estava me sentindo completamente miserável pensando nisso quando uma luz apareceu no fim do túnel. O professor pediu silêncio à turma e prosseguiu:
– Claro que eu sei que criar uma poção do nada não é fácil... não é uma tarefa que se consiga sozinho. Alguns de vocês – ele estava olhando para mim – com certeza sozinhos poderiam explodir o castelo inteiro tentando criar alguma coisa. Vocês vão trabalhar em duplas.
SIM! SIM! Eu estava salvo!!! Olhei esperançoso para Hermione. Ela era o meu par natural, afinal, todo mundo sabia que Harry e Rony eram uma dupla. Hermione andava com eles, mas com certeza, faria dupla comigo! Foi quando eu senti uma mão gelada sobre meu ombro. Claro, o velho professor Snape. Vocês acham que ele permitiria isso?
– Você não vai fazer para com a senhorita Granger, Longbotton – disse o professor com um ar sádico. – essa é uma tarefa de integração entre casas... seu par vai ser da Sonserina. Vamos ver se desta vez o senhor consegue algo semelhante com o “Acima das Expectativas” que conseguiu nos NOMs na avaliação final...
Creio que o professor Snape queria tornar realidade os piores pesadelos da turma da Grifinória, especialmente os meus e os de Harry.. Nada mais explica isso. Aquela noite, no salão comunal, era possível sentir pelo volume das nossas conversas que aquela troca podia ter sido desagradável para alguns da Sonserina, mas conseguira ser terrivelmente massacrante para todos na Grifinória. “Bingo, ele conseguiu novamente” – eu pensei – “Nosso amável professor acabou com nosso semestre”. Hermione estava quase chorando:
– Vocês acham que eu vou conseguir alguma coisa trabalhando ao lado do Crabbe? Ele... ele nem sabe contar até três.
– Ah, tá bom, Hermione – Rony disse visivelmente mal–humorado – pelo menos você se garante. Faz tudo sozinha e pronto. E eu, que não sou grande coisa e ainda assim vou fazer par com a besta quadrada do Goyle?
– Ninguém está pior eu – disse Simmas, que sempre fazia par com Dino – vocês conseguem se ver tendo que passar o semestre todo discutindo um trabalho com o seqüelado do Zabini?
– Ele não é nada melhor que o Malfoy – disse Harry – eu sim, estou ferrado. Como se eu não tivesse problemas suficientes para cuidar, ainda vou fazer par com um cara que vive dizendo que eu vou pagar pelo pai ter ido para cadeia “por minha causa”. Droga.
– Pelo menos agora ele não pode dizer que o pai dele vai te ferrar – disse Rony rindo.
Harry não riu. Rony era o único que ainda comentava com bom humor os fatos relacionados ao episódio do fim do semestre, quando o padrinho do Harry morrera por causa da mesma mulher horrível que havia acabado com a vida dos meus pais. Eu permaneci calado e os outros voltaram a falar nas aulas de poções e no nosso azar coletivo. Gina se aproximou e ficou um bom tempo prestando atenção na conversa ao lado do Dino, até perguntar para mim:
– E você, Neville, com quem vai ter que fazer dupla?
– Eu tenho mesmo que dizer? – perguntei, num estado de espírito terrível. Todos olharam para mim, e Rony disse:
– Coitado. Ele vai fazer par com a Pansy Parkinson.
– Estou morto – eu disse – imaginem como vai acabar esse semestre: minha avó com certeza vai me mandar um berrador dizendo que eu sou a vergonha da família. Eu não tenho a mínima chance. Mas a culpa é dela mesma. Se eu soubesse que ela tinha armado com o examinador, eu pedia pessoalmente para o Professor Snape corrigir a prova. Antes isso que ter que aturá–lo mais esse ano.
–Neville, se você quiser ser Auror, vai ter que ser bom em poções – disse Hermione. – Acho que sua avó...
–Hermione, minha avó decidiu que eu vou ser auror... mas nunca perguntou a minha opinião sobre isso. Com certeza, se para ser auror vou ter que aturar aquela chatinha da Parkinson por um ano...
– Pô, se você quer a minha opinião, antes ela que a Emília Burlstode. – disse Rony
– Qual o problema com a Emília Burlstode? – perguntou Hermione
– Você deveria saber – riu Rony – levou uma surra dela no segundo ano! Imagina o que ela faria com o Nev aqui...Pelo menos a Pansy só tem um nariz de porquinho. De resto é até bonitinha.
– Essa foi podre, Rony – disse Harry.
– Rony, que coisa ridícula – disse Hermione – será que você só pensa na aparência das garotas?
– Qual é, Mione, relaxa, eu estou só brincando!
Hermione emburrou–se definitivamente com Rony, e eu fui para o dormitório. Até que ele tinha razão: Pansy não era mesmo uma aluna nota dez. Mas se a gente se esforçasse, quem sabe conseguiria fazer alguma coisa, sei lá, uma poção para o Trevo ficar roxo ou coisa parecida. Era melhor deixar para pensar nisso quando estivesse frente a frente com ela, dois dias depois, numa das salas de pesquisa que o Professor Snape tinha reservado para a turma. De repente ela não ia achar tão ruim fazer dupla comigo.
Eu estava enganado.
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