INCONSEQÜENCIAS...

Ele havia mandado instruções para Sue para que se encontrassem no Central Park, porque era o único lugar de Nova Iorque que havia ouvido falar, às duas da tarde. Havia entrado em uma lanchonete que Troy recomendara próxima ao albergue e comido alguma coisa. Depois pegou o metrô e saltou em frente ao Central Park. Olhava maravilhado para aquela cidade. Tinha que admitir uma coisa: O mundo trouxa não era tão horrível como dizia seu pai. Tá, eles não faziam magia, mas construíam prédios, inventavam coisas, viviam a seu modo. Seu pai estava errado. Não eram melhores que os trouxas, apenas, diferentes.
Entrou no parque com as mãos nos bolsos da calça jeans e um pensamento o assaltou. E se Sue não aparecesse? Ela não pudera responder sua carta. E agora, olhando para o parque, concluía que este era enorme, como Sue e ele iam encontrar-se? Foi nesse momento que uma voz disse, bem atrás dele:
‒ Então, Draco Malfoy? Esforçando-se para se tornar uma pessoa melhor?
Ele voltou-se surpreso ao dar com o rosto rosado e maroto dela, emoldurado por seus cabelos cacheados louros como os de um anjo. Ela o encarava risonha com seus grandes olhos azuis. Ele deu um passo em sua direção e a abraçou e beijou, cheio de saudade e paixão. Depois de alguns minutos, finalmente satisfeito e sentindo-se feliz, ele perguntou:
- Como você me encontrou?
- Eu sou trouxa, Draco, mas não sou burra. Você me disse que estaria hospedado no Brooklyn, eu sabia que você viria de Metrô, foi só ficar perto da entrada do parque mais próxima do metrô para quem vem do Brooklyn. Só um ingênuo como você para marcar um encontro num lugar imenso como o Central Park sem usar um ponto de referência.
Ele pegou o queixo dela e disse:
‒ Seu pai tem razão, Sue, você realmente é uma metidinha.
‒ E é por isso que você me ama, Draco, o mal intencionado. Quer conhecer o parque?
‒ Eu quero conhecer tudo. Meu querido e imbecil pai encheu meus bolsos de galeões e dólares americanos, que eu não faço a mínima idéia de como gastar, mas que com certeza, vou gastar com você.
Eles foram andando pelo parque e ela foi contando como fora aceita em uma das melhores  universidade do país, foi falando de seus planos para a faculdade. Sue acabara de completar 18 anos, dois dias depois do aniversário de Draco. Quando ela pediu detalhes do plano que ele usara para enganar o pai, Draco sentiu-se um pouco intimidado em dizer que havia se inscrito num curso de vodu. Sue olhou-o aterrorizada e ele disse que sabia que a escola era fajuta. Ela não gostou do mesmo jeito. Ele tentou mudar de assunto para evitar uma briga e para não precisar mencionar o pedaço de pano sujo com o sangue de Harry.
‒ Draco – Sue disse – Magia Negra é sempre perigosa, entende? Bem ou malfeita, acho que malfeita pode ser perigosa para você.
‒ Vamos falar de outra coisa? Tem matado muitos vampiros?
‒ Draco, é sério.
‒ Está bem, eu vou dar um jeito do bonequinho que eu fizer ficar bem diferente do meu “desafeto”
‒ Desafeto? Draco, você vai fazer vodu de uma pessoa?
‒ É parte do curso, Sue, você preferia que eu não viesse?
‒ Eu preferia que você arrumasse uma forma digna de me ver.
‒ Por favor, esqueça isso. Vou ser o aluno mais imbecil do curso, pior que Neville Longbotton na aula de poções... – Sue respirou fundo e ele sorriu, ela continuou encarando-o séria.
‒ Você não perde essa mania de se achar melhor que os outros.
‒ Existe uma pessoa que é muito melhor que eu, e eu sei disso. Você. Eu adoraria ser como você, mas sou como sou. Vamos esquecer isso?
Por aquele dia, Sue esqueceu. Eles se divertiram muito, mais que haviam se divertido em Londres quando seu pai estragara a festa. Ela o levou a lojas de trouxas, que vendiam mais coisas que ele imaginava existir. Por ele, compraria tudo que aparecia na frente, só para matar a curiosidade, mas ela não deixou, até que passaram na frente de uma loja de jóias e souvenirs e Draco viu uma coisa que o fez arrastá-la para lá. Não era uma jóia cara, pelo contrário Era até baratinha para uma jóia, mas ele teria comprado-a ainda se acabasse com todos os dólares que tinha no bolso. Um cordão fino de ouro com um pequeno pingente em forma de gota, feito de uma pedra semipreciosa vermelha. Sue olhava maravilhada para a jóia, feliz. Ele disse a ela, quando colocou o cordão em volta de seu pescoço:
- Uma gota de sangue, para você lembrar de mim. – Ela sorria para ele. Draco se sentia feliz. Do lado dela ele esquecia a raiva que tinha dentro de si. Uma raiva constante que o fazia tratar o mundo a sua volta com desprezo e parecendo entediado.  Para a tristeza dos dois, a tarde se escoou e eles precisaram se separar, porque ele tinha hora para entrar no albergue. O dia seguinte seria melhor.
O dia seguinte foi realmente melhor e o outro mais ainda. Draco e Sue passeavam despreocupadamente pela Nova Iorque trouxa e pela Nova Iorque bruxa, que ela conhecia pouco, mas que ele em pouco tempo entendia, porque usava o tipo de lógica que ele conhecia. Acharam um cinema bruxo no domingo e ele levou-a para ver: “A máscara de Monfort”, um filme de aventura que ele tinha assistido três vezes em Londres. Ela adorou a primeira, a segunda e a quinta história. Até que ele cansou de ver o filme e a carregou para fora, sob protesto. Parecia perfeito. Era tudo que ele queria. Quem dera ele estivesse ido a Nova Iorque apenas para ver Sue.
Mas ele precisava fazer o curso. E a segunda feira finalmente chegou. Ele imaginava que ia ser chato e desagradável fazer o tal curso de vodu, mas não tinha nem idéia de quanto seria terrível. Ao entrar na escola, teve que ver novamente a bruxa desagradável que o olhava como se ele estivesse sem roupas. Chegou à sala de aula em cima da hora, seu material estava sobre uma carteira, onde havia uma placa indicando: “Draco Malfoy”. O curso tinha mais alguns alunos, todos eles mau encarados, inclusive um garoto que devia ter uns treze anos. Draco sentou-se no meio de três sujeitos esquisitos e parecidos, vestidos em capas pretas e de cabeça raspada. Tinham tatuagens na cabeça em letras góticas, com nomes de bruxos famosos, praticantes de artes das trevas e símbolos consagrados por eles. Olharam-no com respeito, o garoto atrás dele cutucou-o, dizendo:
‒ Você é o inglês? O estudante de Hogwarts?
‒ Hum-hum. – Draco respondeu mau humorado para o garoto que sorriu e estendeu a mão.
‒ Duanne Jonston, pode me chamar de Duff. Esses são meus amigos Stephen “Izzy” Thomas e Jonas  Austen, pode chama-lo de Jumbo – disse indicando o garoto esquelético à esquerda de Draco e um outro obeso, à sua direita. – Somos todos puro sangue, pode ficar tranqüilo,  temos 200 anos de tradição em nossas famílias – “Danem-se”, pensou Draco. – E você, soube que sua família é muito tradicional.
‒ É, é sim.
‒ E rica... – Draco ficou indignado. Como o sujeito podia saber tanto sobre ele?
‒ Como você sabe?
‒ Nós fizemos um levantamento sabe – o garoto sorriu, mostrando dentes brancos meio acavalados – não queríamos mistura com a escória... quem sabe alguém como você não entenda a nossa causa...
‒ Causa?
‒ O fim dos sangues ruins.
‒ Não estou interessado – disse Draco, lembrando-se que há algum tempo atrás estaria sim, bem interessado nisso, mas agora não. Melhor se afastar destes tipos.
Quando o professor Igor Zimmerman chegou, Draco descobriu que as coisas sempre podiam ficar piores. Era um sujeito baixo e magro, sumido dentro de uma veste preta, muito grande para ele. Tinha uns cabelos escorridos e cheios de pontas e uns olhinhos pretos cínicos, bem juntos. Seu nariz reto, fino e comprido tinha embaixo um bigode, para disfarçar os dentes projetados para a frente, como os de um rato. Toda figura do professor, mais a postura curvada, davam a ele o aspecto de uma ratazana gigante. Ele olhou Draco de imediato, com um olhar ligeiramente maníaco:
‒ Então, temos um aluno do velho mundo bruxo... alguém interessado nas práticas pouco recomendáveis das artes das trevas... sabia que você pode ser preso quando chegar a Inglaterra, garoto? – Draco encarou o professor sem medo, sentindo uma onda de indignação subir-lhe pela nuca, aparecendo em seu rosto sob a forma de uma vermelhidão incômoda.
‒ Na verdade – disse procurando controlar-se – Eu quero aprender sobre o vodu para poder entendê-lo e combatê-lo. – Não sabia de onde tirara isso, mas serviu para deixar o professor mais enraivecido.
‒ É mesmo? Explique isso para a pessoa que você vai fazer sentir dor, garoto... ela adoraria entender.
Depois deste começo nada animador, Draco começou a sentir-se cada vez pior conforme o professor explicava como funcionava a magia do vodu, que o objeto ou parte do corpo do desafeto serviam como um endereço, que as energias maléficas seguiam, fazendo mal à distância. Draco começou, a contragosto, a sentir-se culpado. Não, não gostava de Harry Potter, mas também não estava nem um pouco a fim de fazê-lo sangrar ou gritar de dor. No fim da aula, arrastou os pés da sala, respirando aliviado quando se viu bem longe da escola. Conversou sobre aquilo com Troy, que estava no quarto se arrumando para sair para sua aula de luta.
‒ Desista, cara. Diga ao seu pai que o curso é fajuto e não o faça. Diga a ele que descobriu algo mais interessante e que depois volta.
‒ Você não conhece meu pai... na hora que ele receber a coruja, ele aparata aqui e me leva de volta. Eu tenho que fazer esse maldito curso, se quero continuar a ver minha garota.
Sue também não ficou feliz com ele quando ele contou sobre o curso de vodu. E disse algo que o machucou:
‒ Vá embora, Draco. Volte para sua casa. Eu vou sentir sua falta, mas vai ser pior se você ficar. Isso vai te fazer um mal irreparável.
‒ Nunca! Eu quero ficar com você, Sue.
‒ Então rompa com seu pai e fique comigo, mas de verdade. Esqueça o dinheiro dos Malfoy e seu passado e venha para Nova Iorque. Você pode arrumar um emprego e terminar seus estudos aqui. Depois você resolve o que faz.
‒ Não posso. Eu quero terminar Hogwarts, e se romper com meu pai, não vou poder. Eu vou fazer o vodu ficar bem fajuto e ele não vai funcionar, eu te prometo, Sue. Não vou fazer mal algum ao idiota do Potter.
‒ Se você continuar chamando-o desta forma, se continuar com inveja dele, vai acabar gostando de fazer mal a ele, e depois não vai conseguir parar.
‒ Não, eu não vou fazer mal a ele. Posso não gostar dele, mas amo você e jamais faria algo que você não fosse gostar.
Os dias de Draco eram divididos em: manhã, em que ele se sentia miserável, perseguido pelo professor Zimmerman porque seu bonequinho estava ficando realmente muito malfeito, a hora do almoço, em que ele e Troy conversavam (ele estava fazendo a primeira amizade verdadeira na vida) e a tarde e noite, em que Sue compensava o horror do seu dia a dia. Se divertiam tanto que ele esquecia completamente o professor Ratazana e seus colegas skinheads ligeiramente imbecis. Por Sue, tudo valia a pena.
Em duas semanas, ele já estava íntimo de Nova Iorque. Na noite da sexta-feira da segunda semana  que passou por lá, quando pensava em se despedir de Sue para ir para o albergue, ela o carregou para um beco e bateu com o nó dos dedos num tijolo. Surgiu uma porta de madeira escura, com um rosto de mulher que falava com sotaque do Harlem:
‒ Oh, man! É você, Sue Van Helsing, a garotinha da irmandade? Seu pai foi um grande freqüentador da outra boate, sabe? A que fechou antes de você nascer...
‒ Eu sei, Aretha, ele conheceu minha mãe lá... e é só por isso que sem ser fantasma ou bruxa eu posso entrar... Este é meu namorado, Draco Malfoy.
‒ Malfoy, Malfoy... nome de bruxo, yeah! Steve vai te adorar, man – um fantasma atravessou a porta e avaliou-o com um olhar displicente:
‒ Um bruxo louro com Sue?  Bonito, muito bonitinho... olá Sue, como vai sua mãe, minha perua favorita? E o seu pai, o louco Van Helsing... espero que ele acabe com todos os vampiros daqui... podem entrar...
‒ Benvindos ao Substudio 54 – começou Aretha, a porta – Disco rolando até a eternidade, os anos 70 estão de volta – disse, dando passagem aos dois.
Draco se divertiu como nunca aquela noite. Dançou com Sue, esquecendo-se da hora, eram mais de duas da manhã quando se deu conta que perdera o horário do albergue. Sue sorriu:
‒ Essa noite você vai dormir na minha casa.
Quando chegaram no apartamento onde Sue estava morando com o pai, ela pediu que ele ficasse em silêncio e o conduziu no escuro até seu quarto. Ele estava extremamente sem graça de dizer a ela o quanto era inexperiente.  Ela fechou a porta do quarto e disse, timidamente, mostrando um pacotinho de preservativos a ele:
‒ Por favor, Draco, não pense mal de mim... você vai ser o primeiro.
Pensar mal dela? Draco não podia pensar mal dela de forma nenhuma, ele realmente a queria demais. Passaram a noite se descobrindo, se amando, até que adormeceram abraçados e Draco sonhou, agarrado ao corpo de Sue, que coisas terríveis aconteciam, e que ele a perdia. Acordou suando frio, ela ainda estava adormecida ao seu lado e ele abraçou-a mais, amedrontado por não se lembrar do que sonhara, mas sabendo que fora um pesadelo. Ela acordou e perguntou o que fora. Ele ficou mudo.
‒ Algo mudou entre nós? – ela perguntou apreensiva.
‒ Sim. Eu achei que fosse impossível te amar mais que ontem, mas agora eu sei que não é. Sue, quer casar comigo?
‒ Não. Ainda não.
‒ Como não?
‒ Draco, somos ainda muito jovens. Você precisa se tornar realmente independente para ficar ao meu lado. Eu preciso me formar. Temos a vida pela frente. Vamos dar um passo de cada vez, para não cair, está bem?
Não, não estava bem. Draco não estava acostumado a ser rejeitado, era mimado e prepotente. Saiu da casa de Sue antes que o pai dela acordasse e foi para o Albergue tomar um banho.  Depois do banho, encontrou Troy, que disse:
- Você está com cara de quem se deu muito bem... – Draco sorriu. Ia começar a contar vantagem, como fizera a vida inteira, quando se lembrou que afinal de contas era Sue, a sua garota. E ficou só no sorriso.  O fim de semana com ela passou voando, e Segunda de manhã ele voltou à escola, arrastando o pé por saber que naquele dia teria que usar realmente o boneco que fizera.  O professor, que tinha uma especial implicância com ele, disse:
‒ Então, meu jovem “inglês”, vamos ver se você realmente leva algum jeito para as artes das trevas... Espete seu desafeto.
Draco olhou o boneco. Era um pastiche do que era Harry Potter, um boneco em cujo o núcleo estava o trapo sujo que seu pai lhe dera, feito de cera de abelhas africanas cozida numa poção com mais meia dúzia de ingredientes nojentos, aos quais eles haviam enformado e posteriormente ele havia acrescentado uns óculos e um cabelo esquisito, assim como uma pequena veste de bruxo. Ele olhou o boneco pensativo, o professor dissera que só podiam espetar em um lugar, porque se tratava de prática controlada (na verdade, era totalmente ilegal, mas os advogados da escola haviam achado um meio de achar uma pequena brecha na lei). Draco então pensou que se Harry se ferisse no braço esquerdo não seria tão ruim, não tinha idéia do tipo de ferida que provocaria.
Espetou o boneco e olhou desafiador para o professor. Nada aconteceu. O professor disse, com maligna satisfação:
- Vejam que tradição pode não ser sinônimo de eficiência... ele não causou dano algum em seu desafeto. Duff, espete seu boneco.
O skinhead de dentes acavalados espetou na barriga o boneco de uma garota trouxa que conhecia (fixação doentia, pensou Draco, a garota deve ter dado o fora nele) e para deleite do professor e da turma, uma gota de sangue surgiu na superfície cerosa do boneco. Duff riu, malignamente. O mais satisfeito parecia ser um garoto de treze anos, de ar ligeiramente psicopata que fizera um boneco da própria mãe. Todos os alunos tiveram êxito, menos Draco. O professor o olhou, pronto para humilhá-lo:
‒ Acho bom você tirar sangue deste boneco até Sexta feira, ou não recebe o certificado do curso. Pode não ser problema seu... este sujeito pode ter proteção.
Draco saiu satisfeito. Quem queria um maldito certificado? Conseguira, fizera um vodu tão malfeito que não obtivera êxito, Sue ficou preocupada quando ouviu a história:
‒ E se realmente não for problema seu, Draco? E se ele tiver proteção?
‒ Proteção? O Potter? Ele é um dos sujeitos que mais se machucou desta turma... só num jogo de quadribol ele perdeu todos os ossos do braço... não, eu é que fui ruim mesmo... mais propenso a acidentes que ele que ele só o Longbotton ... – Draco parou. Subitamente lembrou-se da história da veste. A veste protetora que provocara a desclassificação da Grifnória na temporada anterior à passada. Estava com Longbotton, mas pertencia a Potter... e se Potter estivesse vestindo-a? Não, não era isso. Afastou esse pensamento e concentrou-se em Sue.
Aquela semana foi a que passou mais rápido, sempre com o professor humilhando-o, e ele não ligando. Não provocara ferimento algum em Potter, isso era bom, Sue ficaria satisfeita. Então, no último dia de aula, quando chegou e foi pegar o boneco espetado, engoliu em seco. Do braço esquerdo, onde o aguilhão estava espetado, saía, fluído e contínuo, um fino filete de sangue.

CAPÍTULO 5 – INCONSEQÜENCIAS...

Ele havia mandado instruções para Sue para que se encontrassem no Central Park, porque era o único lugar de Nova Iorque que havia ouvido falar, às duas da tarde. Havia entrado em uma lanchonete que Troy recomendara próxima ao albergue e comido alguma coisa. Depois pegou o metrô e saltou em frente ao Central Park. Olhava maravilhado para aquela cidade. Tinha que admitir uma coisa: O mundo trouxa não era tão horrível como dizia seu pai. Tá, eles não faziam magia, mas construíam prédios, inventavam coisas, viviam a seu modo. Seu pai estava errado. Não eram melhores que os trouxas, apenas, diferentes.
Entrou no parque com as mãos nos bolsos da calça jeans e um pensamento o assaltou. E se Sue não aparecesse? Ela não pudera responder sua carta. E agora, olhando para o parque, concluía que este era enorme, como Sue e ele iam encontrar-se? Foi nesse momento que uma voz disse, bem atrás dele:
‒ Então, Draco Malfoy? Esforçando-se para se tornar uma pessoa melhor?
Ele voltou-se surpreso ao dar com o rosto rosado e maroto dela, emoldurado por seus cabelos cacheados louros como os de um anjo. Ela o encarava risonha com seus grandes olhos azuis. Ele deu um passo em sua direção e a abraçou e beijou, cheio de saudade e paixão. Depois de alguns minutos, finalmente satisfeito e sentindo-se feliz, ele perguntou:
- Como você me encontrou?
- Eu sou trouxa, Draco, mas não sou burra. Você me disse que estaria hospedado no Brooklyn, eu sabia que você viria de Metrô, foi só ficar perto da entrada do parque mais próxima do metrô para quem vem do Brooklyn. Só um ingênuo como você para marcar um encontro num lugar imenso como o Central Park sem usar um ponto de referência.
Ele pegou o queixo dela e disse:
‒ Seu pai tem razão, Sue, você realmente é uma metidinha.
‒ E é por isso que você me ama, Draco, o mal intencionado. Quer conhecer o parque?
‒ Eu quero conhecer tudo. Meu querido e imbecil pai encheu meus bolsos de galeões e dólares americanos, que eu não faço a mínima idéia de como gastar, mas que com certeza, vou gastar com você.
Eles foram andando pelo parque e ela foi contando como fora aceita em uma das melhores  universidade do país, foi falando de seus planos para a faculdade. Sue acabara de completar 18 anos, dois dias depois do aniversário de Draco. Quando ela pediu detalhes do plano que ele usara para enganar o pai, Draco sentiu-se um pouco intimidado em dizer que havia se inscrito num curso de vodu. Sue olhou-o aterrorizada e ele disse que sabia que a escola era fajuta. Ela não gostou do mesmo jeito. Ele tentou mudar de assunto para evitar uma briga e para não precisar mencionar o pedaço de pano sujo com o sangue de Harry.
‒ Draco – Sue disse – Magia Negra é sempre perigosa, entende? Bem ou malfeita, acho que malfeita pode ser perigosa para você.
‒ Vamos falar de outra coisa? Tem matado muitos vampiros?
‒ Draco, é sério.
‒ Está bem, eu vou dar um jeito do bonequinho que eu fizer ficar bem diferente do meu “desafeto”
‒ Desafeto? Draco, você vai fazer vodu de uma pessoa?
‒ É parte do curso, Sue, você preferia que eu não viesse?
‒ Eu preferia que você arrumasse uma forma digna de me ver.
‒ Por favor, esqueça isso. Vou ser o aluno mais imbecil do curso, pior que Neville Longbotton na aula de poções... – Sue respirou fundo e ele sorriu, ela continuou encarando-o séria.
‒ Você não perde essa mania de se achar melhor que os outros.
‒ Existe uma pessoa que é muito melhor que eu, e eu sei disso. Você. Eu adoraria ser como você, mas sou como sou. Vamos esquecer isso?
Por aquele dia, Sue esqueceu. Eles se divertiram muito, mais que haviam se divertido em Londres quando seu pai estragara a festa. Ela o levou a lojas de trouxas, que vendiam mais coisas que ele imaginava existir. Por ele, compraria tudo que aparecia na frente, só para matar a curiosidade, mas ela não deixou, até que passaram na frente de uma loja de jóias e souvenirs e Draco viu uma coisa que o fez arrastá-la para lá. Não era uma jóia cara, pelo contrário Era até baratinha para uma jóia, mas ele teria comprado-a ainda se acabasse com todos os dólares que tinha no bolso. Um cordão fino de ouro com um pequeno pingente em forma de gota, feito de uma pedra semipreciosa vermelha. Sue olhava maravilhada para a jóia, feliz. Ele disse a ela, quando colocou o cordão em volta de seu pescoço:
- Uma gota de sangue, para você lembrar de mim. – Ela sorria para ele. Draco se sentia feliz. Do lado dela ele esquecia a raiva que tinha dentro de si. Uma raiva constante que o fazia tratar o mundo a sua volta com desprezo e parecendo entediado.  Para a tristeza dos dois, a tarde se escoou e eles precisaram se separar, porque ele tinha hora para entrar no albergue. O dia seguinte seria melhor.
O dia seguinte foi realmente melhor e o outro mais ainda. Draco e Sue passeavam despreocupadamente pela Nova Iorque trouxa e pela Nova Iorque bruxa, que ela conhecia pouco, mas que ele em pouco tempo entendia, porque usava o tipo de lógica que ele conhecia. Acharam um cinema bruxo no domingo e ele levou-a para ver: “A máscara de Monfort”, um filme de aventura que ele tinha assistido três vezes em Londres. Ela adorou a primeira, a segunda e a quinta história. Até que ele cansou de ver o filme e a carregou para fora, sob protesto. Parecia perfeito. Era tudo que ele queria. Quem dera ele estivesse ido a Nova Iorque apenas para ver Sue.
Mas ele precisava fazer o curso. E a segunda feira finalmente chegou. Ele imaginava que ia ser chato e desagradável fazer o tal curso de vodu, mas não tinha nem idéia de quanto seria terrível. Ao entrar na escola, teve que ver novamente a bruxa desagradável que o olhava como se ele estivesse sem roupas. Chegou à sala de aula em cima da hora, seu material estava sobre uma carteira, onde havia uma placa indicando: “Draco Malfoy”. O curso tinha mais alguns alunos, todos eles mau encarados, inclusive um garoto que devia ter uns treze anos. Draco sentou-se no meio de três sujeitos esquisitos e parecidos, vestidos em capas pretas e de cabeça raspada. Tinham tatuagens na cabeça em letras góticas, com nomes de bruxos famosos, praticantes de artes das trevas e símbolos consagrados por eles. Olharam-no com respeito, o garoto atrás dele cutucou-o, dizendo:
‒ Você é o inglês? O estudante de Hogwarts?
‒ Hum-hum. – Draco respondeu mau humorado para o garoto que sorriu e estendeu a mão.
‒ Duanne Jonston, pode me chamar de Duff. Esses são meus amigos Stephen “Izzy” Thomas e Jonas  Austen, pode chama-lo de Jumbo – disse indicando o garoto esquelético à esquerda de Draco e um outro obeso, à sua direita. – Somos todos puro sangue, pode ficar tranqüilo,  temos 200 anos de tradição em nossas famílias – “Danem-se”, pensou Draco. – E você, soube que sua família é muito tradicional.
‒ É, é sim.
‒ E rica... – Draco ficou indignado. Como o sujeito podia saber tanto sobre ele?
‒ Como você sabe?
‒ Nós fizemos um levantamento sabe – o garoto sorriu, mostrando dentes brancos meio acavalados – não queríamos mistura com a escória... quem sabe alguém como você não entenda a nossa causa...
‒ Causa?
‒ O fim dos sangues ruins.
‒ Não estou interessado – disse Draco, lembrando-se que há algum tempo atrás estaria sim, bem interessado nisso, mas agora não. Melhor se afastar destes tipos.
Quando o professor Igor Zimmerman chegou, Draco descobriu que as coisas sempre podiam ficar piores. Era um sujeito baixo e magro, sumido dentro de uma veste preta, muito grande para ele. Tinha uns cabelos escorridos e cheios de pontas e uns olhinhos pretos cínicos, bem juntos. Seu nariz reto, fino e comprido tinha embaixo um bigode, para disfarçar os dentes projetados para a frente, como os de um rato. Toda figura do professor, mais a postura curvada, davam a ele o aspecto de uma ratazana gigante. Ele olhou Draco de imediato, com um olhar ligeiramente maníaco:
‒ Então, temos um aluno do velho mundo bruxo... alguém interessado nas práticas pouco recomendáveis das artes das trevas... sabia que você pode ser preso quando chegar a Inglaterra, garoto? – Draco encarou o professor sem medo, sentindo uma onda de indignação subir-lhe pela nuca, aparecendo em seu rosto sob a forma de uma vermelhidão incômoda.
‒ Na verdade – disse procurando controlar-se – Eu quero aprender sobre o vodu para poder entendê-lo e combatê-lo. – Não sabia de onde tirara isso, mas serviu para deixar o professor mais enraivecido.
‒ É mesmo? Explique isso para a pessoa que você vai fazer sentir dor, garoto... ela adoraria entender.
Depois deste começo nada animador, Draco começou a sentir-se cada vez pior conforme o professor explicava como funcionava a magia do vodu, que o objeto ou parte do corpo do desafeto serviam como um endereço, que as energias maléficas seguiam, fazendo mal à distância. Draco começou, a contragosto, a sentir-se culpado. Não, não gostava de Harry Potter, mas também não estava nem um pouco a fim de fazê-lo sangrar ou gritar de dor. No fim da aula, arrastou os pés da sala, respirando aliviado quando se viu bem longe da escola. Conversou sobre aquilo com Troy, que estava no quarto se arrumando para sair para sua aula de luta.
‒ Desista, cara. Diga ao seu pai que o curso é fajuto e não o faça. Diga a ele que descobriu algo mais interessante e que depois volta.
‒ Você não conhece meu pai... na hora que ele receber a coruja, ele aparata aqui e me leva de volta. Eu tenho que fazer esse maldito curso, se quero continuar a ver minha garota.
Sue também não ficou feliz com ele quando ele contou sobre o curso de vodu. E disse algo que o machucou:
‒ Vá embora, Draco. Volte para sua casa. Eu vou sentir sua falta, mas vai ser pior se você ficar. Isso vai te fazer um mal irreparável.
‒ Nunca! Eu quero ficar com você, Sue.
‒ Então rompa com seu pai e fique comigo, mas de verdade. Esqueça o dinheiro dos Malfoy e seu passado e venha para Nova Iorque. Você pode arrumar um emprego e terminar seus estudos aqui. Depois você resolve o que faz.
‒ Não posso. Eu quero terminar Hogwarts, e se romper com meu pai, não vou poder. Eu vou fazer o vodu ficar bem fajuto e ele não vai funcionar, eu te prometo, Sue. Não vou fazer mal algum ao idiota do Potter.
‒ Se você continuar chamando-o desta forma, se continuar com inveja dele, vai acabar gostando de fazer mal a ele, e depois não vai conseguir parar.
‒ Não, eu não vou fazer mal a ele. Posso não gostar dele, mas amo você e jamais faria algo que você não fosse gostar.
Os dias de Draco eram divididos em: manhã, em que ele se sentia miserável, perseguido pelo professor Zimmerman porque seu bonequinho estava ficando realmente muito malfeito, a hora do almoço, em que ele e Troy conversavam (ele estava fazendo a primeira amizade verdadeira na vida) e a tarde e noite, em que Sue compensava o horror do seu dia a dia. Se divertiam tanto que ele esquecia completamente o professor Ratazana e seus colegas skinheads ligeiramente imbecis. Por Sue, tudo valia a pena.
Em duas semanas, ele já estava íntimo de Nova Iorque. Na noite da sexta-feira da segunda semana  que passou por lá, quando pensava em se despedir de Sue para ir para o albergue, ela o carregou para um beco e bateu com o nó dos dedos num tijolo. Surgiu uma porta de madeira escura, com um rosto de mulher que falava com sotaque do Harlem:
‒ Oh, man! É você, Sue Van Helsing, a garotinha da irmandade? Seu pai foi um grande freqüentador da outra boate, sabe? A que fechou antes de você nascer...
‒ Eu sei, Aretha, ele conheceu minha mãe lá... e é só por isso que sem ser fantasma ou bruxa eu posso entrar... Este é meu namorado, Draco Malfoy.
‒ Malfoy, Malfoy... nome de bruxo, yeah! Steve vai te adorar, man – um fantasma atravessou a porta e avaliou-o com um olhar displicente:
‒ Um bruxo louro com Sue?  Bonito, muito bonitinho... olá Sue, como vai sua mãe, minha perua favorita? E o seu pai, o louco Van Helsing... espero que ele acabe com todos os vampiros daqui... podem entrar...
‒ Benvindos ao Substudio 54 – começou Aretha, a porta – Disco rolando até a eternidade, os anos 70 estão de volta – disse, dando passagem aos dois.
Draco se divertiu como nunca aquela noite. Dançou com Sue, esquecendo-se da hora, eram mais de duas da manhã quando se deu conta que perdera o horário do albergue. Sue sorriu:
‒ Essa noite você vai dormir na minha casa.
Quando chegaram no apartamento onde Sue estava morando com o pai, ela pediu que ele ficasse em silêncio e o conduziu no escuro até seu quarto. Ele estava extremamente sem graça de dizer a ela o quanto era inexperiente.  Ela fechou a porta do quarto e disse, timidamente, mostrando um pacotinho de preservativos a ele:
‒ Por favor, Draco, não pense mal de mim... você vai ser o primeiro.
Pensar mal dela? Draco não podia pensar mal dela de forma nenhuma, ele realmente a queria demais. Passaram a noite se descobrindo, se amando, até que adormeceram abraçados e Draco sonhou, agarrado ao corpo de Sue, que coisas terríveis aconteciam, e que ele a perdia. Acordou suando frio, ela ainda estava adormecida ao seu lado e ele abraçou-a mais, amedrontado por não se lembrar do que sonhara, mas sabendo que fora um pesadelo. Ela acordou e perguntou o que fora. Ele ficou mudo.
‒ Algo mudou entre nós? – ela perguntou apreensiva.
‒ Sim. Eu achei que fosse impossível te amar mais que ontem, mas agora eu sei que não é. Sue, quer casar comigo?
‒ Não. Ainda não.
‒ Como não?
‒ Draco, somos ainda muito jovens. Você precisa se tornar realmente independente para ficar ao meu lado. Eu preciso me formar. Temos a vida pela frente. Vamos dar um passo de cada vez, para não cair, está bem?
Não, não estava bem. Draco não estava acostumado a ser rejeitado, era mimado e prepotente. Saiu da casa de Sue antes que o pai dela acordasse e foi para o Albergue tomar um banho.  Depois do banho, encontrou Troy, que disse:
- Você está com cara de quem se deu muito bem... – Draco sorriu. Ia começar a contar vantagem, como fizera a vida inteira, quando se lembrou que afinal de contas era Sue, a sua garota. E ficou só no sorriso.  O fim de semana com ela passou voando, e Segunda de manhã ele voltou à escola, arrastando o pé por saber que naquele dia teria que usar realmente o boneco que fizera.  O professor, que tinha uma especial implicância com ele, disse:
‒ Então, meu jovem “inglês”, vamos ver se você realmente leva algum jeito para as artes das trevas... Espete seu desafeto.
Draco olhou o boneco. Era um pastiche do que era Harry Potter, um boneco em cujo o núcleo estava o trapo sujo que seu pai lhe dera, feito de cera de abelhas africanas cozida numa poção com mais meia dúzia de ingredientes nojentos, aos quais eles haviam enformado e posteriormente ele havia acrescentado uns óculos e um cabelo esquisito, assim como uma pequena veste de bruxo. Ele olhou o boneco pensativo, o professor dissera que só podiam espetar em um lugar, porque se tratava de prática controlada (na verdade, era totalmente ilegal, mas os advogados da escola haviam achado um meio de achar uma pequena brecha na lei). Draco então pensou que se Harry se ferisse no braço esquerdo não seria tão ruim, não tinha idéia do tipo de ferida que provocaria.
Espetou o boneco e olhou desafiador para o professor. Nada aconteceu. O professor disse, com maligna satisfação:
- Vejam que tradição pode não ser sinônimo de eficiência... ele não causou dano algum em seu desafeto. Duff, espete seu boneco.
O skinhead de dentes acavalados espetou na barriga o boneco de uma garota trouxa que conhecia (fixação doentia, pensou Draco, a garota deve ter dado o fora nele) e para deleite do professor e da turma, uma gota de sangue surgiu na superfície cerosa do boneco. Duff riu, malignamente. O mais satisfeito parecia ser um garoto de treze anos, de ar ligeiramente psicopata que fizera um boneco da própria mãe. Todos os alunos tiveram êxito, menos Draco. O professor o olhou, pronto para humilhá-lo:
‒ Acho bom você tirar sangue deste boneco até Sexta feira, ou não recebe o certificado do curso. Pode não ser problema seu... este sujeito pode ter proteção.
Draco saiu satisfeito. Quem queria um maldito certificado? Conseguira, fizera um vodu tão malfeito que não obtivera êxito, Sue ficou preocupada quando ouviu a história:
‒ E se realmente não for problema seu, Draco? E se ele tiver proteção?
‒ Proteção? O Potter? Ele é um dos sujeitos que mais se machucou desta turma... só num jogo de quadribol ele perdeu todos os ossos do braço... não, eu é que fui ruim mesmo... mais propenso a acidentes que ele que ele só o Longbotton ... – Draco parou. Subitamente lembrou-se da história da veste. A veste protetora que provocara a desclassificação da Grifnória na temporada anterior à passada. Estava com Longbotton, mas pertencia a Potter... e se Potter estivesse vestindo-a? Não, não era isso. Afastou esse pensamento e concentrou-se em Sue.
Aquela semana foi a que passou mais rápido, sempre com o professor humilhando-o, e ele não ligando. Não provocara ferimento algum em Potter, isso era bom, Sue ficaria satisfeita. Então, no último dia de aula, quando chegou e foi pegar o boneco espetado, engoliu em seco. Do braço esquerdo, onde o aguilhão estava espetado, saía, fluído e contínuo, um fino filete de sangue.

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