GERÁRD GAMAGLIEL



Snape conseguiu erguer um braço no ar e pegou a varinha que Harry atirara, antes que Sibila e Rabicho pudessem dizer “Ah”, ele gritou:
    ‒ EXPELIARMUS! ‒ as varinhas dos dois voaram para a mão dele, que entregou uma a Sirius quase sem pensar.
    ‒ Impedimenta! ‒ Sirius apontou para Rabicho e Sibila, que caíram desacordados
    ‒ Aeros! Ambos levitaram do poço com ratos e rapidamente tiraram os outros de dentro de lá. Snape correu para perto de Rabicho e Sibila, caídos, e conjurou cordas tão fortes, com tanta raiva, que os dois ficaram enrolados como múmias. Ele e Sirius faziam tudo sem se falar, apenas agindo, um não tomando conhecimento da presença do outro. Snape olhou para Rony e Hermione desacordados e encostando a varinha no peito de cada um disse:
    ‒ Enervate!  ‒ Escutou a voz de Sirius atrás dele dizendo a mesma coisa com Sheeba e correu para um canto da caverna onde estavam as coisas que Rabicho retirara de suas vestes.  Voltou correndo com um vidro contendo uma substância vermelha que parecia sangue. Colocou uma gota nos lábios de Hermione, e ela olhou-o sem dizer nada. O mesmo aconteceu com Rony. Ergueu-se para ver Sirius abraçado ao corpo inerte de Sheeba, à beira do fosso. Ele a apertava com força e murmurava:
    ‒ Não morra, Sheeba, não me deixe. ‒ Snape abaixou-se ao lado dela e pegou seu pulso e pela primeira vez  encarou Sirius, que o encarou de volta sério, segurando as lágrimas nos olhos. Sentiu  que embaixo da pele de Sheeba ainda havia uma pulsação fraca, quase imperceptível e disse:
    ‒ Ela ainda está viva, Black. Você sabe o que fazer. ‒ Sirius encarou-o mais uma vez por um segundo, então apontou a varinha para o próprio coração e disse:
    ‒ Vita Primessencia! ‒ reprimiu um grito de dor, enquanto sentia que seu coração parava por segundos de bater. Um calor saiu de seu peito e chegou a superfície sob a forma de uma tênue luz rosada, que pulsava no ritmo de um coração. Sirius equilibrou a luz na ponta da varinha, então com muito cuidado depositou-a sobre os lábios de Sheeba, e aproximou seu rosto do dela. Seus lábios tocaram os dela, que estavam frios. Ele sentia o calor da luz que tirara de seu próprio coração sobre eles. Sem hesitar por um segundo, soprou a luz para dentro dos lábios de Sheeba.
    Uma luz suave percorreu o corpo de Sheeba, que tremeu por um segundo. Snape, que tinha o pulso dela retido sob seus dedos, sentiu que a pulsação voltava e encarou Sirius novamente. Balançou a cabeça mudo, em assentimento, e não pôde deixar de sorrir. Depois de um segundo de hesitação, Sirius sorriu-lhe de volta. Ela ia sobreviver.
    ‒ Sirius... ‒ Sheeba abriu os olhos e sorriu ‒ Harry...?
    ‒ Shhhh. Não fale nada... Você ainda está muito fraca.
    ‒ Ponha uma gota disso nos lábios dela. ‒ Snape disse e levantou-se, saindo de perto dos dois
    ‒ Vá buscar, Sirius... Vá buscar Harry. ‒ Sirius lembrou-se de uma promessa que fizera e chamou:
    ‒ Snape, faça-me um favor, por favor. Fique com ela.
    ‒ Aonde você vai?
    ‒ Vou buscar Harry.

Harry tinha caído pela fenda agarrado à Voldemort, que o olhava surpreso. O bruxo sustentava a varinha na mão, bem segura. Harry achou que ele fosse matá-lo, mas Voldemort riu alto e disse:
    ‒ Ainda bancando o herói, Potter? Achou que fosse me matar na queda? Achou que fôssemos morrer juntos?
    Harry não disse nada, sua cicatriz subitamente parou de doer. Voldemort desaparatara em pleno ar e ele continuava caindo... Fora muito mais fácil que ele imaginara... achava que iam cair juntos e morrer, nunca soubera que se podia desaparatar com os pés fora do chão....na verdade,  lembrara-se da queda da vassoura, quando a vestimenta que Sheeba lhe dera impedira que se machucasse... mas agora, enquanto caía, avaliava as probabilidades:
    E se a veste tivesse perdido os poderes  como o Olho de Tigre que Hermione usava?
    E se ela só funcionasse para pequenas quedas? Segundo o professor Binns, a queda da fenda das gárgulas era de dois mil  metros... será que alguém já saltara de um bungee jump com dois mil metros?
    E se isso tudo estivesse errado e ele não parasse nunca mais de cair???
    O diabo era que a queda não terminava nunca, e a ansiedade era muito pior que a queda em si, caía no escuro, muito rápido para enxergar qualquer coisa nas paredes... repentinamente, sem aviso, seu corpo foi erguido no ar, balançou, subiu, desceu, subiu, desceu de novo e quando ele já estava ficando tonto, despencou suavemente no chão. Que começou a afundar.
    “Não acredito que sobrevivi a essa queda para morrer atolado numa poça de areia movediça... quem sabe se daqui a dez mil anos não me encontram fossilizado?”. Tentava manter a sanidade enquanto sentia seu corpo afundando no chão de areia movediça. Uma luz o iluminou e uma mão forte e grossa de pedra o puxou pelas vestes. A coisa que o erguera o puxou para o alto e o encarou de frente. Harry pode ver a cara feia de uma gárgula de bom tamanho, que o olhava sorrindo.
    A gárgula puxou-o para cima de uma pedra onde ele estava e perguntou-lhe:
    ‒ Podeis andar?
    ‒ Posso. Estou bem, quer dizer, coberto de lama, mas bem.
    ‒ Já caíram muitos aqui dentro, mas sois o primeiro a sobreviver...
    ‒ É uma queda e tanto...
    ‒ Sois bruxo?
    ‒ Harry hesitou um segundo... a última notícia que tivera sobre a relação de bruxos com gárgulas não era muito animadora, e, levando-se em conta o tamanho da gárgula, se ela achasse que eram inimigos, Harry estaria em considerável desvantagem.
    ‒ Na verdade eu ainda sou estudante, em Hogwarts.
    ‒ Hogwarts! Conheceis Godric Griffindor, então?
    ‒ Não posso conhecer... ele morreu há mais de mil anos...
    ‒ Gerárd esquece que vós viveis menos que nós...   não me apresentei, mil perdões ‒ A gárgula ergueu-se o mais que uma gárgula podia erguer-se, pois andava abaixado de joelhos dobrados ‒ Meu nome é Gerárd Gamagliel, Gárgula da sétima casa de Gamagliel, do Clã dos Galdino, Gampstone, Grunjer e Grunhenwald ‒ disse e abaixou-se numa reverência. ‒  E vós ? ‒ ergeu os pequenos olhinhos de pedra para Harry.
    ‒ Harry Potter ‒ disse estendendo a mão ‒ Muito prazer. ‒ A gárgula apertou a mão de Harry e perguntou:
    ‒ Quereis desembaraçar-te do produto da terra que vos cobre?
    ‒ Como? Ah! A lama... seria bom
    ‒ Segui então este que vos fala.
    Foram andando ao longo do desfiladeiro que a fenda formava. Era muito escuro realmente, mas Gerárd tinha uma tocha de fogo sagrado nas mãos, conforme explicou a Harry, aquele fogo era muito antigo e não se apagava nunca, o que era uma bênção levando-se em consideração que ali não havia luz alguma... Pareciam estar no fundo de um abismo à noite, com um céu negro e sem estrelas bem acima. Chegaram a uma mina d'água onde Harry se lavou, a água era quente... lembrou-se que estavam tão dentro da terra que só podia realmente ser muito quente. Depois de limpo, perguntou a Gerárd:
    ‒ Como eu saio daqui?
    ‒ Sair?
    ‒ É, sair.
    ‒ Vós tendes asas?
    ‒ Não.
    ‒ Vassoura?
    ‒ Não.
    ‒ És oriental e possuis tapete voador?
    ‒ Também não.
    ‒ Então não sais, Gerárd sente muito, mas ficarás preso aqui como Gerárd.
    Só então Harry lembrou-se que Gárgulas podiam voar.
    ‒ Você não pode voar? ‒ A gárgula fez uma cara triste.
    ‒ Na verdade não. Não com estas asas. ‒ Virou-se de costas para Harry mostrando um par de asas. Uma dela estava quebrada pela metade. Sentiu muita pena de Gerárd, que parecia não saber há quanto tempo estava ali.
    ‒ Gerárd pode fazer a vós uma pergunta sem ofensa?
    ‒ Claro.
    ‒ A Guerra. Perdemos, não perdemos?
    ‒ Perderam. E feio.
    ‒ Gerárd imaginava. Gerárd caiu aqui na época da guerra... depois passou mais de 200 anos chamando... Quando viu que ninguém respondia, achou que Guerra havia sido perdida. Perdemos muitos?
    ‒ Não é pessoal, não é mesmo?
    ‒ Não, Gerárd dá a palavra.
    ‒ Morreram todos, só sobrou você...  ‒ Gerárd deu um grande suspiro.
    ‒ Gerárd sabia que ia terminar assim. Gerárd só queria confirmar. ‒ Gerárd começou a se lamentar, falando mal de seus parentes gárgulas, mortos há mais de mil anos, contando complicadas e chatíssimas histórias de briga de famílias entre Grenshills, Grunds, Gladstones... Harry ouvia, imaginou que devia ser chato ficar mil anos sem ter o que conversar. Harry julgou ver lá em cima algo como uma estrela cadente passar, mas achou que fosse imaginação sua. Alguns minutos depois Harry viu a luz de novo, e achou que ela estava descendo rapidamente em direção ao fundo da fenda. Ficou prestando atenção e de repente percebeu o que era a luz. Seu coração deu pulos dentro do peito. Ouvia um som inconfundível junto com a aproximação da luz. Gerárd percebeu também e ficou quieto, ouvindo. Então disse:
    ‒ Gerárd pensa que alguém vem resgatar Harry Potter. ‒ Em questão de minutos, uma silhueta grande foi se avolumando  e Harry viu pousar bem na sua frente, gigante, barulhenta e agradavemente amigável, a motocicleta de Sirius Black.

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