parte 2



Acordou no mesmo horário de todas as manhãs, tomou um banho quente e contemplou seu belo corpo nu no espelho. O começo normal de apenas mais um dia, mesmo sabendo que aquilo não passava de uma mentira. Bebeu um copo de água e vestiu-se; colocou a roupa mais simples que tinha, guardando as demais na mala já aberta sobre a penteadeira.



Lançou um olhar longo e perturbado ao jovem que dormia, num sono leve, entre os lençóis revirados de sua cama. Lembrou-se das ultimas palavras que o ouviu dizer “hoje você foi minha, só minha, e eu serei seu para sempre” uma súbita angustia instalou-se em seu coração.

- Desculpe, Harry.



você está

me contagiando

exaurida

minha, minha

garotinha triste

estou pensando em você

minha, minha

garotinha triste

você ficou

tão insensível

e fui eu quem

a deixou assim





Sussurrou para si, com os olhos umedecidos, prestes chorar. As lembranças da ultima noite passando vagamente por seus pensamentos confusos.



Foi para a cozinha, os pés descalços não faziam um ruído se quer em contato com o assoalho de madeira. As taças de vinho, sujas, ainda estavam sobre a mesa e a garrafa vazia, caída no tapete da sala. Ele logo acordaria. Ficou sentada no sofá, a cabeça enterrada entre as mãos tremulas, mal conseguia lembrar-se da ultima vez que se sentira assim. A boca seca, as palavras lhe faltavam, o suor frio escorria pelo seu corpo. Aquele turbilhão de sensações, mesmo sendo quase desconhecidas queriam dizer uma coisa muito obvia e simples, até mesmo para ela. Era medo.



Manteve-se praticamente imóvel até ouvir os passos dele ecoarem pelo corredor, e ver pelo canto do olho, sua silhueta encostada á porta da cozinha. Os cabelos desarrumados, o abdômen definido e o corpo que sempre foram dela e um par de olhos verdes, que nunca tinham sido de ninguém. Era o mesmo Harry Potter que conhecera há três anos.



Você está indo embora no trem das 7:30 e está indo para

Hollywood

Garota você me deu a mesma desculpa tantas vezes que parece

que o que era mal ficou bom



- Pensei que acordaria sentido o seu cheiro, mas quando abri os olhos estava sozinho – ele disse com a voz rouca e a fitando com um olhar indecifrável.

Ela, nada disse, não havia nada a ser dito, nada. Baixou o rosto, não conseguia olhá-lo nos olhos.

- O que foi Sophia? Fiz alguma coisa errada?

- Não, nada – ela respondeu com um sorriso amarelo para reconfortá-lo.

- Então por que você está chorando?

- Eu não estou chorando – disse ríspida limpando as lágrimas antes que escorressem pelo seu rosto – E você não deveria ter vindo até aqui. Volte para a sua namorada e me deixem em paz.



Você está pegando as suas coisas e dizendo como é difícil me

dizer que é hora de partir

Mas eu sei que você não está vestindo nada debaixo desse casaco





Ao ouvir aquilo, ela teve certeza de que ele havia desmoronado, não conseguia dizer uma só palavra, nem penetrar seus misteriosos olhos negros, tão frios e impassíveis, como ela sempre os mantinha para deixá-lo intimidado. Minutos de um silêncio desconfortante se passaram.



- Você vai embora outra vez, não vai? – finalmente ele teve coragem para perguntar.

- Vou, e dessa vez é pra sempre – respondeu, acendendo um cigarro, sabia que aquilo o irritava, mas era seu único modo de manter-se calma.

- É sempre assim não é? As coisas ficam difíceis, você começa a se envolver, e então vai embora!



Aquele tipo de amor

Me fez querer abaixar as cortinas

Aquele tipo de amor

Agora eu nunca, nunca, nunca, nunca mais serei o mesmo





Ela se manteve calada, com seu olhar impassível, como se, do nada, uma barreira cobrisse seus olhos, e eles, nada demonstrassem, nem raiva, nem compaixão, muito menos arrependimento, nada, absolutamente nada. Aquele olhar sempre deixava Harry sem saber o que fazer, poderia chorar, gritar, ou qualquer coisa que fizesse, sabia que tudo era inútil, ela havia construído uma muralha através de si, e nem mesmo ele era capaz de derrubá-la.



- Mas que droga! Porque você não responde! – gritou sacudindo-a pelos braços, o que nada adiantou, ela continuou impassível – Quer saber de uma coisa? Acho que eu vou mesmo voltar para a minha namorada, você não presta!



Eu vou enlouquecer, enlouquecer, baby, eu vou enlouquecer

Você apronta

Depois vai embora

Você me deixa

Louco, louco, louco, por você baby

O que eu posso fazer, querida

Eu me sinto triste





Ele já havia voltado para o quarto estava vestindo a camisa, quando se voltou para a porta, prestes a sair, a viu parada ao lado da penteadeira.

- Três anos se passaram e você continua parecendo um garoto de 16. Pensei que a morte de Dumbledore e todas as coisas que descobriu sobre mim haviam mudado alguma coisa, mas me enganei. Continua o mesmo, exatamente o mesmo. – enquanto falava ela se movia lentamente em sua direção – Até o olhar inocente não mudou. Foi isso que sempre me fez recuar, fugir depois de me envolver com você. Não quero acabar com esse brilho nos seus olhos.



- Mas se esqueceu de uma coisa Sophia, não tenho mais 16 anos, não sou uma criança. Sei que a qualquer momento você pode resolver fugir no meio da noite e nunca mais aparecer, eu não ligo, a simples esperança de que você pode voltar já me basta. – os olhos dele estavam cheios de lágrimas, o rosto corado, e o pior dos olhares de culpa, estampado em suas feições – Continua me tratando como se eu fosse apenas mais um joguinho, e algum tempo depois volta e comete os mesmos erros. Só não entendo porque você volta.- respirou fundo, encarou-a e viu que lágrimas escorriam pelo seu rosto como se aparecessem do nada, não pareciam fazer parte de suas feições de pedra. Entendeu naquele instante que nunca tinha visto-a realmente chorando. E gritou quase como um desesperado – Por que você volta, Sophia?

- Porque eu te amo.



Eu vou enlouquecer, enlouquecer, baby, eu vou enlouquecer

Você apronta

Depois vai embora

Você me deixa

Louco, louco, louco, por você baby

O que eu posso fazer, querida

Eu me sinto triste



Ela o encarou num silencio profundo e confuso, sua vontade era sair correndo antes que Harry fizesse alguma pergunta.



- O que você disse? – ele gaguejou, incrédulo.

Ela suspirou, cansada e saiu do quarto a passos duros, Harry atrás dela.

- Sophia – puxou-a pelo braço, forçando-a a parar e encara-lo

- O que? – perguntou fria, como se nada tivesse acontecido

- Eu também te amo – sorriu e para sua surpresa ela o abraçou



Harry sentia-se como se o tempo tivesse parado, seu coração explodia de felicidade “ela disse, finalmente disse que me ama!” repetia para si. Ficaram abraçados por vários minutos, como se aquele momento fosse eterno, e ao mesmo tempo, final. Passou as mãos delicadamente pelos cabelos negros dela e beijou sua testa. Nos seus braços era tão pequena e insegura, diferente da mulher que descobrira na noite anterior. Os dois extremos de personalidade, como os dois lados de uma moeda encontravam-se naquela garota. De um lado a mulher sensual, fria, arrogante e independente. Do outro, a garota tristonha, insegura e sofredora.



- Como vai ser daqui pra frente? – ela sussurrou, a voz rouca

- Não sei, e realmente não me importo, dês de que eu esteja com você – disse sorrindo

Sophia desvencilhou-se de seus braços e voltou-se para o quarto, Harry apenas a seguiu com o olhar. Fechou a mala que estava sobre a penteadeira, e o encarou, séria.

- Preciso ir para Paris – disse sem sinal algum de sentimento

- E quando você volta? – perguntou Harry com um ultimo pingo de esperança, a voz amarga

- Não sei, daqui a um mês, talvez dois. – olhou para o relógio na parede oposta – já esta tarde, eu preciso mesmo ir. Acho bom você se vestir e ir embora também – disse de costas para ele, já parada próxima á porta.



Com os olhos úmidos, Harry foi ate o quarto e vestiu-se, a felicidade de poucos segundos atrás tinha sumido. Há três anos atrás era assim, e teve a impressão de que continuaria sendo para sempre. Sophia aparecia do nada, bagunçava sua cabeça, seu coração e depois ai embora deixando um rastro de caos por onde passava. Andou até ela sem deixar uma única lagrima cair, e ali frente a frente outra vez, viu em seus olhos aquele mesmo brilho perdido de arrependimento que só havia aparecido uma única vez. Na mansão dos Neveu, quando ela lhe deu as costas para fugir com Nickolas.



Parou em frente a porta, pensou em tirar as chaves do bolso para abri-la, mas não estava trancada. Abriu-a devagar, tenso, com medo do que encontraria lá, dentro, já esperava um possível escândalo.

- Harry!!! Onde você estava? – ela gritou imediatamente ao vê-lo.



Aquele tipo de amor

Escraviza um homem

Aquele tipo de amor

Manda um homem para a sepultura



- Por ai – disse ríspido, tirando o casaco e se jogando na cama, estava irritado de mais para aturar Gina.

- Como assim “Por ai”??? – eu cheguei aqui 23:00 e você tinha sumido!!! Onde você estava! – gritou, num salto Harry pulou da cama, bufando de raiva e parou na frente dela

- Gina – suspirou tentando ser paciente – eu passei a noite fora, está bem!

- Aonde, com quem?? – ela gritou outra vez, os olhos úmidos

Andou sem rumo até ficar distante dela, dizer aquelas palavras olhando em seus olhos seria mais difícil ainda, parou de frente para a janela, tomou fôlego, e disse com a voz rouca

- Com a Sophia.

Minutos de silencio se seguiram, Harry não tinha coragem de dizer mais. Ouviu os passos de Gina se aproximarem.

- Você dormiu com ela, não é?

- Sim.



Só se deu conta do que havia acontecido quando sentiu seu rosto arder e ver a mão de Gina ainda apostos, pronta para lhe dar outro tapa. Mesmo sabendo que havia ferido os sentimentos dela não se importava, á aquela altura as coisas não podiam ser piores. Ela o encarava com ódio e rancor, os quais Harry jamais imaginou ver naqueles olhos sempre alegres e amorosos, sentiu pena dela.



- Desculpe – foi a única coisa que conseguiu dizer.

- Desculpas! Você me trai com aquela vagabunda e volta aqui pedindo desculpas! – gritou Gina.

- Vagabunda! Não se atreva a chamá-la assim outra vez – sem raciocínio sobre o que estava fazendo e com o súbito ódio controlando seu coração, precipitou-se para a frente e segurou Gina pelos dois braços com força.

- Me largue! – ela sussurrou, os dentes cerrados, Harry a soltou.

- Vá embora, por favor, está tudo acabado não esta?! – disse já sem forças para gritar outra vez.

Ouviu apenas os passos duros dela até a porta e a mesma bater num estrondo que fez as frágeis paredes do quarto tremerem.



insensível

acha que está

onde devia

mas será que está

no lugar certo?

você está

me contagiando

exaurida



Cansado de mais para sair ou fazer qualquer outra coisa, Harry tomou um banho quente e foi direto para a cama, mesmo sendo manhã, estava exausto pela noite (praticamente) não dormida. Aninhou-se nos lençóis quentes, mesmo assim o sono demorou a vir. Sentia-se triste, tanto pela ia de Sophia quanto por ter terminado com Gina, “Um bom sono resolverá” disse para si decidido, virou-se para o lado e dormiu.



Havia se passado mais de um mês, Sophia se encontrava deitada em sua cama na mansão dos Neveu em Paris. Olhou para o lado, lá estava seu marido, Nickolas Ogden, o mesmo garoto que conheceu aos 11 anos; em nada havia mudado, suas feições mantinham o brilho jovial e pertinente que sempre tivera. Já passavam das 8:00, levantou-se, vestiu o roupão e desceu as grandes escadarias de mármore até a sala de jantar, a comprida mesa de madeira escura estava arrumada.



- Bom dia senhora, espero que tenha passado bem a noite – disse Nancy, a empregada puxando a cadeira para ela se sentar.

- Bom dia Nancy. – respondeu friamente, estava de mau humor – O que veio na correspondência?

- O jornal do Sr. Ogden, e uma carta sem remetente para a senhora – ela lhe estendeu a mão.



Sophia puxou a carta na mãe da empregada e pediu que esta saísse, não havia duvida de que aquela carta era de Harry. Suas mãos tremiam e seu coração batia acelerado, quando terminou de lê-la, bateu o punho na mesa e se levantou bruscamente, assuntando Nancy.



“Sophia.



Sei que estou arriscando, mas preciso ter notícias suas. Não podemos simplesmente esquecer de tudo, aquela noite foi especial para mim, e sei que para você também. Quando voltar a Londres me procure com urgência, precisamos conversar.



Com carinho, Harry”



Amassou a carta e atirou-a na lareira acesa da sala, os olhos úmidos. Apoiou a cabeça nas mãos, olhando para o chão de madeira na esperança de que um buraco se abrisse e a tragasse para o inferno, era realmente isso que esperava, era isso que merecia. Ouviu passos distantes e o ranger da porta atrás de si, não precisou dar-se ao trabalho de se virar, sabia que era Nickolas.



- De quem era a carta? – ele perguntou friamente parando a poucos centímetros atrás da poltrona onde ela estava sentada.

- Harry Potter – disse sem rodeios, sabia que não conseguiria esconder nada dele por muito tempo.

- Deixe-me adivinhar, pedindo noticias suas, querendo te encontrar, dizendo que depois que transou com você ficou tão excitado para te ter outra vez que não agüenta mais? – ele falava enquanto andava devagar ao redor da poltrona, a fuzilando com os olhos.

- Isso mesmo – respondeu ela calma, mas com ironia na voz.

Um longo silencio se instalou, Sophia sentia os olhos dele sobre ela. Baixou os seus, mirando novamente o chão, não estava em condições de enfrenta-lo, mas não sabia que tipo de coisas iria ouvir.

- Você está se preocupando por nada, meu amor – levantou-se – eu queimei a carta – soltou um sorriso amarelo e o beijou de leve nos lábios, mas ele continuava frio.

- É justamente isso que me preocupa Sophia – ele disse alto quando ela lhe deu as costas indo para a sala de jantar, sem virar-se, respondeu apenas.

- Não seja tolo, Nickolas.



Sentou-se para tomar café, e do outro lado da comprida mesa, ele se sentou, não trocaram uma só palavra durante o resto da manhã. Na hora do almoço, Nancy se aproximou da mesa para servi-la, quando estendeu a mão para colocar em seu prato uma porção de molho, Sophia agarrou seu punho com firmeza, fazendo-a derramar todo o molho.



- Sei o quanto minha vida privada faz parte das suas conversas inúteis, mas da próxima vez que se meter nos meus assuntos será despedida, fui clara? – disse com firmeza, soltando o braço da moça, já assustada quando terminou.

- Foi sim senhora, desculpe-me – disse tremula e deixou a sala com choramingues.



Passou o resto da tarde pensando, os últimos 3 anos passaram por seus olhos como se tivessem acontecido outra vez. Chorou quando lembrou-se de seu casamento, uma igreja fria, sua entrada desolada, sozinha. Suas visitas constantes aos Pântanos de Morva, os primeiros passos de Gustave, o dia em que disse a primeira palavra, coisas tão simples e importantes que haviam sido perdidas. Tinha poucas coisas boas para lembrar. Olhou fixamente para o porta-retrato ao lado de sua cama. Ela, com Gustave no colo e Nickolas ao seu lado, todos rindo, acenando, felizes. Atirou-o contra a parede, aquilo tudo era uma mentira.



O sol já se punha, iluminado fracamente o jardim dos fundos, sentada na sacada esperando Nickolas voltar do trabalho, havia tomado a decisão.

- Nickolas, precisamos conversar – disse quando ele se aproximou.









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