Operação Cupido



- É um saco, não é? Aguentar um professor que tá morto, mas que continua dando aulas? – comentou Tiago para mim, enquanto estávamos debaixo de uma árvore na beira do lago.


- Tiago, esse é o nosso último ano. Só precisamos aguentar ele mais alguns meses. – respondi, deitada sobre a grama.


O sol daquela tarde de quarta-feira estava quentíssimo e ótimo para aproveitar o resto do dia.


- O que você pretende fazer quando terminar a escola? – ele perguntou.


- Não sei. Não gosto de nada que se refere ao Ministério, nem Gringotes e muito menos ser auror. – falei pensativa. – Se bem que auror não é tão ruim assim, mas é uma profissão muito perigosa, considerando os dias de hoje.


- Perigoso ou não, é isso que desejo ser. – ele se deitou do meu lado.


Ficamos em silêncio, escutando o barulho da lula gigante brincando no lago e alguns alunos correndo em volta.


- Você acha que vou conseguir N.I.E.M's suficientes para me tornar um auror? – Tiago perguntou.


- Claro. Você é muito bom em feitiços.


- Mas sou péssimo em Poções.


- Você tem a mim pra te ajudar.


Ele olhou para mim e sorriu.


- Eu tenho você. – ele repetiu.


Eu deitei minha cabeça em seu colo, e ele começou a acariciar meu cabelo.


- Estou com medo. – comentei.


- Do quê?


- De quando a gente sair de Hogwarts e enfrentar todo esse perigo lá fora.


- É só tomar cuidado.


- E você acha que todas as pessoas que foram mortas não estavam prevenidas?


- Deram azar.


- E se nós dermos azar?


- Impossível. Eu sou um cara muito sortudo.


Eu bufei, rindo.


- Acho que você tem que parar de ser tão metido.


- Estou falando a pura verdade. Ou você acha que só o talento me faz ganhar os jogos de quadribol?


- Acho que é só o talento. – eu disse, pegando uma folha caída no chão para rasgá-la. – E como vão os jogos?


- O treino continua bom. E agora estamos em primeiro lugar no campeonato. – ele respondeu, feliz. - Corvinal perdeu pra Sonserina enquanto eu estava na ala hospitalar. Fiquei surpreso de a Sonserina ter ganhado sem um batedor decente, já que Mulciber também foi proibido de jogar.


- É, fiquei sabendo.


- Porque você não foi assistir?


- Primeiro, se o senhor não se lembra, eu estava cuidando de você.


- Como poderia me lembrar se eu estava dormindo?


- E segundo – eu o ignorei. – Não estava a fim de ver a torcida nojenta da Sonserina.


- Eu também não fiquei feliz da Sonserina ter ganhado, mas isso nos beneficiou. Mas agora a Sonserina tem que perder para a Lufa-lufa no próximo jogo.


- Bem que quadribol poderia ser igual ao futebol. Assim poderia haver empate. – eu ri.


- O que é futebol?


- Um esporte trouxa.


- E como que é?


- Tem só uma bola e dois gols. Os jogadores têm que chutar a bola para dentro do gol adversário.


- Porque chutar?


- Porque são as regras.


- Que estranho. – comentou Tiago, rindo. – E como pode acabar em empate?


- Se o tempo acabar e os dois times tiverem o mesmo numero de gols.


- Tempo?


- Noventa minutos. – respondi, achando engraçada a conversa. Nunca pensei que um dia iria explicar regras de futebol a um homem.


- Que estranho. – repetiu ele. – Esses trouxas inventam cada coisa.


- Para eles é a coisa mais comum do mundo. Eles achariam estranho um esporte em que todos voam em uma vassoura.


Ele parou um pouco de falar, ainda pensando.


- Me fale mais. – ele pediu.


- Sobre o quê?


- Os trouxas.


- O que quer saber?


- Para que servem os carros?


- Para se locomover. – respondi, com um tom igual ao que se explica a uma criança que dois mais dois são quatro.


- Mas não é muito devagar?


- Eles ainda não sabem se transportar como bruxos.


- Ainda?


- É, vai saber se eles descobrem. – falei, rindo mais ainda com a sua cara intrigada.


- Hum. – ele disse, simplesmente.


Agora o sol definitivamente estava se pondo e o céu começou a escurecer, fazendo com que as luzes do castelo começassem a acender.


- Vamos para dentro?


- Ok.


Nos colocamos de pé e partimos em direção ao castelo, nossas mãos entrelaçadas.


- Estou feliz que nunca mais te vi com o Ranhoso. – ele comentou.


Eu suspirei impaciente.


- Eu falei pra você que era definitivo. E não comece esse assunto.


- Tudo bem, só foi um comentário. – ele se defendeu.


- Sabe, esse ano está uma loucura. Aconteceu tanta coisa que eu já não tô aguentando mais.


- O quê, por exemplo?


- Voce e Severo lutando pra lá e pra cá, aquela confusão do Salgueiro Lutador, você sendo atingido por uma Maldição Cruciatus de Mulciber, a sala de Slughorn explodiu, o Professor Binns morreu, eu descobri que Aluado é um lobisomem sem falar do que andar acontecendo fora da escola. – falei, relembrando os fatos e percebendo que não foi necessariamente na ordem certa.


- Mas isso vai parar. Agora que voce está longe daquele Ranhoso tudo vai começar a se acalmar.


- Espero que sim.


Chegamos ao Salão Principal já cheio de alunos jantando e logo localizamos Maria, Dougie e os outros. Nos acomodamos junto a eles.


- E aí, caro Pontas. – cumprimentou Sirius. – Achei que Lílian havia te seqüestrado.


- Eu tenho cara que seqüestra alguém? – indaguei.


- Desse tempo pra cá acho que sim. – ele respondeu, comendo com veracidade uma coxa de peru. Preferi não responder, pois se ele dissesse alguma coisa não seria nada agradável.


Olhei para a mesa dos professores, onde agora se destacava um vulto branco perolado. Me perguntei porque ele ainda comparecia as refeições, já que não podia mais comer.


- Fizeram o dever de Astronomia? – perguntou Maria, preocupada. – É sério, estou muito preocupada com os N.I.E.M's.


- Você conseguiu passar em Astronomia no N.O.M.? – perguntou Dougie espantado.


- Passei, não tá lembrado não? – Maria ergueu a sobrancelha. – Ou você acha que não sou inteligente o bastante para não conseguir isso?


- Eu não disse isso. – ele respondeu depressa.


- Então porque o espanto?


- Eu não havia me lembrado.


- Sei. – ela falou com desdém. – Voce sempre duvidou de minha capacidade, Dougie, e já não é de hoje.


- Desde quando isso?


- Desde sempre! – ela exclamou, batendo o guardanapo com ferocidade na mesa.


- Te controla, Maria. – resmungou Dougie, olhando para seu prato.


- Me controlar? – ela respondeu. – Não tenho culpa de você ser um idiota e ficar julgando o que eu sou e o que não sou capaz de fazer!


Sem dizer mais nada, ela se levantou e saiu com passos pesado pelo Salão. Todos que presenciaram a pequena discussão a seguiram indagadores com o olhar até ela sair de vista.


- O que houve com ela? – perguntou Aluado, antes de qualquer um de nós.


- Isso é o que eu queria saber. – Dougie falou, com a boca cheia. – Ela é louca.


- Acho que você deveria ir falar com ela, Dougie. – eu respondi com seriedade. – Ela deve estar com algum problema.


- Vai você. Você é a amiga dela.


- E você é o namorado dela!


- Eu não namoro ela pra aguentar as crises bobas que ela vem tendo.


Olhei pra ele, chocada.


- Vai falar com ela! – insisti.


- Não!


- Vocês precisam conversar!


- Eu não estou a fim de conversar, já falei.


- A questão não é estar a fim ou não, e sim que vocês precisam conversar.


- Caramba, Lílian! – ele exclamou, batendo o guardanapo na mesa igual à Maria. – Tudo bem! Eu falo com ela! Mas não vai adiantar nada.


Ele se levantou e caminhou enraivecido.


- O que há com eles? – foi a vez de Tiago perguntar.


- Não me pergunte. – respondi, me servindo de mais batatas.


Quando chegamos à Torre da Grifinória apenas encontramos Dougie sentado numa poltrona, adiantando o dever de História de Magia (que Binns passou sem hesitar) e com uma cara nada amigável.


- É melhor nem chegar perto. – sussurrei para os outros. – Maria deve estar lá em cima. Vou falar com ela.


Subi apressada as escadas para o dormitório onde Maria já estava ali, por acaso adiantando o dever de Astronomia, com a mesma cara do que o namorado.


- Maria, o que aconteceu? – perguntei assim que fechei a porta.


- Não quero falar sobre isso. – ela respondeu sem erguer a cabeça.


- Ah quer sim! – sentei do seu lado na cama. – Pode falar.


Ela continuou a escrever, sem ousar olhar para mim.


- Maria?


- Ah, ok. – ela disse, jogando os pergaminhos pro lado. – Mas é um motivo muito bobo.


- Fala.


- Sabe, é que eu pressinto, não, eu sinto que o meu namoro com Dougie não vai dar certo.


- Como assim? – falei espantada.


- É que está muito... sem graça ultimamente. Era tão bom antes, era bom ficar com ele, mas agora está muito entediante.


- Vocês sentem falta de se agarrar na aula da McGonagall? – brinquei e ela riu.


- É sério, Lílian. Mas o pior é que ele não esta ligando pra isso. Pra ele esta tudo bem, ficamos só nisso. Ele até veio me perguntar o que houve, de tão ignorante que é!


- Então porque voce não fala a verdade?


- Eu não! Ele tem que se tocar!


- Mas os homens são assim mesmo, Mariazinha. – falei, passando a mão em sua cabeça. – Voce não pode esperar nada deles.


- Voce não pode dizer isso.


- Porque não?


- Olhe só o Tiago! Vocês dois!


- Mas é que... está no começo. – falei, pensando nisso agora. – Talvez mais tarde tudo se esfrie.


- Não está no começo. Faz tempo que está rolando um clima entre vocês.


- Mas só agora estamos namorando firme.


Ela fez uma expressão arrasada.


- Espera aí. Acho que posso te ajudar. – falei, tendo uma súbita idéia.






- Acha que vai dar certo? – Tiago falou.


- Não custa tentar. – sussurrei, para que McGonagall não nos escutasse.


- É. – ele concordou, excitado. – E se não der certo?


- Deixa de ser pessimista Tiago Potter. – falei, acenando a varinha. Estávamos praticando Feitiços Conjuratórios, onde devíamos fazer surgir uma pena. Comigo não tinha acontecido nada ainda.


- Está fazendo o movimento errado, Lílian. – falou Aluado atrás de mim, segurando meu pulso para me ensinar. Dessa vez metade da pena surgiu.


- Obrigada. – agradeci e voltei à atenção a Tiago. – Veja, fala algo pra convencer Dougie a ir até a tapeçaria dos trasgos dançantes, pense no que eu te disse e fale pra ele entrar, ok?


- Ok.


- Vou dar um jeito de levar Maria até lá. Vou chegar dez minutos antes, ok?


- Ok. – ele repetiu, assentindo. Ele fez o movimento da varinha e a pena surgiu intacta sobre sua mesa.


- Parabéns. – elogiei, e ele sorriu satisfeito.


Eu imitei o que ele havia feito e então finalmente conjurei a pena.


- Então, não se esqueça, às nove horas. – informei, ao mesmo tempo em que a sineta tocava.


Peguei correndo meu material para acompanhar Maria.


- Vai jantar com a gente hoje? – perguntei a ela.


- Fazer o quê. – ela suspirou e então me olhou desconfiada. – O que voce queria dizer com ter uma idéia para me ajudar ontem? Voce não me respondeu.


- Ainda to pensando nela, mas não tenho nada formado. – eu disse, inventando uma desculpa na hora. Digamos que estou ficando boa nisso. Repito que estou andando muito com Tiago. – Coisas trouxas.


- Coisas trouxas?


- É. É uma... simpatia.


- Simpatia?


- É.


- Funciona? – ela perguntou, risonha.


- Deve funcionar. – dei de ombros. – Tenho que ver com minha mãe.


- E posso saber o que se trata essa simpatia?


- "Simpatia para ajudar no seu relacionamento". – me surpreendi de novo com a rapidez que meu cérebro formulava a mentira.


- Acho que não tem esse termo em Regras de uma boa bruxa. – ela comentou.


- Ah, com certeza não.


Fomos para o Salão Principal pro jantar. Quando nos sentamos, Tiago me lançou um olhar significativo e eu assenti. Maria e Dougie fingiram não notar a presença do outro.


Durante toda a refeição ficou um clima desconfortável com o silencio dos dois, mas Almofadinhas tratava tudo aquilo com naturalidade ou motivo de gozações.


Passado o tempo do jantar, que eu achei que fosse durar uma eternidade, o Salão começou a esvaziar e todos os alunos foram para suas respectivas casas.


Eu e Maria ficamos adiantando os deveres na Sala Comunal; eu sempre consultava o relógio, enquanto Maria fazia listas de coisas que estava odiando sobre o Dougie. Deu oito e quarenta e Maria continuava a falar.


- Maria, quer que eu te mostre o lugar que Tiago me levou? – perguntei, interrompendo quando ela começava a falar mal do xampu de cabelo que Dougie usava.


- Agora? – ela perguntou desconfiada.


- A Sala Precisa só aparece à noite. – menti.


- Mas tem tantos deveres...


- Não tem importância – falei, me pondo de pé. – Depois eu te empresto os meus. Vamos ou não?


Ela ficou indecisa, mas então deu de ombros e assentiu.


Quando passávamos pelo buraco do retrato, onde Tiago estava encostado, lhe fiz um sinal discreto e rápido, enquanto sem ninguém ver ele me passava uma capa prateada.


Maria voltara a por defeitos em Dougie enquanto caminhávamos pelo corredor, e por azar topamos com Filch.


- O que fazem aqui?


- Tudo bem. – respondi depressa. – Sou monitora-chefe e estou fazendo a patrulha.


- E ela? – ele apontou pra Maria.


- Ela estava perambulando por aí. Já vou dar um jeito nisso.


- Mas a Torre da Grifinória é pra lá. – ele apontou na direção que estávamos vindo.


- Mas não é pra Torre da Grifinória que a estou levando. – respondi, piscando.


Ele nos olhou desconfiado e então virou as costas, manco, com Madame Nora em seus calcanhares.


- Foi por pouco. – comentou Maria.


- É. – suspirei aliviada.


Quando chegamos ao sétimo andar, fui depressa enfrente da tapeçaria dos tragos e pensei três vezes enquanto eu andava para lá e para cá: "Quero um lugar bem romântico para um casal. Quero um lugar bem romântico para um casal. Quero um lugar bem romântico para um casal.".


- O que você está fazendo? – ela indagou e então com uma exclamação notou a porta que do nada havia aparecido na parede.


- Uau! – ela falou quando entramos na sala. Notei que não era do mesmo jeito que eu e Tiago passamos. Com certeza ele fez grandes modificações no local.


Consultei o relógio enquanto ela ainda olhava a sala. Nove horas.


- Acho que eu ouvi passos. – falei. – Vou ver quem é.


Sai da sala e vesti a capa; segundos depois Tiago e Dougie apareceram no corredor. Tiago andou pra lá e pra cá como eu e a porta surgiu.


- Tá aí. A Sala Precisa. – Tiago indicou a porta.


- Legal! – exclamou Dougie e entrou na sala, sem hesitar.


- Lílian? – perguntou Tiago divertindo-se.


Eu despi a capa.


- Acha que eles vão ficar lá dentro? – ele indagou.


- Acho que sim. Maria já deve ter entendido tudo.


- Sendo assim é melhor a gente ir. Quase topamos com Filch, que estava muito desconfiado.


- Tá, entra na capa. – eu disse, olhando para os lados a fim de ver se o zelador não estava por aí.


Caminhamos de volta à sala comunal. Tiago teve que se curvar, pois seus pés ficaram totalmente à mostra.


- Tomara que dê tudo certo. – Tiago comentou.


- É.


Eu esperava que a noite dos dois fossem tão boa, ou melhor, do que a que tive com Tiago. Mas eu tinha 99% de certeza que deu certo. Já se passavam da meia-noite e a cama de Maria continuava ainda vazia.

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